Governo não
sabe quantos celulares recebem alerta da Defesa Civil para chuvas extremas
O novo sistema de envio de
alertas de eventos climáticos desenvolvido pelo governo federal, conhecido como
Defesa Civil Alerta, não contabiliza o número de celulares que efetivamente
recebem os avisos, segundo a Agência
Pública apurou com exclusividade.
O Ministério da Integração e
do Desenvolvimento Regional, responsável pela Defesa Civil Nacional, afirmou à
reportagem que não é possível saber a quantidade de celulares que de fato
recebem os alertas nem quantos dispositivos bloquearam o recebimento das
mensagens.
A Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel), que coordena o disparo das mensagens junto às
operadoras de telefonia, também não tem dados sobre a quantidade de usuários
que desabilitaram os alertas de nível severo.
Especialistas consultados
pela Pública apontam
que a falta dessas informações impede que as defesas civis estaduais e
municipais espalhadas pelo país saibam quantos cidadãos foram de fato atingidos
pelos alertas e quantos recusaram o recebimento dos avisos.
<><>Por
que isso importa?
·
O novo sistema do governo federal foi inaugurado em
janeiro e deve ser usado em todo o país, mas sistema não mede quantos celulares
recebem o aviso.
·
Especialistas apontam que faltam estudos e ações
com a população para que alertas de fato tenham resultado.
O principal diferencial do
Defesa Civil Alerta em comparação a outros sistemas que já são usados no Brasil
é que a mensagem se sobrepõe na tela do celular, chamando atenção da pessoa. O
sistema dispensa cadastro prévio, necessário para os alertas via SMS já
utilizados.
O alerta funciona com a
tecnologia cell broadcast,
que usa as antenas telefônicas para enviar o conteúdo aos celulares localizados
na área definida pelas defesas civis dos estados e municípios. É necessário que
o aparelho esteja conectado à rede 4G ou 5G para receber o aviso. Por enquanto,
o serviço está disponível apenas para as regiões Sul e Sudeste, com previsão de
expansão para todo o país ao longo de 2025.
·
Sistema
foi usado pela primeira vez durante chuva recorde em SP
A primeira vez que a
ferramenta entrou em ação foi em 24 de janeiro, na cidade de São Paulo,
durante a maior chuva já
registrada na capital no período de uma hora desde o ano de 1961, quando
começaram as medições do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Após a
notificação da Defesa Civil, alguns celulares exibiram uma mensagem pop-up
informando que se tratava de um alerta de emergência sem fio, com a opção de
continuar recebendo esses avisos ou não.
Segundo a Pública apurou, moradores
Jardim Pantanal, bairro da zona leste que passou seis dias com casas alagadas,
não teriam recebido alertas para as chuvas que ocorreram no final de janeiro e
início de fevereiro.
É possível desabilitar os
alertas de nível severo, como o emitido em São Paulo. Contudo, em casos de
nível extremo, não é possível cancelar o aviso, que dispara um som de sirene no
celular. Essa situação ocorreu no Rio de Janeiro no
dia 29 de janeiro.
Segundo a Anatel, a
estimativa divulgada de que 8 milhões de aparelhos teriam recebido o alerta
extremo no Rio de Janeiro, informada em coluna do jornal O Globo, diz respeito ao número de dispositivos
registrados no município que suportam conectividade 4G ou 5G e, portanto, são
compatíveis com o sistema. Mas a quantidade exata de celulares que realmente
soaram o aviso é desconhecida.
“É muito preocupante a
impossibilidade de saber que, do total de x aparelhos que existem em uma
região, y foram avisados e z não querem receber mais o alerta”, analisa Jordan
Henrique de Souza, professor de gestão pública em proteção e defesa civil na
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
“À medida que os alertas são
dados e não se efetivam – o que pode acontecer no futuro, infelizmente, porque
é impossível ter uma modelagem perfeita [para a previsão de eventos extremos]
–, a quantidade de pessoas que começarão a desacreditar os alertas e desativar
essas notificações vai aumentar”, completa.
Na visão de Souza, o novo
sistema de alertas é um avanço importante e pode ajudar a aprimorar a resposta
das cidades aos eventos climáticos extremos, que estão mais frequentes e
intensos com o aquecimento do planeta. Porém é preciso estabelecer outras
formas de dialogar com a população e atentar para a forma como a mensagem é
percebida.
“No momento em que o cidadão
recebe um alerta desse nível, com um barulho estridente [no caso do alerta
extremo] e uma mensagem muito impactante, se ele não souber como agir diante
disso, há o risco de gerar uma preocupação e uma confusão sobre o que está
acontecendo. Tem vários memes das pessoas levando susto com o alerta, e qual é
o significado que fica disso?”, provoca.
Victor Marchezini, sociólogo
e pesquisador do Centro Nacional de Monitoramento de Alertas e Desastres
Naturais (Cemaden), compartilha a mesma percepção: “Houve uma grande
pressa para se implantar o sistema, mas sem considerar os efeitos positivos e
negativos que os alertas podem gerar nos usuários. As mensagens costumam
ser muito genéricas e sempre dependem da interpretação das pessoas que conhecem
o lugar onde estão”.
·
População
precisa ser sensibilizada para saber como agir diante do alerta
Marchezini coordena o
projeto Capacidades Organizacionais de Preparação para Eventos Extremos (Cope),
que busca construir sistemas de alerta que sejam centrados nas pessoas e
atendam às necessidades específicas para o contexto socioambiental de uma
comunidade.
Ele avalia que foram feitas
poucas pesquisas nos municípios brasileiros para entender como os cidadãos se
comportam diante dos alertas e como percebem esses avisos. “Pode ser que
essa tecnologia [Defesa Civil Alerta] tenha utilidade para uma determinada
classe social em um município da região Sudeste, mas não para outro município
da região Nordeste. Ainda não estamos nos questionando se o mecanismo de
disseminação de alertas em massa é uma estratégia efetiva para todas as cidades
de grande, médio e pequeno porte.”
Para Marchezini, o fortalecimento
dos núcleos comunitários de proteção e defesa civil, por exemplo, pode ser mais
eficaz para a proteção de vidas em certas cidades do que o disparo de alertas
por celular. Em especial nos casos de pessoas com dificuldade de manusear os
dispositivos, como idosos, ou em regiões com baixa cobertura de sinal.
“As pessoas não são só
receptoras do alerta, elas têm autonomia de decisão no momento da emergência.
Temos que ouvi-las para pensar no desenho do sistema de alertas e envolver as
comunidades no mapeamento das áreas de risco, para que elas saibam quais
lugares são seguros e quais não são. Se isso não for feito, de nada
adianta disparar um monte de alertas”, diz.
Jordan Henrique de Souza
defende a realização de campanhas periódicas de conscientização sobre os
alertas na televisão e nas redes sociais, para que a população entenda como
agir diante de um alerta e não perca a credibilidade no aviso.
“Se muitas pessoas começarem
a desabilitar as notificações de alertas, é sinal de que estão insatisfeitas ou
incomodadas com o serviço. E se estão se sentindo assim, por quê? Como podemos
melhorar o serviço?”, diz Marchezini.
Sem dados sobre o
recebimento e o cancelamento dos alertas, será difícil responder a essas
perguntas.
¨ Alertas
da Defesa Civil: o que é e o que significa severo e extremo
Alertas da Defesa Civil
foram disparados, na última semana, em função das fortes chuvas na região
Sudeste do país. Os avisos são
divididos em duas classificações: severo e extremo.
Segundo o Governo
Federal, as Defesas Civis competentes em municípios e estados enviam os alertas
em tempo real, via telefonia celular, com sinal 4G ou 5G disponível. A mensagem
aparece na frente de qualquer conteúdo que esteja na tela do celular.
Os alertas avisam de
desastres naturais e causados pelo homem e são classificados de acordo com a
Classificação e Codificação Brasileira de Desastres (Cobrade), e fornecem
orientações de como agir para se proteger.
>> Entenda os dois tipos:
- “Alerta Extremo”: tem um nível
máximo de alerta e aponta para ameaças extremas à vida ou à propriedade.
Esse nível de alerta chama a população para adotar medidas de proteção
imediata.
- “Alerta Severo” não há uma
urgência imediata, ou seja, a população tem mais tempo para se proteger.
<><> Alertas
emitidos
Pela primeira vez, a Defesa Civil do Rio de Janeiro emitiu um “Alerta Extremo”, pelo
celular, à população, no fim de tarde de quarta-feira (29), devido às pancadas
de chuvas e a possibilidade alagamentos.
Já a Defesa Civil de Belo Horizonte (MG) enviou um “Alerta Severo” para
queda de granizo, na última segunda-feira (27).
Na última sexta-feira
(24), cidadãos da capital paulista receberam um “Alerta severo” enviado pela Defesa
Civil estadual devido às chuvas que atingiram a
cidade de região metropolitana de São Paulo.
Fonte: Por Gabriel Gama, da
Agencia Pública/CNN Brasil
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