Solidariedade à Palestina: colisões e
urgências
As fraturas provocadas
pela questão palestina não surgiram em 7 de outubro de 2023. A panela de
pressão de dezesete anos de bloqueio israelense à Faixa de Gaza explodiu no
ataque coordenado pelo Hamas, que rompeu o cerco militar e procedeu a um
massacre de centenas de civis e centenas de militares, e à captura de centenas
de reféns em Israel. Nem tampouco tais divergências foram inauguradas pela
reação do governo de extrema direita de Benjamin Netanyahu, que consiste na
completa obliteração do território com maior densidade populacional do planeta,
com mais de dois milhões de pessoas – metade das quais são crianças. Frente à
escala de horrores, a opinião pública mundial viu o cinismo e a passividade de
anos recentes racharem-se em fissuras muito mais diversas do que o desgastado
paradigma da ‘polarização’. Em particular, o campo da esquerda mundial
divide-se acerca de conceitos como autodeterminação, antissionismo, tática e
estratégia da militância internacional; e este é o único campo em que tais
dilemas me interessam, pois, em matérias de solidariedade, a direita já muito
ajuda quando pouco atrapalha. Minha premissa analítica, que espero
incontroversa, é que todas as vidas e sofrimentos humanos valem por igual. Como
homem branco nascido deste etnoestado patriarcal que convencionamos chamar
Brasil, reconheço múltiplos mecanismos estruturais de supremacia, privilégio e
opressão violenta de grupos sociais marginalizados, bem como do apagamento de
sua memória histórica e cultural, que se encontram nas narrativas de
desumanização acerca dos Palestinos. Por outro lado, tenho clareza de que o
ciclo de atrocidades que presenciamos há décadas só será rompido com pressão
política exercida com máxima unidade, o que inevitavelmente explicitará
contradições e desconfortos no interior da própria esquerda. Mais ainda, eu
entendo que algumas perspectivas acerca desse conflito partem de uma percepção
assimétrica da dignidade de certo grupo envolvido frente aos demais; se você
possui tais vínculos, é provável que algumas partes deste texto lhe sejam
desagradáveis. Se servir de consolo, todas as partes deste texto foram
desagradáveis para mim.
·
Necroaritmética:
álgebra necropolítica do luto
Um expediente retórico
assustadoramente comum entre as militâncias implicadas no conflito, e que me
parece intolerável, é o que proponho chamar necroaritmética. Você
certamente já ouviu comparações entre o número de vítimas israelenses do Hamas
e o número de palestinos vitimados antes e depois de 7 de outubro, computando
uma desproporcionalidade nos crimes de guerra israelenses que relativize ou
mesmo justifique a atrocidade daquele ataque; por outro lado, trata-se também
da maior mortalidade de judeus em um mesmo ataque desde o Holocausto, cujo
trauma relativiza ou mesmo justificaria a escala da represália indiscriminada
de Israel contra a população civil de Gaza. Ora, se todos os sofrimentos
humanos valem por igual, então parece-me inevitável parafrasear a escritora
indiana Arundhati Roy, em seu texto “A álgebra da justiça infinita”, postulando
que os números de vítimas sempre se somam, jamais se subtraem ou se
dividem.
A necropolítica,
segundo o teórico camaronês Achille Mbembe, é a expressão máxima da soberania
em que um poder (como o Estado) tem a capacidade de decidir quem pode viver e
quem deve morrer. O filósofo brasileiro Vladimir Safatle apoia-se neste
conceito para denunciar os mecanismos de apagamento da memória coletiva e de
gestão do luto: em culturas estruturalmente violentas, como a brasileira, o
exercício do poder dá-se inclusive pela decisão de quem é digno de luto e quem
morre como coisa. Sob essa perspectiva, podemos entender que a prática
necroaritmética, por um lado, responde a uma certa economia do luto, já que
opera exatamente para anular a dissonância afetiva de sentir compaixão pelas
vítimas em “ambos os lados”; por outro lado, parece-me claro que a incorporação
de teses necroaritméticas à militância é em si mesma uma reprodução da
necropolítica subjacente, e portanto contraproducente ao seu enfrentamento.
Além de moralmente indigentes, tais teses são politicamente divisivas e
portanto inócuas para a causa que presumem apoiar. Não é “mais de esquerda”
minimizar as mortes bárbaras e os sequestros dos civis israelenses,
subtraindo-as do número de mortos e prisioneiros palestinos nas mãos de Israel;
tanto quanto é um insulto à memória das vítimas do nazismo lastrear novos
crimes israelenses em seu sofrimento, dividindo qualquer martírio dos
palestinos por seis milhões. Proponho rotular e denunciar com veemência a
utilização retórica de operações necroaritméticas em qualquer lado da questão
palestina.
·
Países e cidadania
Um País é uma linha
poligonal imaginária, que separa a Terra em duas regiões disjuntas, uma das
quais é colorida de fetiches e a outra também. Esta estúpida geometria
simbólica da presença humana no planeta não derivou de nenhum projeto racional,
mas sim da coagulação histórica de esferas de poder e suas capacidades
recíprocas de violência. O formato apoia-se na invenção de mitologias
nacionais, como se os comandados que morreram nas medições de forças
fronteiriças não se parecessem muito mais entre si do que com seus comandantes
– estes sim, não-raro, falantes de uma mesma língua. Qualquer expressão
essencialista de identidade nacional que reivindique formas ideais de uma
cultura ou características morais particulares de seu povo é igualmente
artificial e tola. No entanto, os Estados nacionais são a forma atual de
provimento da cidadania, a proteção de direitos individuais mínimos e a
promoção do bem-estar coletivo – na medida em que este não prejudique em
demasia os interesses das elites proprietárias. Tomando como imperativo moral o
acesso de todos os seres humanos à cidadania plena em algum Estado que a
possibilite, chegamos ao impasse entre o projeto nacional sionista, em suas
diversas nuances, e à inegável reivindicação dos Palestinos por soberania territorial
e política. Especificamente, a ideia de um Estado de Israel destinado a
expressar historicamente alguma promessa profética ao povo judeu parece-me tão
estranha quanto um Estado brasileiro, ou francês, ou indonésio, vocacionado a
realizar esta ou aquela missão essencial na trajetória daquele povo.
Simetricamente, a urgência de um Estado Palestino impõe-se como uma necessidade
pragmática de acesso à cidadania, e não como tela de projeção de algum
idealismo anti-imperialista na qual, não-raro, o sofrimento imediato do povo
palestino é pretexto oratório sem centralidade estratégica. Se a função
nacional do Estado de Israel é oferecer proteção e autodeterminação àquele
povo, então pelo mesmo argumento também os Palestinos têm direito a um Estado
pleno que lhes garanta o mesmo, sem pré-condições ou barganhas adicionais. O
“direito a existir” de Israel está predicado no mesmo direito a existir do
Estado Palestino, e esta deve ser a meta estratégica urgente da solidariedade
internacional.
·
Autodeterminação dos
povos, supremacia étnica e a esquerda sionista
O ponto anterior alude
naturalmente ao princípio da autodeterminação dos povos, que também produz
fraturas quando aplicado ao interior de um dado país, na medida em que seu
traçado poligonal encerra grupos culturalmente diversos em alguma medida e
inseridos desigualmente em relações de poder. Afinal, se um país expressa a
essência cultural de um de seus grupos, é inevitável que conceda cidadania
subalterna aos demais. Vista ao revés, infere-se desta ideia que todo grupo
étnico ou cultural não-hegemônico é ontologicamente uma ameaça à
autodeterminação do grupo hegemônico, que portanto só se pode manifestar e
garantir sob um regime de supremacia étnica.
É assustador
encontrar, mesmo em perspectivas identificadas com o pacifismo à esquerda do
trabalhismo sionista, a premissa de que a segurança dos judeus em Israel requer
a contenção dos não-judeus da região em um lugar social, quando muito, de
cidadãos de segunda classe. Insere-se assim a necroaritmética demográfica como
elemento divisivo na classe trabalhadora, e essa é a contradição central que o
sionismo de esquerda busca justificar com impressionante contorcionismo
retórico, apoiado essencialmente em dois pilares. Primeiro, de que a
autodeterminação do povo judeu se traduz como direito à hegemonia social em um
país, já que são minoria em todos os outros países. Nesse sentido, eu me
pergunto que grupo social teria direito à hegemonia social no Brasil, por
exemplo? No marco mínimo de qualquer noção substantiva de autodeterminação do
povo brasileiro, a única hegemonia social que deve interessar à esquerda é a da
classe que tudo produz em aliança com os povos tradicionais, e não vejo por que
Israel deveria ser diferente. Segundo, de que tal hegemonia seria um mal menor
necessário e potencialmente gentil, vejam lá que os palestinos israelenses
vivem melhor que os demais palestinos ou outros povos ao redor, apoiando-se em
um dos vícios mais detestáveis na esquerda, que é a inabalável convicção da
própria benevolência. O fato é que os palestinos jamais se satisfarão com um
horizonte de sub-cidadania, ainda que os tiranos se julguem amáveis, e muito
menos com a expropriação brutal e incessante, justamente porque ou a
autodeterminação é direito de todos os povos, ou então não é de nenhum. Assim
sendo, ou a esquerda sionista defende ostensivamente a criação imediata do
Estado palestino, sem pré-condições e com a retirada total dos colonos da
Ocupação, uma solução balanceada para o retorno dos refugiados e um compromisso
com a igualdade social radical no longo prazo – ou seja, abre-se a redefinir
sua autodeterminação como visão de futuro – ou esquerda não é. Mais ainda, deve
denunciar as mentiras oficiais, os abusos de direitos humanos e a retórica
genocida da extrema-direita israelense, nosso inimigo comum. Por outro lado, a
esquerda internacionalista, se tem como prioridade o sofrimento dos palestinos,
tem portanto a obrigação de acumular forças para a vitória histórica, e não o
luxo de escolher aliados. É mais fácil aliar-se com quem defende um Estado
Palestino em fronteiras de 1967 do que com a ‘direita democrática’ brasileira,
por exemplo, e vejam onde estamos; se a esquerda em Israel tem força política
para virar o jogo ou não, isso depende também do nosso apoio, retirando-os de
um lugar defensivo e reforçando-lhes a moral para destituir seu governo
extremista. Qualquer indivíduo ou grupo do campo sionista que adote
sinceramente a pauta acima é, por definição, nosso aliado tático, ainda que
tenhamos divergência sobre seu componente supremacista imediato. A convergência
é possível a partir de nosso horizonte comum, em que a superação de todas as
formas de discriminação é objetivo estratégico no processo de expansão da cidadania
em cada país. Isto posto, recordo que países são times inventados para um jogo
estúpido, no qual todos perdemos e a autodeterminação de um povo ou outro é no
máximo uma premiação paliativa.
·
Direito de existir e a
responsabilidade do Mundo
Um Direito de Existir
abstrato é em si mesmo uma confusão de categorias; um lago, a palavra
‘berinjela’ e o Brasil existem devido a uma série de eventos passados que
culminaram em sua formação, não como expressão de um Direito que lhes seja
anterior. Os Estados reconhecem seus direitos recíprocos a partir de sua
existência como polos de força historicamente organizados nos territórios que
já governam. Nesse marco, a criação de um Estado como expressão de um Direito é
de fato uma singularidade de Israel e do futuro Estado da Palestina, cuja
criação mútua emana da Resolução 181 da Assembleia Geral das Nações Unidas
(AGNU), uma peça do Direito Internacional também conhecida como Plano de
Partição para a Palestina.
Neste lugar situa-se a
demanda incessante, entre os apoiadores de Israel, de que seu direito a
existir, com ou sem o predicado explícito de Estado judaico, seja reconhecido
como pré-condição para qualquer crítica às suas políticas. A preocupação é que
singularizar as consequências da autodeterminação sionista sobre os palestinos,
enquanto diversos outros estados nacionais também se baseiam na opressão
presente ou passada de minorias, constituiria uma predileção fundamentalmente
discriminatória. Afinal, por que a esquerda internacionalista demonstra tanta
solidariedade com os palestinos e não, na mesma medida, com os uigures na
China, os negros periféricos nos Estados Unidos da América, ou os
bougainvilenses em Papua Nova Guiné?
Uma resposta fácil
para esta insinuação é que todas essas opressões se somam, jamais se subtraem
necroartimeticamente, e, portanto, uma delas não se pode justificar a partir
das demais. Outra, mais controversa, é que a esquerda também se solidariza com
as lutas de todos os povos oprimidos, ainda que deixe de explicar a ênfase
singular na solidariedade aos palestinos. A esquerda dedica-se então a explicar
a centralidade da luta palestina a partir de algum princípio universalizável,
como ponta-de-lança da luta anti-imperialista global, desafio à projeção
geopolítica hegemônica dos Estados Unidos, ou quintessência do ideal
descolonial… você escolhe. Tais abordagens, no entanto, pouco contribuem para
dirimir entre os não-convertidos a suspeita de fundo, apoiada em precedentes
reais, de um latente antissemitismo estrutural apoiado em novas semióticas. Parece-me
que a réplica mais contundente a qualquer enunciado, ainda que emitido de má
fé, deve partir do que ele contém de verdadeiro; nesse caso, é verdade que o Estado
de Israel tem o direito de existir. Esse direito é uma singularidade histórica
que lhe foi concedida pelas potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial e
pela AGNU, imposta à força aos palestinos, e por cujas consequências brutais o
Mundo é desde então corresponsável. Direito esse que é por corolário também o
Direito de Existir do Estado Palestino, pois formulado no mesmo documento do
ordenamento internacional. Direito esse que os palestinos não perderam por
discordarem de sua implementação unilateral, lastreada na violência colonial
britânica, e que nenhum outro povo tampouco aceitaria; por via das dúvidas,
Israel aceitaria hoje as fronteiras de 1948? Assim sendo, o Mundo deve aos
palestinos a criação de seu Estado, em caráter urgente e singular, precisamente
porque Israel tem o direito de existir. Estas notas curtas não esgotam a
questão atual de solidariedade com o povo palestino, passando ao largo de
muitos pontos importantes, mas espero que contribuam para abrir ângulos até
então pouco contemplados no debate e na ação política. Repensar nossos valores
de fundo, prioridades e alianças, e amadurecer com as colisões, é uma tarefa
histórica da esquerda internacionalista na luta por Paz, Justiça e Palestina
Livre.
¨ A superioridade da guerra do povo frente ao genocídio sionista:
como os palestinos derrotam o exército de Israel
A história dos
conflitos entre a resistência palestina e o Estado de Israel é marcada pela
disparidade de forças e recursos. No entanto, é justamente nesse contexto de
assimetria que a guerra justa do povo palestino revela sua superioridade
estratégica frente às forças sionistas. O êxito militar não se mede em números
de soldados e poder bélico, mas também na capacidade de adaptação, paciência
revolucionária e conhecimento eficaz do terreno e das táticas de combate. E,
principalmente, na justeza da linha que conduz a guerra e a decisão de heróicos
homens e mulheres, de calçados e roupas simples, mas com uma coragem temperada
em 70 anos de resistência à ocupação colonial. O chefe comunista chinês
Mao Tsetung, que dirigiu a luta anti-imperialista na China contra o Japão e
desenvolveu escritos teóricos militares estudados pelos palestinos, afirma que
“toda guerra justa e revolucionária é dotada de tremendo poder e pode transformar
muitas coisas ou abrir caminho para sua transformação”. A propósito, a essência
dessa afirmação não se reflete nas operações político-militares e nas
mobilizações da resistência palestina? Mesmo diante de um inimigo com grande
contingente e poder bélico, as organizações palestinas têm sido capazes de
desequilibrar as forças reacionárias de Israel, transformando a aparente
desvantagem em um campo fértil para a luta prolongada e a resistência
organizada.
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A Guerra de Guerrilha Palestina
A guerra
revolucionária é necessariamente uma guerra prolongada. Para converter forças
fracas em fortes e aparatos inferiores em superiores, é preciso atuar com
iniciativa, flexibilidade e planejamento. No contexto palestino, a guerra dos
povos se adapta ao tipo de luta travada pelas organizações militares de
guerrilha do Hamas, Jihad Islâmica Palestina e Frente Popular para a Libertação
Palestina, em Gaza e Cisjordânia, assim como pelo Hezbollah, no Líbano. Em
Gaza, os combatentes palestinos enfrentam o cerco inimigo aplicando conhecidas
táticas de guerrilha para confundir, desorientar e exaurir as forças
sionistas.
Um dos eventos mais
notáveis foi a emboscada da Brigada Al-Qassam no bairro de Shejaiya, no norte
de Gaza, onde pelo menos 10 oficiais e um comandante de batalhão da Brigada
Golani foram mortos. A batalha, que durou mais de três horas, destacou a
astúcia dos combatentes da Al-Qassam, que se disfarçaram com uniformes da Força
de Defesa de Israel (FDI) e utilizaram fuzis M16, atraindo os soldados para um
prédio repleto de explosivos. Shejaiya está para os palestinos de Gaza, como
Ienan está para os chineses: a orgulhosa e heróica base de apoio que ilustra
para o mundo a forja de aço palestina. Além disso, as forças de resistência
utilizam artefatos explosivos de alto impacto para sabotagens, disparos de
foguetes, emboscadas e, de maneira brilhante, a guerra de túneis como método
para alcançar superioridade tática. Esses túneis, carinhosamente chamados de
“metrô de Gaza”, se estendem por dezenas de quilômetros sob a Gaza e Israel,
permitindo que os combatentes se movimentem com agilidade, preservando suas
forças e evitando a detecção.
As forças da
Resistência tem se capacitado e demonstram que Israel não tem (como
naturalmente não conseguiria ter) conhecimento total sobre as forças do Hamas.
No dia 24 de junho, as Brigadas Al-Qassam realizaram um ataque audacioso contra
um veículo blindado do tipo Ovik, atingido por um míssil teleguiado do tipo
ATGM. O armamento de origem chinesa, com tecnologia inédita para a organização,
resultou na destruição do veículo. Desde quando este armamento está em
Gaza e quais outros a resistência pode ter em seu arsenal, são incógnitas que
assombram os comandantes israelenses. Tanto Shujaiya, ao norte, e Rafah, ao
sul, foram respostas exemplares da Resistência Palestina à rede de mentiras de
Israel. Ambas localidades foram consideradas controladas pelas tropas
sionistas, que afirmaram que tinham dizimado as forças do Hamas.
Na Palestina, as
emboscadas e ataques rápidos contra patrulhas e postos de controle israelenses
são táticas essenciais que vão além da mera neutralização das forças inimigas;
elas têm como alvo estratégico a captura de armamentos e munições, fortalecendo
assim a capacidade operacional da resistência. Exemplo disso é o
desenvolvimento do Al-Yassin 105mm, o primeiro míssil anti-blindado da Brigada
Al-Qassam, que surgiu durante a operação Dilúvio de Al-Aqsa. Esse míssil
representa um marco significativo na evolução do arsenal da resistência
palestina, simbolizando a adaptação e inovação diante de um adversário
militarmente superior. O Al-Yassin 105mm não apenas demonstra a habilidade
técnica dos combatentes, mas também reflete uma estratégia bem-sucedida de utilização
de recursos capturados para aumentar a eficácia em campo. Eis os frutos da
engenharia de guerra de Gaza.
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O Papel do Povo na Resistência
O fator tempo na
guerra dos povos, e seu caráter prolongado, favorecem as forças populares.
Contudo, a resistência palestina compreende que o desgaste das forças
israelenses depende da mobilização constante das massas, criando um estado de
guerra prolongada em que essas massas, ainda que desarmadas, estejam
constantemente mobilizadas para defender sua justa causa. A mobilização
das massas é a espinha dorsal da resistência, proporcionando apoio logístico,
informações e recursos para as organizações armadas. Desde o início do
conflito, as comunidades palestinas têm se organizado em protestos,
manifestações e ações contra o Estado de Israel, demonstrando o vínculo
orgânico entre as massas e a resistência palestina. Isso explica como o
Hamas, considerado inexistente na Cisjordânia antes de 7 de outubro de 2023,
ganhou a confiança das massas palestinas e viu sua popularidade aumentar para
73%. Essa mobilização é evidente nos campos de refugiados palestinos em Jenin, Nablus
e Tulkarem, onde o Hamas conseguiu desenvolver suas forças, tornando-se
bastiões da resistência na Cisjordânia. A autoridade da Resistência é
reconhecida pelas massas, que vêem nas organizações de luta armada não apenas
uma máquina de combate militar a Israel, mas aqueles que legitimamente levam
adiante os seus princípios. A luta armada palestina e a mobilização das
massas se entrelaçam numa relação simbiótica: uma só pode existir com a outra.
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O futuro da Palestina: desenvolver a guerra revolucionária até a vitória
final
A resistência
palestina demonstrou uma impressionante unidade e coesão entre os seus
componentes. O próprio lançamento do Dilúvio de Al Aqsa foi uma operação
conjunta entre diversas forças palestinas que atuam em Gaza e que gestaram
durante 2 anos este feito transcendental. No terreno da guerra, lutar de
maneira coesa e unida é sinal de saúde das forças guerrilheiras palestinas,
algo que não se observa nas forças sionistas. São milhares de ações conjuntas
orquestradas e empreendidas dentro e fora de Gaza. O anúncio de Yahya
Sinwar como o novo líder do Birô Político do Hamas, após o criminoso
assassinato de Ismail Haniyeh na capital do Irã, foi visto como grande exemplo
desta unidade. Sinwar é amplamente reconhecido pelas massas palestinas como um
defensor firme e leal da luta armada, garantindo os princípios e interesses do
povo palestino. A solidariedade internacionalista, principalmente a
solidariedade militar do Hezbollah, Kata’ib Hezbollah no Iraque e do Movimento
Ansarallah, são grandes contributos na epopeia histórica desenvolvida pelo povo
palestino. O exército israelense é forçado a responder a uma guerra prolongada
de desgaste e a cada dia que se prolongar a agressão sionista, se encurtará a
derrocada de Israel.
A Resistência
Palestina, em todas as suas frentes, pavimenta o caminho para libertar as
terras de seu povo das garras do sionismo. A luta armada palestina está posta
centro do debate internacional e prova para todos que a guerra do povo pode
triunfar e se transformar em um poderoso motor de libertação dos oprimidos. Em
suma, o povo palestino, em especial a Resistência Nacional e o Hamas, que hoje
exerce a função de vanguarda e ponto de unificação, aprenderam da experiência
do proletariado internacional o seguinte princípio: o imperialismo, e também o
sionismo, é um tigre de papel. E, com ele, aprenderam com o proletariado
internacional a grande verdade de que as massas populares podem triunfar, desde
que disponham de forças armadas próprias, desenvolvam a guerra de guerrilhas
umbilicalmente vinculada às mais amplas massas, todas mobilizadas em função da
guerra patriótica, e faça das zonas liberadas verdadeiros bastiões em que tudo,
absolutamente tudo, está em função da guerra do povo. A Resistência Palestina,
em suma, aprendeu a aplicar as formas e espírito da guerra popular: ao fazê-lo,
não apenas transforma para sempre a luta de libertação da Palestina, dando-lhe
a chance de vencer, como também lança, para todo o globo, a poderosa palavra de
ordem de que, com estes princípios universais, devidamente aplicados a cada
realidade, todas as classes e povos oprimidos também podem triunfar.
Fonte: Por Henrique N.
Sá Earp, em A Terra é Redonda/A Nova Democracia
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