sábado, 30 de agosto de 2025

O entreguismo dos donos do Brasil

Muito se comentou, nas últimas semanas, sobre o papel entreguista da extrema direita em sua relação umbilical com o imperialismo. O falso nacionalismo do bolsonarismo, com o uso de bonés ou a continências à bandeira norte-americana, é conhecido há bastante e não causa qualquer surpresa. Contudo, nesse processo, também chamou atenção a postura das classes dominantes, oscilando entre bater continência aos ditames de Trump e fazer críticas pontuais à política do chefe do imperialismo.

Essa postura entreguista não é exatamente uma novidade para as classes dominantes. Para as elites, o Brasil que emergiu do século XIX não deveria ser uma nação de capitalismo autônomo, como França e Estados Unidos, mas um país cuja economia estaria atrelada à lógica e à dinâmica do mercado externo, ditado pelas grandes potências, consolidando um desenvolvimento econômico subordinado “aos centros estrangeiros de economia mundial e praticamente extorsivo quanto à massa da população pobre e trabalhadora”. O que se tem no Brasil é uma classe dominante que não defende uma perspectiva de autonomia em relação ao imperialismo.

Os militares, pretensamente nacionalistas, também nunca tiveram uma perspectiva autônoma em relação ao imperialismo. Uma parcela de oficiais, que parece não se incomodar com os ataques de Trump contra Brasil, se aliou ao bolsonarismo na frustrada tentativa de golpe que desembocou na depredação de prédios públicos em Brasília. Essa subordinação não é novidade. Golbery do Couto e Silva, ideólogo da Escola Superior de Guerra (ESG), referindo-se à relação entre o Brasil e os Estados Unidos, afirmava, em 1959: “O Brasil é também uma nação que, pela sua origem cristã e os valores democráticos e liberais que substanciam a cultura ainda em germe nesta fronteira em expansão, integra o Mundo do Ocidente” .

Segundo Golbery, atuante politicamente durante os governos da ditadura, o Brasil deveria desenvolver “uma geopolítica consciente e decididamente partícipe da geoestratégia defensiva da Civilização Ocidental, a cujos destinos temos os nossos indissoluvelmente ligados, quer o queiramos ou não” . O anticomunismo, assim, se evidenciava e concretizava como dominação política e ideológica do imperialismo.

Esses temas relacionados ao desenvolvimento econômico e à subordinação das classes dominantes aos interesses imperialistas foram discutidos por Florestan Fernandes. Partindo da compreensão de que a “revolução burguesa” no Brasil se deu como processo lento e realizado desde cima, no qual as elites buscavam uma autonomia relativa, mas não uma independência em relação ao imperialismo, aponta que se difundiu desde o século XIX a ideia de que o desenvolvimento capitalista poderia produzir, em qualquer país de origem colonial, resultados similares aos dos países europeus e dos Estados Unidos. Bastaria estar aliado a esses países. Para Fernandes, a difusão dessa ideia “foi parte do processo de colonização, de transferência da ideologia dominante nas nações capitalista hegemônicas”.

Fernandes apontava a particularidade do desenvolvimento das classes dominantes no Brasil, destacando que a burguesia atingiu “sua maturidade e, ao mesmo tempo, sua plenitude de poder sob a irrupção do capitalismo monopolista”, mantendo e agravando as condições “que tornaram a sociedade brasileira potencialmente explosiva, com o recrudescimento inevitável da dominação externa da desigualdade social e do subdesenvolvimento”.

Embora o Brasil tenha o PIB entre os maiores do mundo, sua produção não está voltada para o seu próprio desenvolvimento, por meio de infraestrutura, emprego e melhoria das condições sociais da população. Sua produção está voltada prioritariamente para interesses de grupos ou empresas estrangeiras, que se ocupam de transferir a maior parte possível dos ganhos para a matriz. Esse é um traço de países dominados pelo imperialismo, nos quais o mercado interno está ligado ao externo.

Essa questão está intrinsecamente ligada ao processo de transformação histórica e econômica. A transição estrutural e histórica para o padrão de desenvolvimento dentro das relações imperialistas requer profundas alterações “dos mecanismos de mercado, na organização do mercado financeiro e de capitais, nas dimensões da produção industrial”. Esse processo ocorre com a conivência e o apoio das classes dominantes, implicando tanto em alianças comerciais internas e externas como na necessidade de políticas desenvolvidas pelo Estado.

Percebe-se que essa lógica está mais aguda contemporaneamente, em especial por conta do avanço da dominação imperialista depois do colapso da União Soviética. Nos governos mais recentes, em diferentes países, inclusive no Brasil, a dominação econômica do imperialismo elevou-se consideravelmente. Nem mesmo os governos Lula, com sua tímida e eventual retórica desenvolvimentista e suas políticas sociais, implementou ações que visassem acabar com a lógica de dominação imposta pelo imperialismo. Os governos petistas deram continuidade à política econômica dos governos anteriores.

A economia do Brasil é dominada pelo capital externo, cujos interesses são os que emanam de suas matrizes. O capital privado nacional está ligado de forma íntima com o estrangeiro, sendo seu sócio menor, defendendo não um projeto de nação, mas os interesses de seus aliados externos. Portanto, ao vermos na atualidade as classes dominantes oscilando entre o apoio aos ataques de Trump e a defesa de uma negociação em que o Brasil assuma uma postura subordinada, devemos procurar a explicação nas particularidades do desenvolvimento econômico e nas relações estabelecidas com o imperialismo.

A conquista de uma independência de fato, a partir do controle sobre seus recursos naturais e sobre a economia, somente é possível a partir de uma ruptura com essas relações de dominação. Contudo, medidas como essas são apenas possíveis por um governo dos trabalhadores que, apostando na mobilização popular, aponte suas ações no sentido da superação do capitalista e da construção do socialismo. Para a burguesia nativa, somente existe a perspectiva de negociar melhores formas de permanecer submisso aos ditames imperialistas, não sendo aliada, em nenhuma hipótese, na luta por uma nova sociedade.

•        Via crucis do rentista traíra. Por Fernando Nogueira da Costa

Despertou revolta dentre os colegas da Faria Lima e todos se manifestaram contra a declaração de “a política monetária está funcionando”, dada pelo economista-chefe do BTG Pactual e ex-secretário do Tesouro, durante o governo golpista. Foi estampada na primeira página do jornal oficioso de O Mercado!

“Estamos, em um cenário surpreendente, com o menor nível de desemprego da história e expectativas de inflação para 2025, 2026 e 2027 não esperadas por ninguém há três meses. Está se consolidando o cenário para o Banco Central do Brasil começar a cortar juros no primeiro trimestre do próximo ano”, disse. Segundo ele, “se tivermos mais duas leituras positivas de inflação, vai entrar na mesa a possibilidade de antecipar esse corte para o fim do ano corrente”.

Os parças agora querem o queimar na avenida! A cena é digna de uma ópera bufa do rentismo. O coitado, sempre tão fiel à cartilha fiscalista, de repente, cometeu o pecado mortal: sugeriu a política monetária do governo petista está funcionando de maneira coordenada com a política fiscal e, pior, insinuou os juros poderem cair antes do combinado.

Resultado? Uma rebelião furiosa entre os sacerdotes da Faria Lima, como se alguém tivesse mexido no cálice sagrado do CDI.

Na avenida simbólica dos Fundos de Investimento, o coro é uníssono: “Blasfêmia! Sacrilégio!”. Para eles, a simples ideia de cortar juros é como anunciar a expropriação da propriedade privada.

O “pleno emprego histórico”, elogiado pelo ex-secretário do Tesouro no governo temeroso é, na visão desses colegas, um problema moral. Afinal, trabalhadores com salário em alta e confiança demais no pleno emprego se tornam atrevidos, exigem direitos, e isso ameaça o dogma central: o rentista feliz.

Não importa se as expectativas de inflação para 2025, 2026 e 2027 estão melhorando. Para o coração da Faria Lima, notícia econômica só é boa se não servir de argumento para baixar juros. Se o pão ficar mais barato e o desemprego cair, isso é visto como “ruído estatístico”. Mas se o dólar espirrar, aí sim a inflação importada é motivo para convocar uma cruzada monetária com juros disparatados diante do Fed, e fazer os farialimers felizes.

O pecado do ex-secretário do Tesouro foi lembrar em público sobre a possibilidade de os juros de 15% aa caírem. A taxa de juro mensal equivalente é de aproximadamente 1,17%, um juro composto capaz de propiciar acumulação financeira.

Isso traz tranquilidade inclusive para os pobres coitados detentores apenas do patamar mínimo para estar entre os 161.726 detentores de contas exclusivas de 69 mil grupos econômicos familiares. Com R$ 2,421trilhões no agregado, dá a bagatela média de praticamente R$ 15 milhões per capita, ou seja, se todo esse valor fosse aplicado em 100% CDI, daria o suporte de rendimentos de juros mensais de R$ 175.152,68, certamente, muito inferior à “renda do trabalho” dessa laboriosa gente.

Para se ter uma ideia, segundo Sérgio Gobetti e outros (2025), “no topo da pirâmide – entre os 0,01% mais ricos – a renda captada pela PNAD é quase doze vezes inferior à apurada a partir dos dados do IRPF. Enquanto a PNAD estima renda média mensal de pouco mais de R$ 200 mil em 2023 para esse grupo, as declarações dessas mesmas pessoas revelam rendimentos médios mensais de R$ 2,5 milhões”.

Por conta dessa penúria, foi como se um padre da consagrada Santíssima Trindade do Tripé Macroeconômico tivesse dado uma piscadela para o demônio da heterodoxia. Seus ex-colegas já afiam as foices e martelos, acendem tochas e esquentam o óleo ao ponto de fervura: querem queimá-lo vivo, na avenida, não por discordarem dos fundamentos, mas por ele ter ousado sugerir os lucros financeiros não precisarem crescer para sempre à custa da economia real.

No fundo, o ex-temeroso só disse o óbvio: a política econômica do demônio petista está funcionando! Mas, na liturgia da Faria Lima, verdade é só aquilo capaz de manter o juro alto e o povo quieto. E qualquer desvio dessa missa – mesmo vindo de um ex-secretário do Tesouro do louvado governo golpista com a aprovação oportunista das reformas neoliberais de “flexibilização” (sic) – merece fogueira!

Daí, em uma “Via crucis do rentista traíra”, o imprudente falante da verdade, refletida nos números estatísticos, foi obrigado a carregar a cruz do corte de juros. Enquanto desfilava era vaiado pelos colegas ao longo da Faria Lima.

Estação I (BTG Pactual) – O pecado da verdade

O economista-chefe do BTG e ex-secretário do Tesouro, pela ousadia de afirmar em público “a política monetária está funcionando”, cometeu um pecado monumental. Os colegas da Faria Lima reagiram como inquisidores: murmuraram entre si, prepararam tochas e manchetes de jornal e o escorraçaram de lá.

Estação II (Itaú BBA) – O julgamento editorial

Nas salas envidraçadas da Avenida Faria Lima, cada planilha se tornou um martelo e uma foice para punir o “cumunista infiltrado”. Analistas e colunistas da Grande Imprensa Neoliberal discutiram: “Como ele ousou sugerir corte de juros?!” A verdade científica pouco importa, aqui não é um campus universitário! O dogma do superávit e do juro alto deve prevalecer acima de qualquer realidade econômica!

Estação III (Bradesco BBI) – A carga do corte de juros

O imprudente ergue então a cruz simbólica do corte de juros, cada quilo carregado com expectativas de inflação favoráveis e pleno emprego histórico. O peso é brutal, porque tocar nesse tema é tocar no sagrado: o rendimento seguro do rentista.

Estação IV (Goldman Sachs) – O espancamento midiático

Tochas são acesas, ou melhor, tweets, colunas e editoriais criam alvoroço. Os farialimers se inflamam. “Que ele seja queimado em plena avenida!”, gritam os sacerdotes do tripé em uníssono. A cruz dele é atacada com argumentos circulares: “Baixar juros é populismo!”, “Austeridade fiscal em risco!”, “Confiança de O Mercado abalada!”.

Estação V (JPMorgan Chase)– O auxílio da heterodoxia

Não há recurso com apelo à heterodoxia, ela só existe para ser citada como advertência. O trânsfuga caminha sozinho, enquanto o coro da Faria Lima repete: “Que sirva de lição: aqui não se critica o juro alto nem se anuncia pleno emprego!”.

Estação VI (Credit Suisse) – A chegada à cruz do conselho monetário

Finalmente, o sem papas na língua, capaz de expressar o pensado de forma direta, mesmo se isso não for agradável para os outros colegas, chega à mesa de sacrifício do Copom simbólico. Ali, suspira. A cruz do corte de juros ainda pesa, mas ele acha ter escutado um sussurro da economia real: “Há espaço sim para baixar juros e celebrar o pleno emprego”.

Estação VII (UBS) – Ressurreição monetária

Se o Banco Central do Brasil ousar antecipar o corte, a ressurreição do cristo será discreta: sussurrada entre economistas, ignorada pelos editorialistas, e imediatamente convertida em manchete alarmista: “Risco de inflação brevemente!”.

•        Repúdio total aos novos negacionistas do Holocausto

Num período imediatamente prévio à II Guerra Mundial, e durante o transcorrer da mesma, a Europa foi palco de um dos episódios mais abomináveis da história humana.

Sob a batuta de Adolf Hitler, a Alemanha nazista levou a cabo matanças programadas e executadas com crueldade e perversidade de estarrecer até os mais insensíveis seres humanos. A sanha nazi-hitlerista trucidou impiedosamente milhões de pessoas pertencentes a grupos considerados indesejáveis e inservíveis pelos nazistas.

Dentre as principais vítimas da fúria bestial do nazismo, podemos listar milhões de ciganos, os acusados de estarem vinculados a sindicatos de trabalhadores e organizações comunistas, os judeus e um incontável número de seres de nacionalidades eslavas (russos, poloneses, etc.), assim como vários outros.

Entretanto, não obstante a imensa quantidade de provas e indícios que confirmam a ocorrência destas monstruosidades, ainda há gente que persiste em não reconhecer, ou dar o devido peso, a esta funesta obra da maldade humana. Os que assim se comportam são os denominados negacionistas do Holocausto.

Como não podia deixar de ser, quase toda a humanidade de mente sã sempre expressou o devido repúdio e condenação a todos os que têm demonstrado tamanha insensibilidade diante do sofrimento causado a tantos seres humanos pelos agentes da morte hitleristas.

Porém, a negação do Holocausto hitlerista, que vinha sendo mantido tão somente por um reduzido número de pessoas, via de regra, através de meios alheios ao chamado “mainstream” informativo, agora está sendo suplantada pela de outro, que está em pleno desenvolvimento neste exato instante, em outras palavras, o Holocausto do povo palestino.

Só que, desta vez, os negacionistas do novo Holocausto não se limitam a um punhadinho de alienados vinculados a meios de pouca relevância. Nesta oportunidade, a despeito de que as provas e os detalhes dos crimes hediondos que estão sendo cometidos contra o indefeso povo palestino estejam disponíveis em ainda muito mais abundância (fotos, gravações de vídeos, relatos presenciais, etc.), a esmagadora maioria dos meios corporativos dos países hegemônicos do capitalismo ocidental, e naqueles a eles subordinados, se recusa a admitir que esteja havendo um deplorável genocídio por parte de um dos exércitos mais bem armados do planeta, ou seja, as mal chamadas Forças de Defesa de Israel.

Os que dirigem essa mídia corporativa ocidental e seus cúmplices não se comovem ao constatar a imensa covardia lançada contra crianças, mulheres e a população civil indefesa. Os vídeos e fotos dos bombardeios contra hospitais e locais de moradia, com o consequente despedaçamento de milhares de seres humanos, nada disto é suficiente para que o regime sionista do Estado de Israel seja considerado como genocida.

Nem mesmo as cenas com milhares de crianças esqueléticas em desesperada busca de comida consegue romper a insensibilidade dessa mídia. Não parece haver nenhuma condenação ao fato de que essa fome alastrada se deva a que o sionismo israelense bloqueou a entrada de água e alimentos em Gaza como forma de destruir sua população também por meio da fome.

Este é o Holocausto de nossos dias. A maior diferença em relação com aquele ocorrido sob o nazismo é que este conta com um número muitíssimo maior de negacionistas, e incrustados em boa parte dos meios hegemônicos dos países capitalistas. De um ponto de vista humanitário, não há como condenar o negacionismo daquele Holocausto e silenciar-se diante deste.

 

Fonte: Por Michel Goulart da Silva, no Correio da Cidadania/Brasil 247

 

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