segunda-feira, 14 de outubro de 2024

João Filho: ‘Musk arregou e Twitter voltou. Piores do que nunca’

“Continuaremos a defender a liberdade de expressão, dentro dos limites da lei, em todos os lugares onde operamos” — foi dessa maneira mansa que o X de Elon Musk se manifestou após o desbloqueio da plataforma no Brasil. Como já se imaginava, o empresário enfiou o rabinho entre as pernas e resolveu respeitar as leis do país.

Até poucos dias atrás, o homem mais rico do mundo dedicava-se a usar seu poder para atacar o judiciário e o governo brasileiro. O tom legalista da nota da empresa contrasta com a virulência dos ataques ao judiciário e ao governo brasileiro feitos pelo seu dono até poucos dias atrás.

“O tirano Alexandre é o ditador do Brasil e Lula, seu cãozinho”, chegou a afirmar em postagem no X. Em outro momento, alimentado pelas mentiras bolsonaristas, disse que o ministro Alexandre de Moraes é “um falso juiz” que interferiu diretamente na eleição do presidente Lula.

De repente, toda essa valentia murchou. A vibrante luta pela liberdade de expressão absoluta não existe mais. Nesses 40 dias de suspensão, ficou claro que o X precisa do Brasil, mas o Brasil não precisa do X. Ao contrário do que Musk imaginou, uma grande comoção pública para pressionar o STF não aconteceu.

O país sobreviveu à ausência da plataforma com tranquilidade. Já os investidores do X não aguentaram ficar tanto tempo sem um dos seus maiores mercados no mundo e pressionaram Musk para que ele respeitasse as decisões da justiça brasileira.

Investidores da Starlink, outra empresa de Musk impactada pelas consequências das suas loucuras, também pressionaram. Humilhado no embate político que ele mesmo criou, Musk então pagou as multas, cumpriu todas as decisões judiciais e se curvou ao Estado brasileiro.

O homem mais rico do mundo testou os limites da soberania brasileira e acabou dando com a cara no muro. Esse é o lado bom dessa história. O lado ruim é que o X voltará a ser a principal máquina de propagação de mentiras da extrema-direita brasileira.

Em poucos minutos rolando a timeline logo após o bloqueio, fui engolido por tweets de Elon Musk e de bolsonaristas, vídeos pró Trump, postagens supremacistas e anti-imigração e todo o tipo de chorume de extrema-direita. Nas mãos de Elon Musk, o X se tornou uma rede social programada para promover a ideologia do seu dono.

Musk foi devidamente enquadrado pela justiça brasileira e agora vai ter que continuar no sapatinho se quiser que o X continue operando no Brasil. Nos EUA, terra da liberdade de expressão absoluta, a plataforma segue à vontade para manipular o algoritmo em favor da candidatura de Trump e permitir que seu dono continue propagando as mentiras mais absurdas.

Nas últimas semanas, Musk esqueceu o Brasil e se focou em trabalhar pela eleição de Trump, chegando até subir no palanque em comício do candidato republicano. Sem medo de ver o X ser acusado de parcialidade durante a disputa eleitoral, o empresário afirmou que os democratas são uma ameaça à democracia e não disfarça que fará do X uma fábrica de mentiras em favor de Trump.

Enquanto os EUA se preparavam para a chegada do furacão MIlton, considerado pelos especialistas um dos mais perigosos de todos os tempos, a dupla Trump e Elon Musk esteve na linha de frente da disseminação de teorias conspiratórias sobre o evento.

Isso já havia acontecido há menos de duas semanas, quando o furacão Helene havia atingido a Carolina do Norte, sudeste dos EUA, deixando ao menos 235 mortos. É consenso entre os cientistas que o alto poder destrutivo desses furacões é consequência direta do aquecimento global. Como sabemos, Trump e Musk são notórios negacionistas climáticos que militam contra esses consensos científicos.

Exatamente como aconteceu no Brasil durante as enchentes no Rio Grande do Sul, as mentiras foram fabricadas com o intuito de descredibilizar as ações do governo federal.

Uma das que mais se espalharam afirmava que as verbas destinadas para ajudar as vítimas estavam sendo desviadas pela Agência Federal de Gerenciamento de Emergências, a Fema na sigla em inglês, para ajudar imigrantes.

Musk afirmou no X que a agência “bloqueou ativamente”as doações para as vítimas do Helene e está “confiscando bens (…) e trancando-os para declarar que são seus”. O bilionário também ajudou a alimentar os boatos de que as autoridades da Carolina do Norte haviam “assumido o controle para impedir que as pessoas ajudassem” as vítimas.

Em outra postagem, Musk inflou a paranóia anti-imigratória — uma das principais marcas da campanha de Trump — ao afirmar que: “A Fema gastou seu orçamento transportando imigrantes ilegais para o país em vez de salvar vidas americanas. Traição”.
Musk, que é um dos maiores doadores da campanha de Trump, afirmou também que o presidente Joe Biden e a vice Kamala Harris estão “se esforçando para não ajudar as pessoas” que moram em áreas com muitos eleitores republicanos.

Esse conjunto de mentiras tem causado impacto direto na vida de milhares de americanos impactados pelos furacões. Segundo a Fema, muitas pessoas estão sendo dissuadidas de procurar ajuda do governo. Membros das equipes de emergência foram descredibilizados e estão sendo ameaçados. Qualquer semelhança com o que o bolsonarismo fez nas tragédias do Rio Grande do Sul não é mera coincidência. A extrema direita replica suas estratégias de sucesso em todas as partes do mundo.

Enquanto Musk faz o que quer nos EUA, aqui no Brasil o STF estabeleceu um freio. Mas nem tudo aqui são mil maravilhas. Acompanhamos nos últimos meses o crescimento da popularidade de Pablo Marçal, uma figura abjeta que se sentiu à vontade para atacar violentamente seus adversários com mentiras criminosas.

Tudo sob a benção dos tribunais eleitorais, que pouco ou nada fizeram. Assim como Musk, Marçal também se sentiu à vontade para descredibilizar as ações governamentais no socorro às vítimas da tragédia no Rio Grande do Sul.

É importante que a postura do STF diante dos crimes de Elon Musk estabeleça um novo padrão no judiciário brasileiro e vire referência para o resto do mundo. Não é mais possível tolerar os crimes de pessoas poderosas, que têm capacidade política e financeira de jogar a população contra governos em momentos de crise.

Não é mais possível acobertar crimes dessa magnitude sob o falso manto da liberdade de expressão. Vivemos uma era em que pandemias e desastres climáticos se tornarão parte do cotidiano. Se os estados não se imporem contra os delírios conspiratórios de meia dúzia de ricaços e poderosos negacionistas, o mundo caminhará rapidamente para um buraco ainda mais profundo.

 

¨      A eleição que Musk acompanhou. Por Paulo Motoryn

São Paulo? Que nada! Enquanto todos nós olhávamos para o resultado das eleições municipais nas capitais brasileiras, interesses bilionários estavam mobilizados para acompanhar o pleito na pequena cidade de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais.

O município de 34 mil habitantes é a capital do chamado “Vale do Lítio”, onde estão as maiores reservas de lítio do país. O mineral, chamado de "petróleo branco", é essencial para a fabricação de baterias de carros elétricos e muito valorizado na corrida global pela transição energética.

Em Araçuaí, a população reconduziu ao cargo de prefeito Tadeu, do PSD, com quase 70% dos votos. E a origem dos recursos que deram tração à campanha dele é simbólica: uma doação de R$ 150 mil vinda de Rubens Ometto, dono da Cosan, indústria de açúcar, etanol e energia.

A contribuição de Ometto representou nada menos que 80% do valor arrecadado pela campanha de Tadeu, e quase o triplo do que arrecadou a candidatura da oposição, do PT. Uma pessoa envolvida no pleito me disse o seguinte: “Estava equilibrado. Até essa fortuna pintar aqui”.

A doação não veio do nada. Ometto vem diversificando sua fortuna para o setor de mineração. Em 2022, por exemplo, ele surpreendeu ao adquirir 4,1% da Vale, gigante do minério de ferro que fornece lítio à Tesla – sim, a empresa do bilionário sul-africano Elon Musk.

Além de Ometto, Araçuaí também é central nos planos de outro bilionário: o governador mineiro Romeu Zema, do partido Novo, que foi aos Estados Unidos no ano passado lançar internacionalmente o projeto do Vale do Lítio, a “galinha dos ovos de ouro” de sua gestão.

Não à toa, outro fator é apontado por adversários como fundamental para a arrancada de Tadeu para a vitória eleitoral em Araçuaí: a visita de um secretário de Zema às vésperas do pleito prometendo a construção de um aeroporto na cidade. Você pode assistir à cena aqui.

Fato é que, na contramão de países como Chile, Bolívia e México, que estão estatizando a extração de lítio, Zema tem se esbaldado com as possibilidades de um decreto do ex-presidente Jair Bolsonaro que autorizou a participação de empresas estrangeiras na extração do lítio.

O governador simplesmente vendeu as ações do estado de Minas Gerais na Companhia Brasileira de Lítio, que atua na exploração do lítio em Araçuaí desde 1991. E, com a bênção de Zema, a empresa canadense Sigma também começou as operações no mesmo território.

A Sigma, por sinal, já foi alvo de tentativas de compra por parte de duas das maiores empresas globais: a chinesa BYD e a Tesla. Por isso, não tenho medo de soar exagerado: Araçuaí não viveu só uma eleição, mas uma batalha estratégica que pode moldar o futuro do Brasil e do mundo.

<><. É tetra, é tetra!

Falando em Ometto, é preciso dizer que ele, mais uma vez, liderou as doações eleitorais no Brasil. Em 2024, destinou R$ 18,2 milhões para apoiar 197 candidatos, incluindo prefeitos e vereadores em todo o país.

Ometto já havia figurado como o maior doador nas últimas três eleições.

 

¨      Elon Musk perde R$ 66 bilhões de sua fortuna em 24 horas

A fortuna de Elon Musk sofreu uma queda significativa de R$ 66 bilhões na última sexta-feira, refletindo a desvalorização das ações da Tesla, que recuaram 8,8%. Com isso, a montadora de veículos elétricos perdeu US$ 68 bilhões (R$ 382,5 bilhões) em valor de mercado. Apesar do impacto, Musk ainda se mantém como o homem mais rico do mundo, com um patrimônio de US$ 248,8 bilhões (R$ 1,38 trilhão), à frente de outros bilionários como Larry Ellison, da Oracle, e Jeff Bezos, da Amazon.

A queda nas ações aconteceu após o evento de lançamento do Cybercab, robotáxi da Tesla, realizado na quinta-feira (10) em Los Angeles, nos Estados Unidos. Segundo analistas financeiros, o evento não atendeu às expectativas, apresentando poucos detalhes sobre o novo veículo. Adam Jonas, analista do Morgan Stanley, destacou que houve uma "decepção com os detalhes do robotáxi", enquanto Toni Sacconaghi, da Bernstein, classificou a apresentação como "surpreendentemente ausente em detalhes". Dan Levy, do Barclays, reforçou que "não houve atualizações indicando oportunidades de curto prazo", e Nancy Tengler, CEO da Laffer Tengler Investments, descreveu o evento como "muito vago para o gosto do mercado".

<><> Divergências sobre o evento

Apesar das críticas, houve também avaliações positivas. Dan Ives, do Wedbush, comentou que "discorda fortemente" de que o evento tenha sido uma decepção. Já John Murphy, do Bank of America, afirmou que "o evento correspondeu ao hype". A reação mista reflete o impacto de uma apresentação que não conseguiu convencer todos os investidores.

<><> O que é o Cybercab

O Cybercab é um veículo autônomo sem volante e pedais, capaz de transportar dois passageiros e equipado com portas que se abrem para cima. De acordo com Elon Musk, a produção começará em 2026, e o preço de venda será inferior a US$ 30 mil, cerca de R$ 170 mil. Durante o evento, Musk destacou o potencial de utilização do robotáxi: "A grande maioria do tempo, os carros estão apenas parados. Mas se forem autônomos, podem ser usados cinco vezes mais, talvez dez vezes mais." Ele também enfatizou que a tecnologia dos veículos dispensa hardware adicional, utilizando apenas inteligência artificial e câmeras, o que pode representar uma abordagem mais econômica.

O Cybercab é o primeiro grande lançamento da Tesla desde o Cybertruck, apresentado em 2019 como um "carro quase indestrutível". Naquele ano, Musk já havia prometido um robotáxi, mas o lançamento foi adiado diversas vezes até a apresentação em Los Angeles. Durante o evento, Musk também apresentou um robô humanoide chamado Optimus e um veículo maior, a robovan, capaz de transportar até 20 pessoas.

<><> Recepção do mercado

Segundo a Reuters, investidores estavam ansiosos por informações concretas sobre o cronograma de produção dos robotáxis, a aprovação regulatória e detalhes sobre o plano de negócios da Tesla para enfrentar concorrentes no setor. Dennis Dick, trader de ações da Triple D Trading, expressou sua frustração: "Tudo parece legal, mas não muito em termos de prazos. Sou acionista e estou bastante decepcionado. Acho que o mercado queria prazos mais definitivos."

<><> Desafios técnicos e regulatórios

A tecnologia autônoma do Cybercab é baseada em um sistema de aprendizado de máquina que opera de forma independente, sem interferência humana após o treinamento inicial. Esse método é descrito como uma "caixa-preta", o que, segundo um engenheiro da Tesla ouvido pela Reuters, "torna quase impossível ver o que deu errado quando ele se comporta mal e causa um acidente." Essa abordagem técnica pode dificultar a aprovação regulatória, especialmente em comparação com concorrentes como Waymo (da Alphabet), Cruise (da General Motors) e Uber, que investem em sensores redundantes para garantir maior segurança e aceitação pelas autoridades.

 

Fonte: The Intercept/Brasil 247

 

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