quarta-feira, 31 de julho de 2024

'Woke', 'brat', 'Maga': o que significam os termos que marcam eleição nos EUA

As eleições presidenciais nos Estados Unidos foram marcadas por reviravoltas recentes, incluindo um atentado contra o ex-presidente Donald Trump e a desistência de Joe Biden.

Além dos eventos dramáticos, a disputa também é caracterizada por um vocabulário próprio, influenciado pelas redes sociais.

Termos como "woke", "brat" e o lema "Maga" (Make America Great Again, em inglês) de Donald Trump têm uma forte presença do debate online e, de acordo com especialistas, podem influenciar significativamente os eleitores.

"Essas palavras e expressões são muito importantes porque, em primeiro lugar, são fáceis de memorizar e espalhar", avalia Lucas Leite, doutor em Relações Internacionais e professor da mesma disciplina na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap).

"Elas rapidamente constroem uma identidade comum que carrega algo mais complexo do que apenas o termo. Ajudam a criar identificação com quem se apoia, como se apoia e por que se apoia."

Entenda a seguir o que significam estes termos e o peso eles que podem ter na eleição presidencial americana de 2024.

·        'Brat'

Kamala Harris, vice-presidente de Joe Biden e cotada para substituí-lo na corrida presidencial, ganhou o título de brat, termo que dominou o TikTok de jovens nas últimas semanas.

A palavra é o nome do álbum mais recente da cantora britânica Charli XCX, que foi quem "batizou" Kamala com o termo.

Em vídeo publicado no TikTok, a cantora descreve brat como "aquela garota que é um pouco bagunceira, gosta de festas e às vezes fala besteiras. Que se sente bem consigo mesma, mas às vezes tem crises. E que se diverte apesar disso. É muito honesta, muito direta, um pouco volátil. Faz coisas bobas. Isso é ser uma brat."

Muitos teorizam que o termo é o oposto de "clean girl", uma tendência estética minimalista — na qual as garotas usam pouca maquiagem, nada de estampa e preferem tons claros — que é frequentemente empregada por influenciadoras.

Mas o que isso tem a ver com a vice-presidente americana?

Embora Harris seja uma democrata com posições políticas relativamente moderadas, ela realmente vai contra algumas "regras pré-definidas", avalia Leite.

Como a primeira mulher, pessoa negra e pessoa de descendência sul-asiática a ocupar o cargo de vice-presidente, Harris já é uma figura atípica na política americana.

"Isso tudo mostra que ela é uma quebra de paradigmas, especialmente em um país com o histórico de candidatos dos Estados Unidos, concorrendo contra um homem branco mais velho que defende posições conservadoras", diz Leite.

Quando celebridades pop apoiam um certo candidato, afirma o especialista, isso gera identificação e facilita que o discurso político seja trazido para a esfera da comunicação rápida e fluida da internet.

"Faz com que os jovens consigam ver nela um elemento de identificação comum com o 'nós' do mainstream pop, o grupo que define o que é tendência. Isso tem um apelo muito forte junto à internet, especialmente com a geração Z."

Harris rapidamente abraçou o meme. A imagem de fundo do seu perfil oficial no X (antigo Twitter) foi alterado para um verde limão, a cor da capa do álbum de Charli XCX e considerada "símbolo" das brat.

Silvio Waisbord, professor de Mídia e Assuntos Públicos da Universidade George Washington, Estados Unidos, avalia que, com isso, há claramente uma tentativa na campanha da democrata de alcançar os jovens.

"Estão tentando atrair mulheres, jovens, eleitores negros. Eles já têm tentado apresentá-la de uma maneira mais acessível do que uma figura política tradicional", acrescenta Waisbord.

"As eleições nos Estados Unidos são mais sobre mobilizar a própria base do que qualquer outra coisa, até mais do que tentar alcançar outros grupos de eleitores. O que ela está tentando fazer é usar uma linguagem e imagens que, no passado, foram eficazes para engajar pessoas que votaram nos democratas ou que têm tendência a votar neles."

No Tiktok, vídeos curtos com músicas da cantora britânica mostram imagens antigas de Harris discursando, mas também rindo e dançando. Uma imagem descontraída de uma possível candidata à Presidência.

"Esse jeito mais despojado tem sido usado pelo Partido Republicano para criticá-la, e o que ela tem tentado fazer é reapropriar-se dessas críticas, dizendo 'Sim, esta sou eu', e tornar isso mais positivo e humano", diz Waisbord.

·        'Woke'

Outro termo que se tornou popular — tanto entre democratas quanto entre republicanos, embora com conotações diferentes — é woke, que, em tradução literal do inglês, significa "desperto".

A palavra ganhou significados bem mais amplos. Na gíria norte-americana, ser ou estar 'woke' pode indicar com quais posturas políticas você se mais se identifica.

O uso do termo surgiu na comunidade afroamericana e originalmente queria dizer "estar alerta para a injustiça racial".

Em um evento em 2023, Trump afirmou não gostar do termo, porque "metade das pessoas não consegue nem defini-lo" e "não sabe o que é".

O termo já não é amplamente usado no debate político, mas seu significado implícito, sim.

"Para os republicanos, apoiadores de Trump, o woke é encarado de forma pejorativa, quase como um insulto às pessoas de esquerda ou progressistas nos Estados Unidos", avalia Waisbord.

"Mas hoje é raro que se use o termo em discursos. É mais comum que ataquem os mesmos aspectos do que ele representa, mas de formas diversas."

Um exemplo disso aconteceu durante a Olimpíada de Tóquio, quando a seleção de futebol feminino dos Estados Unidos ganhou uma medalha de bronze.

Trump atacou o time por não levar o ouro para casa, alegando que eles são "liderados por um grupo radical de maníacos esquerdistas" e que o país "deveria substituir os wokesters por patriotas".

Muitas pessoas acreditam que quem cunhou a expressão foi o romancista William Melvin Kelley (1937-2017).

Em 1962, Kelley publicou um artigo no jornal americano The New York Times com o título "If You're Woke, You Dig it" ("Se você estiver desperto, entenderá", em tradução livre).

O termo ressurgiu na última década com o movimento Black Lives Matter, criado para denunciar a brutalidade policial contra as pessoas afrodescendentes.

Mas, desta vez, seu uso se espalhou para além da comunidade negra e passou a ser empregado com significado mais amplo.

Em 2017, o dicionário inglês Oxford acrescentou este novo significado de woke, definido como: "Estar consciente sobre temas sociais e políticos, especialmente o racismo".

Assim como algumas pessoas se autodefinem com muito orgulho como alguém woke, ou atento contra a discriminação e a injustiça, outros utilizam o termo como insulto.

O próprio dicionário Oxford faz esta distinção. Após a definição, acrescenta: "Esta palavra é frequentemente empregada com desaprovação por pessoas que pensam que outros se incomodam muito facilmente com estes assuntos, ou falam demais sobre eles, sem promover nenhuma mudança".

·        'Maga'

Lema da campanha de Donald Trump desde 2016, Maga é sigla para "Make America Great Again" (Tornar a América Grande Novamente, em tradução livre).

O slogan é amplamente usado por republicanos e apoiadores do ex-presidente americano.

A frase é estampada em itens como camisetas e principalmente em bonés vermelhos, vistos em grande número durante os comícios de Trump.

Originalmente usada por Ronald Reagan como slogan em sua campanha presidencial de 1980 ("Let's Make America Great Again" - Vamos Tornar a América Grande Novamente), a releitura da frase teve rápida adesão entre os apoiadores de Trump.

"É emocional, simples, de fácil entendimento e oferece a possibilidade de participação", avalia o especialista de marketing Ben Ostrower, em entrevista à BBC.

"Independentemente da sua opinião sobre Donald Trump, ele é um grande vendedor. E é um mérito do Maga ser um divisor de águas tão forte."

O professor Lucas Leite relembra que, quando Ronald Reagan propôs tornar a América grande novamente, ele tentava resgatar o orgulho nacional, mostrando que os Estados Unidos poderiam voltar a ser uma potência.

"No entanto, devemos questionar: grandeza em relação a quê? A que período? Para quem?", pondera Leite.

O professor avalia que o lema Maga foi instrumentalizado naquele contexto e, atualmente, faz parte de um discurso frequentemente associado a supremacistas brancos, que defendem a ideia de um americano "verdadeiro", anglo-saxão, protestante e branco.

"Essa identidade representava a grandeza dos Estados Unidos e foi diluída por minorias e imigrantes. O Maga, portanto, tem essa capacidade de criar uma identidade forte e facilitar a comunicação e a identificação com a figura de Trump", diz Leite.

Silvio Waisbord acrescenta que o Partido Republicano e Trump "buscam representar essa posição anti-elitista, muito populista, defendendo a noção mítica da pessoa comum".

Mas, como aponta Waisbord, o lema não é usado pelos democratas de uma forma crítica, com um tom pejorativo como o termo woke.

"Biden e Kamala estão tentando evitar qualquer referência negativa à base principal do Partido Republicano agora, que é basicamente a classe trabalhadora branca sem educação formal, porque isso já teve um efeito negativo no passado."

 

¨      Rússia nega acusação de interferência em eleições e diz que EUA querem mostrar Moscou como inimiga

O Kremlin rejeitou nesta terça-feira (30) as declarações da inteligência dos Estados Unidos de que a Rússia está tentando interferir na eleição presidencial e disse que os espiões norte-americanos querem retratar Moscou como inimiga.

As acusações de que a Rússia está supostamente tentando influenciar as próximas eleições presidenciais estadunidenses são absurdas, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov.

"Quanto a essas acusações, elas são absurdas e as rejeitamos veementemente. Haverá muitas declarações desse tipo à medida que as eleições nos EUA se aproximam, porque a Rússia e o chefe de Estado russo [Vladimir Putin], pessoalmente, são fatores essencialmente significativos que tanto republicanos quanto democratas exploram durante sua luta política, especialmente na campanha eleitoral", disse Peskov.

O porta-voz também comentou a situação do aumento da dívida nacional dos EUA, a qual, na segunda-feira (29), atingiu a marca de US$ 35 trilhões (R$ 197,4 trilhões) pela primeira vez na história, de acordo com dados do Departamento do Tesouro norte-americano.

"É claro que os Estados Unidos, como uma das maiores economias do mundo, têm um impacto direto na situação econômica internacional, isso é inequívoco. Mas é improvável que toda essa situação de alguma forma desacelere as aspirações militaristas. Do nosso ponto de vista, é quase impossível falar sobre isso", disse Peskov quando perguntado se a alta dívida poderia desacelerar os planos militaristas de Washington.

A dívida nacional bruta dos Estados Unidos chegou à marca em um lembrete da difícil situação fiscal do país, enquanto disputas legislativas sobre impostos e iniciativas de gastos pairam na Casa Branca.

A tinta vermelha está se acumulando mais rapidamente do que muitos economistas previram, pois os custos dos programas federais promulgados nos últimos anos excederam as projeções iniciais.

Mesmo diante desse cenário, os candidatos presidenciais ofereceram poucas ideias para reduzir o peso da dívida, à medida que o saldo negativo continua aumentando, analisou o The New York Times.

 

¨      'Golpe na Suprema Corte': reforma nos EUA privará o Poder Judiciário de independência, diz advogado

A reforma da Suprema Corte proposta pelo presidente dos EUA, Joe Biden, transformará a entidade em mais um órgão partidário e prejudicará a independência do Poder Judiciário, declararam o ex-procurador-geral dos EUA William Barr e o advogado Kelly Shackelford em um artigo para a Fox News.

"A última coisa que precisamos agora neste país é um golpe na Suprema Corte, que ameaçaria nossa república democrática", diz o artigo.

Os autores expressaram preocupação de que a proposta de reforma judiciária não é nada mais do que uma tentativa de minar a legitimidade da Suprema Corte. Biden e os democratas não estão contentes com os juízes, fiéis à Constituição e à interpretação tradicional de suas disposições.

"Se este golpe for bem-sucedido, será posto fim ao Estado de direito, uma vez que o sistema judiciário não passará de uma ferramenta política dos que estão no poder", disseram os advogados.

O presidente dos EUA, Joe Biden, propôs recentemente reformar a Suprema Corte dos EUA e remover a imunidade dos ex-presidentes do país. Ele defende a rotação de juízes na suprema instituição judiciária, propondo que os presidentes substituam um dos nove juízes a cada dois anos, com um mandato de 18 anos (atualmente eles têm mandato vitalício); propõe um código de conduta vinculativo para a Suprema Corte, bem como alterar a Constituição para que os ex-presidentes não tenham imunidade "por crimes cometidos enquanto no cargo".

 

Fonte: BBC News Mundo/Sputnik Brasil

 

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