Marcus Pestana: As eleições e o futuro
político
No domingo (6),
tivemos o primeiro turno das eleições municipais de 2024. Feitas as contas,
começaram os exercícios reproduzindo velhos vícios que se traduzem em uma
pergunta: qual é o recado das urnas?
Nenhum. Há a eterna
tentativa de ver as eleições locais como a antessala das eleições nacionais,
que ocorrem dois anos depois. Ledo engano. Primeiro, porque as eleições
municipais têm baixo conteúdo ideológico. Não se discute o papel do Estado, as
diretrizes econômicas ou os alinhamentos internacionais. A discussão é muito
mais concreta. Ficam na mesa temas como a qualidade do ensino nas escolas de
ensino fundamental, o grau de acesso aos serviços de saúde no SUS, o saneamento
básico e a moradia popular, a mobilidade urbana e o transporte coletivo. E
competência e capacidade de gestão não são monopólios da direita, da esquerda
ou do centro.
Segundo, porque o
eleitor é muito mais sábio que imagina nossa vã filosofia. Não vota em
padrinhos. Os dois atuais maiores líderes populares, Lula e Bolsonaro, tiveram
alguma influência, mas marginal. O eleitor vai, durante a campanha, por um
processo de decantação, desenvolvendo rejeições, erguendo preferências,
consolidando escolhas, numa misteriosa e complexa dinâmica. Mais de 30% dos
eleitores em todo o Brasil abstiveram-se ou votaram nulo e branco.
Sempre tive
resistência à ideia da reeleição, introduzida pelo PSDB. A população demonstrou
que não tem problemas com ela. Mais de 80% dos prefeitos candidatos foram
reeleitos. Prefeito bom, independente de partido e valores ideológicos, fica.
Prefeito ruim é apeado do poder. Os prefeitos de capitais JHC (Maceió – 83,25%
– PL), Bruno Reis (Salvador – 78,66%- União Brasil), João Campos (Recife –
78,11% – PSB) e Eduardo Paes (Rio de Janeiro – 60,47% – PSD) tiveram vitórias
expressivas. Já o prefeito de Teresina, Dr. Pessoa (PRD), obteve apenas 2,2%
dos votos. Em Minas, prefeitas do PT de duas das quatro maiores cidades,
Marília Campos (Contagem) e Margarida Salomão (Juiz de Fora), obtiveram
vitórias inquestionáveis, graças a sua boa avaliação. Há viés ideológico,
incapacidade de avaliação pelo povo ou algum recado das urnas nesses números?
Nenhum. Ventos existem e formam ondas. Há eleições com clima de mudança. A de
2024 foi marcada por ares favoráveis à continuidade.
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E as repercussões para
2026? Inexistentes no essencial. Lula continua muito maior que o PT e a
esquerda. Bolsonaro mantém seu estilo pouco institucionalizado. Dos seis
partidos que elegeram mais de 400 prefeitos cada (PSD, MDB, PP, União, PL e
Republicanos), cinco deles estarão, como sempre, dentro de uma postura
pragmática, prontos para apoiar e ter ministros em governos futuros da direita,
da esquerda ou do centro. O PSD, maior vitorioso, com a eleição de 878
prefeitos no primeiro turno, abriga seu dirigente maior, Gilberto Kassab –
principal assessor do Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, potencial
candidato da direita em 2026 –, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o
ministro Alexandre da Silveira alinhados com Lula e com o Governo Federal.
Portanto, devagar com
andor analítico que o santo da política é de barro. O povo votou procurando o
melhor gestor para o seu cotidiano nas cidades. A manutenção ou a mudança dos
atuais rumos nacionais estão por ser construídas e não há nenhum recado das urnas
sobre isto.
¨ Ideologia ou soberania? Por Alexandre Aragão de Albuquerque
Ainda são vivas em
nossa memória as deploráveis imagens de um evento ocorrido em outubro de 2017,
na cidade de Miami (EUA), no qual o ex-capitão do exército brasileiro Jair
Bolsonaro, num gesto de amplo espectro ideológico e midiático, bateu
continência para a bandeira estadunidense.
Em maio de 2019, já
eleito presidente do Brasil, voltaria a editar o mesmo gesto subserviente, por
ocasião de um jantar oferecido a ele pela Câmara de Comércio Brasil-Estados
Unidos, em Dallas. Além do gesto de submissão aos norte-americanos, Jair Bolsonaro
alterou o próprio bordão de seu marketing político ao proclamar: “Brasil e
Estados Unidos acima de tudo”.
Além de
constrangedores, estes gestos refletem não apenas a bajulação servil de setores
da direita brasileira ao império ianque, mas o alinhamento ideológico da
deplorável política externa bolsonarista, revelando alto grau de vassalagem,
retroalimentando velhas práticas entreguistas e de total dependência externa do
Brasil aos EUA.
Comentando tais
gatunices, o presidente Lula, ainda aprisionado no cárcere político a que foi
submetido, em razão do golpe de 2016, na Polícia Federal, em Curitiba, numa
entrevista concedida aos jornalistas Florestan Fernandes Junior (El país)
e Mônica Bergamo (Folha de S. Paulo), em 26 de abril de 2019, de forma
altiva sentenciou:
“Eu nunca vi um
presidente do Brasil bater continência para a bandeira americana. Eu nunca vi
um presidente do Brasil ficar dizendo eu amo os Estados Unidos. Alguém acha que
os Estados Unidos vão favorecer o Brasil? Americano pensa em americano em 1º.
lugar, em americano em 2º. lugar, em americano em 3º. lugar. E ficam os lacaios
brasileiros achando que os americanos vão fazer alguma coisa por nós. Quem tem
que fazer por nós, somos nós. Precisamos acabar com o complexo de vira-lata,
levantar a cabeça, pois a solução dos problemas do Brasil está dentro do
Brasil”.
Recordemos que o plano
de setores da direita de golpear o Brasil em 08 de janeiro de 2023 fracassou em
virtude da capacidade de resposta imediata e precisa do presidente Lula
orientando o então Ministro da Justiça Flávio Dino a não decretar a GLO (Garantia
da Lei e da Ordem) diante daquela arruaça planejada, mas procedendo uma
intervenção na secretaria de segurança do Distrito Federal, coordenada pelo
secretário-executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Capelli.
Este ato de
inteligência política foi capaz de unir as instituições do Brasil,
governadores, magistrados, ministros, deputados, senadores em torno da pessoa
do Presidente e de seu governo recém-eleito democraticamente. Contudo, é mister
entender que esses setores da direita não se deram por vencidos, continuam
agindo em vários fronts.
Caso recente aconteceu
num evento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), realizado no último 8
de outubro, no qual foi assinado um acordo de cooperação voltado para a
promoção e o fortalecimento da Base Industrial de Defesa e Segurança (BIDS),
com a presença do Ministro da Defesa José Múcio Monteiro.
Múcio Monteiro iniciou
sua vida política na ARENA (Aliança Renovadora Nacional), partido oficial da
ditadura militar instalada no Brasil com o Golpe de 1964. Foi eleito
vice-prefeito do município de Rio Formoso-PE (1975), mas não assumiu o mandato
para ser presidente da CELPE (Companhia de Eletricidade de Pernambuco). Com a
extinção da ARENA, filiou-se ao PDS, partido de substituição ao anterior,
migrando depois para o PFL, facção que veio em seguida com o fim do PDS. Ainda
militou no PSDB (2001-2003) e no PTB (2003-2023), estando atualmente no PRD.
No evento recente na
CNI, Múcio Monteiro expressou com muita desenvoltura sua visão ideológica do
projeto político brasileiro. Falas cirúrgicas, bem selecionadas. Por questões
de limitação do espaço editorial, analisaremos aqui apenas uma passagem de seu
discurso, deixando como sugestão a leitura de toda a sua mensagem.
A essência do discurso
do ministro de Lula foi uma crítica aberta à política externa do governo do
Presidente. Na visão de Múcio Monteiro, o governo Lula deve bater continência a
Israel e a OTAN. Disse Múcio Monteiro: “A questão diplomática interfere na Defesa.
Houve uma licitação. Venceram os judeus, o povo de Israel, mas por questões de
guerra, o Hamas, por questões ideológicas não podemos aprovar [o contrato]”.
Uma fundamentação
falaciosa e deplorável. Afinal, quem ganhou a concorrência não foi o povo
judeu, mas o governo sionista de Benjamin Netanyahu. Além disso, importante
destacar que a guerra genocida perpetrada pelo sionismo israelense não é contra
o Hamas, mas visa ao extermínio do povo palestino. Agora Benjamin Netanyahu
autorizou ataques maciços a outro povo, o libanês. Mas entre o genocídio
palestino, os ataques ao povo libanês e o sionismo israelense, o ministro Múcio
Monteiro deixou entrever em sua retórica ter preferência pelos sionistas.
Além disso, pareceu
desconsiderar que em 19 de fevereiro deste ano o ministro das Relações
Exteriores de Israel e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu declararam o
Presidente Lula persona non grata. Isto parece não ter a menor
relevância para ele. Por quê?
Recordemos que em sua
viagem à Etiópia, participando da abertura da 37ª. Cúpula da União Africana, na
capital Adis Abeba, em 17 de fevereiro, o Presidente Lula falou para 54
representantes de países daquele continente. Na entrevista coletiva, após o
evento, o Presidente brasileiro classificou a morte de civis em Gaza como
genocídio, criticando os países desenvolvidos por reduzirem ou cortarem a ajuda
humanitária na região. Lula afirmou que o que está acontecendo na Faixa de Gaza
com o povo palestino (e não com o Hamas) não existiu em nenhum momento
histórico. Não é uma guerra entre soldados e soldados. É uma guerra entre um
Exército altamente preparado contra mulheres e crianças indefesas e inocentes.
Mas para Múcio
Monteiro esse genocídio parece ser algo normal, que não se deve levar em conta
no processo das decisões políticas brasileiras. Para ele, importante mesmo é
fechar o contrato com o governo de Netanyahu e ficar do lado da OTAN. Todo
apanhado empírico é pura ideologia.
Segundo a ONU, em um
ano de genocídio, a destruição em Gaza pode estar na casa dos 90%, algo jamais
visto na história, superando em muito as cidades europeias destruídas em seis
anos de 2ª. Guerra Mundial. É a primeira vez na história das guerras e genocídios
que 100% da população é declarada sob fome. É inédito também o deslocamento de
mais de 90% de uma demografia atacada por agressor externo. (BdF, 09/10/2024).
A decisão sobre
compras e vendas de material bélico é essencialmente política. Uma questão de
soberania nacional. Jamais pode ser reduzida à falácia ideológica de mera
questão técnica e comercial. Implica sempre definição de aliados estratégicos,
principalmente num contexto internacional de construção de um mundo multipolar.
Múcio Monteiro
conscientemente afrontou publicamente o chefe de Estado brasileiro, pois é ele
quem define a política externa do país. O que pretende com essa manifestação?
Ridicularizar o presidente Lula?
• Petistas apostam que Bolsonaro repetirá
estratégia de Lula em 2026
Lideranças petistas
apostam que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deverá repetir, em 2026, a
mesma estratégia adotada pelo presidente Lula nas eleições presidenciais de
2018.
Na avaliação de
caciques do PT, mesmo inelegível, Bolsonaro registrará sua candidatura à
Presidência da República no TSE, assim como fez Lula em 2018, quando estava
preso.
Caso o TSE indefira a
candidatura do ex-presidente, como é o esperado, petistas apostam que Bolsonaro
alcaçará seu vice na chapa como candidato ao Palácio do Planalto.
Petistas reconhecem
que essa seria uma estratégia “inteligente”. A avaliação é de que, ao registrar
a candidatura, Bolsonaro deve conseguir colocar seu vice no segundo turno.
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Direita não bolsonarista teme candidatura de Bolsonaro
Como noticiou a
coluna, lideranças políticas de centro-direita temem que, mesmo inelegível,
Bolsonaro se registre como candidato ao Palácio do Planalto em 2026.
Na avaliação de
caciques da centro-direita, caso repita em 2026 o que Lula fez em 2018,
Bolsonaro acabaria com qualquer chance de um candidato desse espectro político
no pleito.
A avaliação é
compartilhada por aliados do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União
Brasil), que vem se colocando como possível candidato à Presidência em 2026.
• Ou a justiça cassa Marçal ou ele rachará
ainda mais a direita em 2026. Por Ricardo Noblat
Vamos lá outra vez: no
país de “se a próxima eleição presidencial fosse hoje”, ou melhor, tivesse
acontecido entre os dias 25 e 29 de setembro último reunindo somente Lula (PT),
Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Pablo Marçal (PRTB), o resultado…
O resultado teria
sido: Lula, 32% dos votos, Marçal 18% e Tarcísio, 15%. Votos indecisos: 18%.
Votos nulos, em branco e abstenção: 18%. É o que mostra pesquisa da Quaest que
entrevistou duas mil pessoas. Margem de erro: dois pontos percentuais.
Lula pode comemorar?
Pode. Mas a pesquisa trouxe um dado que deve preocupá-lo: na faixa dos
eleitores mais pobres, os que ganham de 0 a 2 salários-mínimos, aumentou o
percentual dos que acham que ele não deve se candidatar ao quarto mandato.
Em julho passado, 45%
dos brasileiros ouvidos pela Quaest disseram que Lula deveria ser candidato; no
final de setembro, 40%. Os que em julho disseram que ele não deveria ser
candidato (53%), no final de setembro somavam 58%.
O racha da direita se
deu dentro do eleitorado de Bolsonaro. Enquanto Lula mantém 71% dos votos que
conquistou em 2022, Marçal e Tarcísio dividem o espólio de Bolsonaro, cada um
com cerca de 30% dos votos bolsonaristas.
Lula vence Marçal e
Tarcísio em todas as regiões do país, mas no Sul vence Marçal só por dois
pontos. Nordeste: Lula, 44%, Marçal, 15% e Tarcísio 7%. No Centro-Oeste, Lula
bate Tarcísio por 34% a 14%; no Sudeste, 25% a 20%; e no Sul, 25% a 13%.
Marçal aproveitou a
eleição municipal para nacionalizar o seu nome; o de Tarcísio ainda não está
nacionalizado. No momento, segundo a Quaest, Marçal, Michelle Bolsonaro e
Tarcísio têm “o mesmo percentual de força” para enfrentar Lula em 2026.
Quando se viu de fora
do segundo turno para prefeito de São Paulo, Marçal anunciou que daqui a dois
anos será candidato – ou a governador de São Paulo ou a presidente da
República. Não será se a Justiça cassar seus direitos políticos, tornando-o
inelegível.
É pelo que torce
Tarcísio, e os afortunados da avenida Faria Lima, em São Paulo.
• Pablo Marçal abre ferida no bolsonarismo
e difere de Joice e Doria. Por Paulo Capelli
Ao contrário de Joice
Hasselmann, João Doria e Alexandre Frota, que viraram desafetos de Bolsonaro e
persona non grata na direita, Pablo Marçal deixa uma ferida aberta no
bolsonarismo. Esta é a primeira vez que a ruptura de Bolsonaro com um aliado
divide seus eleitores e o próprio grupo político do ex-presidente.
Das outras vezes, o
campo conservador interpretou que o cenário era Bolsonaro versus “oportunistas”
que mudaram de lado. Agora, parte dele atribui a pecha de oportunista ao
ex-presidente, que optou por manter o apoio a Ricardo Nunes (MDB), de centro,
em vez de apoiar Pablo Marçal, que carregou no discurso ideológico contra a
esquerda.
O eleitorado
conservador via em Joice, Doria e Frota figuras que poderiam ajudar Bolsonaro.
Uma vez que mudaram de lado, foram descartados e taxados de traidores.
Com Pablo Marçal, há
uma diferença. Entre apoiadores de Bolsonaro, há quem veja no ex-coach
potencial de substituir o capitão a médio e longo prazo. A retórica afiada e o
discurso antissistema e antiesquerda, adotado originalmente por um e replicado
por outro, contribuíram para essa percepção.
No grupo político do
ex-presidente, deputados bolsonaristas que caminharam com Nunes contabilizam o
estrago que a campanha no primeiro turno causou. Esses parlamentares
colecionaram comentários hostis nas redes sociais.
E, embora Pablo Marçal
recorra a robôs para turbinar sua atuação na internet, a maioria dessas
mensagens é de eleitores reais. Entre os atingidos, está o governador de São
Paulo, Tarcísio de Freitas, político que mais criticou o ex-coach nos últimos
meses.
Ainda não se sabe se
Bolsonaro vai recuperar o apoio da maioria daqueles que reprovaram a adesão à
candidatura de Nunes. Mas o fato é que o ex-presidente teve, pela primeira vez,
sua liderança contestada no campo conservador.
Até mesmo políticos de
peso que já trocaram farpas com Bolsonaro, como Ronaldo Caiado e Romeu Zema,
não conseguiram desgastar o ex-presidente e dividir o eleitorado da forma como
Pablo Marçal conseguiu.
Fonte: Congresso em
Foco/Metrópoles
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