Mãe alerta sobre como vape contribuiu para
morte de filho aos 20 anos após infecção: 'pulmão não reagiu'
"Não foi o vape
que causou a morte do meu filho, mas o pulmão dele ficou comprometido pelo uso
do vape e não conseguiu reagir a uma bactéria".
O relato é de Lia
Paiva, mulher do ex-jogador Serginho e mãe de Diego Paiva dos Santos, de 20
anos. O jovem morreu em 7 de agosto após um infarto pulmonar. Conhecido também
como embolia pulmonar, a condição atrapalha a passagem de sangue do coração
para o pulmão, comprometendo a oxigenação e podendo levar ao óbito.
Lia contou ao g1 que
Diego machucou o ombro no jiu-jitsu. Primeiro, a família pensou que fosse
apenas uma lesão. Ele fez um raio-X do ombro, ressonância, passou por um
ortopedista e nada foi encontrado, só uma inflamação. Dias depois, ele voltou
ao hospital porque a dor não parou.
"Ele foi ao
hospital depois de muita briga. Meia hora depois ele estava intubado, com 46%
de saturação, pulmão péssimo. Fizeram os exames e descobriram que era uma
bactéria que entrou através de um furúnculo. Acreditamos que ele se contaminou
no tatame e a bactéria ficou alojada no ombro. Ele entrou com quadro de choque
séptico e foi para a UTI", relata a mãe.
Segundo Lia, os
médicos estavam otimistas com a recuperação do jovem.
"Em quatro dias,
o fígado melhorou, o rim melhorou. O antibiótico estava fazendo efeito em todas
as partes comprometidas, inclusive no coração. Mas faltava o pulmão. E aí viram
que um pulmão já tinha ido e, na madrugada, ele teve o infarto pulmonar no
outro pulmão e veio a óbito".
Ela usou a imagem de
um pulmão saudável (acima, esquerda, com tons mais escuros) para comparar com o
pulmão do filho (acima, na direita, imagem esbranquiçada). "Ele nem pulmão
tinha de tanta infecção".
A mãe diz que o vape
contribuiu para a morte do filho.
"A causa maior
foi a bactéria, mas o pulmão não reagiu pelo uso excessivo do vape".
Diego fumava o vape
desde os 15 anos. Ou seja, cinco anos usando o dispositivo. A mãe conta que ele
fumava muito e que tentava convencê-lo a parar.
"Ele fumava
compulsivamente. Eu mandava vários textos sobre o assunto e ele não acreditava.
Eu jogava o vape fora, ele comprava outro. Ele teve Covid duas vezes e não teve
problema, mas o médico já havia alertado que o pulmão estava comprometido. Ele
pediu para levar o vape para o hospital", conta.
Margareth Dalcolmo,
pneumologista e presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia
(SBPT), explica que o processo inflamatório e a destruição da arquitetura
pulmonar feitos pelos cigarros eletrônicos é grave e indelével.
"O número de
substâncias é muito grande e nem sabemos todas. Sabemos que além de nicotina,
que é uma centena de vezes superior ao cigarro tradicional, o jovem adicto fuma
o equivalente a 400 cigarros por semana. Ele fica adicto em cinco dias e o dano
pulmonar é como se tivesse um enfisema pulmonar agudo", comenta a
pneumologista.
• O vape e seus riscos
O cigarro eletrônico,
conhecido como vape, é proibido no Brasil desde 2009. Mas isso não impede que
ele seja facilmente encontrado no comércio ou online. Além disso, dados do IPEC
apontam que o número de usuários de cigarro eletrônico quadriplicou no Brasil
em quatro anos: saltou de 500 mil em 2018, para 2,2 milhões de usuários em
2022.
Outros números mostram
que a proibição, na prática, não influencia no uso. De acordo com uma pesquisa
da Universidade Federal de Pelotas realizada com 10 mil brasileiros, quase 20%
dos jovens entre 18 e 24 anos já experimentaram vapes. O IBGE traz outro número
alarmante: quase 17% dos estudantes de 13 a 17 anos já experimentaram os
cigarros eletrônicos.
Uma pesquisa realizada
Vigilância Sanitária da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo em parceria
com o Instituto do Coração (Incor) e o Laboratório de Toxicologia da Faculdade
de Medicina da USP apontou que o vape provoca até seis vezes mais intoxicação
por nicotina do que cigarro convencional.
“O estudo indica que a
intoxicação por nicotina em quem usa o cigarro eletrônico é tão alta quanto, ou
até pior, que nos usuários de cigarro tradicional. Também foi notado uma falta
de conhecimento entre os mais jovens sobre os riscos de dependência",
apontou Jaqueline Scholz, diretora do Núcleo de Tabagismo do Incor e
coordenadora da pesquisa.
Já um estudo feito
pela Universidade Federal de Santa Catarina em parceria com a Polícia
Científica do estado encontrou nos cigarros eletrônicos a octodrina, uma
substância semelhante à anfetamina. Ela entra para a lista de outras
substâncias, como glicerol, propilenoglicol, formaldeído, acetaldeído,
acroleína, acetona e nicotina. Elas são tóxicas, cancerígenas e a nicotina atua
para viciar.
"Eu considero os
dispositivos eletrônicos para fumar uma invenção diabólica da indústria do
tabaco. Tenho atendido jovens de 16 a 22 anos com uma adicção muito grande,
dificuldade de largar o vício. É uma dependência muito rápida", pontua
Margareth Dalcolmo.
• Pesquisa encontra substância semelhante
à anfetamina em cigarros eletrônicos no Brasil
Há quem ache que os
cigarros eletrônicos são apenas vapor inofensivo, composto de água e sabor, mas
eles estão longe disso. Esses dispositivos contêm centenas de substâncias,
várias delas tóxicas. O que eles há neles, exatamente, ainda não é muito claro,
mas pesquisadores encontraram, pela primeira vez, vapes com uma substância
semelhante à anfetamina, uma droga sintética que potencializa o vício.
Os cigarros
eletrônicos são proibidos no Brasil, mas entram ilegalmente, principalmente
pelas fronteiras, movimentando um mercado milionário, segundo a polícia. Com
procedências diversas, é um desafio para a pesquisa determinar o que,
exatamente, eles contêm, já que muitas das substâncias nem constam nas
embalagens.
Foi tentando entender
melhor a que riscos as pessoas estavam expostas que a Universidade Federal de
Santa Catarina e a Polícia Científica do estado se juntaram em uma pesquisa. Na
análise, eles conseguiram identificar a octodrina, que é da mesma família da
anfetamina e tem efeitos semelhantes. A droga estava presente em três marcas
diferentes circulando no Brasil.
A substância entra
para a lista ao lado de outras, como:
Glicerol,
propilenoglicol, formaldeído, acetaldeído, acroleína, acetona e nicotina. Elas
são tóxicas, cancerígenas e a nicotina atua para viciar.
Segundo especialistas,
os cigarros estão criando uma geração de viciados cada vez mais jovens. É o
caso de João Pedro, influenciador com milhões de seguidores, que fuma vape
desde os 15 anos.
“É uma necessidade tão
grande de usar, que ficar sem era como não ter água ou passar fome. Era
desesperador, eu não conseguia. Usava 5 mil tragadas em uma semana, e essa era
a primeira e a última coisa que eu fazia no meu dia, acordando até de madrugada
para usar.” — João Pedro, influenciador.
A incerteza sobre as
substâncias e suas quantidades na produção do mercado ilegal é, justamente, um
dos argumentos da indústria, que tenta reverter a proibição. Apesar disso, a
medida não é um consenso. Médicos e especialistas em saúde são contra.
<><>
Anfetamina nos vapes
Um dos desafios da
pesquisa é obter, de forma legal, os cigarros eletrônicos. Para isso, é
necessária a autorização de órgãos reguladores, o que é um processo burocrático
e demorado. Isso porque, para uma pesquisa ter validade, não pode usar algo
ilegal no país sem que isso seja monitorado.
Uma das possibilidades
é conseguir os dispositivos em parceria com a polícia, que os apreende. Foi o
que fez a Polícia Científica de Santa Catarina, que se uniu à Universidade
Federal do estado e levou os vapes para o laboratório.
Os pesquisadores
analisaram dez dispositivos de três marcas diferentes e encontraram octodrina,
uma substância da família da anfetamina, com os mesmos efeitos, em todos eles.
➡️ Segundo a polícia e os pesquisadores, em nenhuma das embalagens
havia a descrição da presença da droga. Ou seja, as pessoas estavam
consumindo-a sem saber.
A octodrina é uma
substância da mesma família da anfetamina, que é uma droga sintética
estimulante que atua no sistema nervoso central. Ela causa agitação e, como
consequência, afeta também o sistema cardiovascular, provocando taquicardia.
Isso, por si só, é
preocupante, mas o que a pesquisadora envolvida no estudo, Camila Marchioni,
aponta é que a octodrina pode aumentar o potencial de vício nos cigarros
eletrônicos.
“O cigarro eletrônico
é viciante, e essa substância aumenta esse potencial. A pessoa vai ter que usar
cada vez mais frequentemente para obter o mesmo efeito e precisará fumar mais
vezes ao longo do dia para conter a resposta de abstinência. Na hora de parar
de fumar, isso pode ser ainda mais difícil. É um risco enorme.” — Camila
Marchioni, pesquisadora envolvida na análise.
➡️ O resultado da pesquisa ainda é preliminar. Segundo os
pesquisadores, ainda é preciso saber quanto de octodrina esses dispositivos
levam. Por ter sido identificada nos testes, a suspeita é de que não seja
pouco.
"Fizemos isso
para saber melhor com o que estamos lidando e para poder alertar a população. O
resultado mostra que pode ser um risco ainda maior do que se acreditava. Essa
substância não está na embalagem. A pessoa acha, erroneamente, que está usando
vapor d’água, e está usando uma coisa dessas", pontua Thiago Luis Silva,
perito da polícia científica que participou da análise.
Sobre o assunto, a
Anvisa reforçou que os dispositivos são proibidos no país, assim como sua
comercialização.
<><> O que
tem na fumaça do vape?
A fumaça com um cheiro
agradável, longe de se parecer com o cigarro comum, pode até confundir. Mas
especialistas reforçam: não é água.
➡️ Com base no que é encontrado no exterior e sabendo que a maior
parte do que é consumido no país é contrabandeado, as substâncias mais comuns
são: glicerol, propilenoglicol, formaldeído, acetaldeído, acroleína, acetona e
nicotina.
Veja como cigarro
eletrônico faz parte da rotina de jovens influenciadores — Foto: Reprodução/TV
Globo
E você pode se
perguntar: por que ainda não sabemos exatamente o que há nesses dispositivos?
🚬 O primeiro desafio é que o vape possui o que é conhecido como
sistema aberto. Sua carga é um líquido fácil de manipular, que qualquer pessoa
pode incluir diferentes tipos de substância. Há, inclusive, quem faça a versão
caseira disso.
➡️ Basta uma busca nas redes e aparecem dezenas de vídeos que
ensinam como montar a própria carga usando a glicerina e o propilenoglicol para
dissolver a nicotina. Nesse caso, é difícil controlar as quantidades, inclusive
da nicotina.
Uma pesquisa recente
da Vigilância Sanitária de São Paulo, em parceria com o Instituto do Coração
(Incor) e o Laboratório de Toxicologia da Faculdade de Medicina da USP,
descobriu que usuários de vape têm de três a seis vezes mais nicotina no
organismo.
Nos Estados Unidos, em
2019, dezenas de pessoas morreram ao consumirem vapes. A suspeita é de que
parte delas tenha usado a versão com THC, o princípio ativo da maconha. Para
entregar a droga, o cigarro também continha outra substância: a vitamina E. Oleosa,
ela aderiu aos pulmões de quem usava, causando graves complicações.
“Qualquer pessoa pode
comprar as substâncias e prepará-las ela mesma. Não dá para ter noção do quanto
está colocando e a nicotina, por exemplo, além de viciante, pode ser tóxica em
altas quantidades. Além disso, é possível misturar muitas outras coisas sem que
a pessoa que compra saiba. É um risco muito grande.” — Adriana Gioda, que
pesquisa os cigarros eletrônicos pela PUC no Rio de Janeiro.
🚬 Adriana faz parte do grupo de pesquisadores que enfrenta o
desafio de saber o que há no vapor dos cigarros eletrônicos circulando no
Brasil. Ela reforça que, além da burocracia para conseguir levar os
dispositivos para o laboratório, existe uma segunda limitação, que é a falta de
tecnologia.
➡️ Uma substância, quando queimada, pode se transformar em outra,
que pode ser ainda mais tóxica. Ou seja, seria necessário saber o que há no
líquido, mas também o que ele produz quando aquecido. Para isso, os
pesquisadores precisam de um equipamento que consiga analisar o vapor do
dispositivo, mas que não existe no Brasil.
“Vamos conseguir, mas
para isso gastamos tempo encontrando maneiras de driblar para fazer a análise
de uma forma que o resultado seja seguro. É importantíssimo ter essa resposta
porque ela vai poder dar clareza, ajudar na saúde pública. Temos adolescentes
usando isso; precisamos saber ao que estão expostos”, explica Adriana Gioda.
<>< Qual é o
risco?
O que os médicos
reforçam é que, apesar de não se saber exatamente o que há na fumaça, as
evidências de que são prejudiciais já são visíveis: casos de internação, jovens
viciados cada vez mais cedo em nicotina e doenças pulmonares.
A médica pneumologista
e presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT),
Margareth Dalcolmo, destaca que o vício é um risco para um país que é
referência no combate ao tabagismo e que esses dispositivos estão criando uma
nova geração de fumantes.
Eles contêm nicotina
em quantidades absurdamente altas e substâncias cancerígenas. Não dá para saber
o que mais tem além disso; estamos vendo agora esse caso da anfetamina. É um
risco enorme para a saúde pública. As pessoas precisam entender: cigarro eletrônico
não é melhor, não é inocente.
— Margareth Dalcolmo,
presidente da SBPT.
O influenciador João
Pedro, 20 anos, conta que, quando começou a fumar, aos 14 anos, achava que o
vapor era inofensivo, apenas um aroma. Com o tempo, percebeu um vício que
descreve como descontrolado, além de problemas de saúde.
"Na época em que
eu comecei, tinha muito conteúdo online que falava que era inofensivo, que era
melhor do que cigarro, que não apresentava risco. Eu acabei entrando nisso
inocente e, quando percebi o risco, estava viciado em um nível que parecia tarde
demais para parar. Hoje, eu estou tentando e usando as minhas redes para
mostrar para outras pessoas o risco que isso tem", conta João Pedro.
João faz parte da
campanha #semnicotina, que começou com Gustavo Foganoli, tiktoker, depois que a
amiga precisou ser hospitalizada com um problema pulmonar por causa do cigarro.
No Brasil, a Evali,
doença pulmonar causada pelos cigarros eletrônicos, não é de notificação
compulsória. Ou seja, os médicos não são obrigados a notificar quando um
paciente é tratado pela doença. Por isso, há subnotificação. Segundo a Anvisa,
são nove casos até agora.
➡️ Do outro lado, o argumento da indústria é que a proibição
permite que cigarros eletrônicos com qualquer tipo de substância e sem controle
circulem no país. Esses pontos foram levantados na discussão do projeto de lei
em andamento no Senado Federal, que pretende permitir o comércio desses
dispositivos no território nacional.
A justificativa também
foi apresentada à Anvisa durante a revisão da regra sobre o dispositivo, mas
foi refutada por médicos e especialistas. Um dos exemplos citados é a crise com
adolescentes em países onde os vapes são permitidos, como no Reino Unido e nos
Estados Unidos.
<><> E por
que os vapes estão nas ruas?
Apesar de serem
proibidos, é fácil encontrar cigarros eletrônicos sendo vendidos nas ruas.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 17% dos
estudantes de 13 a 17 anos já usaram o cigarro eletrônico.
A demanda exige um
esforço de fiscalização que ainda não consegue dar conta do volume de cigarros
eletrônicos que entra pelas fronteiras do país.
➡️ De acordo com a polícia, esse é um mercado milionário e vem
ganhando espaço entre criminosos.
No início de julho,
por exemplo, a polícia civil do Espírito Santo prendeu um dos maiores
vendedores de cigarros eletrônicos no estado. Ele fornecia os produtos online,
e as vendas de pouco mais de dois meses superavam a marca de R$ 500 mil. O
homem ostentava uma vida de luxo, com carros importados.
Em abril, quando a
Anvisa atualizou a regulamentação, mantendo os dispositivos proibidos no país,
uma das frentes apontadas foi o reforço na fiscalização e no combate à
importação ilegal. Uma das principais portas de entrada são as fronteiras,
principalmente com a Bolívia.
Segundo a Receita
Federal, eles têm agido em parceria com as polícias.
De janeiro a abril
deste ano, dados mais atualizados do órgão, foram apreendidas 615 mil unidades
que eram contrabandeadas, totalizando uma média de R$ 27 milhões.
Fonte: g1
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