segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Jeferson Miola: Haddad diz que juros altos “inibem alta de preços”; Nobel Stiglitz diz que condenam economia à “morte”

Durante a presidência do bolsonarista Roberto Campos Neto no Banco Central/BC, o ministro Fernando Haddad criticava os juros altos.

“Você não vai corrigir a inflação de 2024 aumentando o juro. Você tem que ver a trajetória da inflação ao longo dos meses para saber qual é o remédio adequado para conter eventualmente preços”, declarou Haddad em entrevista em agosto de 2024 reagindo à elevação da taxa de juros para 10,5% no mês anterior.

Mas agora, com Gabriel Galípolo liderando a maioria da direção do Banco Central indicada pelo governo Lula, Haddad matizou seu entendimento: –“o remédio para corrigir a inflação é, muitas vezes, aumentar a taxa de juros para inibir a alta de preços”, disse ele em entrevista recente [7/2/2025].

Afinal, qual das duas terapias avaliadas por Haddad seria recomendável?

Aquela que refuta o aperto monetário, pois considera que o aumento dos juros não seria “remédio adequado para conter eventualmente preços” [agosto/24], e sim um veneno; ou aquela terapia que prescreve o “aumento da taxa de juros para inibir a alta de preços” [fevereiro/25]?

Na opinião do prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz, “aumentar as taxas de juros não resolve os problemas do lado da oferta”.

O economista entende que juro elevado “pode até piorar, porque o que precisamos fazer agora é investir mais nos gargalos do lado da oferta”. E “aumentar os juros dificulta a realização desses investimentos” necessários para aumentar a oferta e, assim, baixar os preços.

“Como que o aumento de juros vai levar a mais alimentos, mais energia e resolver o problema de escassez de microprocessadores? Não vai de jeito nenhum”, adverte Stiglitz, acrescentando que “o risco real é que isso piore as coisas” [entrevista na Alemanha, em agosto/2022].

No programa Roda Viva [16/10/2023] Stiglitz explicou a qualidade distinta da inflação que na atualidade afeta todas economias do planeta – que é de oferta, não de demanda.

“A inflação atual é diferente da inflação normal. Essa inflação, a inflação pós-pandemia, é diferente da inflação que o Brasil e o mundo tiveram no passado. Esta é sobretudo uma inflação do lado da oferta”, explica, acrescentando que, neste caso, “juros altos são contraprodutivos. Eles pioram a situação”.

“O fato básico é que a inflação atual não é causada por um excesso da procura agregada”, mas no lado da oferta e respectivos custos aumentados desde a pandemia.

Stiglitz exemplifica isso em relação ao aumento dos preços imobiliários nos EUA. Para ele, o “remédio” para conter os altos preços imobiliários seria “construir mais moradias. O que a alta taxa de juros faz? Dificulta isso. Portanto, ela exacerba o problema”.

Em outro exemplo, sobre o impacto inflacionário nos EUA causado pela escassez de chips para a indústria automobilística, Stiglitz recorda que o setor não planejou a compra de chips para a produção, “e os fabricantes de chips mandaram sua produção para outras indústrias”.

Quando a indústria automobilística fez novos pedidos, “os fabricantes de chips avisaram que ia demorar, mas foi só uma questão de tempo até que esses chips começassem a chegar”.

Instigante, Stiglitz questiona: “Foram os juros altos que levaram ao aumento da produção de chips? Não. Foi só uma questão de tempo, e então a produção de carros voltou, os estoques cresceram e o preço dos carros baixou”.

Outro fator que influencia a inflação no mundo em distintos graus é a guerra na Ucrânia. O conflito causou aumento do preço mundial do petróleo e, para o Brasil, afetou o preço dos fertilizantes. Stiglitz então pergunta: “aumentar a taxa de juros resolveria o problema da escassez de petróleo?”, e emenda a resposta: “Não”.

Na participação em seminário promovido pelo BNDES em março de 2023, Stiglitz disse que “a taxa de juros do Brasil é chocante. Uma taxa de 13,75%, ou 8% real, é o tipo de taxa de juros que vai matar qualquer economia. É impressionante que o Brasil tenha sobrevivido a isso, que seria uma pena de morte”.

Como disse certa vez o presidente Lula, “não existe nenhuma justificativa para a taxa de juros a 13,5%, é só ver a carta do Copom para ver a vergonha que é esse aumento de juros e a explicação que deram para sociedade brasileira”.

Se confirmar a projeção da última Ata do Banco Central, os juros poderão ultrapassar os 15% a partir de abril, patamar superior aos 13,75% que indignaram Lula, escandalizaram Stiglitz e ensejaram-no a alertar para os efeitos “mortais” disso para a economia brasileira.

Combater a inflação e o alto custo de vida com uma estratégia de crescimento, ao invés do contracionismo econômico com juros altos legado da gestão do bolsonarista Campos Neto, é o desafio central do governo Lula de olho na eleição de 2026.

A professora Isabella Weber, da Universidade de Massachusetts destaca a “percepção de longa data de acadêmicos que estudaram a história da inflação: picos de preços em itens essenciais podem derrubar governos. Quando as pessoas descobrem que, sem culpa própria, os bens sem os quais não conseguem viver de repente se tornam dramaticamente mais caros, elas perdem a confiança no sistema”.

As eleições presidenciais ocorridas em vários países no ano de 2024 mostram governos que perderam e governos que venceram a batalha da inflação e da carestia. O governo Lula precisa recolher daquelas experiências os ensinamentos que levem à sua reeleição em 2026.

¨      Lula não vai ficar de braços cruzados diante do BC e ampliará crédito acessível, diz Gleisi

A presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), elogiou neste sábado (8) o anúncio feito pelo presidente Lula sobre a ampliação de modalidades de crédito acessível para a população. Em suas declarações, Gleisi criticou as altas taxas de juros mantidas pelo Banco Central e defendeu uma postura mais ativa do governo frente à política monetária contracionista.

Segundo a dirigente, o acesso facilitado ao crédito aumentará o poder de consumo da população, impulsionando o crescimento econômico e fortalecendo a economia como um todo. Gleisi reforçou a importância de medidas que priorizem o desenvolvimento social e a redução das desigualdades, em contraste com uma política monetária que, em sua avaliação, desfavorece a maioria da população.

"Muito importante o anúncio do presidente Lula de que novas modalidades de crédito acessível vêm por aí. As pessoas precisam de crédito para comprar o que precisam e é assim que a economia gira, fazendo o país crescer. É o governo mostrando que não vai ficar de braços cruzados diante dos juros estratosféricos. Vamos em frente, presidente", escreveu Gleisi em postagem na plataforma X.

O presidente Lula afirmou na sexta-feira (7) que pretende lançar mais políticas para ampliar o crédito disponível para a população. Em cerimônia de anúncios relacionados à segurança hídrica na Bahia, Lula defendeu que uma população com mais acesso ao crédito tem o potencial de movimentar o mercado interno.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou anteriormente que o governo vai implementar um mecanismo para fortalecer as concessões de crédito com desconto em folha de pagamento para os trabalhadores do setor privado.

¨      Governo Lula impulsiona crédito consignado e defende papel dos bancos públicos

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforça sua visão de um Brasil com mais acesso ao crédito, promovendo uma forte participação dos bancos públicos no novo modelo de crédito consignado privado.

Reportagem do jornal Folha de S. Paulo destaca que a nova medida chega em um momento estratégico, em que o Banco Central mantém uma política de juros altos para conter a inflação, e o governo Lula busca alternativas para estimular o crescimento econômico sem comprometer a responsabilidade fiscal. A iniciativa tem potencial para transformar o setor de crédito, sendo comparada ao impacto positivo que o Pix teve nos meios

Além disso, Lula sinalizou que mais políticas de crédito estão a caminho, com foco especial no apoio a pequenos empreendedores e na ampliação do financiamento para setores estratégicos, como infraestrutura e indústria, por meio do BNDES. Com essa estratégia, o governo reafirma seu compromisso com o desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida da população, garantindo que o crédito chegue a quem mais precisa.

¨      Bancos sempre encontram justificativa para elevar juros do consignado, diz Lupi

O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, manifestou forte resistência ao aumento do teto dos juros do empréstimo consignado do INSS, afirmando que os bancos sempre encontram um argumento para justificar a elevação das taxas.

Lupi defende que a tomada de decisão sobre o juro do consignado também leve em consideração fatores como a recente queda do dólar, informa a coluna Painel do jornal Folha de S.Paulo.

No início de janeiro, o Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS) elevou o teto do juro do consignado de 1,66% ao mês para 1,80% ao mês, após pressões do setor bancário. Os bancos alegavam que a taxa estava defasada diante das sucessivas altas da Selic. No entanto, Lupi contesta algumas dessas justificativas, como o impacto da inflação e a valorização do dólar no final do ano passado devido às incertezas fiscais do governo.

"O último argumento foi que o dólar encarece a tomada de empréstimo. Agora que começou a cair, como é que fica?" questionou o ministro. "Sempre que a macroeconomia aponta para uma redução dos juros, os bancos encontram um novo argumento para justificar um aumento."

Lupi também destacou que o governo atendeu a algumas demandas do setor financeiro, como a redução do prazo entre a decisão sobre o teto e sua efetiva aplicação. Antes, esse processo levava de sete a dez dias; agora, a média é de 48 horas.

¨      Governo Lula reavalia memorando para adesão do Brasil à OCDE

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está reavaliando os termos do memorando negociado durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL) para a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Na prática, o processo de adesão ao chamado "Clube dos Ricos" foi travado.

A OCDE reúne as economias mais desenvolvidas, como Estados Unidos, Alemanha, Japão, França, Canadá e Itália. Os membros assumem acordos para boas práticas em diversas áreas e passam por avaliações sobre eficiência de políticas públicas e princípios liberais.

Conforme relatado pela CNN, a resistência à adesão à OCDE dentro do governo petista é liderada pelo assessor especial para assuntos internacionais da Presidência, Celso Amorim, e conta com o apoio da Casa Civil, do PT e de parte do Itamaraty.

Nos bastidores, os principais argumentos contrários ao ingresso do Brasil na OCDE envolvem a visão de que a organização possui um viés neocolonialista, além da avaliação do governo de que a OCDE tem se tornado um bloco mais político do que econômico.

Apesar da resistência, o governo ainda analisa os impactos da adesão. Em entrevista à CNN, o secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, Maurício Lyrio, afirmou que o Brasil já cumpre cerca de 120 das 260 condicionantes do acordo.

"Os inimigos dos países estão dentro deles mesmos", afirma Saint- Pierre

Em entrevista ao programa Forças do Brasil, da TV 247, o professor de Relações Internacionais da UNESP Hector Saint-Pierre afirmou que os principais desafios para a autonomia política e estratégica do Brasil estão dentro do próprio país. Segundo ele, as elites nacionais, incluindo setores financeiros, industriais, militares, acadêmicos e jornalísticos, desempenham um papel fundamental na manutenção da dependência externa do país.

"Os inimigos dos países estão dentro deles mesmos", afirmou Saint-Pierre, explicando que as próprias classes dominantes brasileiras impedem a conquista da autonomia estratégica ao manterem relações de dependência política e econômica com grandes potências, especialmente os Estados Unidos. "São elites comprometidas com a dependência econômica, epistémica e estratégica", disse.

Na entrevista, o professor criticou a influência das Forças Armadas na formulação da política externa brasileira. "As Forças Armadas têm uma aliança estratégica pré-definida com os Estados Unidos. Como podemos pensar em uma política externa autônoma se uma das principais gramáticas de decisão já está comprometida?", questionou. Ele ainda alertou para a presença de um general brasileiro no Comando Sul dos Estados Unidos, ressaltando que essa decisão nunca passou pelo Congresso Nacional nem foi amplamente debatida na esfera política.

Saint-Pierre também abordou o impacto do governo de Donald Trump na política internacional e suas consequências para o Brasil. Ele destacou que a administração Trump aposta em uma política de isolacionismo e guerra comercial, o que pode criar desafios para os parceiros tradicionais dos Estados Unidos. "O mundo parou para ver o que Trump vai fazer", observou, indicando que o governo norte-americano pode adotar medidas protecionistas que afetariam o Brasil. "Se o Brasil for taxado em 25% na exportação de produtos para os Estados Unidos, o Brasil pode aplicar a reciprocidade diplomática. Mas a questão é: vamos estar preparados para isso?", questionou.

Sobre a crise na Ucrânia e o reposicionamento global das potências, Saint-Pierre ressaltou que a guerra deixou claro que a hegemonia militar dos Estados Unidos foi abalada. "Hoje, a Rússia conseguiu demonstrar capacidade de dissuasão não nuclear, algo que era impensável há alguns anos", explicou. Ele mencionou também o avanço tecnológico da China e do Irã, que desenvolveram armamentos avançados e mais baratos, desafiando o tradicional complexo industrial-militar ocidental.

No cenário brasileiro, Saint-Pierre criticou mudanças na postura do governo Lula em relação à Venezuela e ao BRICS. "A política externa é definida por pressões internas e, hoje, o governo brasileiro se encontra cercado por uma imprensa corporativa hostil, um Congresso adverso e uma aliança de governo que vai do centro à direita", explicou. Ele apontou que a negativa do Brasil à entrada da Venezuela no BRICS foi mal recebida por aliados estratégicos como China e Rússia. "Putin recebeu Maduro calorosamente, enquanto o Brasil deu sinais contraditórios", afirmou.

A respeito da crescente polarização política, o professor criticou a perda de identidade ideológica dos partidos políticos, que, segundo ele, buscam apenas a sobrevivência eleitoral. "O bolsonarismo foi derrotado eleitoralmente, mas não politicamente. A extrema direita tem um discurso agressivo e provocações claras, enquanto a esquerda tem medo de perder votos e adota uma linguagem neutra", analisou. Para Saint-Pierre, essa falta de identidade política compromete a capacidade da esquerda de formular um projeto de poder efetivo.

Ao longo da entrevista, Saint-Pierre reforçou que a política externa não é apenas uma questão de diplomacia, mas um reflexo das estruturas de poder internas do país. "A diplomacia é um instrumento da política internacional. Mas quem define a política internacional é o governo, e esse governo é fruto de correlações de forças dentro do país", destacou. Segundo ele, para que o Brasil alcance uma posição mais independente no mundo, é necessário enfrentar as barreiras internas que limitam a soberania nacional. "Se quisermos ter uma política externa autônoma, precisamos primeiro resolver nossos conflitos internos", concluiu.

 

Fonte: Brasil 247

 

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