terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Diplomacia brasileira em retrospectiva: principais conquistas da política externa de Lula em 2024

O ano de 2024 não deu trégua para a diplomacia no planeta. Conflitos se intensificaram e proliferaram ao redor do planeta, sobretudo no Oriente Médio. Embates se intensificaram entre grandes potências, envolvendo embargos econômicos, eleições conturbadas, disputas geopolíticas e negociações nos organismos multilaterais.

Apesar das crises e dos impasses que exigiram jogo de cintura, mas também firmeza por parte do governo brasileiro, um balanço do ano de 2024 da política externa aponta para um saldo positivo, importantes tratados e acordos, mediação em conflitos e organização exitosa de eventos envolvendo chefes de Estado em solo brasileiro.

<><> Confira os principais feitos no sistema internacional do Itamaraty na busca por um mundo mais multipolar:

·        1. Cúpula dos líderes do G20

A reunião das maiores economias do mundo, realizada no Rio de Janeiro, logrou, após dois anos de desentendimento, consenso na declaração final dos chefes de Estado que obteve aval de países antagônicos como Estados Unidos e Rússia e, mesmo, de países que ameaçavam azedar o texto final, como a Argentina liderada por Javier Milei.

Merece destaque a Aliança Global contra a Fome e Pobreza e o grupo do G20 Cidades, com previsão de financiamento para a infraestrutura de cidades sustentáveis.

·        2. Mediação em conflitos internacionais

O Brasil também se posicionou de maneira proativa como mediador em conflitos internacionais, retomando uma diplomacia pacifista e de diálogo.

Isso inclui a atuação em temas como o conflito na Ucrânia, onde o Brasil tem defendido soluções pacíficas e buscado construir pontes entre diferentes atores internacionais, como o plano de paz sino-brasileiro, proposto conjuntamente com a China ao Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), em outubro.

·        3. Retorno ao Comitê de Direitos Humanos da ONU

Em 2024, o Brasil conquistou uma vitória diplomática significativa ao ser reeleito para o Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Esse retorno reflete o esforço do Brasil para reconquistar uma posição de destaque no cenário internacional, especialmente em questões de direitos humanos.

·        4. Diplomacia no Oriente Médio e na África

A diplomacia brasileira tem buscado expandir sua influência no Oriente Médio e na África, com o Brasil sendo ativo em foros multilaterais e reforçando suas parcerias comerciais e políticas com países da região.

A intensificação das relações — com países como a Arábia Saudita e a intensificação dos laços com nações africanas — são algumas das vitórias diplomáticas importantes. Vale destacar a retomada das negociações com os Emirados Árabes Unidos e o Mercosul.

O acordo volta a avançar mais de duas décadas depois da visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Liga Árabe e quase duas décadas depois da assinatura do marco de cooperação entre o Mercosul e o Conselho de Cooperação do Golfo.

Em 2023, quando Lula visitou o país duas vezes, os Emirados Árabes Unidos foram o 28º maior destino de produtos brasileiros e, no primeiro semestre de 2024, avançaram para a 13ª posição.

·        5. Acordo Mercosul-União Europeia

Embora o acordo Mercosul-União Europeia (UE) tenha sido assinado em 2019, as negociações de implementação continuaram em 2024 com importantes avanços. O Brasil desempenhou um papel fundamental para que o acordo fosse finalmente ratificado e começasse a ser implementado, especialmente no que diz respeito ao comércio de produtos agrícolas, industriais e serviços.

Negociadores do governo brasileiro esperam que o acordo seja assinado em breve, após solucionadas as exigências ambientais do bloco europeu. Embora o acordo Mercosul-UE tenha sido assinado em 2019, em 2024 houve progresso significativo na ratificação e na implementação desse tratado.

·        6. Acordo de Vaca Muerta

região de Vaca Muerta, na Argentina, é uma das maiores reservas de gás e petróleo não convencionais do mundo e, em novembro, o Brasil e a Argentina formalizaram um acordo para explorar em conjunto recursos naturais em Vaca Muerta, com foco em investimentos e infraestrutura compartilhada.

Esse acordo é estratégico para a segurança energética do Brasil, pois a exploração de gás de xisto e petróleo não convencionais em Vaca Muerta pode ajudar a garantir o fornecimento de energia de forma mais sustentável e integrada entre os dois países.

·        7. Acordo Brasil-China em energia renovável

Em 2024, o Brasil também fortaleceu sua cooperação com a China no setor de energias renováveis, com a assinatura de um acordo para expandir projetos de energia solar, eólica e hidrelétrica. A parceria também se alinha aos compromissos do Brasil em relação à Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável e ao Acordo de Paris sobre mudanças climáticas.

Ao todo foram firmados 37 acordos durante a visita de Xi Jinping ao Brasil para a Cúpula de Líderes do G20.

·        8. Acordos ambientais com países da bacia do rio Amazonas

Em 2024, o Brasil reforçou acordos multilaterais com países da bacia do rio Amazonas para a proteção ambiental e sustentabilidade. Esses acordos visam combater o desmatamento ilegal, promover o desenvolvimento sustentável da região e proteger a biodiversidade.

A colaboração entre Brasil, Peru, Colômbia e outros países da região tem sido crucial para fortalecer os mecanismos de cooperação transfronteiriça e garantir o futuro ambiental da Amazônia, com foco em políticas de preservação e uso sustentável dos recursos naturais.

·        9. Operação Raízes do Cedro: maior repatriação da história

Coordenada pelo Ministério das Relações Exteriores, em parceria com os ministérios da Saúde e da Defesa, a operação Raízes do Cedro resgatou, entre outubro e novembro, mais de 2,6 mil pessoas, além de 34 animais de estimação que estavam no Líbano.

Ao todo foram feitos 13 voos, que também transportaram 90 toneladas de doações, essenciais para o país afetado pelos ataques de Israel. Essa foi a maior operação de repatriação já feita pelo Brasil, de acordo com o Itamaraty.

Ano que vem promete ainda mais provas de fogo para o Brasil, a começar pelas duas cúpulas globais em território brasileiro: a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas e o encontro de chefes de Estado do BRICS.

¨      Trama de golpe de Estado, escala 6×1, Musk vs. STF: fatos que marcaram a política brasileira em 2024

Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas listam os temas mais marcantes da política brasileira em 2024.

Um ano que foi marcado por episódios inéditos para a política nacional. Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, analistas destacam os principais acontecimentos que marcaram a política em 2024.

<><> Prisão dos irmãos Brazão

Um tema que gerou forte repercussão política em 2024 foi a prisão dos irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, apontados como mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), em 2018, e de Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, acusado de usar o cargo para atrapalhar as investigações.

Bruno Bolognesi, cientista político e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), afirma que, embora importante, não é possível dizer que as prisões signifiquem um avanço, tendo em vista que explicitam a força da milícia, que ele aponta como algo "paraestatal".

"Junta gente do Estado com gente fora do Estado. Então eu acho que, de fato, é importante a investigação. Acho que demorou muito para conseguir chegar a um culpado, chegar no mandante", afirma.

Ele afirma ser "um alívio saber que o sistema judiciário, a polícia, funciona em alguma medida", mas que, por outro lado, "é muito preocupante saber que esse pessoal está cada vez mais se metendo em política e cada vez mais elegendo pessoas, cada vez mais tendo cargos no Judiciário, no Legislativo, no Executivo".

<><> Demissão de Silvio Almeida

Outra notícia que causou repercussão este ano foi a demissão de Silvio Almeida do comando do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, após vir à tona acusações de assédio sexual. Uma das vítimas foi a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.

Bolognesi avalia que o caso acabou criando uma situação desconfortável porque "esperava-se mais do Silvio Almeida", em um contexto de combate ao racismo, ao machismo e de defesa de minorias.

"Acho que tem um problema, que é ter ali uma pessoa idealizada, e essa idealização do nada acabar com denúncias de assédio que, claro, não têm nenhuma conclusão ainda. […] Mas são denúncias que parecem ter bastante concretude."

<><> Elon Musk vs. STF

O especialista aponta, ainda, o embate entre o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e o empresário Elon Musk como um dos fatos marcantes de 2024.

Ele afirma que o episódio revelou que o Brasil tem legislação própria, que deve ser imposta inclusive a bilionários norte-americanos. Por outro lado, ele aponta que o caso expôs certo ativismo do STF.

"Eu acho que esse tom de um STF meio heroico, que está consertando o país, consertando o mundo, eu acho que toma esse tom de polarização que não é bom. O tempo todo no Brasil a polarização é reforçada. Então esse tipo de coisa reforça ainda mais a divisão que está expressa [na população]", afirma.

<><> Fim da escala 6×1

Rodolfo Tamanaha, professor de ciências políticas do Ibmec Brasília, considera a discussão em torno do fim da escala 6×1 uma das mais acaloradas do ano, que impacta diretamente a vida do trabalhador. Segundo ele, quem trabalha na escala 6×1 tem muita dificuldade de "viver além do trabalho".

Por outro lado, Tamanaha afirma que o assunto também gerou discussão, liderada pelo empresariado, sobre o impacto econômico que a mudança poderia trazer. Segundo ele, embora tenha sido um passo importante levar a discussão do tema para o Congresso, essa é uma batalha difícil de ser vencida pelos que reivindicam pelo fim da escala 6×1.

"É uma queda de braço difícil para o trabalhador ganhar. Já deu um passo importante, que foi levar essa discussão para os legisladores, mas o empresariado brasileiro tem muita força para batalhar lá por tantas, ou não, mudanças, ou mudanças que não o prejudiquem tanto."

<><> Bets esportivas

Tamanaha também aponta a discussão em torno das apostas esportivas, popularmente conhecidas como Bets, como outro ponto nevrálgico de 2024.

Ele lembra que as bets, antes tipificadas no Código Penal como contravenção, foram legalizadas em 2018, durante o governo de Michel Temer. Nos anos seguintes, a atividade se intensificou no país, mas sem uma regulação mais decisiva.

"Somente em 2023 que o governo Lula editou uma medida provisória, que depois foi convertida em uma lei, e aí você teve uma regulamentação mais detalhada com ação nesse tema. Foi criada uma secretaria específica dentro do Ministério da Fazenda, do Ministério da Saúde e dos Esportes para tratar do tema, pensando nos seus vários reflexos — não só econômicos, mas reflexos do ponto de vista de saúde, de publicidade, de proteção à criança e ao adolescente. Então realmente é um tema que ainda carece de muita discussão."

<><> Prisão de Braga Netto

A prisão do general Walter Braga Netto, por envolvimento na tentativa de golpe de Estado tramada em 2022 e atualmente investigada pela Polícia Federal (PF), foi um dos episódios mais efervescentes da política em 2024.

É a primeira vez na história do país que um general de quatro estrelas, a mais alta patente do Exército Brasileiro, é preso, o que torna o episódio particularmente marcante, conforme aponta Rogério Baptistini, cientista político e sociólogo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

"Os militares têm atuado como um poder moderador e têm se sentido confortáveis nesse papel. A nossa história é tristemente marcada por manifestações dos militares, por conspirações e por intervenções de longo prazo. A última delas, de 1964, durou 21 anos e terminou com a isenção dos militares no projeto de anistia de 1979. A prisão do Braga Netto agora sinaliza que as coisas estão mudando", avalia.

Ele acrescenta que o processo que culminou na prisão do general é "robusto" e é possível que novas prisões sejam anunciadas nos próximos meses.

"Eu acredito que a Procuradoria-Geral da República vai apresentar a denúncia contra os militares e os civis, e essa denúncia vai conduzir a um processo que vai colocar muita gente diante da justiça em condições de enfrentar penas severas. Nós vamos ver penalizações muito graves, porque as pessoas tentaram cometer um crime que é o mais grave crime que se pode cometer contra o Estado Democrático, ou seja, suspender a democracia, aplicar um golpe de Estado."

<><> Especulação sobre Lula tentar a reeleição em 2026

Quando disputou as eleições em 2022, Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que seu objetivo era apenas um mandato e que não pretendia disputar a reeleição em 2026.

Porém, ao longo do ano, especialmente nos últimos meses, muitos analistas especularam que Lula já estaria mirando a corrida eleitoral de 2026, enquanto outros apontam que ele não teria condições de concorrer por questões de saúde.

Questionado sobre o tema, Baptistini afirma não saber se Lula vai ser, de fato, candidato em 2026, mas frisa não ver outro nome substituto à altura no campo governista. Ademais, ele critica o fato de associarem o discurso em torno da reeleição à saúde do presidente.

"Por enquanto, não há nomes no campo governista maiores do que Lula. No campo oposicionista, os nomes que surgem lutam pelo espólio de [Jair] Bolsonaro. Para Lula, o caminho também não é fácil. O cenário ainda é muito instável para a gente poder fazer projeções, mas a saúde não parece ser um empecilho", afirma.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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