Maduro vence eleição na Venezuela, diz
conselho; oposição contesta e aponta fraude 'grosseira'
O Conselho Nacional
Eleitoral (CNE) da Venezuela anunciou
na madrugada desta segunda-feira (29/7) que o presidente Nicolás
Maduro venceu as eleições
presidenciais do domingo (28/7), mas os resultados foram contestados
pela oposição, que disse ter havido fraude "grosseira" para modificar
os números.
Segundo o presidente
do CNE, Elvis Amoroso, Maduro obteve 51,2% dos votos, contra 44,2% do opositor
Edmundo González, com 80% das urnas apuradas.
O anúncio aconteceu
pouco depois da meia-noite em Caracas (1h em Brasília). Amoroso, um aliado de
Maduro, disse que a tendência da apuração era "contundente e
irreversível".
O presidente do CNE
também disse que o país investigará "ataques terroristas" ao sistema
eleitoral aos quais atribuiu o atraso na divulgação.
Nas horas de espera, o
país mergulhou em tensão, com a oposição denunciando supostas irregularidades
no processo e declarando ter vencido o pleito.
Momentos depois do
anúncio, a principal líder da oposição, María Corina
Machado, inabilitada para exercer cargos públicos e apoiadora de
González, contestou o resultado.
"Ganhamos em
todos os Estados do país e sabemos o que aconteceu hoje. Cem por cento das atas
que o CNE transmitiu nós temos e toda essa informação aponta que Edmundo obteve
70% dos votos", disse Machado a jornalistas.
Ela acrescentou
avaliar que as supostas modificações feitas nos resultados haviam sido
"grosseiras".
O embate prenuncia
mais tensão nas próximas horas e dias na Venezuela, sob acompanhamento dos
países vizinhos e dos EUA.
O secretário de Estado
americano, Antony Blinken, afirmou que seu país tem "sérias
preocupações" sobre o resultado anunciado. "A comunidade
internacional está observando isso de perto e responderá de acordo”, afirmou
Blinken.
O presidente chileno,
Gabriel Boric, questionou abertamente os resultados e disse que o Chile só
reconhecerá números "verificáveis".
Já Brasil, Colômbia e
México - todos de governos à esquerda, como o de Boric - ainda não haviam se
pronunciado até a publicação desta reportagem (leia mais abaixo).
O presidente Nicolás
Maduro, de 61 anos, que dirige o país desde 2013, comemorou a
vitória que lhe dará um terceiro mandato a partir de janeiro.
"Temos de
respeitar o árbitro e que ninguém pretenda manchar essa jornada bonita",
disse o mandatário venezuelano.
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'Vigília' nos centros eleitorais
Desde o encerramento
das urnas - às 18h de Caracas (19h em Brasília) -, os dois principais nomes da
oposição intensificaram os pedidos para que seus eleitores continuassem em
"vigília" nos centros eleitorais.
María Corina Machado,
que liderou a campanha transferindo seu apoio a González,
um ex-diplomata de 74 anos, pediu que os oposicionistas atuando como fiscais
exigissem atas de resultados nos centros de votação, citando que esse era um
direito previsto em lei.
"Esses são
minutos cruciais, horas decisivas", disse Machado. "Precisamos que
todos os venezuelanos permaneçam nos centro de votação acompanhando os
observadores.”
Os apelos foram
seguidos de denúncias de opositores sobre supostas irregularidades em centros
de votação. Pouco antes do anúncio oficial, González disse no Twitter ter
ganhado a disputa.
Desde 2013 a oposição
não aparecia com tamanha possibilidade de derrotar o governo, segundo os
analistas, apesar das denúncias de que o processo eleitoral não teve condições
justas de competição.
Além da própria
inabilitação de Machado, houve dificuldades para que os milhões de venezuelanos
que estão no exterior por causa da longa crise econômica e política do país
pudessem votar.
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Reação e papel do Brasil, Colômbia e dos EUA
O processo eleitoral
foi seguido de perto pelos países vizinhos e pelos EUA, mas teve uma reduzida
participação de observadores internacionais, depois que o governo Maduro, que
controla o CNE, retirou o convite para que uma missão da União Europeia acompanhasse
o pleito.
Logo após o anúncio
dos resultados, o presidente chileno Gabriel Boric
disse que o Chile só reconhecerá números "verificáveis".
"O regime de
Maduro deve entender que os resultados que publica são difíceis de
acreditar", afirmou no X, antigo Twitter, enquanto aliados de Maduro como
os governos da Bolívia e de Honduras felicitavam o presidente venezuelano.
Os presidentes de
Brasil e Colômbia, países apontados por analistas como potenciais mediadores na
situação venezuelana, permaneciam em silêncio sobre os resultados até a
publicação deste texto. O México também não havia se manifestado.
Para acompanhar a
disputa, o governo brasileiro enviou a Caracas Celso Amorim, ex-chanceler e
influente assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para temas
internacionais.
Na noite de domingo,
Amorim divulgou nota celebrando que "a jornada tenha transcorrido com
tranquilidade, sem incidentes de monta", com "participação expressiva
do eleitorado".
"Estou em contato
com diferentes forças políticas e analistas eleitorais, além de membros da
equipe de observadores do Centro Carter e do Painel de Especialistas da ONU. O
presidente Lula vem sendo informado ao longo do dia. Vamos aguardar os resultados
finais e esperamos que sejam respeitados por todos os candidatos", disse o
ex-chanceler.
A declaração reforçou
a mensagem de Brasília nos últimos dias de que o resultado, seja qual fosse,
deveria ser respeitado.
Na última semana,
Lula, um aliado do chavismo, marcou uma inusual distância do presidente
venezuelano ao criticar a declaração de Maduro de que uma vitória da oposição
levaria a “um banho de sangue”.
Enquanto isso, o
libertário argentino Javier Milei, de aberta oposição a Maduro, se manifestou
no X (antigo Twitter).
"Fora, ditador
Maduro", escreveu Milei em maiúsculas. "Os dados anunciam uma vitória
acachapante", seguiu, quando ainda não existiam resultados oficiais
divulgados.
A vice-presidente dos
Estados Unidos, Kamala Harris, havia afirmado no início da noite que a
"vontade do povo venezuelano deve ser respeitada".
Ainda antes do
resultado, Kamala, que será possivelmente a rival de Trump nas eleições deste
ano, defendeu um "futuro mais democrático", sem mencionar nomes.
O papel que terá os
EUA é um aspecto aguardado, já que Washington mantém sanções à indústria
petrolífera venezuelana para punir o governo Maduro.
Sob pressão da Guerra
da Ucrânia e para incentivar o processo eleitoral da Venezuela, a Casa Branca
afrouxou as sanções por alguns meses em 2023, após um acordo que prometia a
participação da oposição nas eleições.
Como o CNE impediu
María Corina Machado de concorrer, a redução das sanções foi revertida.
Logo após o anúncio
dos resultados feito pelo CNE, o secretário de Estado dos Estados Unidos,
Antony Blinken, afirmou que seu país tem "sérias preocupações" sobre
o resultado anunciado.
Blinken disse também
que os EUA estavam preocupados com o fato de o resultado não refletir nem a
vontade e nem os votos dos venezuelanos.
"É fundamental
que todos os votos sejam contados de forma justa e transparente, que as
autoridades eleitorais partilhem imediatamente informações com a oposição e
observadores independentes e sem demora e que as autoridades eleitorais
publiquem a apuração dos votos. A comunidade internacional está observando isso
de perto e responderá de acordo", disse.
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Como funciona o sistema eleitoral venezuelano?
Um dos grandes temas a
partir de agora será uma possível auditoria dos resultados.
Na Venezuela, o
sistema de votação é eletrônico, mas há diferenças em relação ao brasileiro.
Ao chegar ao local de
votação, o eleitor apresenta o documento, que é registrado no sistema. Depois,
por meio da biometria, é feita a autenticação e a urna eletrônica é liberada
para que ele vote.
As fotos dos
candidatos aparecem na tela. No entanto, o sistema indica os candidatos
apoiados por cada partido. Quanto mais apoios tiver, mais fotos aparecerão.
Assim, Maduro apareceu 13 vezes. González, três.
Depois de votar, o
sistema imprime o voto e o eleitor o coloca em uma urna. Após a votação, os
fiscais comparam os resultados das urnas eletrônicas com os do papel. Cada urna
também imprime uma ata, cópia dos dados a serem enviados ao CNE.
Pouco depois do
anúncio feito pelo CNE, o chanceler venezuelano, Yvan Gil, divulgou uma nota
dizendo que seu país estava denunciando e alertando ao mundo sobre "uma
operação de intervenção contra o processo eleitoral."
¨ Por que oposição da Venezuela rejeita vitória de Maduro
A líder da oposição
venezuelana, María Corina
Machado, rejeitou a vitória de Nicolás
Maduro nas eleições presidenciais que foram
anunciadas no domingo (28/7) pelo Conselho Nacional Eleitoral
(CNE) do país.
Machado diz ter todas
as atas de votação que foram entregues aos observadores da oposição, que ainda
estavam nos centros de votação da Venezuela à
meia-noite no horário local.
A opositora disse que
o seu cálculo aponta 70% dos votos para Edmundo González, o representante da
oposição nas urnas, e 30% para Maduro.
Minutos antes, o CNE
havia anunciado resultados que davam 44,2% a González e 51,1% a Maduro, com 80%
das urnas apuradas.
Enquanto os números de
Machado se baseiam em 40% das atas, o primeiro boletim do CNE, que considera
80% das urnas apuradas, afirma refletir uma "tendência
irreversível".
"Ganhamos e todos
sabem disso", disse Machado. "Isto não é uma fraude, é ignorar e
violar a soberania popular. Não há forma de justificar isso, não com a
informação que temos", acrescentou ela.
Na Venezuela, cada
local de votação emite uma ata, que é impressa diversas vezes.
Esse documento é, ao
mesmo tempo, transmitido ao CNE e entregue aos observadores de cada partido.
Portanto, todos têm,
em teoria, acesso aos resultados.
Machado afirmou que a
oposição vai anunciar algumas medidas nos próximos dias.
"Agora cabe a nós
defender a verdade, porque isso influencia a vida de todos", disse.
"Todas as regras foram violadas. Nossa luta continua."
As eleições
venezuelanas foram observadas pelo Carter Center, dos Estados Unidos, e pela
Organização das Nações Unidas (ONU), duas entidades com pouca influência
política e com fortes limitações para analisar as informações.
Durante a campanha,
Machado percorreu o país — apesar de encontrar em todas as rodovias ou
aeroportos postos de controle militar ou bloqueios espontâneos que fechavam o
caminho da comitiva. A oposição relatou 130 prisões de militantes e ativistas.
Existem 8 milhões de
venezuelanos no exterior, ou 15% da população total. Destes, apenas 1% puderam
votar por causa das dificuldades no registo de eleitores em embaixadas e
consulados.
O presidente do CNE,
Elvis Amoroso, é um político ligado ao chavismo e atuou em entidades que
impedem pessoas de concorrer às eleições.
Apesar disso, e das
reclamações de que a votação não teve condições justas, como a inabilitação o
de Machado, desde 2013 a
oposição não via tantas possibilidades de derrotar o chavismo.
De acordo com
sondagens divulgadas antes das eleições, a oposição
apresentava vantagem.
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As atas e as testemunhas - *Análise de Daniel Pardo, jornalista da BBC News
Mundo, serviço em espanhol da BBC
Apesar do ceticismo, a
oposição venezuelana participou das eleições porque tinha uma possibilidade de
pensar que seria uma disputa parcialmente competitiva, com a participação de 90
mil testemunhas nos 30.026 locais de voto espalhados por todo o país.
Essas testemunhas
poderiam transmitir os resultados ao vivo por meio das atas de votação
impressas em cada centro.
Machado diz que as
testemunhas da oposição conseguiram compilar os resultados de 40% das atas e
que, com uma vantagem tão grande quanto a que ela alega, fica evidente a
vitória de González.
A outra parcela dos
registros segue aparentemente nos centros de votação, assim como muitas das
testemunhas: 90 mil pessoas em todo o país que, segundo denúncias, sofreram
assédio das autoridades ao longo do domingo (28/7).
Especialistas em
eleições descreveram o pleito na Venezuela como o "mais oportunista"
da história recente da Venezuela.
Porém, mesmo assim, a
oposição diz que teve um resultado avassalador. E a prova estaria justamente
nas tais atas de votação.
Fonte: BBC News Mundo
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