sábado, 8 de fevereiro de 2025

Como os indígenas conseguiram reverter decisão do governo do Pará na educação

 “Enquanto a revogação não for publicada no Diário Oficial do Estado, nós não vamos desocupar”, declara o cacique Dadá Borari, após receber a confirmação da assinatura de um termo de compromisso para revogar a lei 10.820/2024, na última quarta-feira (5). 

O documento foi assinado pelo governador do Pará, Helder Barbalho, em conjunto com lideranças indígenas, quilombolas, ribeirinhos e representantes do Sindicato das Trabalhadoras e Trabalhadores em Educação Pública do Estado do Pará (SINTEPP), além de parlamentares e integrantes do governo, na sede da Secretaria de Estado de Planejamento e Administração (SEPLAD).

A revogação da lei era uma das principais reivindicações de povos indígenas, quilombolas e professores, que ocupam a sede da Secretaria de Educação do Estado do Pará desde 14 de janeiro. De acordo com eles, os termos da legislação representavam uma ameaça, entre outros pontos, ao magistério e ao Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME) e à mesma modalidade para indígenas (SOMEI), tratando de ensino em áreas de difícil acesso.

A liderança indígena Alessandra Munduruku, que esteve presente no ato da assinatura com o governo, celebrou o momento como um resultado da luta coletiva. “Isso é a união, é a força dos povos indígenas do Estado Pará, e os paraenses que estão juntos”, disse.

Além das manifestações na capital paraense, indígenas e apoiadores também protestam pela educação na rodovia BR-163, no oeste paraense, região de Santarém. Segundo o comunicador indígena, Waltinho Kumaruara a vigilância continua. “Esse é o momento de comemorarmos, mas também ficar atentos, pois ainda estamos no primeiro processo da revogação”.

“Só vamos acreditar que foi revogada, quando sair no diário oficial, pois apesar do comprometimento do governador, a lei ainda terá uma outra apreciação pelos deputados estaduais na Assembleia Legislativa, por isso nós vamos continuar as ocupações aqui na BR e também na SEDUC”, afirma Kumaruara.

A partir desse acordo, o executivo encaminhará o termo de compromisso para a Assembleia Legislativa do Estado do Pará, no qual poderá ser apreciada por comissões e depois em plenário. Até então, não há previsão divulgada oficialmente sobre as datas dessa tramitação e da revogação.

Em nota o Conselho Indígena Tapajós Arapiuns, uma das organizações que estão à frente das manifestações, destacou: “Informamos que é positiva a assinatura do Termo de Compromisso que indica a revogação da Lei 10.820 na tarde de hoje (5). Tudo poderia ter sido mais simples se o governador Helder Barbalho tivesse se disponibilizado ao diálogo desde o início, evitando esticar a corda e o desgaste que vivenciamos. Para nós, povos indígenas, o melhor é estarmos em nossos territórios, junto aos nossos parentes, cuidando da Mãe Terra e defendendo o bem viver”, diz o texto.

A nota ainda afirma que “infelizmente, fomos obrigados a continuar na cidade, defendendo uma educação pública que cuide de nossas florestas e rios e adie o final do mundo. Por fim, afirmamos que a ocupação do prédio da Seduc continua, até que a revogação da Lei 10.820 seja publicada no Diário Oficial do Estado, materializando a vitória dos povos da Amazônia. Surara! Sawê!”, pontua.

·        Repercussão

A lei 10.820/2024 foi sancionada em dezembro de 2024 pela ALEPA. Em 14 de janeiro, indígenas de diversas regiões do Estado ocuparam a sede da SEDUC, em Belém, pedindo a revogação da lei, no qual extinguiu artigos sobre o SOMEI; e também do atual secretário estadual de educação, Rossieli Soares.

Durante os dias de protesto, o Amazônia Vox publicou levantamento com base no Orçamento Geral do Estado (OGE) que comprova uma redução de previsão orçamentária de 85% na função “Implementação da Educação Indígena”, que saiu de R$ 3,5 milhões em 2024 para R$ 500 mil em 2025.

Após o início das manifestações, a causa gerou repercussão a nível estadual e nacional quando a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). Em resposta nos últimos dias, a ministra do STF, Cármen Lúcia, deu o prazo de cinco dias para explicações do governador Helder Barbalho (MDB) e do presidente da Alepa, deputado Chicão (MDB), a respeito da lei.

A Defensoria Pública da União também ajuizou ação civil pública contra o estado do Pará, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e a empresa Meta Platforms, responsável pelo Facebook e Instagram a respeito da propagação de fake news feitas pelo governador Helder Barbalho sobre a mobilização dos povos indígenas em defesa da educação.

 

¨      Lula defende Marina Silva no licenciamento para petróleo na foz do Amazonas

Os “desenvolvimentistas do século passado”, que defendem a exploração máxima de recursos minimizando os impactos socioambientais, acusam a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, de barrar o “progresso” do Brasil. Um discurso arcaico, colonialista, mas que cai como uma luva para os defensores da exploração de petróleo no Brasil “até a última gota” no licenciamento do poço de combustíveis fósseis que a Petrobras quer perfurar no bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas.

Na 4ª feira (5/2), porém, o presidente Lula saiu em defesa da ministra. Dois dias após se comprometer com o novo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), em “destravar” o quanto antes a licença para a petroleira perfurar no bloco, localizado no litoral amapaense, Lula disse, em entrevista a rádios de Minas Gerais, que Marina não é responsável pelo “atraso” na liberação do documento apontado. “Atraso”, claro, que só existe na visão dos “desenvolvimentistas”, já que o IBAMA, responsável pela análise, está apenas cumprindo o que determina a legislação ambiental brasileira.

“Há uma confusão na imprensa, sei lá causada por quem, de tentar jogar em cima da companheira Marina a responsabilidade pela não aprovação da exploração de petróleo na Margem Equatorial do Rio Amazonas [foz do Amazonas]. A Marina não é a responsável”, disse o presidente da República, em fala destacada por O GloboEstadão e Eixos.

Desde que o IBAMA negou pela primeira vez a licença para a Petrobras perfurar um poço no FZA-M-59, em maio de 2023, Marina Silva vem sendo questionada, muitas vezes em tom acusatório. Em todas as vezes a ministra respondeu o óbvio, como mostrou mais uma vez O Globo: o IBAMA é um órgão de Estado – não de governo – que segue as leis. Como tal, suas decisões são tomadas após o cumprimento de uma série de ritos legais. Não é o IBAMA, ou o Ministério do Meio Ambiente (MMA), quem decide a política energética brasileira, já frisou várias vezes Marina. Logo, não é o IBAMA, ou o MMA, quem decide se o Brasil vai ou não explorar combustíveis fósseis na foz do Amazonas ou em qualquer outra bacia geológica brasileira.

Ao defender publicamente Marina, Lula mostra ter entendido suas competências. No entanto, o presidente voltou a falar em “solução” para a liberação da licença, o que continua alimentando que uma decisão técnica terá desfecho político.

Além disso, Lula voltou a repetir que o Brasil precisa do petróleo da foz do Amazonas, mesmo sem saber se de fato existem combustíveis fósseis lá. E que esse suposto petróleo é necessário porque será o dinheiro desse óleo que vai financiar a transição energética brasileira. O que é uma falácia, já que as fontes renováveis já dominam a matriz elétrica nacional sem qualquer centavo dos combustíveis fósseis.

Se de fato quiser usar dinheiro de petróleo e gás fóssil para investir em fontes renováveis de energia, bastaria ao governo redirecionar subsídios. Como mostra um estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC), para cada R$ 1 aplicado em subsídios pelo governo federal em fontes renováveis, outros R$ 4,52 são aplicados pelos cofres públicos na indústria de combustíveis fósseis – 82% do total.

Enquanto não é feito esse ajuste, necessário tanto pelo aspecto fiscal como pela necessidade climática, a pressão política pela licença para a Petrobras perfurar um poço na foz do Amazonas continua. Não à toa a presidente da petroleira, Magda Chambriard, disse no dia seguinte à promessa de Lula para Davi Alcolumbre que respondeu todas as demandas do IBAMA em novembro do ano passado, informam Valor e Agência Brasil. E que a Unidade de Estabilização e Despetrolização (UED) de Oiapoque (AP) requisitada pelo órgão ambiental deverá ficar pronta em março.

Questionado sobre prazos, já que há gente do governo dizendo que a licença para o FZA-M-59 sairá em 30 dias, o IBAMA informou na 3ª feira (4/2) que o pedido da Petrobras para explorar petróleo na foz do Amazonas ainda está em análise pela equipe técnica do órgão e que não há prazo para uma resposta, relata o g1. Algo que o presidente do órgão, Rodrigo Agostinho, já havia dito antes. Mas que Davi Alcolumbre e a turma do governo que está com medo da repercussão de uma licença para explorar combustíveis fósseis no ano da COP30 parecem não [querer] escutar.

 

¨      BNDES bloqueia R$ 728 mi em crédito rural para desmatadores

O BNDES anunciou na última 3ª feira (4/2) que vetou o financiamento de cerca de R$ 728 milhões a produtores rurais com suspeitas de desmatamento ilegal em suas propriedades. A medida foi possível a partir de uma parceria com a plataforma MapBiomas, que faz o monitoramento ambiental por meio de imagens de satélite nos biomas brasileiros.

De acordo com o BNDES, o MapBiomas emitiu 3.461 alertas ativos de desmatamento em propriedades com solicitação de crédito rural. O valor de financiamento negado a partir dessas informações é quase 1% dos R$ 79,5 bilhões de crédito rural solicitados desde fevereiro de 2023, quando a parceria foi iniciada, até dezembro do ano passado.

Entre as regiões, o Norte teve o maior percentual de financiamentos negados (2,1% dos R$ 3,9 bilhões solicitados), com alertas ativos de desmatamento em 2,5% das 6,6 mil solicitações. Já o Nordeste foi a região com a maior taxa de alertas ativos de desmatamento (2,76% das mais de 8,4 mil solicitações), com o bloqueio de 1,7% dos R$ 5,5 bilhões solicitados.

Na ranking dos estados, o Amazonas é o líder de financiamentos negados, com 13% barrados do total de R$ 12 milhões solicitados; o estado também liderou os alertas de desmatamento, com 6,38% de alertas em 47 solicitações de crédito. Entre todos os entes federativos, o Distrito Federal e o Amapá foram os únicos que não tiveram alertas.

Somente em 2024, os financiamentos negados somaram cerca de R$ 393 milhões, o que representa 0,9% dos R$ 43,6 bilhões de crédito rural solicitados ao BNDES. Os 2,09 mil alertas ativos de desmatamento do MapBiomas corresponderam a 1,21% das mais de 173 mil solicitações encaminhadas ao BNDES no ano passado.

“A integração dos alertas de desmatamento do MapBiomas com a plataforma operacional do BNDES nos permite atuar de forma ágil e precisa na análise dos financiamentos. Dessa forma, evitamos que recursos públicos incentivem práticas que comprometam a preservação ambiental, ao mesmo tempo que garantimos segurança jurídica e previsibilidade para os produtores que operam dentro da normalidade”, afirmou Maria Fernanda Coelho, diretora de crédito digital para micro, pequenas e médias empresas do BNDES.

 

¨      Fronteira agrícola do Matopiba concentra 82% do desmatamento do Cerrado em 2024

O desmatamento no Cerrado caiu em 2024 e a maior parte da devastação segue concentrada no Matopiba, área de expansão da fronteira agrícola, que abrange o Tocantins e parte de Maranhão, Piauí e Bahia. Os dez municípios mais desmatados no ano passado no bioma estão localizados nessa faixa.

Os dados, divulgados nesta quinta-feira (6) pelo Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado (Sad Cerrado), indicam que, em 2024, o desmatamento no Cerrado atingiu 712 mil hectares, área maior que o Distrito Federal. Isso representa uma queda de 33% em relação a 2023. Do total da área desmatada, 78%, ou cerca de 555 mil hectares, está dentro de propriedades particulares.

“Apesar da redução, a área total desmatada segue nos patamares elevados quando comparamos com a série histórica e também com o desmatamento em outros biomas, como a Amazônia”, avalia Fernanda Ribeiro, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e coordenadora do SAD Cerrado.

De acordo com informações do Ipam, cerca de 62% da vegetação nativa do Cerrado está dentro de propriedades rurais submetidas às regras do Código Florestal Brasileiro, que permite o desmatamento de 80% da área total das propriedades fora da Amazônia Legal.

“Apesar do respaldo legal, o desmatamento de áreas privadas traz riscos tanto para a biodiversidade do bioma quanto para as próprias propriedades, que passam a sofrer com secas mais severas e clima mais extremo”, informa a nota emitida pelo Ipam.

Depois das áreas privadas, os vazios fundiários – zonas sem proprietários ou mecanismos de governança definidos – são a segunda categoria fundiária mais desmatada, correspondendo a cerca de 10% dos alertas de desmatamento ou 70 mil hectares de vegetação nativa.

Nas unidades de conservação, que são áreas protegidas pelos estados ou pelo governo federal, a área desmatada corresponde a 5,6% do desmatamento do Cerrado, totalizando 39 mil hectares suprimidos. Nesta categorias, as principais áreas atingidas também foram aquelas localizadas no Matopiba, como a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins, que perdeu 12 mil hectares para o desmatamento, e o Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba, que teve 6,7 mil hectares destruídos.

<><> Municípios mais desmatados

Os municípios vizinhos de Balsas (MA), Alto Parnaíba (MA), Mateiros (TO) e Ponte Alta do Tocantins (TO) são os quatro primeiros da lista com maior desmatamento registrado em 2024, totalizando 61 mil hectares desmatados, cerca de 10% da área desmatada no Matopiba.

Balsas lidera a lista e tem 35% do território ocupado por atividades agropecuárias, com destaque para plantio de soja. São mais de 269 mil hectares destinados ao cultivo do grão e quase 65 mil hectares cobertos por pastagem.

O município vizinho de Alto Parnaíba, que ocupa a segunda posição na lista, desmatou 16,6 mil hectares, 29% a menos do que no período anterior. No Tocantins, Ponte Alta aumentou seu desmatamento em 61%, perdendo 15 mil hectares de vegetação nativa, enquanto Mateiros diminuiu 5,7% e chegou a 11,5 hectares derrubados.

O quinto município com mais desmatamento do bioma é São Desidério (BA), que em 2023 foi o mais desmatado. Em 2024, o município perdeu 12,5 mil hectares de vegetação nativa, uma redução de 65% em relação ao ano anterior.

Em todo o Matopiba, 34% da área é ocupada por atividades agropecuárias, com destaque para as pastagens, que dominam mais de 15 milhões de hectares, e as plantações de soja, que ultrapassam 4 milhões de hectares.

A região é também a maior emissora de gás carbônico (CO2), o principal gás causador do aquecimento global. De janeiro de 2023 a julho de 2024, o desmatamento no Cerrado brasileiro emitiu 135 milhões de toneladas CO2, quantidade superior às emissões do setor industrial no Brasil. 80% dessas emissões vieram do Matopiba.

 

Fonte: Por Ayla Tapajós, da Agencia Pública/ClimaInfo/Brasil de Fato

 

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