sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Como a ultradireita avança a agenda da "nova ordem mundial"

Na ocasião da posse de Donald Trump, em janeiro de 2025, fãs do presidente americano vindos de todas as partes do mundo afluíram a Washington para participar do evento histórico. Entre os presentes, estavam o presidente da Argentina, Javier Milei, e a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni. Políticos de ultradireita na oposição, como Nigel Farage, do Reino Unido, assim como representantes do partido Alternativa para a Alemanha (AfD), também se vangloriaram por estar entre os convidados.

A direita radical aproveitou o evento para fazer contatos com seus pares pelo mundo todo. Na véspera, figuras como o filho do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, o ideólogo-mor de Trump, Steve Bannon, um parlamentar da AfD e vários influenciadores também se encontraram para trocar ideias. Um influenciador de direita da Alemanha inclusive se filmou no encontro enquanto se gabava de ter recebido um convite do embaixador de El Salvador. O movimento tem uma sede de conexões nunca vista antes.

O fato de justamente Donald Trump ter se tornado um ímã para ultranacionalistas de todo o mundo com sua agenda "America First" é um fenômeno por si só – sobretudo porque muitos deles tendem a ser ideólogos antiamericanos. Mas essa aliança global de antiglobalistas é um paradoxo apenas à primeira vista.

·        Contra a imigração e uma sociedade moderna

"O que une essas redes é a rejeição da migração, o nacionalismo, as imagens da família tradicional e o antiglobalismo", sumariza a professora de sociologia Katrine Fangen, da Universidade de Oslo, na Noruega 

"O objetivo dessas redes não é simplesmente lutar por mais influência política. Seu objetivo final é um realinhamento da ordem mundial ideológica global – elas estão lutando pelo nacionalismo e pelo conservadorismo social e contra a democracia liberal."

E a direita radical está aprendendo rapidamente através da troca de experiências. As estratégias e os sucessos num país são logo adotados por outros movimentos, analisa o cientista político Thomas Greven, da Universidade Livre de Berlim. Ele considera que a extensão da rede da direita radical é algo historicamente sem precedentes.

As táticas são descritas em seu livro Das internationale Netz der radikalen Rechten (A rede internacional da direita radical): "Por exemplo, a estratégia de Bannon 'flooding the zone with shit' ["inundar a zona com merda"] é muito bem-sucedida internacionalmente. Nela, o oponente político é constantemente bombardeado com provocações, mentiras, novas ideias e hostilidade", explica Greven. "Essa estratégia de comunicação agora é usada em todos os lugares por atores radicais de direita." 

A relação de seus seguidores com a democracia é instrumental: eles precisam dela para chegar ao poder. "O foco é dizer: quem quer que tenha sido eleito deve ser capaz de governar sem barreiras", explica Thomas Greven. Seu termo para isso é "democracia hipermajoritária", ou seja, voltada exclusivamente para supostas maiorias.

"Viktor Orbán, por exemplo, levanta-se e diz: 'Fui eleito com um mandato claro para manter a migração fora da Hungria, e não quero que instituições europeias, tribunais, resistência da sociedade civil ou qualquer mídia financiada por estrangeiros me impeçam de governar'".

Contradições e concessões são anátema para eles. "Os protagonistas da direita radical estão incomodados com o fato de que, devido à crescente legalização, burocratização e supranacionalização, há obstáculos demais essa vontade da maioria. E esta deve se impor numa democracia hipermajoritária."

·        O financiamento da direita radical

Em sua luta ideológica, a direita radical também tem muito dinheiro à disposição. Os doadores mais famosos vêm dos EUA: Elon Musk e os irmãos Koch, empresários bilionários que apoiam a luta ideológica. O bilionário da tecnologia Musk, aliás, não se envolve apenas com dinheiro, mas é, ele próprio, um protagonista da direita radical. Em sua plataforma X, ele se entusiasma com a AfD na Alemanha, apoia a direita radical no Reino Unido e critica os partidos liberais.

Mas não são apenas os doadores privados que apoiam as redes de direita. Rússia e China, por exemplo, também são constantemente criticadas por alimentar as redes populistas de direita para desestabilizar as sociedades liberais. 

Entretanto o financiamento por parte dos inimigos declarados da direita radical também ganhou importância, como no caso das verbas da própria União Europeia e de democracias liberais. Na Alemanha, por exemplo, o odiado Estado liberal é o doador mais importante da AfD: em 2021, mais de 10 milhões de euros, ou cerca de 45% dos recursos do partido, vieram dos cofres do Estado.

A explicação é que, numa democracia partidária, o Estado apoia o trabalho das diferentes siglas – e o apoio financeiro aumenta conforme o crescimento delas. "Isso permite que os partidos radicais de direita ampliem seu alcance. Além disso, o Parlamento Europeu, por exemplo, lhes oferece um espaço mais ou menos automático para a cooperação internacional, incluindo recursos adicionais que protegem suas redes", observa a socióloga Katrine Fangen.

Neste início de 2025, a estratégia das redes radicais de direita parece estar funcionando: Donald Trump foi reeleito nos EUA, e os partidos populistas de direita continuam a crescer na preferência dos eleitores em países como Alemanha, França, Reino Unido e Áustria.

Sua ascensão é irrefreável? O cientista político Thomas Greven diz que não. Muitos partidos radicais de direita se beneficiariam do fato de nunca terem tido que governar sozinhos, e sua situação de oposicionistas é relativamente confortável. Além disso, seu sucesso encobre as diversas fissuras de movimentos cuja união, muitas vezes, é apenas superficial, explica o acadêmico.

"Se a discordância nas bases quanto aos conteúdos se unir à insatisfação entre o eleitorado em geral, o sucesso da ultradireita pode ser novamente revertido", argumenta Greven. Mas há um pré-requisito, enfatiza o politólogo: "que as instituições democráticas funcionem".

¨      Merkel volta a criticar candidato da CDU por apoio da AfD

A ex-chanceler federal da Alemanha Angela Merkel reiterou nesta quarta-feira (06/02) suas críticas ao líder e candidato à chefia do governo do partido conservador União Democrata Cristã (CDU), Friedrich Merz, por ter contado com votos da ultradireita para aprovar uma moção parlamentar exigindo regras de imigração mais rígidas.

Merkel, que já liderou a CDU, divulgou uma declaração após a votação na qual afirmava que Merz cometeu um equívoco ao romper o chamado "cordão sanitário" contra a ultradireita e se desvincular do compromisso de não formar maiorias parlamentares com a legenda Alternativa para a Alemanha (AfD). A decisão do candidato gerou uma onda de repúdio e desencadeou protestos em massa em todo o país.

Na ocasião, a ex-chanceler escreveu que o "cordão sanitário" era "uma expressão de grande responsabilidade política, que eu apoio totalmente". "É errado não se sentir mais vinculado a essa proposta e, portanto, pela primeira vez, ter permitido deliberadamente em 29 de janeiro uma maioria com os votos da AfD em uma votação no Bundestag (Parlamento) alemão."

Nesta quarta-feira, Merkel defendeu sua posição, no momento em que a Alemanha se aproxima das eleições gerais, marcadas para 23 de fevereiro.

"Achei correto não permanecer em silêncio em uma situação tão decisiva", disse Merkel em um evento organizado pelo jornal alemão Die Zeit. "Não me envolvo em debates políticos normais, mas achei que essa era uma questão de fundamental importância."

<><> Merkel rejeita culpa pela ascensão da AfD

A ex-chanceler também afirmou que a AfD se beneficiou politicamente da disputa política em torno da imigração ocorrida entre a CDU e seu partido coirmão na Baviera, a União Social Cristã (CSU), durante seu governo.

Ela, porém, rejeitou acusações de que sua política de migração teria sido politicamente "equivocada". "Quando deixei o cargo, a AfD tinha 11% [de apoio popular]. O fato de estar agora com 20% não é mais minha responsabilidade."

A pesquisa Politbarometer da emissora pública ZDF, divulgada a poucas semanas das eleições, coloca a CDU à frente com 29% da preferência dos eleitores, seguida da AfD, com 21%. O SPD aparece em terceiro lugar (15%), seguido de perto pelos Verdes (14%).

¨      Trump reavalia permanência na ONU

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou na terça-feira (04/02) uma ordem executiva para retirar o país do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU).

Com a medida, o republicano retirou os EUA de uma série de órgãos da entidade e ordenou uma ampla revisão do financiamento da nação para a ONU.

Além disso, Trump decidiu bloquear o financiamento da Agência das Nações Unidas para os Refugiados da Palestina (Unrwa). A principal fornecedora de ajuda humanitária a civis em Gaza já foi proibida de atuar no território ocupado por Israel após decisão do Parlamento israelense.

 

Trump, inclusive, deve se reunir ainda nesta terça com o premiê israelense Benjamin Netanyahu. É esperado que os aliados falem sobre as próximas etapas do acordo de cessar-fogo em Gaza.

A decisão de Trump também foi direcionada ao envolvimento de Washington na Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) também será reavaliado.

Entre outras ordens executivas assinadas na Casa Branca, Trump autorizou uma nova pressão em cima do Irã. Além disso, o magnata alertou que deixou avisado que, se Teerã o assassinasse, o país persa “seria aniquilado”. Porém, do lado iraniano, não houve qualquer tipo de fala nesse sentido.

<><>  ‘Palestinos adorariam deixar Gaza, diz Trump

O presidente dos Estados Unidos afirmou nesta terça-feira que os palestinos, caso pudessem, “adorariam” deixar a Faixa de Gaza para viver em outro lugar.

“Eles adorariam deixar Gaza, acho que ficariam emocionados com isso”, declarou o mandatário no Salão Oval.

A fala é mais uma do mandatário sugerindo a ideia de levar a população palestina para a Jordânia e o Egito, países fronteiriços com Israel.

No entanto, os ministros das Relações Exteriores do Egito, Jordânia, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Catar rejeitaram firmemente qualquer projeto de deslocamento forçado de palestinos.

Em um comunicado conjunto, os chanceleres afirmaram que a proposta de Trump “ameaça a estabilidade da região, corre o risco de prolongar o conflito e prejudica as possibilidades de paz e coexistência entre os povos da região”

¨      Milei segue passos de Trump e retira Argentina da OMS

O porta-voz da Casa Rosada, Manuel Adorni, informou em coletiva de imprensa nesta quarta-feira (05/01) que o presidente da Argentina, Javier Milei, vai retirar o país da Organização Mundial da Saúde (OMS) devido a "diferenças profundas em relação à gestão sanitária".

Segundo Adorni, as diferenças se dão, principalmente, em relação à gestão de saúde durante a pandemia de covid-19. "Os argentinos não permitirão que uma organização internacional intervenha em nossa soberania, muito menos em nossa saúde", anunciou.

Ele acrescentou que a decisão "dá ao país maior flexibilidade para implementar políticas adaptadas ao contexto de interesses que a Argentina requer, bem como maior disponibilidade de recursos, e reafirma o nosso caminho em direção a um país com soberania em matéria de saúde".

A gestão sanitária da entidade durante a pandemia, no governo do peronista Alberto Fernández (2019-2023) "nos levou ao maior confinamento da história da humanidade e à falta de independência da influência política de alguns Estados", afirmou o porta-voz.

Ele esclareceu que a Argentina "não recebe financiamento da OMS, portanto esta medida não representa uma perda de recursos para o país". Em contraste, relatos na imprensa argentina afirmam que o país receberia 10 milhões de dólares (R$ 60 milhões) por ano.

Em junho de 2024, a Argentina se recusou a aderir a um novo protocolo sobre pandemias estabelecido pela OMS, deixando clara sua intenção se retirar da organização. "Nosso país não assinará nenhum acordo sobre pandemia que possa afetar a soberania nacional", disse Adorni na época.

<><> Seguindo os passos de Trump

A decisão do governo argentino está em linha com a ordem executiva assinada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que logo no primeiro dia de seu novo mandato. retirou seu país da OMS e congelou o financiamento para programas de combate ao HIV em países em desenvolvimento.

Como os Estados Unidos são o maior contribuinte da OMS, a retirada forçou a entidade a rever seus programas e prioridades.

Assim como Trump, Milei também criticou o desempenho da OMS no combate ao coronavírus. Uma declaração do gabinete do líder ultradireitista divulgada após a coletiva de imprensa detalhou os motivos da decisão argentina.

Segundo a nota, a OMS "falhou em seu maior teste, ao promover quarentenas eternas sem respaldo científico quando teve que combater a pandemia de covid-19". O isolamento "causou uma das maiores catástrofes econômicas da história mundial", e poderia ser catalogado como "um crime de lesa humanidade".

<><> "Influência política" na OMS

Dessa forma, o governo argentino concluiu que "é urgente que a comunidade internacional repense a finalidade das organizações supranacionais, financiadas por todos, que não cumprem os objetivos para que foram criadas [...] e buscam se impor aos países-membros”.

O gabinete de Milei afirma que a OMS "confirmou inflexibilidade em mudar seu enfoque e, longe de admitir seus erros, escolhe continuar assumindo competências que não lhe dizem respeito e que limitam as soberania nacionais."

"Hoje as evidências indicam que as prescrições da OMS não funcionam porque são resultado de influência política, e não têm base na ciência", pontificou a Casa Rosada.

 

Fonte: DW Brasil

 

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