terça-feira, 15 de outubro de 2024

Marcus Pestana: As eleições e o futuro político

No domingo (6), tivemos o primeiro turno das eleições municipais de 2024. Feitas as contas, começaram os exercícios reproduzindo velhos vícios que se traduzem em uma pergunta: qual é o recado das urnas?

Nenhum. Há a eterna tentativa de ver as eleições locais como a antessala das eleições nacionais, que ocorrem dois anos depois. Ledo engano. Primeiro, porque as eleições municipais têm baixo conteúdo ideológico. Não se discute o papel do Estado, as diretrizes econômicas ou os alinhamentos internacionais. A discussão é muito mais concreta. Ficam na mesa temas como a qualidade do ensino nas escolas de ensino fundamental, o grau de acesso aos serviços de saúde no SUS, o saneamento básico e a moradia popular, a mobilidade urbana e o transporte coletivo. E competência e capacidade de gestão não são monopólios da direita, da esquerda ou do centro.

Segundo, porque o eleitor é muito mais sábio que imagina nossa vã filosofia. Não vota em padrinhos. Os dois atuais maiores líderes populares, Lula e Bolsonaro, tiveram alguma influência, mas marginal. O eleitor vai, durante a campanha, por um processo de decantação, desenvolvendo rejeições, erguendo preferências, consolidando escolhas, numa misteriosa e complexa dinâmica. Mais de 30% dos eleitores em todo o Brasil abstiveram-se ou votaram nulo e branco.

Sempre tive resistência à ideia da reeleição, introduzida pelo PSDB. A população demonstrou que não tem problemas com ela. Mais de 80% dos prefeitos candidatos foram reeleitos. Prefeito bom, independente de partido e valores ideológicos, fica. Prefeito ruim é apeado do poder. Os prefeitos de capitais JHC (Maceió – 83,25% – PL), Bruno Reis (Salvador – 78,66%- União Brasil), João Campos (Recife – 78,11% – PSB) e Eduardo Paes (Rio de Janeiro – 60,47% – PSD) tiveram vitórias expressivas. Já o prefeito de Teresina, Dr. Pessoa (PRD), obteve apenas 2,2% dos votos. Em Minas, prefeitas do PT de duas das quatro maiores cidades, Marília Campos (Contagem) e Margarida Salomão (Juiz de Fora), obtiveram vitórias inquestionáveis, graças a sua boa avaliação. Há viés ideológico, incapacidade de avaliação pelo povo ou algum recado das urnas nesses números? Nenhum. Ventos existem e formam ondas. Há eleições com clima de mudança. A de 2024 foi marcada por ares favoráveis à continuidade.

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E as repercussões para 2026? Inexistentes no essencial. Lula continua muito maior que o PT e a esquerda. Bolsonaro mantém seu estilo pouco institucionalizado. Dos seis partidos que elegeram mais de 400 prefeitos cada (PSD, MDB, PP, União, PL e Republicanos), cinco deles estarão, como sempre, dentro de uma postura pragmática, prontos para apoiar e ter ministros em governos futuros da direita, da esquerda ou do centro. O PSD, maior vitorioso, com a eleição de 878 prefeitos no primeiro turno, abriga seu dirigente maior, Gilberto Kassab – principal assessor do Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, potencial candidato da direita em 2026 –, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o ministro Alexandre da Silveira alinhados com Lula e com o Governo Federal.

Portanto, devagar com andor analítico que o santo da política é de barro. O povo votou procurando o melhor gestor para o seu cotidiano nas cidades. A manutenção ou a mudança dos atuais rumos nacionais estão por ser construídas e não há nenhum recado das urnas sobre isto. 

 

¨      Ideologia ou soberania? Por Alexandre Aragão de Albuquerque

Ainda são vivas em nossa memória as deploráveis imagens de um evento ocorrido em outubro de 2017, na cidade de Miami (EUA), no qual o ex-capitão do exército brasileiro Jair Bolsonaro, num gesto de amplo espectro ideológico e midiático, bateu continência para a bandeira estadunidense.

Em maio de 2019, já eleito presidente do Brasil, voltaria a editar o mesmo gesto subserviente, por ocasião de um jantar oferecido a ele pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, em Dallas. Além do gesto de submissão aos norte-americanos, Jair Bolsonaro alterou o próprio bordão de seu marketing político ao proclamar: “Brasil e Estados Unidos acima de tudo”.

Além de constrangedores, estes gestos refletem não apenas a bajulação servil de setores da direita brasileira ao império ianque, mas o alinhamento ideológico da deplorável política externa bolsonarista, revelando alto grau de vassalagem, retroalimentando velhas práticas entreguistas e de total dependência externa do Brasil aos EUA.

Comentando tais gatunices, o presidente Lula, ainda aprisionado no cárcere político a que foi submetido, em razão do golpe de 2016, na Polícia Federal, em Curitiba, numa entrevista concedida aos jornalistas Florestan Fernandes Junior (El país) e Mônica Bergamo (Folha de S. Paulo), em 26 de abril de 2019, de forma altiva sentenciou:

“Eu nunca vi um presidente do Brasil bater continência para a bandeira americana. Eu nunca vi um presidente do Brasil ficar dizendo eu amo os Estados Unidos. Alguém acha que os Estados Unidos vão favorecer o Brasil? Americano pensa em americano em 1º. lugar, em americano em 2º. lugar, em americano em 3º. lugar. E ficam os lacaios brasileiros achando que os americanos vão fazer alguma coisa por nós. Quem tem que fazer por nós, somos nós. Precisamos acabar com o complexo de vira-lata, levantar a cabeça, pois a solução dos problemas do Brasil está dentro do Brasil”.

Recordemos que o plano de setores da direita de golpear o Brasil em 08 de janeiro de 2023 fracassou em virtude da capacidade de resposta imediata e precisa do presidente Lula orientando o então Ministro da Justiça Flávio Dino a não decretar a GLO (Garantia da Lei e da Ordem) diante daquela arruaça planejada, mas procedendo uma intervenção na secretaria de segurança do Distrito Federal, coordenada pelo secretário-executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Capelli.

Este ato de inteligência política foi capaz de unir as instituições do Brasil, governadores, magistrados, ministros, deputados, senadores em torno da pessoa do Presidente e de seu governo recém-eleito democraticamente. Contudo, é mister entender que esses setores da direita não se deram por vencidos, continuam agindo em vários fronts.

Caso recente aconteceu num evento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), realizado no último 8 de outubro, no qual foi assinado um acordo de cooperação voltado para a promoção e o fortalecimento da Base Industrial de Defesa e Segurança (BIDS), com a presença do Ministro da Defesa José Múcio Monteiro.

Múcio Monteiro iniciou sua vida política na ARENA (Aliança Renovadora Nacional), partido oficial da ditadura militar instalada no Brasil com o Golpe de 1964. Foi eleito vice-prefeito do município de Rio Formoso-PE (1975), mas não assumiu o mandato para ser presidente da CELPE (Companhia de Eletricidade de Pernambuco). Com a extinção da ARENA, filiou-se ao PDS, partido de substituição ao anterior, migrando depois para o PFL, facção que veio em seguida com o fim do PDS. Ainda militou no PSDB (2001-2003) e no PTB (2003-2023), estando atualmente no PRD.

No evento recente na CNI, Múcio Monteiro expressou com muita desenvoltura sua visão ideológica do projeto político brasileiro. Falas cirúrgicas, bem selecionadas. Por questões de limitação do espaço editorial, analisaremos aqui apenas uma passagem de seu discurso, deixando como sugestão a leitura de toda a sua mensagem.

A essência do discurso do ministro de Lula foi uma crítica aberta à política externa do governo do Presidente. Na visão de Múcio Monteiro, o governo Lula deve bater continência a Israel e a OTAN. Disse Múcio Monteiro: “A questão diplomática interfere na Defesa. Houve uma licitação. Venceram os judeus, o povo de Israel, mas por questões de guerra, o Hamas, por questões ideológicas não podemos aprovar [o contrato]”.

Uma fundamentação falaciosa e deplorável. Afinal, quem ganhou a concorrência não foi o povo judeu, mas o governo sionista de Benjamin Netanyahu. Além disso, importante destacar que a guerra genocida perpetrada pelo sionismo israelense não é contra o Hamas, mas visa ao extermínio do povo palestino. Agora Benjamin Netanyahu autorizou ataques maciços a outro povo, o libanês. Mas entre o genocídio palestino, os ataques ao povo libanês e o sionismo israelense, o ministro Múcio Monteiro deixou entrever em sua retórica ter preferência pelos sionistas.

Além disso, pareceu desconsiderar que em 19 de fevereiro deste ano o ministro das Relações Exteriores de Israel e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu declararam o Presidente Lula persona non grata. Isto parece não ter a menor relevância para ele. Por quê?

Recordemos que em sua viagem à Etiópia, participando da abertura da 37ª. Cúpula da União Africana, na capital Adis Abeba, em 17 de fevereiro, o Presidente Lula falou para 54 representantes de países daquele continente. Na entrevista coletiva, após o evento, o Presidente brasileiro classificou a morte de civis em Gaza como genocídio, criticando os países desenvolvidos por reduzirem ou cortarem a ajuda humanitária na região. Lula afirmou que o que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino (e não com o Hamas) não existiu em nenhum momento histórico. Não é uma guerra entre soldados e soldados. É uma guerra entre um Exército altamente preparado contra mulheres e crianças indefesas e inocentes.

Mas para Múcio Monteiro esse genocídio parece ser algo normal, que não se deve levar em conta no processo das decisões políticas brasileiras. Para ele, importante mesmo é fechar o contrato com o governo de Netanyahu e ficar do lado da OTAN. Todo apanhado empírico é pura ideologia.

Segundo a ONU, em um ano de genocídio, a destruição em Gaza pode estar na casa dos 90%, algo jamais visto na história, superando em muito as cidades europeias destruídas em seis anos de 2ª. Guerra Mundial. É a primeira vez na história das guerras e genocídios que 100% da população é declarada sob fome. É inédito também o deslocamento de mais de 90% de uma demografia atacada por agressor externo. (BdF, 09/10/2024).

A decisão sobre compras e vendas de material bélico é essencialmente política. Uma questão de soberania nacional. Jamais pode ser reduzida à falácia ideológica de mera questão técnica e comercial. Implica sempre definição de aliados estratégicos, principalmente num contexto internacional de construção de um mundo multipolar.

Múcio Monteiro conscientemente afrontou publicamente o chefe de Estado brasileiro, pois é ele quem define a política externa do país. O que pretende com essa manifestação? Ridicularizar o presidente Lula?

 

•        Petistas apostam que Bolsonaro repetirá estratégia de Lula em 2026

Lideranças petistas apostam que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deverá repetir, em 2026, a mesma estratégia adotada pelo presidente Lula nas eleições presidenciais de 2018.

Na avaliação de caciques do PT, mesmo inelegível, Bolsonaro registrará sua candidatura à Presidência da República no TSE, assim como fez Lula em 2018, quando estava preso.

Caso o TSE indefira a candidatura do ex-presidente, como é o esperado, petistas apostam que Bolsonaro alcaçará seu vice na chapa como candidato ao Palácio do Planalto.

Petistas reconhecem que essa seria uma estratégia “inteligente”. A avaliação é de que, ao registrar a candidatura, Bolsonaro deve conseguir colocar seu vice no segundo turno.

<><> Direita não bolsonarista teme candidatura de Bolsonaro

Como noticiou a coluna, lideranças políticas de centro-direita temem que, mesmo inelegível, Bolsonaro se registre como candidato ao Palácio do Planalto em 2026.

Na avaliação de caciques da centro-direita, caso repita em 2026 o que Lula fez em 2018, Bolsonaro acabaria com qualquer chance de um candidato desse espectro político no pleito.

A avaliação é compartilhada por aliados do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), que vem se colocando como possível candidato à Presidência em 2026.

 

•        Ou a justiça cassa Marçal ou ele rachará ainda mais a direita em 2026. Por Ricardo Noblat

Vamos lá outra vez: no país de “se a próxima eleição presidencial fosse hoje”, ou melhor, tivesse acontecido entre os dias 25 e 29 de setembro último reunindo somente Lula (PT), Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Pablo Marçal (PRTB), o resultado…

O resultado teria sido: Lula, 32% dos votos, Marçal 18% e Tarcísio, 15%. Votos indecisos: 18%. Votos nulos, em branco e abstenção: 18%. É o que mostra pesquisa da Quaest que entrevistou duas mil pessoas. Margem de erro: dois pontos percentuais.

Lula pode comemorar? Pode. Mas a pesquisa trouxe um dado que deve preocupá-lo: na faixa dos eleitores mais pobres, os que ganham de 0 a 2 salários-mínimos, aumentou o percentual dos que acham que ele não deve se candidatar ao quarto mandato.

Em julho passado, 45% dos brasileiros ouvidos pela Quaest disseram que Lula deveria ser candidato; no final de setembro, 40%. Os que em julho disseram que ele não deveria ser candidato (53%), no final de setembro somavam 58%.

O racha da direita se deu dentro do eleitorado de Bolsonaro. Enquanto Lula mantém 71% dos votos que conquistou em 2022, Marçal e Tarcísio dividem o espólio de Bolsonaro, cada um com cerca de 30% dos votos bolsonaristas.

Lula vence Marçal e Tarcísio em todas as regiões do país, mas no Sul vence Marçal só por dois pontos. Nordeste: Lula, 44%, Marçal, 15% e Tarcísio 7%. No Centro-Oeste, Lula bate Tarcísio por 34% a 14%; no Sudeste, 25% a 20%; e no Sul, 25% a 13%.

Marçal aproveitou a eleição municipal para nacionalizar o seu nome; o de Tarcísio ainda não está nacionalizado. No momento, segundo a Quaest, Marçal, Michelle Bolsonaro e Tarcísio têm “o mesmo percentual de força” para enfrentar Lula em 2026.

Quando se viu de fora do segundo turno para prefeito de São Paulo, Marçal anunciou que daqui a dois anos será candidato – ou a governador de São Paulo ou a presidente da República. Não será se a Justiça cassar seus direitos políticos, tornando-o inelegível.

É pelo que torce Tarcísio, e os afortunados da avenida Faria Lima, em São Paulo.

 

•        Pablo Marçal abre ferida no bolsonarismo e difere de Joice e Doria. Por Paulo Capelli

Ao contrário de Joice Hasselmann, João Doria e Alexandre Frota, que viraram desafetos de Bolsonaro e persona non grata na direita, Pablo Marçal deixa uma ferida aberta no bolsonarismo. Esta é a primeira vez que a ruptura de Bolsonaro com um aliado divide seus eleitores e o próprio grupo político do ex-presidente.

Das outras vezes, o campo conservador interpretou que o cenário era Bolsonaro versus “oportunistas” que mudaram de lado. Agora, parte dele atribui a pecha de oportunista ao ex-presidente, que optou por manter o apoio a Ricardo Nunes (MDB), de centro, em vez de apoiar Pablo Marçal, que carregou no discurso ideológico contra a esquerda.

O eleitorado conservador via em Joice, Doria e Frota figuras que poderiam ajudar Bolsonaro. Uma vez que mudaram de lado, foram descartados e taxados de traidores.

Com Pablo Marçal, há uma diferença. Entre apoiadores de Bolsonaro, há quem veja no ex-coach potencial de substituir o capitão a médio e longo prazo. A retórica afiada e o discurso antissistema e antiesquerda, adotado originalmente por um e replicado por outro, contribuíram para essa percepção.

No grupo político do ex-presidente, deputados bolsonaristas que caminharam com Nunes contabilizam o estrago que a campanha no primeiro turno causou. Esses parlamentares colecionaram comentários hostis nas redes sociais.

E, embora Pablo Marçal recorra a robôs para turbinar sua atuação na internet, a maioria dessas mensagens é de eleitores reais. Entre os atingidos, está o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, político que mais criticou o ex-coach nos últimos meses.

Ainda não se sabe se Bolsonaro vai recuperar o apoio da maioria daqueles que reprovaram a adesão à candidatura de Nunes. Mas o fato é que o ex-presidente teve, pela primeira vez, sua liderança contestada no campo conservador.

Até mesmo políticos de peso que já trocaram farpas com Bolsonaro, como Ronaldo Caiado e Romeu Zema, não conseguiram desgastar o ex-presidente e dividir o eleitorado da forma como Pablo Marçal conseguiu.

 

Fonte: Congresso em Foco/Metrópoles

 

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