terça-feira, 30 de julho de 2024

Miguel do Rosário: ‘A vitória de Maduro e a questão democrática’

Antes de nossas considerações sobre a vitória de Nicolas Maduro nas eleições presidenciais da Venezuela, pela terceira vez consecutiva, examinemos rapidamente as manifestações de três presidentes da região:

“Parabenizamos o povo venezuelano e o presidente Nicolás Maduro pela vitória eleitoral deste histórico 28 de julho. Ótima maneira de lembrar o Comandante Hugo Chávez. Acompanhámos de perto esta festa democrática e congratulamo-nos com o facto de a vontade do povo venezuelano nas urnas ter sido respeitada. Queremos ratificar a nossa vontade de continuar a fortalecer os nossos laços de amizade, cooperação e solidariedade com a República Bolivariana da Venezuela, no quadro da integração soberana dos nossos povos e no objectivo comum de avançar para um mundo multipolar.” Luis Arce, presidente da Bolívia

“O regime de Maduro deve compreender que os resultados que publica são difíceis de acreditar. A comunidade internacional e especialmente o povo venezuelano, incluindo os milhões de venezuelanos no exílio, exigem total transparência das atas e do processo, e que observadores internacionais não comprometidos com o governo prestem contas pela veracidade dos resultados. Do Chile não reconheceremos nenhum resultado que não seja verificável.” Gabriel Boric, presidente do Chile.

“DITADOR MADURO, FORA!!!

Os venezuelanos escolheram acabar com a ditadura comunista de Nicolás Maduro. Os dados anunciam uma vitória esmagadora da oposição, e o mundo aguarda que ele reconheça a derrota após anos de socialismo, miséria, decadência e morte.

A Argentina não vai reconhecer outra fraude e espera que as Forças Armadas desta vez defendam a democracia e a vontade popular.

A Liberdade Avança na América Latina.” Javier Milei, presidente da Argentina.

***

Das três manifestações, a de Milei é seguramente a mais vulgar. Mais que isso, ao convocar as Forças Armadas da Venezuela a interferir no processo político, ele adota um tom odiosamente golpista. A extrema direita latina tem essa marca esquizofrênica, de encher a boca para falar em democracia, ao mesmo tempo em que opera para destruí-la sempre que a democracia não lhe convém. É um comentário autoritário em todas as acepções, na história, na forma, no conteúdo.

A manifestação de Boric, por sua vez, é uma postura tristemente servil aos interesses geopolíticos dos EUA. Mas eu também procuro sempre preconizar cuidado e tolerância da esquerda com relação a Boric, porque me parece que suas posturas refletem uma correlação de forças do próprio Chile, onde os setores conservadores são muito agressivos e fortes, e apenas se mantém neutralizados, alijadas do poder, porque Boric tem conseguido mantê-los divididos. E sua estratégia é justamente posar de “menino bonzinho”, em especial em temas internacionais, tentando agradar sobretudo esses setores reacionários de classe média, que constituem, desde os anos 50, a tradicional massa de manobra do golpismo em toda a América Latina.

Já o presidente da Bolívia, Luis Arce, teve a atitude mais digna e correta, que é respeitar integralmente o processo democrático da Venezuela, cuja instituição eleitoral central já decretou a vitória de Nicolás Maduro.

Naturalmente, o processo ainda não terminou. Pelas reações da oposição venezuelana, que não aceitou o resultado, adotando um discurso estridente de “fraude”, e pela imediata adesão dos EUA, via Anthony Blinken, ao discurso que põe em dúvida a lisura do processo, está claro que o país terá que superar mais uma série de obstáculos políticos, internos e externos, antes de poder efetivamente comemorar sua vitória.

No Brasil, o debate sobre a Venezuela permanece muito contaminado pela influência norte-americana e dos veículos de imprensa tradicionais, que historicamente se submetem caninamente aos interesses do império. Essa imprensa conseguiu, há tempos, envenenar a opinião pública brasileira, incluindo (eu diria até sobretudo) muitos setores intelectualizados, sobre a questão venezuelana. Essa é quase uma batalha perdida no debate político brasileiro, e por isso mesmo constitui um ponto extremamente sensível, e até mesmo perigoso, para a esquerda e para o governo Lula.

Também aqui é preciso muito cuidado, paciência e tolerância, para não deixar que a crise política na Venezuela seja importada para o Brasil, o que não nos permitiria nem ajudar nosso vizinho, nem a nós mesmos. A última coisa de que precisamos no momento é de uma crise política no Brasil motivada pela crise no governo Maduro.

A atitude mais adulta e mais prudente da esquerda e do governo será esperar que passe o momento de frustração e histeria, por parte daqueles que realmente acreditavam na vitória da oposição venezuelana, sem entrar em embates desnecessários. Essa é a razão pela qual o presidente Lula está esperando a volta de Celso Amorim, que foi à Venezuela acompanhar de perto o processo, para ouvir seu relato e tomar uma decisão sobre a melhor estratégia.

O chamado “chorus espernandis” é um direito sagrado dos perdedores. Deixemo-los chorar à vontade, livremente, sem serem incomodados.

Cabe aos vencedores, uma postura de magnanimidade.

Digo isso porque me preocupa a atitude bélica, faca nos dentes, de um setor importante da esquerda, tratando com truculência todos aqueles que optam por uma atitude mais crítica em relação ao regime venezuelano e à maneira como as eleições foram conduzidas.

A esquerda brasileira precisa ser extremamente estratégica, porque ainda temos muitos desafios a serem vencidos por aqui, neste segundo semestre. O mais perigoso será, naturalmente, chegar a um acordo com o centro político sobre a sucessão de Arthur Lira. Para terminar o mandato sem sobressaltos, e garantir a sua reeleição, Lula vai precisar de um presidente da Câmara comprometido com a democracia e a governabilidade. Não pode ser um bolsonarista raíz, e ao mesmo tempo precisa ser alguém com habilidade política suficiente para não empurrar o centro e a direita liberal para a extrema-direita.

Além disso, o tema Venezuela vai passar (e com sorte, o país se normalizará) e iremos precisar de todos, de Boric, de Arce, dos liberais democráticos, da esquerda moderada, do centro político, além de toda a esquerda brasileira e latino-americana, neste desafio gigantesco de promovermos um desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo em nosso continente. Não podemos nos dar ao luxo de queimar pontes com ninguém!

Sobre o processo venezuelano em si, minha opinião é simples e direta: cabe respeitar a soberania do país e a decisão de suas instituições. A asserção de que o conselho eleitoral da Venezuela é “controlado por Maduro”, e que, portanto, estaria disposto a cometer fraudes, não me parece nem séria, nem ética, nem democrática. Quando se participa de um processo eleitoral, implica-se que se está de acordo com a sua lisura. Caso contrário, a denúncia precisa ser feita antes, não depois. É muito irresponsável participar de uma eleição e comemorar, em caso de vitória, e acusar fraude, em caso de derrota.

De qualquer forma, há observadores internacionais, e, ao longo das próximas horas e dias, teremos mais detalhes sobre a higidez do processo eleitoral venezuelano. Naturalmente, nenhum grupo político, de esquerda ou direita, deve ser lenientes com fraudes eleitorais, mas fraudes devem ser denunciadas com provas cabais.

Não se pede para aprovar o governo Maduro, ou gostar do regime venezuelano. Mas trata-se de um país independente, com uma sociedade politizada, perfeitamente capaz de resolver seus próprios problemas.

Além do mais, qualquer análise sobre os conflitos políticos e as dificuldades econômicas da Venezuela, que não considere a consequência devastadora das sanções unilaterais, criminosas, profundamente antidemocráticas, dos Estados Unidos, também não me parece honesta.

O Brasil precisa defender o fim das sanções à Venezuela, a soberania e autodeterminação de seu povo, e trabalhar para ajudá-lo a superar suas crises, pois uma América do Sul estável, capaz de se desenvolver economica e tecnologicamente, será fundamental para o futuro do Brasil, além de constituir uma contribuição importante para um mundo multipolar mais equilibrado e pacífico.

•        Maduro denuncia nova tentativa de golpe de Estado na Venezuela diante dos resultados eleitorais

O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, afirmou nesta segunda-feira (29) que há uma tentativa em curso na Venezuela de impor um novo golpe de Estado em decorrência dos resultados das eleições presidenciais do país.

"Há uma tentativa de impor novamente um golpe de Estado na Venezuela, de natureza fascista e contrarrevolucionária, eu poderia chamar isso de uma espécie de Guaidó 2.0", disse Maduro.

Nesta segunda-feira, Maduro foi proclamado pelo Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela (CNE) como presidente reeleito para o período de 2025-2031.

"O Conselho Nacional da Venezuela, de acordo com suas atribuições, confirma que o cidadão Nicolás Maduro é o presidente eleito para um período de seis anos nas eleições presidenciais realizadas em 28 de julho, de acordo com a constituição do país", declarou o presidente do CNE, Elvis Amoroso.

Maduro afirmou que recebe com "humildade" a credencial do CNE que o proclama presidente reeleito para os próximos seis anos.

"Recebo esta credencial constitucional e legal do poder encarregado de tratar das questões eleitorais da Venezuela, que emitiu uma decisão que recebo com humildade […] e assumo o mandato do povo para ser seu presidente e liderar nosso país para a paz e a prosperidade, para a unidade nacional através do diálogo", disse Maduro na sede da CNE em Caracas.

As eleições venezuelanas ocorreram no último domingo (28). Segundo o resultado divulgado pelo CNE, Maduro obteve 51,2% dos votos expressos, enquanto o adversário Edmundo González ficou em segundo lugar com 44,2%.

 

•        Vitória de Maduro abre caminho para a paz, o diálogo e a estabilidade política. Por José Reinaldo de Carvalho

A Venezuela surpreendeu o mundo ao realizar eleições marcadas pela paz e estabilidade, sinalizando uma nova era de tranquilidade e ordem política. O presidente Nicolás Maduro antes mesmo de conhecer o resultado, disse que as eleições foram “bonitas” e “realizadas em paz”. E repetiu: “paz, paz, paz, perfeita paz”. Ele foi reeleito com 51,2% dos votos, enquanto seu principal adversário alcançou 44% dos sufrágios. Ao discursar após a proclamação dos resultados afirmou que "o fascismo na Venezuela, na terra de Bolívar e Chávez, não passará". Até o momento em que escrevemos esta coluna a oposição não se manifestou. Horas antes da divulgação do resultado pelo Conselho Nacional Eleitoral, a líder da extrema direita apelou a seus seguidores para pressionar as autooridades e disse ter apoio internacional.

A jornada ocorreu livre de incidentes, à exceção de um ataque hacker ao site do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), órgão que apura e divulga os resultados das eleições na Venezuela, segundo Maduro uma tentativa de "evitar que a população tivesse acesso aos resultados".

É um momento histórico para o país, em que pela primeira vez o candidato oficialista, Nicolás Maduro, enfrentou uma concorrência robusta de nove candidatos de oposição, sendo um deles de extrema direita, que pregava a violência política contra o governo e seus partidários e ameaçava o país de guerra civil e banho de sangue. É o mesmo grupo político que pediu mais sanções e intervenção estrangeira contra o país.

Além da paz, da tranquilidade e da ordem, a eleição deste histórico 28 de julho desqualificou, derrotou, fez fracassar os funestos planos e atos insurrecionais antidemocráticos e contrarrevolucionários. Mesmo com um discurso violento, nenhum setor da oposição boicotou as eleições. Muitos setores oposicionistas anteriormente relutantes em participar do processo eleitoral, acabaram por não boicotar as eleições e incentivaram seu eleitorado a exercer seu direito ao voto. Essa mudança de postura legitimou o processo eleitoral venezuelano, tornando-o um exemplo de democracia participativa e protagonista, revelando ao mundo o vigor da democracia popular vocacionada à construção do socialismo.

Falaram mais alto o patriotismo e o espírito cívico do povo venezuelano. 

A vitória de Nicolás Maduro representa não apenas um triunfo pessoal, a vitória de um partido e de uma coalizão eleitoral, mas também uma reafirmação do chavismo como força política dirigente. Esta eleição solidifica a democracia participativa e destaca o compromisso do povo venezuelano com a continuidade de sua revolução bolivariana, cuja essência, como dizia seu comandante Hugo Chávez, é o anti-imperialismo e a construção de uma sociedade com direitos políticos, humanos e sociais para todos.

Começa uma nova etapa política no país. A decisão soberana do povo abre possibilidades promissoras para a estabilização do país, criando um ambiente favorável para o diálogo político que estabeleça um novo sistema de convivência entre as diversas forças políticas, a não ser que a extrema direita decida retomar o caminho do golpismo com o auxílio de seus aliados internacionais.

A vitória de Maduro e do chavismo representa também uma derrota contundente para a extrema direita, que viu suas políticas de violência e desestabilização fracassarem diante da vontade popular. Este resultado sinaliza um novo começo para a Venezuela, onde o diálogo interno e internacional pode ser um fator que contribua para o desenvolvimento do país. O governo, agora fortalecido, tem a oportunidade de buscar a suspensão das sanções internacionais impostas unilateralmente pelo imperialismo estadunidense, ao arrepio do direito internacional.

Com este triunfo, a Venezuela envia uma mensagem clara ao mundo de que um povo unido e mobilizado sob uma direção política lúcida e combativa supera quaisquer adversidades.

 

Fonte: O Cafezinho/Brasil 247

 

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