quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

É provável que Trump rife a Ucrânia e promova a acomodação geopolítica com a Rússia, aponta analista

Em entrevista o podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas analisam o que esperar do novo mandato de Trump em questões nevrálgicas como a relação entre EUA e China e o conflito ucraniano, e se a mira do republicano pode, eventualmente, se voltar para o Brasil.

Donald Trump tomou posse nesta segunda-feira (20) para o seu segundo mandato como presidente dos EUA. Sua chegada à Casa Branca ocorre em meio a uma série de incertezas geradas pelas declarações polêmicas que disparou antes mesmo de vencer as eleições presidenciais.

Trump já falou em anexar o Canadá, publicou um mapa com o território do Canadá anexado aos EUA, ameaçou comprar a Groenlândia, ainda que a Dinamarca não queira vender, defendeu aumentar a contribuição dos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) de 2% para 5% e ameaçou taxar os países do BRICS em 100%, caso não desistam de uma moeda alternativa ao dólar para transações entre seus integrantes.

Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas analisam quais ameaças disparadas por Trump correm o risco de serem concretizadas e se ele pode, eventualmente, voltar a sua mira para o Brasil.

Thiago Rodrigues, professor de relações internacionais do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (Inest/UFF), afirma que a retórica de Trump sempre traz consigo uma ideia de que os EUA são uma grande vítima de vários complôs ou articulações globais, que vão desde tentativas de destruição da indústria americana pelos chineses até questões geopolíticas que ameaçariam os EUA, como questões no Ártico, na Rússia e na Europa.

"Essa retórica vitimista é sempre preocupante porque ela procura mobilizar a sociedade de um país, quando ela é colocada sempre como uma preparação, na verdade, para o que seria uma defesa a contra-ataques externos. Mas como esses ataques são muitas vezes construídos, não são reais, essa retórica prepara a sociedade para o ataque. Ou seja, prepara para mobilizações de cunho agressivo no exterior", explica.

Ele acrescenta que, em paralelo, Trump se fortalece por um apoio interno além do tradicional, que inclui um conjunto de magnatas do chamado "novo capitalismo", como Mark Zuckerberg e Elon Musk, que, segundo ele, de forma muito oportunista se aproximaram dele e pegaram carona em seu discurso.

Rodrigues afirma que atualmente a China cumpre o papel de "inimigo crível" para a população americana, por ser um grande país, com grandes recursos tecnológicos e um Estado forte.

"É muito mais visível, muito mais pautável para um cidadão médio entender outro país poderoso como inimigo do que, por exemplo, uma rede terrorista, que é algo muito mais fluido, algo sem materialidade. Então isso é mais fácil de vender e, ao mesmo tempo, tem uma batalha comercial imensa colocada com os chineses que é difícil saber até que ponto ela é real, porque há enormes interesses do capitalismo americano na economia chinesa", afirma.

Há uma expectativa de um encontro em breve entre Trump e o presidente russo, Vladimir Putin. A Suíça já ofereceu seu território para o encontro. Questionado sobre o que esperar de Trump em relação ao conflito ucraniano, Rodrigues frisa que o ucraniano Vladimir Zelensky deve ter sido "a primeira pessoa a ter entrado em pânico" após ser anunciada a vitória de Trump no pleito presidencial americano.

"Porque a aproximação de Trump com Putin no primeiro mandato foi grande e me parece que faz parte dos cálculos geopolíticos de Washington sob [a gestão] Trump uma política de acomodação e apaziguamento com a Rússia. Assim foi na época da Crimeia e como tudo indica que vai ser assim também na Rússia", afirma.

Ele acrescenta que isso é o que Trump sinalizou ao afirmar que vai acabar com o conflito ucraniano em apenas 24 horas.

"Quando Trump diz que vai resolver rapidamente a questão da guerra na Ucrânia, essa resolução rápida [...] parece que é uma sinalização do tipo: 'Olha, Putin, você consolida o que o você já conquistou agora. O Zelensky e os ucranianos vão ter que se conformar com o que eles têm e a gente acaba essa guerra agora, a gente faz algum tipo de compensação para a Ucrânia'", diz o analista.

Segundo ele, é provável que Trump exija alguma garantia de que a Ucrânia não seja incorporada, de fato, ao sistema europeu da OTAN e à União Europeia (UE).

"Eu acho que, para falar no português bem claro, a Ucrânia vai ser rifada pelo Trump. [...] Acho que interessa mais ao Trump uma Rússia (não aliada, seria muito forte dizer isso), mas uma Rússia com que [...] se pode acertar grandes questões geopolíticas, do que insistir nessa diretriz que vinha sendo dos EUA sob [a gestão] Biden de apoiar o Zelensky e de apoiar uma expansão que interessava, por exemplo, a Alemanha, uma expansão do sistema europeu à fronteira com a Rússia."

Roberto Goulart Menezes, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB), considera que a China será a questão central no primeiro ano do novo mandato de Trump. Ele destaca que o país asiático alcançou um superávit comercial em 2024 de quase US$ 1 trilhão (cerca de R$ 6 trilhões).

"A China já detém quase um terço da produção industrial do planeta, isso é praticamente inédito, esses números são inéditos para o comércio mundial. E nós sabemos que isso dá a dimensão do tamanho do desafio dos EUA com o Trump para lidar com a China", afirma.

Ele lembra que as políticas que Trump adotou para conter Pequim em seu primeiro mandato foram mantidas na gestão Biden, e diz que "o governo Trump, é claro, tende a mantê-las e fazer ajustes no sentido de aumentar a pressão contra a China".

O especialista afirma ainda que a América Latina "não será poupada" da "política externa agressiva" de Trump, e é esperado um aumento de pressão, principalmente sobre Cuba e Venezuela.

"Nós temos aí tudo para esperar um aumento da pressão contra o governo de [Nicolás] Maduro na Venezuela, que tomou posse no último dia 10 de janeiro para o seu terceiro mandato, também isolado na região, isolado internacionalmente. Então isso aumenta as dificuldades do governo Maduro."

Ademais, ele aponta que a mira de Trump pode, sim, se voltar ao Brasil, apesar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Celso Amorim, afirmarem que o Brasil se relacionará bem com a gestão Trump assim como se relacionou bem com a gestão de George W. Bush (2001-2009).

"Tudo leva a crer que o Brasil também vai ter dificuldades com Trump, porque Trump vai adotar medidas comerciais indiscriminadas, [e isso] vai afetar o Brasil", afirma.

Sobre a questão do financiamento ucraniano, Menezes destaca que os EUA já colocaram mais de US$ 200 bilhões (cerca de R$ 1,2 trilhão) de dólares na Ucrânia e que Biden implicou os EUA no conflito, o que a gestão Trump considera que é algo que pode ser revisto.

"Eu acho que a política de Trump em relação à Rússia, se a gente lê pela Estratégia de Segurança Nacional dos EUA, tanto a de 2017 quanto a de 2022, nenhuma das duas colocam a Rússia como alvo central."

Já em relação ao Brasil, Menezes afirma que é provável que Trump cancele o apoio de US$ 500 milhões (cerca de R$ 3 bilhões) prometido por Biden ao Fundo Amazônia.

"E em relação à Amazônia, hoje o que preocuparia ou preocupa o Brasil é uma possível ação militar da Venezuela contra a Guiana, que poderia levar a uma entrada dos EUA [em um eventual conflito], e os EUA a fincarem uma base militar [na Amazônia]", afirma o especialista.

<><> Rússia está aberta para dialogar com administração Trump sobre conflito ucraniano, afirma Putin

A Rússia está pronta para dialogar com o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, sobre o conflito ucraniano, disse o presidente russo Vladimir Putin em uma reunião do Conselho de Segurança da Rússia na segunda-feira (20).

O presidente Putin parabenizou Trump pela posse, que ocorrerá hoje (20) às 12h00 (14h00, horário de Brasília) na Rotunda do prédio do Congresso em Washington.

O líder russo admitiu que a campanha eleitoral de Trump foi muito difícil, acompanhada com a pressão contínua contra ele e sua família e que culminou com atentados contra sua vida.

"Estamos abertos ao diálogo com a nova administração dos EUA sobre o conflito ucraniano. O mais importante aqui é abordar as raízes essenciais da crise", disse Putin.

Ele sublinhou que Moscou sempre esteve pronta para manter relações equitativas com qualquer administração da Casa Branca e nunca se recusou a dialogar.

A Rússia também vê as declarações do presidente eleito Trump em que expressa desejo de recuperar contatos diretos com Kremlin, rompidos pela administração do presidente cessante Joe Biden.

Moscou saúda as palavras de Trump sobre a necessidade de fazer todo o possível para evitar uma Terceira Guerra Mundial.

"Quanto à resolução da situação em si, gostaria de enfatizar mais uma vez que seu objetivo não deve ser um breve cessar-fogo, nem algum tipo de trégua para o reagrupamento de forças e rearmamento para a subsequente continuação do conflito, mas uma paz duradoura baseada no respeito aos interesses legítimos de todas as pessoas, de todos os povos que vivem na região", acrescentou.

Neste contexto, Putin afirmou que a parte russa espera um diálogo igualitário e de respeito mútuo, que também incluiria as questões de estabilidade e segurança estratégica.

O presidente russo ressaltou que continuará lutando em prol dos interesses de seu povo:

"Esse é, na verdade, o objetivo e o significado da operação militar especial."

¨      Novo chanceler dos EUA: negociações com a Rússia iniciarão 'quase imediatamente', pois é prioridade

O novo secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, diz que o conflito ucraniano tem de terminar e as negociações com a Rússia sobre o assunto devem começar "quase imediatamente", uma vez que é uma das principais prioridades do presidente Donald Trump.

Recém-promovido ao cargo, Rubio não anunciou um prazo certo do fim do conflito, mas confirmou que o novo governo quer alcançar a paz.

"Queremos que a guerra termine. Isso está bem claro. Vocês viram o presidente falar que ele quer ser um presidente que promove a paz e acaba com conflitos, e isso também será complicado", disse Rubio, citado pelo canal de TV CNN.

Ele também alegou que, de qualquer maneira, cada parte do conflito "vai ter que ceder algo", reiterando mais uma vez que ele precisa terminar.

Quando perguntado em que momento será possível estabelecer, pelo menos, um cessar-fogo na Ucrânia, Rubio afirmou:

"Isso será uma das principais prioridades do presidente, portanto, será quase imediata."

Marco Rubio, um filho de imigrantes de Cuba, se tornou o secretário de Estado dos EUA na administração Trump, sucedendo ao prévio Antony Blinken, conhecido por ter se manifestado contra negociações com a Rússia para a continuação da luta na Ucrânia.

Em abril de 2024, Rubio votou contra um pacote de ajuda militar à Ucrânia de US$ 95 bilhões (mais de R$ 573 bilhões).

Contudo, já ontem (20), o presidente russo Vladimir Putin parabenizou Trump pela posse e anunciou que a Rússia está disposta a dialogar com o novo presidente dos EUA sobre o conflito ucraniano.

¨      Laços entre China e Rússia não dependem da conjuntura política, diz Putin

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, ressaltou que o trabalho conjunto da China e da Rússia tem papel central no contexto da estabilidade nos assuntos internacionais durante videochamada com o líder chinês, Xi Jinping, realizada hoje (21).

O líder russo destacou que as negociações entre a China e a Rússia no início do ano já são uma boa tradição. Conforme as palavras de Putin, os dois países estão coordenando seus passos em organizações multilaterais, inclusive na ONU e em seu Conselho da Segurança, na Organização para Cooperação de Xangai (OCX) e em outras.

O presidente russo também mencionou o fato de que a China e a Rússia estão promovendo juntamente a construção de uma ordem multipolar justa e realizando um trabalho em prol dos interesses de segurança indivisível no espaço euroasiático e no mundo inteiro.

"Estes laços são autossuficientes e não dependem dos fatores de política interna e conjuntura mundial atual", acrescentou o presidente Putin.

Vladimir Putin ressaltou que ambos os países têm um nível bastante alto de desenvolvimento da cooperação econômica.

"Conforme os dados chineses, ele [volume de negócios] totalizou quase US$ 245 bilhões [cerca de R$ 1,5 trilhão]. China é o nosso parceiro-chave, e a Rússia já está no quinto lugar na lista dos países parceiros comerciais da China", finalizou.

Durante os governos de Xi Jinping e Vladimir Putin, o vínculo entre as duas nações se tornou mais forte, afirmou o jornal Global Times em dezembro de 2024.

Segundo a mídia, tanto a Rússia como a China têm mantido estreita comunicação e coordenação nas plataformas multilaterais das quais os países fazem parte, como o BRICS, a ONU e a Organização para a Cooperação de Xangai, o que demonstra mais claramente a independência e resiliência e dá o exemplo de intercâmbios amistosos entre os principais países e vizinhos.

¨      Jornal revela quem na administração Biden insistiu que a luta na Ucrânia continuasse

Sendo elogiado por seus esforços em um conflito, o discurso final deste alto funcionário se destacou pelas críticas duras e diretas em relação a um outro. Um dos jornais mais importantes e famosos dos Estados Unidos, o The New York Times, chama-o de "secretário da Guerra".

O turno de serviço dessa pessoa começou com a retirada desordenada do pessoal norte-americano do Afeganistão, onde Washington acumulou forças e meios durante 20 anos e deixou tudo em poucos dias em agosto de 2021.

A situação foi tão precária que alguns congressistas do Partido Republicano demandaram que o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, se demitisse, lembra o The New York Times.

Porém, com o início do conflito armado entre a Ucrânia e a Rússia, "chegou seu momento".

Em uma entrevista recente ao mesmo jornal, Blinken admitiu que Washington começou a armar Kiev discretamente mesmo antes do início da operação militar especial russa na Ucrânia, em setembro e dezembro de 2021.

No novo artigo, o jornal diz que no conflito ucraniano o secretário de Estado do EUA, de fato o chanceler, foi mais um estrategista da guerra do que um pacificador.

"Quando o presidente do Estado-Maior Conjunto, Mark Milley, sugeriu no final de 2022 que a Ucrânia deveria capitalizar os ganhos no campo de batalha buscando conversações de paz com Moscou, Blinken insistiu que a luta deveria continuar", revela o The New York Times.

Porém, foi um novo conflito armado que prejudicou significativamente a reputação do chefe da diplomacia norte-americana.

Depois do ataque do movimento palestino Hamas da Faixa de Gaza contra Israel em 7 de outubro de 2023, Blinken sublinhou não só a aliança histórica entre Tel Aviv e Washington, mas também sua etnicidade judia nessa questão.

Mas quanto mais assustadores se tornavam os métodos de guerra israelenses em Gaza, mais crescia a desilusão do público com o secretário de Estado, tendo com o pano de fundo o declínio de eficácia de suas visitas numerosas ao Oriente Médio.

"De todos os personagens do elenco no topo, Antony Blinken tem sido o mais decepcionante", cita o jornal um diplomata e veterano da guerra do Iraque, Michael Casey, que se demitiu no ano passado de seu cargo no Departamento de Estado em Jerusalém, onde trabalhou sobre Gaza.

Seus últimos discursos finais foram ofuscados por manifestantes que trouxeram cartazes "Blinken: Criminoso de Guerra" e gritaram com ele acusando-o de genocídio.

"O trabalho do sr. Blinken e sua reputação com o conflito estão tão entrelaçados que ele poderia muito bem ser chamado por um título de gabinete cancelado que ainda está nas placas do antigo prédio do Departamento de Estado – secretário da Guerra", afirma o jornal.

O Departamento de Guerra dos Estados Unidos foi um antigo departamento executivo do governo dos EUA responsável pela coordenação do Exército dos EUA, dissolvido em 1949.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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