O
entreguismo dos donos do Brasil
Muito
se comentou, nas últimas semanas, sobre o papel entreguista da extrema direita
em sua relação umbilical com o imperialismo. O falso nacionalismo do
bolsonarismo, com o uso de bonés ou a continências à bandeira norte-americana,
é conhecido há bastante e não causa qualquer surpresa. Contudo, nesse processo,
também chamou atenção a postura das classes dominantes, oscilando entre bater
continência aos ditames de Trump e fazer críticas pontuais à política do chefe
do imperialismo.
Essa
postura entreguista não é exatamente uma novidade para as classes dominantes.
Para as elites, o Brasil que emergiu do século XIX não deveria ser uma nação de
capitalismo autônomo, como França e Estados Unidos, mas um país cuja economia
estaria atrelada à lógica e à dinâmica do mercado externo, ditado pelas grandes
potências, consolidando um desenvolvimento econômico subordinado “aos centros
estrangeiros de economia mundial e praticamente extorsivo quanto à massa da
população pobre e trabalhadora”. O que se tem no Brasil é uma classe dominante
que não defende uma perspectiva de autonomia em relação ao imperialismo.
Os
militares, pretensamente nacionalistas, também nunca tiveram uma perspectiva
autônoma em relação ao imperialismo. Uma parcela de oficiais, que parece não se
incomodar com os ataques de Trump contra Brasil, se aliou ao bolsonarismo na
frustrada tentativa de golpe que desembocou na depredação de prédios públicos
em Brasília. Essa subordinação não é novidade. Golbery do Couto e Silva,
ideólogo da Escola Superior de Guerra (ESG), referindo-se à relação entre o
Brasil e os Estados Unidos, afirmava, em 1959: “O Brasil é também uma nação
que, pela sua origem cristã e os valores democráticos e liberais que
substanciam a cultura ainda em germe nesta fronteira em expansão, integra o
Mundo do Ocidente” .
Segundo
Golbery, atuante politicamente durante os governos da ditadura, o Brasil
deveria desenvolver “uma geopolítica consciente e decididamente partícipe da
geoestratégia defensiva da Civilização Ocidental, a cujos destinos temos os
nossos indissoluvelmente ligados, quer o queiramos ou não” . O anticomunismo,
assim, se evidenciava e concretizava como dominação política e ideológica do
imperialismo.
Esses
temas relacionados ao desenvolvimento econômico e à subordinação das classes
dominantes aos interesses imperialistas foram discutidos por Florestan
Fernandes. Partindo da compreensão de que a “revolução burguesa” no Brasil se
deu como processo lento e realizado desde cima, no qual as elites buscavam uma
autonomia relativa, mas não uma independência em relação ao imperialismo,
aponta que se difundiu desde o século XIX a ideia de que o desenvolvimento
capitalista poderia produzir, em qualquer país de origem colonial, resultados
similares aos dos países europeus e dos Estados Unidos. Bastaria estar aliado a
esses países. Para Fernandes, a difusão dessa ideia “foi parte do processo de
colonização, de transferência da ideologia dominante nas nações capitalista
hegemônicas”.
Fernandes
apontava a particularidade do desenvolvimento das classes dominantes no Brasil,
destacando que a burguesia atingiu “sua maturidade e, ao mesmo tempo, sua
plenitude de poder sob a irrupção do capitalismo monopolista”, mantendo e
agravando as condições “que tornaram a sociedade brasileira potencialmente
explosiva, com o recrudescimento inevitável da dominação externa da
desigualdade social e do subdesenvolvimento”.
Embora
o Brasil tenha o PIB entre os maiores do mundo, sua produção não está voltada
para o seu próprio desenvolvimento, por meio de infraestrutura, emprego e
melhoria das condições sociais da população. Sua produção está voltada
prioritariamente para interesses de grupos ou empresas estrangeiras, que se
ocupam de transferir a maior parte possível dos ganhos para a matriz. Esse é um
traço de países dominados pelo imperialismo, nos quais o mercado interno está
ligado ao externo.
Essa
questão está intrinsecamente ligada ao processo de transformação histórica e
econômica. A transição estrutural e histórica para o padrão de desenvolvimento
dentro das relações imperialistas requer profundas alterações “dos mecanismos
de mercado, na organização do mercado financeiro e de capitais, nas dimensões
da produção industrial”. Esse processo ocorre com a conivência e o apoio das
classes dominantes, implicando tanto em alianças comerciais internas e externas
como na necessidade de políticas desenvolvidas pelo Estado.
Percebe-se
que essa lógica está mais aguda contemporaneamente, em especial por conta do
avanço da dominação imperialista depois do colapso da União Soviética. Nos
governos mais recentes, em diferentes países, inclusive no Brasil, a dominação
econômica do imperialismo elevou-se consideravelmente. Nem mesmo os governos
Lula, com sua tímida e eventual retórica desenvolvimentista e suas políticas
sociais, implementou ações que visassem acabar com a lógica de dominação
imposta pelo imperialismo. Os governos petistas deram continuidade à política
econômica dos governos anteriores.
A
economia do Brasil é dominada pelo capital externo, cujos interesses são os que
emanam de suas matrizes. O capital privado nacional está ligado de forma íntima
com o estrangeiro, sendo seu sócio menor, defendendo não um projeto de nação,
mas os interesses de seus aliados externos. Portanto, ao vermos na atualidade
as classes dominantes oscilando entre o apoio aos ataques de Trump e a defesa
de uma negociação em que o Brasil assuma uma postura subordinada, devemos
procurar a explicação nas particularidades do desenvolvimento econômico e nas
relações estabelecidas com o imperialismo.
A
conquista de uma independência de fato, a partir do controle sobre seus
recursos naturais e sobre a economia, somente é possível a partir de uma
ruptura com essas relações de dominação. Contudo, medidas como essas são apenas
possíveis por um governo dos trabalhadores que, apostando na mobilização
popular, aponte suas ações no sentido da superação do capitalista e da
construção do socialismo. Para a burguesia nativa, somente existe a perspectiva
de negociar melhores formas de permanecer submisso aos ditames imperialistas,
não sendo aliada, em nenhuma hipótese, na luta por uma nova sociedade.
• Via crucis do rentista traíra. Por
Fernando Nogueira da Costa
Despertou
revolta dentre os colegas da Faria Lima e todos se manifestaram contra a
declaração de “a política monetária está funcionando”, dada pelo
economista-chefe do BTG Pactual e ex-secretário do Tesouro, durante o governo
golpista. Foi estampada na primeira página do jornal oficioso de O Mercado!
“Estamos,
em um cenário surpreendente, com o menor nível de desemprego da história e
expectativas de inflação para 2025, 2026 e 2027 não esperadas por ninguém há
três meses. Está se consolidando o cenário para o Banco Central do Brasil
começar a cortar juros no primeiro trimestre do próximo ano”, disse. Segundo
ele, “se tivermos mais duas leituras positivas de inflação, vai entrar na mesa
a possibilidade de antecipar esse corte para o fim do ano corrente”.
Os
parças agora querem o queimar na avenida! A cena é digna de uma ópera bufa do
rentismo. O coitado, sempre tão fiel à cartilha fiscalista, de repente, cometeu
o pecado mortal: sugeriu a política monetária do governo petista está
funcionando de maneira coordenada com a política fiscal e, pior, insinuou os
juros poderem cair antes do combinado.
Resultado?
Uma rebelião furiosa entre os sacerdotes da Faria Lima, como se alguém tivesse
mexido no cálice sagrado do CDI.
Na
avenida simbólica dos Fundos de Investimento, o coro é uníssono: “Blasfêmia!
Sacrilégio!”. Para eles, a simples ideia de cortar juros é como anunciar a
expropriação da propriedade privada.
O
“pleno emprego histórico”, elogiado pelo ex-secretário do Tesouro no governo
temeroso é, na visão desses colegas, um problema moral. Afinal, trabalhadores
com salário em alta e confiança demais no pleno emprego se tornam atrevidos,
exigem direitos, e isso ameaça o dogma central: o rentista feliz.
Não
importa se as expectativas de inflação para 2025, 2026 e 2027 estão melhorando.
Para o coração da Faria Lima, notícia econômica só é boa se não servir de
argumento para baixar juros. Se o pão ficar mais barato e o desemprego cair,
isso é visto como “ruído estatístico”. Mas se o dólar espirrar, aí sim a
inflação importada é motivo para convocar uma cruzada monetária com juros
disparatados diante do Fed, e fazer os farialimers felizes.
O
pecado do ex-secretário do Tesouro foi lembrar em público sobre a possibilidade
de os juros de 15% aa caírem. A taxa de juro mensal equivalente é de
aproximadamente 1,17%, um juro composto capaz de propiciar acumulação
financeira.
Isso
traz tranquilidade inclusive para os pobres coitados detentores apenas do
patamar mínimo para estar entre os 161.726 detentores de contas exclusivas de
69 mil grupos econômicos familiares. Com R$ 2,421trilhões no agregado, dá a
bagatela média de praticamente R$ 15 milhões per capita, ou seja, se todo esse
valor fosse aplicado em 100% CDI, daria o suporte de rendimentos de juros
mensais de R$ 175.152,68, certamente, muito inferior à “renda do trabalho”
dessa laboriosa gente.
Para se
ter uma ideia, segundo Sérgio Gobetti e outros (2025), “no topo da pirâmide –
entre os 0,01% mais ricos – a renda captada pela PNAD é quase doze vezes
inferior à apurada a partir dos dados do IRPF. Enquanto a PNAD estima renda
média mensal de pouco mais de R$ 200 mil em 2023 para esse grupo, as
declarações dessas mesmas pessoas revelam rendimentos médios mensais de R$ 2,5
milhões”.
Por
conta dessa penúria, foi como se um padre da consagrada Santíssima Trindade do
Tripé Macroeconômico tivesse dado uma piscadela para o demônio da heterodoxia.
Seus ex-colegas já afiam as foices e martelos, acendem tochas e esquentam o
óleo ao ponto de fervura: querem queimá-lo vivo, na avenida, não por
discordarem dos fundamentos, mas por ele ter ousado sugerir os lucros
financeiros não precisarem crescer para sempre à custa da economia real.
No
fundo, o ex-temeroso só disse o óbvio: a política econômica do demônio petista
está funcionando! Mas, na liturgia da Faria Lima, verdade é só aquilo capaz de
manter o juro alto e o povo quieto. E qualquer desvio dessa missa – mesmo vindo
de um ex-secretário do Tesouro do louvado governo golpista com a aprovação
oportunista das reformas neoliberais de “flexibilização” (sic) – merece
fogueira!
Daí, em
uma “Via crucis do rentista traíra”, o imprudente falante da verdade, refletida
nos números estatísticos, foi obrigado a carregar a cruz do corte de juros.
Enquanto desfilava era vaiado pelos colegas ao longo da Faria Lima.
Estação
I (BTG Pactual) – O pecado da verdade
O
economista-chefe do BTG e ex-secretário do Tesouro, pela ousadia de afirmar em
público “a política monetária está funcionando”, cometeu um pecado monumental.
Os colegas da Faria Lima reagiram como inquisidores: murmuraram entre si,
prepararam tochas e manchetes de jornal e o escorraçaram de lá.
Estação
II (Itaú BBA) – O julgamento editorial
Nas
salas envidraçadas da Avenida Faria Lima, cada planilha se tornou um martelo e
uma foice para punir o “cumunista infiltrado”. Analistas e colunistas da Grande
Imprensa Neoliberal discutiram: “Como ele ousou sugerir corte de juros?!” A
verdade científica pouco importa, aqui não é um campus universitário! O dogma
do superávit e do juro alto deve prevalecer acima de qualquer realidade
econômica!
Estação
III (Bradesco BBI) – A carga do corte de juros
O
imprudente ergue então a cruz simbólica do corte de juros, cada quilo carregado
com expectativas de inflação favoráveis e pleno emprego histórico. O peso é
brutal, porque tocar nesse tema é tocar no sagrado: o rendimento seguro do
rentista.
Estação
IV (Goldman Sachs) – O espancamento midiático
Tochas
são acesas, ou melhor, tweets, colunas e editoriais criam alvoroço. Os
farialimers se inflamam. “Que ele seja queimado em plena avenida!”, gritam os
sacerdotes do tripé em uníssono. A cruz dele é atacada com argumentos
circulares: “Baixar juros é populismo!”, “Austeridade fiscal em risco!”,
“Confiança de O Mercado abalada!”.
Estação
V (JPMorgan Chase)– O auxílio da heterodoxia
Não há
recurso com apelo à heterodoxia, ela só existe para ser citada como
advertência. O trânsfuga caminha sozinho, enquanto o coro da Faria Lima repete:
“Que sirva de lição: aqui não se critica o juro alto nem se anuncia pleno
emprego!”.
Estação
VI (Credit Suisse) – A chegada à cruz do conselho monetário
Finalmente,
o sem papas na língua, capaz de expressar o pensado de forma direta, mesmo se
isso não for agradável para os outros colegas, chega à mesa de sacrifício do
Copom simbólico. Ali, suspira. A cruz do corte de juros ainda pesa, mas ele
acha ter escutado um sussurro da economia real: “Há espaço sim para baixar
juros e celebrar o pleno emprego”.
Estação
VII (UBS) – Ressurreição monetária
Se o
Banco Central do Brasil ousar antecipar o corte, a ressurreição do cristo será
discreta: sussurrada entre economistas, ignorada pelos editorialistas, e
imediatamente convertida em manchete alarmista: “Risco de inflação
brevemente!”.
• Repúdio total aos novos negacionistas do
Holocausto
Num
período imediatamente prévio à II Guerra Mundial, e durante o transcorrer da
mesma, a Europa foi palco de um dos episódios mais abomináveis da história
humana.
Sob a
batuta de Adolf Hitler, a Alemanha nazista levou a cabo matanças programadas e
executadas com crueldade e perversidade de estarrecer até os mais insensíveis
seres humanos. A sanha nazi-hitlerista trucidou impiedosamente milhões de
pessoas pertencentes a grupos considerados indesejáveis e inservíveis pelos
nazistas.
Dentre
as principais vítimas da fúria bestial do nazismo, podemos listar milhões de
ciganos, os acusados de estarem vinculados a sindicatos de trabalhadores e
organizações comunistas, os judeus e um incontável número de seres de
nacionalidades eslavas (russos, poloneses, etc.), assim como vários outros.
Entretanto,
não obstante a imensa quantidade de provas e indícios que confirmam a
ocorrência destas monstruosidades, ainda há gente que persiste em não
reconhecer, ou dar o devido peso, a esta funesta obra da maldade humana. Os que
assim se comportam são os denominados negacionistas do Holocausto.
Como
não podia deixar de ser, quase toda a humanidade de mente sã sempre expressou o
devido repúdio e condenação a todos os que têm demonstrado tamanha
insensibilidade diante do sofrimento causado a tantos seres humanos pelos
agentes da morte hitleristas.
Porém,
a negação do Holocausto hitlerista, que vinha sendo mantido tão somente por um
reduzido número de pessoas, via de regra, através de meios alheios ao chamado
“mainstream” informativo, agora está sendo suplantada pela de outro, que está
em pleno desenvolvimento neste exato instante, em outras palavras, o Holocausto
do povo palestino.
Só que,
desta vez, os negacionistas do novo Holocausto não se limitam a um punhadinho
de alienados vinculados a meios de pouca relevância. Nesta oportunidade, a
despeito de que as provas e os detalhes dos crimes hediondos que estão sendo
cometidos contra o indefeso povo palestino estejam disponíveis em ainda muito
mais abundância (fotos, gravações de vídeos, relatos presenciais, etc.), a
esmagadora maioria dos meios corporativos dos países hegemônicos do capitalismo
ocidental, e naqueles a eles subordinados, se recusa a admitir que esteja
havendo um deplorável genocídio por parte de um dos exércitos mais bem armados
do planeta, ou seja, as mal chamadas Forças de Defesa de Israel.
Os que
dirigem essa mídia corporativa ocidental e seus cúmplices não se comovem ao
constatar a imensa covardia lançada contra crianças, mulheres e a população
civil indefesa. Os vídeos e fotos dos bombardeios contra hospitais e locais de
moradia, com o consequente despedaçamento de milhares de seres humanos, nada
disto é suficiente para que o regime sionista do Estado de Israel seja
considerado como genocida.
Nem
mesmo as cenas com milhares de crianças esqueléticas em desesperada busca de
comida consegue romper a insensibilidade dessa mídia. Não parece haver nenhuma
condenação ao fato de que essa fome alastrada se deva a que o sionismo
israelense bloqueou a entrada de água e alimentos em Gaza como forma de
destruir sua população também por meio da fome.
Este é
o Holocausto de nossos dias. A maior diferença em relação com aquele ocorrido
sob o nazismo é que este conta com um número muitíssimo maior de negacionistas,
e incrustados em boa parte dos meios hegemônicos dos países capitalistas. De um
ponto de vista humanitário, não há como condenar o negacionismo daquele
Holocausto e silenciar-se diante deste.
Fonte:
Por Michel Goulart da Silva, no Correio da Cidadania/Brasil 247

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