segunda-feira, 29 de julho de 2024

Como jovens são cooptados pelo Estado Islâmico no Brasil

Um jovem brasileiro ligado ao Estado Islâmico usou grupos na internet para recrutar quatro adolescentes de cidades do interior do Rio de Janeiro e de São Paulo entre os anos 2022 e 2023. Pelo menos dois menores de 18 anos já estavam em avançado estágio de radicalização.

Conhecido nas redes pelo codinome Mahmoud al-Brazili, Fábio Samuel da Costa Oliveira, hoje com 20 anos, foi preso quando tentava chegar à África, onde se juntaria aos terroristas. Ele foi condenado a 7 anos de prisão por terrorismo e corrupção de menores em maio deste ano. A defesa alega que ele tem deficiência mental e vai entrar com um pedido de revisão criminal.

A prisão de Fábio Samuel chegou a ser divulgada na imprensa no ano passado, mas agora o Metrópoles teve acesso a documentos inéditos da investigação da Polícia Federal (PF) que revelam detalhes de como o grupo terrorista tentava cooptar jovens e adolescentes do Brasil.

Mensagens do aplicativo Telegram revelam a idealização de atentados terroristas em território brasileiro, orientações sobre a construção de bombas caseiras, discursos fundamentalistas religiosos e o compartilhamento de vídeos contendo violência extrema.

        Atentado em igreja

Os investigadores da PF tomaram conhecimento dessa pequena célula do ISIS (sigla em inglês para Estado Islâmico) no Brasil em 2022, após um alerta do serviço de inteligência de Marrocos.

A embaixada do Brasil no Marrocos foi informada de que foi interceptada uma conversa de Mahmoud al-Brazili sobre um possível atentado em uma Igreja Católica de Barbacena (MG). Fábio Samuel morava na cidade com a avó.

Essa denúncia foi repassada para a Divisão de Enfrentamento ao Terrorismo da PF no mesmo dia.

        FBI entra na história

A situação ficou ainda mais urgente depois que o FBI, a polícia federal do Estados Unidos, entrou em contato com os investigadores brasileiros. Um vídeo no pCloud, serviço de armazenamento criptografado, mostrava Fábio Samuel de capuz e rosto coberto, respondendo a uma espécie de questionário do grupo terrorista.

“Eu tenho apoiadores para os quais eu tenho explicado por quais razões o califado é verdade, porque ele está do lado certo”, diz o encapuzado na gravação em inglês. O “califado” a que ele se refere é um sistema de governo religioso defendido pelo ISIS.

Ainda na gravação, Fábio Samuel diz que tem feito traduções de documentos da organização terrorista. Ele aprendeu árabe e inglês sozinho pela internet. Atualmente, o Estado Islâmico atua no norte de Moçambique, que tem o português como idioma oficial.

“Um chamamento aos irmãos falantes do português, irmãos de países como: Brasil, Cabo Verde, Angola, Moçambique. Eu tenho visto muitos irmãos apoiadores e quero ser um recrutador deles”, declara ainda o jovem brasileiro na gravação que foi parar nas mãos do FBI.

        “Meu sonho era explodir”

Conversas pelo Telegram mostram a rotina de doutrinação e radicalização a que eram submetidos os adolescentes. Fábio Samuel selecionou os adolescentes em grupos mais amplos de estudo do alcorão e convidou eles para um mais reservado.

Esse grupo mais reservado era batizado com diferentes nomes como “Clube do Xadrez” e “Estudos de Geopolítica”, uma forma de esconder seu verdadeiro conteúdo. Nas mensagens identificadas pela PF são cogitados atentados terroristas dentro do Brasil.

“Meu sonho era explodir o consulado israelense aqui. O foda é que não tem uma base sólida de salafis brasileiros. Então não ia servir de nada. Colocar uma mochila com uns 10kg de explosivo no portão”, escreveu um dos adolescentes cooptados em mensagem para Fábio Samuel em março de 2022.

O termo “salafis” usado pelo adolescente se refere aos adeptos do salafismo, um movimento ultraconservador dentro do islamismo sunita.

Alguns dias depois de receber a ideia de um atentado contra o consulado, Fábio Samuel enviou um documento com instruções de fabricação de bombas para esse adolescente. O jovem e o adolescente manifestaram no Telegram sobre o interesse em se juntar ao ISIS em Moçambique.

De acordo com a investigação da PF, Fábio Samuel orientou dois adolescentes, de codinomes Hassan e Shams, para cometer um ataque terrorista contra uma representação dos Estados Unidos no Brasil, caso ele fosse barrado na imigração ou preso, quando tentasse sair do país para se juntar ao ISIS.

No momento em que foi preso no Aeroporto de Guarulhos, em 11 de junho do ano passado, Fábio Samuel pediu para fazer uma ligação e entrou em contato com um desses adolescentes. A PF acredita que a ideia era colocar o plano em prática.

        Foco na juventude

O recrutamento de jovens para o Estado Islâmico não é uma exclusividade no Brasil. Estudo do sociólogo franco-iraniano Farhad Khosrokhavar calculou que 67% dos militantes que se juntaram ao ISIS na Síria e no Iraque entre 2012 e 2015 tinham idades entre 14 e 25 anos.

“A palavra-chave do Estado Islâmico é ‘perpetuação’. Ele quer perpetuar o califado. E, para isso, ele se volta para o recrutamento de crianças e adolescentes, porque enxerga neles facilidades de atraí-los e futuros novos combatentes. Principalmente em idades sem maturidade emocional e em que a identidade ainda não foi formada”, explicou ao Metrópoles o doutor em Educação e especialista em Inteligência, Carlos Frederico Felício Fagundes. Ele investiga a “pedagogia da cooptação” por organizações criminosas.

Os pais dos adolescentes que estavam sendo cooptados pelo ISIS não sabiam o que estava acontecendo. Todos os adolescentes possuem uma surpreendente facilidade em aprender novas línguas, mas pelo menos dois deles passaram a apresentar mal desempenho na escola.

Um dos adolescentes chegou a ser expulso da escola porque levou uma faca para a sala de aula. Isso aconteceu na mesma época em que ele passava pelo processo de radicalização pelo Telegram.

Essa investigação da PF sobre o ISIS no Brasil está dentro de um conceito mais amplo que é o do Extremismo Violento Ideologicamente Motivado (Evim), do qual também fazem parte os casos de atentados com motivação neonazista e de subculturas da internet de ódio a mulheres.

        Ex-coroinha

Fábio Samuel foi condenado na Justiça Federal e não houve tentativa de recurso. Ele era assistido pela Defensoria Pública da União. No entanto, um novo advogado da família pretende entrar com um pedido de revisão criminal por considerar que ele possivelmente tem algum tipo de espectro autista, na expectativa de que seja considerado semi-imputável. Na cidade de Barbacena, o jovem era visto apenas como uma pessoa “estranha”.

O advogado Greg Andrade descreve Fábio Samuel como alguém que era muito ativo na Igreja Católica, ao ponto de ser coroinha. Ele se converteu ao islamismo quando começou a trabalhar em serviços gerais num curtume de abate halal, que é um tipo de preparo de produtos de origem animal para exportação ao mercado muçulmano.

A PF suspeita que Fábio Samuel foi cooptado e radicalizado dentro da religião pelos irmãos brasileiros Thaylan e Thauann Palomanes, presos em Málaga, na Espanha, em novembro do ano passado, por envolvimento com o Estado Islâmico.

Para Greg, Fábio Samuel é uma pessoa com hiperfoco e muito inteligente, mas sem apoio necessário do Estado. De fato, os investigadores da PF ficaram impressionados com a facilidade do jovem em falar inglês e árabe.

“O sonho dele é fazer medicina. Os integrantes do Estado Islâmico entraram na mente dele e falaram que lá ele teria condições de estudar e ter várias esposas. Ele ficou muito envolvido, se sentindo muito importante. Talvez foi a única vez na vida que ele se sentiu importante. Nós não damos valor à nossa juventude, mas o terrorismo deu”, avalia o advogado.

A avó de Fábio Samuel, Naide da Costa, de 61 anos, considera que a condenação e prisão do neto foi injusta e entende que ele foi vítima por ter sido cooptado pelo grupo terrorista. “Tem que sempre verificar o que os filhos fazem e aconselhar, porque, por mais que a pessoa seja boa, sempre tem predadores nas redes sociais.”

 

        Filho de militar queria traduzir manual para grupo terrorista

Um adolescente brasileiro, filho de um oficial da Aeronáutica, planejava traduzir manuais de guerra das Forças Armadas para ajudar o grupo terrorista Estado Islâmico. A ideia era ajudar terroristas que estão atuando no norte de Moçambique, na África.

Essa situação foi revelada em uma investigação da Polícia Federal (PF), à qual o Metrópoles teve acesso, sobre um jovem de Minas Gerais ligado ao ISIS (sigla em inglês para Estado Islâmico) que tentava recrutar quatro adolescentes pelo aplicativo Telegram. Ele foi condenado a sete anos de prisão por terrorismo e corrupção de menores.

“O Exército Brasileiro desenvolveu uma doutrina muito grande de guerra irregular. Dá para traduzir esse conhecimento para o inglês e fazê-lo chegar em quem vai dar bom uso, inshaAllah”, escreveu o adolescente filho de oficial das Forças Armadas em uma das mensagens do grupo usado para radicalização.

Adolescente queria traduzir documento das Forças Armadas para ajudar o Estado Islâmico

Ainda no aplicativo, o adolescente diz que essa doutrina do Exército Brasileiro não funcionaria na Síria e no Iraque, mas sim na atuação do grupo terrorista na África. Ele pretendia traduzir os documentos “Patrulha de Emboscadas” e “Patrulha de longo alcance com características especiais”.

        Tradução de documentos

O jovem de Minas Gerais que chefiava o grupo no Telegram de radicalização para o ISIS é Fábio Samuel da Costa Oliveira, que está preso na penitenciária de Três Corações (MG).

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A inteligência do governo do Marrocos e o FBI, polícia federal americana, identificaram contatos dele com lideranças do grupo terrorista avisaram a Divisão de Enfrentamento ao Terrorismo da PF. Em um vídeo encapuzado, ele diz que traduz documentos do Estado Islâmico.

Além disso, Fábio Samuel também tinha a intenção de traduzir os documentos das Forças Armadas brasileiras para o árabe. O jovem, que hoje tem 20 anos, aprendeu inglês e árabe sozinho. Ele morava com a avó, Naide da Costa, de 61 anos, em Barbacena (MG).

De acordo com as investigações, Fábio Samuel orientou os adolescentes a cometerem um atentado em uma representação dos Estados Unidos no Brasil, caso não conseguisse sair do país.

Fábio foi preso pela PF em junho do ano passado quando tentava embarcar para a Turquia, de onde seguiria para se juntar ao ISIS na África.

<><> Situação vulnerável

A defesa de Fábio Samuel defende que ele possui um grau de autismo e acabou sendo influenciado pelos terroristas pela internet. O advogado Greg Andrade pretende entrar com um pedido de revisão criminal para que o jovem seja considerado semi-imputável.

Segundo o defensor, o seu cliente era muito ligado à igreja católica e era coroinha. Na vida adulta se converteu ao islamismo, mas acabou passando por um processo de radicalização pela internet.

“O sonho dele é fazer medicina. Os integrantes do Estado Islâmico entraram na mente dele e falaram que lá ele teria condições de estudar e ter várias esposas. Ele ficou muito envolvido, se sentindo muito importante. Talvez foi a única vez na vida que ele se sentiu importante. Nós não damos valor na nossa juventude, mas o terrorismo deu”, avalia o advogado.

 

        Ex-coroinha e inteligente: quem é brasileiro condenado por terrorismo

Fábio Samuel da Costa Oliveira era um adolescente tido como estranho, mas muito inteligente. Diferentemente de outros garotos da sua idade, não gostava de festas e música alta. Preferia ficar no computador na casa de sua avó onde morava em Barbacena, interior de Minas Gerais. Ali, ele aprendeu sozinho a falar inglês e árabe.

Hoje com 20 anos, Fábio Samuel foi condenado a sete anos de prisão por terrorismo e cooptação de menores. Ele tentava recrutar quatro adolescentes do interior de São Paulo e Rio de Janeiro para o grupo terrorista Estado Islâmico. O esquema foi desfeito pela Polícia Federal (PF).

A sentença da 2ª Vara Federal de Minas Gerais que condena Fábio Samuel é do dia 13 de maio, mas só foi divulgada agora. Reportagem do Metrópoles publicada neste sábado (27/7) revela detalhes inéditos da investigação sobre o recrutamento de jovens pelo ISIS (sigla em inglês para Estado Islâmico) no Brasil.

Tanto Fábio Samuel como os quatro adolescentes que passavam pelo processo de radicalização viviam com seus responsáveis, que não sabiam do envolvimento deles com o grupo terrorista.

“Precisa sempre verificar o que os filhos fazem e aconselhar, porque por mais que a pessoa seja boa, sempre tem os predadores nas redes sociais”, declarou ao Metrópoles Naide da Costa, de 61 anos, a avó de Fábio Samuel, com quem ele vivia desde os 9 anos.

O garoto foi viver com a avó materna após a morte do pai. A mãe acabou se afastando do filho.

<><> Vulnerabilidade

Fábio Samuel vem de uma família pobre, a avó é zeladora de um prédio. Quando era mais jovem era muito dedicado à Igreja Católica, onde era coroinha.

Ao completar a maioridade, se converteu ao islamismo quando trabalhava de serviços gerais em um curtume de abate halal, que é uma forma de preparo de alimentos para exportação a consumidores muçulmanos.

Os investigadores da Polícia Federal suspeitam que Fábio Samuel foi cooptado para o ISIS pelos irmãos Thaylan e Thauann Palomanes, presos em Málaga, na Espanha, por envolvimento com o Estado Islâmico, em novembro do ano passado.

Greg Andrade, advogado de Fábio Samuel, entende que o cliente tem um tipo de autismo e pretende entrar com uma revisão criminal do caso. Para o defensor, o jovem era muito inteligente e tinha peculiaridades, mas não teve apoio do Estado.

“O sonho dele é fazer medicina. Os integrantes do Estado Islâmico entraram na mente dele e falaram que lá ele teria condições de estudar e ter várias esposas. Ele ficou muito envolvido, se sentindo muito importante. Talvez foi a única vez na vida que ele se sentiu importante. Nós não damos valor na nossa juventude, mas o terrorismo deu”, avalia o advogado.

<><> Planejamento de ataques

Fábio Samuel tinha o codinome de Mahmoud al-Brazili e radicalizava quatro adolescentes pelo aplicativo de mensagens Telegram. Ele foi preso em junho do ano passado quando embarcava em Guarulhos (SP) com destino para a Turquia. De lá, seguiria para algum país da África onde o grupo terrorista atua.

Nas mensagens do Telegram, ele manifestava sua vontade de se juntar ao ISIS em Moçambique, onde o grupo luta atualmente na região norte do país.

O jovem brasileiro de Minas Gerais orientava os adolescentes a cometerem um ataque contra uma representação dos Estados Unidos no Brasil, caso ele não conseguisse sair do país, segundo relatório da Polícia Federal.

Em um vídeo interceptado pelo FBI, a polícia federal americana, Fábio Samuel responde a uma espécie de questionário do ISIS e convoca novos militantes que falam português para formar o califado, governo religioso defendido pelos terroristas.

Já o setor de inteligência do governo do Marrocos identificou uma conversa em que o denominado Mahmoud al-Brazili falava sobre a intenção de cometer um atentado em uma igreja católica de Barbacena.

 

Fonte: Metrópoles

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