Pepe
Escobar: 2025 - Segunda Renascença ou Caos?
Em uma
deslumbrante manhã do inverno toscano, estou na lendária igreja dominicana de
Santa Maria Novella, fundada em inícios do século XIII e por fim consagrada
1420, em um lugar muito especial na História da Arte: bem em frente a um dos
afrescos monocromáticos pintados em 1447-1448 pelo mestre da perspectiva Paolo
Uccello, retratando o Dilúvio Universal.
É como
se Paolo Uccello estivesse nos retratando – em nossos turbulentos dias de hoje.
Assim, inspirado pelo superstar platônico Marsilio Ficino – imortalizado em um
chiquérrimo manto vermelho por Ghirlandaio, na Cappella Tornabuoni – tentei dar
uma de De Volta ao Futuro e imaginar quem e o que Paolo Uccello colocaria em
sua representação de nosso atual dilúvio.
Comecemos
com os positivos. 2024 foi o Ano dos BRICS – com os méritos de todas as
conquistas indo para o incansável trabalho da presidência russa.
2024
foi também o Ano do Eixo da Resistência – até a série de ataques sofridos nos
últimos meses, um grave desafio que irá propelir seu rejuvenescimento.
E 2024
foi o ano que definiu os contornos do final de jogo da guerra por procuração na
Ucrânia: o que ainda resta a ser visto é a que profundidade a “ordem
internacional baseada em regras” será enterrada no solo negro da Novorossiya.
Voltemo-nos
agora para as auspiciosas perspectivas que temos pela frente. 2025 será o ano
da consolidação da China como a força geoeconômica máxima de todo o planeta.
Este
será o ano quando a batalha definidora do século XXI – Eurásia versus OTANistão – será agudizada
em uma série de vetores imprevisíveis.
E será
o ano do avanço dos corredores interconectados – o fator definidor da
integração eurasiana.
Não é
por acidente que o Irã é de importância central nessa conectividade entrelaçada
– do Estreito de Hormuz (pelo qual transitam, diariamente, pelo menos 23% do
petróleo mundial) ao porto de Chabahar, que liga o Oeste Asiático ao Sul da
Ásia.
Os
corredores de conectividade que devem ser observados são a volta das principais
sagas do Gasodutistão, o duto de 1.800 quilômetros Turcomenistão-Afeganistão-Paquistão-Índia
(TAPI); o Corredor Internacional de Transportes Norte-Sul (CITNS) que liga três
BRICS (Rússia-Irã-Índia) e diversos outros aspirantes à condição de parceiros
dos BRICS; o Corredor Econômico China-Paquistão (CECP), o projeto carro-chefe,
a Iniciativa Cinturão e Rota (ICR) e, por último mas não menos importante, a
Rota do Mar do Norte (ou Rota da Seda do Norte, como a chamam os chineses),
projeto que vem avançando rapidamente e futuramente irá se converter na
alternativa mais barata e mais rápida ao Canal de Suez.
Alguns
dias antes do início do Trump 2.0 em Washington, Rússia e Irã, por fim, irão
assinar oficialmente, em Moscou, um acordo de parceria estratégica ampla que
vem sendo preparado há dois anos: mais uma vez, um acordo de importância crucial
entre dois dos principais BRICS, com enormes repercussões em cascata em termos
da integração eurasiana.
·
Um canal de comunicação totalmente inviolável
Dmitri
Trenin, um respeitado membro do Conselho Russo de Políticas Exteriores e de
Defesa, é quem tem o mapa de percurso mais realista para uma conclusão
aceitável da guerra por procuração na Ucrânia.
“Aceitável”
não chega nem perto de descrevê-la – porque, do ponto de vista das “elites” do
Ocidente Coletivo, que apostam tudo o que possuem nesta guerra, nada é
aceitável além da derrota estratégica da Rússia, que jamais acontecerá.
No pé
em que as coisas andam, o Presidente Putin vem de fato contendo setores da
elite moscovita que são a favor não apenas de cortar a cabeça da serpente, mas
de também retalhar seu corpo.
Trump,
de sua parte, não tem a menor motivação para se deixar levar para mais um
atoleiro: deixem isso para os sem noção dos chihuahuas europeus.
Portanto,
um possível avanço rumo a um periclitante acordo de “paz” também interessa à
Maioria Global – para não falar da China, que entende até que ponto as guerras
são péssimas para os negócios (pelo menos para quem não pertence à máfia dos
armamentos).
Quando
se trata de uma sempre possível escalada “existencial”, ainda não estamos fora
da zona de perigo, mas ainda restam três semanas para que venha a ocorrer algum
grande golpe alimentado a terror, como em uma falsa bandeira.
Os
dois primeiros meses de 2025 serão absolutamente decisivos no que se refere ao
traçado de um possível compromisso.
Elena Panina,
do RUSSTRAT, contribuiu com uma avaliação estratégica sóbria e concisa do que
pode vir a ocorrer.
O que
Trump essencialmente deseja, tanto quanto anseia por uma porcaria de hambúrguer
do McDonald, é aparecer como o Macho Alfa Supremo. A estratégia de negociações
táticas de Putin não se focará em cortar o barato de valentão de Trump. O
problema é como conseguir isso sem empanar o poder de pop star de Trump – e sem
despejar mais combustível na pira belicista do OTANistão.
Putin
tem em mãos uma série de trunfos que ele mantém secretos – relativos à Europa,
aos britânicos, à China, à própria Ucrânia e ao Sul Global como um todo.
A
demarcação de esferas de influência fará parte de um possível acordo. O
problema é que nenhum detalhe específico deve vazar – tendo que ser mantido
impenetrável à inteligência ocidental.
O que,
segundo observa Panina, significa que, para negociar com Putin, Trump precisará
de um canal de negociação totalmente inviolável, que nem o MI6 possa decifrar.
Uma
dura tarefa, uma vez que, por todo o Deep State, silos sio-con privilegiados
inebriam-se com as vitórias mais recentes dos psicopatas do Velho Testamento no
Líbano e na Síria, e com a fragilização de Teerã daí resultante. Mas isso não
significa que o vínculo Irã-Rússia-China-BRICS esteja em risco.
·
A dinâmica está instalada; pisem com cuidado
Putin
e o Conselho de Segurança devem estar prontos para implementar, passo-a-passo,
um jogo diplomático bastante complexo, por saberem que o trio derrotado e
supremamente irado de democratas, britânicos e governo ucraniano exercerá
pressão máxima sobre Trump e o converterá em “um inimigo da América”, ou alguma
outra bobagem desse tipo.
Moscou
não aceitará trégua nem congelamento: apenas uma solução real.
Caso
isso não funcione, a guerra continuará no campo de batalha, o que para Moscou
não é problema – ou com uma escalada ainda maior. A humilhação final do Império
do Caos, então, estará completa.
Enquanto
isso, a Guerra Fria 2.0 entre China e Estados Unidos avançará mais na esfera
pop do que de forma substantiva. Os analistas chineses mais sagazes sabem que a
verdadeira competição não trata de ideologia – como na Guerra Fria original –
mas sim de tecnologia, desde a IA até o aperfeiçoamento de cadeias de
fornecimento contínuas.
Além
disso, o Trump 2.0, pelo menos em princípio, tem menos que zero interesse em
provocar uma guerra por procuração – ao estilo Ucrânia – contra a China em
Taiwan e no Mar do Sul da China. A China possui muito mais recursos
geoeconômicos do que a Rússia.
Não é
exatamente intrigante, portanto, que Trump esteja sugerindo a ideia de um G2
entre os Estados Unidos e a China. A bolha do Deep State verá isso como a praga
suprema – e lutará contra ela até a morte. O que já é certo é que os poodles
europeus se afogarão em um pântano imundo.
Bem,
as “elites” politicas que nomearam espécimens microcefálicos como a Medusa von
der Leyen e a doida de pedra da mina estoniana como representantes máximos da
União Europeia, que lançam uma guerra contra seu principal fornecedor de
energia, que dão pleno apoio ao genocídio transmitido 24/7 a todo o planeta,
que são obcecadas em erradicar a cultura que as definiu, e que, na melhor das
hipóteses, louvam da boca para fora a democracia e a liberdade de expressão,
essas elites merecem se espojar na lama.
Sobre
a tragédia síria, o fato é que Putin sabe quem é o verdadeiro inimigo:
certamente não um bando de mercenários salafi-jihadistas cortadores de cabeças.
E o Sultão de Ancara também não é o inimigo. Da perspectiva de Moscou, apesar
de todos os seus altissonantes sonhos de substituir a “Ásia Central” pelo
“Turquistão” nos livros escolares turcos, ele não passa de um ator geoeconômico
e mesmo geopolítico de menor importância.
Para
parafrasear o inestimável Michael Hudson – talvez nosso Marsilio Ficino vestido
por Paolo Uccello em um chiquérrimo manto vermelho – é como se, nessa
conjuntura pré-diluviana, as elites americanas estivessem dizendo que “A única
solução é a guerra total contra a Rússia e a China”; a Rússia estivesse dizendo
que “Esperamos que haja paz na Ucrânia e no Oeste Asiático” e a China estivesse
dizendo que “Queremos paz, não a guerra”.
Talvez
isso não baste para que se chegue a uma solução de compromisso – qualquer tipo
de compromisso. A dinâmica, portanto, está instalada: a classe dominante dos
Estados Unidos continuará a impor situações de caos, enquanto Rússia, China e
os BRICS continuarão a testar no “laboratório dos BRICS” modelos de
desdolarização, configurações alternativas ao FMI e ao Banco Mundial e,
futuramente, talvez até mesmo uma alternativa à OTAN.
Uma
cornucópia de anarquia e Guerra de Terror de um lado; realismo sereno e
coordenado de outro. Preparem-se – para qualquer coisa. Partindo da Renascença
florentina, um dos – poucos – pontos altos da humanidade, hoje relegado à
memória, pisem com cuidado através desse incendiário 2025.
¨ 'Um braço da propaganda dos EUA': o que está por trás
das reportagens sobre o narcotráfico mexicano?
Mais uma vez, a
presidente do México, Claudia Sheinbaum, questionou que o jornal americano The
New York Times noticiou a questão do tráfico de drogas no país. O que está por
trás das reportagens de um dos mais importantes veículos de comunicação do EUA?
Nas últimas
semanas, o The New York Times apresentou três reportagens relacionadas ao
tráfico de drogas no México. Na primeira delas, publicada no início de
dezembro, a mídia alegava que estudantes mexicanos de química estavam sendo
recrutados pelo cartel de Sinaloa para trabalhar em laboratórios de produção de
fentanil.
A esse
respeito, a presidente do
México negou
a versão e destacou que, na verdade, "isso começou do outro lado. Pelo que
sei, pelo que vi, é uma série de televisão norte-americana que, de alguma
forma, mostra como um professor de química — e também, como se isso fosse
bom — se envolve na produção e venda de drogas", em referência à
série televisiva Breaking Bad.
No dia 26 de
dezembro, o jornal noticiou que cartéis estavam usando mexicanos sem-teto e
animais para testar novas versões de fentanil. Enquanto isso, na reportagem
divulgada em 29 de dezembro, o The New York Times expôs fotografias e
entrevistas com pessoas supostamente associadas ao cartel de Sinaloa que se dedicavam à
fabricação de fentanil. Nas imagens podiam ser vistos os laboratórios
clandestinos usados pelo crime organizado.
Segundo a
presidente, a reportagem "não tem muita credibilidade pela forma como foi
apresentada, e vamos comprovar isso cientificamente".
Para tal, Sheinbaum
indicou que, nas próximas semanas, o processo de produção do opiáceo será
apresentado em uma coletiva de imprensa. "É muito diferente [o processo],
embora seja uma droga que deve ser combatida, e muitas apreensões de
laboratórios de metanfetaminas que também foram feitas."
"Uma coisa é a
produção de metanfetaminas. Outra muito diferente é o fentanil."
<><> 'Sempre
busca promover a agenda dos EUA'
Segundo o
jornalista e analista mexicano Gabriel Infante, a publicação de
reportagens sobre o suposto funcionamento do narcotráfico mexicano,
especificamente na produção de fentanil, é outro exemplo dos interesses
políticos que predominam na mídia ocidental.
"O The New
York Times — e isso não é novo, mas existe há décadas — é conhecido por ser um
braço de propaganda que procura promover a agenda e os interesses dos Estados
Unidos."
A publicação das
matérias ocorre justamente em meio a uma série de ameaças do presidente eleito
nos Estados Unidos, Donald Trump, contra o México em
questões de segurança,
como a promessa de classificar os cartéis do narcotráfico como terroristas, bem
como a imposição de tarifas se o fluxo de drogas para os EUA não for
interrompido.
"Essas
reportagens são publicadas em um momento político específico e não se dirigem
aos leitores mexicanos, mas sim ao leitor doméstico, norte-americano, e é
precisamente para reforçar essa ideia de que o México não pode lidar com o
tráfico de drogas, que precisa da intervenção dos Estados Unidos."
Da mesma forma, o
jornalista mexicano destacou que as ações do governo do ex-presidente mexicano
Andrés Manuel López Obrador e que as ações dos escritórios da agência de
fiscalização antidrogas estadunidense (DEA, na sigla em inglês) não foram
apreciadas pelas autoridades americanas.
"Eles não
gostam disso […]. O que o The New York Times publica, que tem uma projeção
bastante internacional, é captado por outros meios de comunicação e se
torna um escândalo midiático, mas pretende claramente retratar que o México não
consegue lidar com o tráfico de drogas, embora vejamos que os relatos são
fáceis de refutar."
Fonte: Brasil 247/Sputnik
Brasil
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