quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Rosa Maria Marques: ‘O social sob ataque em nome do déficit zero’

A economia brasileira registra excelentes resultados nos indicadores comumente utilizados para avaliar o desempenho econômico. O crescimento esperado do PIB para 2024 é de 3,5%; ao final de outubro, o nível do desemprego foi o segundo menor desde 2012 (6,4%); a renda média dos ocupados aumentou e o mesmo aconteceu com o investimento produtivo, embora este esteja muito aquém do desejável.

Ainda no rol dos indicadores positivos, a inflação está dentro da meta e a pobreza diminuiu significativamente. Lula sempre declarou que seu objetivo primeiro era o combate à pobreza. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a população abaixo da linha de pobreza adotada pelo Banco Mundial (US$ 6,85 PPC por dia ou R$ 665 por mês) caiu de 31,6% (2022) para 27,4% (2023). Essa proporção foi a menor registrada desde 2012. Já a população em situação de extrema pobreza (US$ 2,15 PPC por dia ou R$ 209 por mês) recuou de 5,9% para 4,4%. Além desse percentual ser o menor desde 2012, é a primeira vez que ficou abaixo dos 5,0%.

Contrasta com esses indicadores, a taxa básica de juros (a taxa básica da economia e a taxa média de juros praticada nas operações compromissadas com títulos públicos federais) que está nas alturas (11,25%). Ao lado disso, o dólar ultrapassou, pela primeira vez, a barreira dos R$ 6,00 sem que as autoridades monetárias tomassem qualquer medida para conter a forte e rápida desvalorização da moeda nacional.

Tanto a taxa básica de juros como o câmbio são resultado da orientação do Banco Central (BC). Este, embora se diga independente, atua em concordância com as posições do chamado “mercado”, nome assumido pelas finanças. Para esse segmento – e por decorrência o Banco Central – tudo é motivo para aumentar a taxa de juros: se há pressão inflacionária, não importando se de oferta e não de demanda, cabe elevar os juros; se o PIB cresce alguma coisa acima do esperado pelo mercado, há que elevar os juros e, finalmente, é preciso aumentar os juros porque a dívida pública é elevada e o “mercado” considera que sua trajetória de expansão está mantida e mesmo aprofundada.

·       O imperativo do ajuste fiscal

O processo pelo qual o pensamento neoliberal passou a determinar a política fiscal e monetária no Brasil abarca décadas. Começou com a abertura da Bolsa ao capital estrangeiro, prosseguiu com a venda dos ativos públicos (as privatizações dos anos 1990), continuou com o estabelecimento de regras para a ampliação do gasto (somente possível com a definição de novos recursos) e pela proibição dos gastos correntes serem financiados com títulos públicos, e prosseguiu com a realização de reformas da aposentadoria tanto dos trabalhadores do setor privado como do público.

Essas primeiras medidas ocorreram particularmente durante o governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), mas tanto Lula como Dilma Rousseff não as reverteram, mesmo que parcialmente, quando assumiram o governo. Ao contrário, no primeiro governo, Lula teve sucesso em aprovar mudança na aposentadoria, exatamente nos aspectos que FHC não tinha sido exitoso.

O segundo grande momento do avanço do neoliberalismo sobre a definição da política fiscal ocorreu em dezembro de 2016, no governo de Michel Temer, aquele que assumiu a presidência da República quando do impeachment de Dilma Rousseff. A partir desse momento, e inscrito na Constituição, o gasto público foi congelado por vinte anos. Ao contrário de outros países, o serviço da dívida pública não foi incluído nesse congelamento e os gastos sociais o foram.

Esse mecanismo ficou conhecido como “Teto do Gasto”. Teve como consequência desorganizar o aparelho do Estado e, entre os setores mais afetados, destacaram-se a Educação e a Saúde públicas. No âmbito da educação se congelaram os salários, não se realizaram concursos de ingresso, foram cortadas bolsas e deixadas à mingua a manutenção, afetando a limpeza, água e eletricidade. Na saúde, atividades de todos os tipos foram comprometidas, obstaculizando a realização de suas ações e serviços.

·       O ajuste fiscal no início do terceiro governo Lula

Em 2023, Lula aprovou um novo regime fiscal, o “Novo Arcabouço Fiscal”. A rigor, como se pode ver em seus parâmetros, houve flexibilização com relação ao Teto do Gasto, mas a primazia do seu controle foi mantida e aprofundada.

<><> Parâmetros

#  I. resultado primário

1. definição da meta para 2023 e para os três anos seguintes (-0,5%; 0,0%; 0,5% e 1,0%, respectivamente).

2. adoção de intervalos de tolerância nas metas, de modo que o resultado primário possa estar 0,25 pontos porcentuais do PIB acima ou abaixo da meta definida.

# II. evolução do gasto

1. Crescimento do gasto real limitado a 70% da variação real dos recursos primários acumulados em 12 meses.

2. Crescimento real do gasto primário limitado ao intervalo 0,6% a 2,5% anual, isto é, não pode crescer acima de 2,5% e não menos que 0,6%.

3. Ficam excluídos dessas normas o Fundo Constitucional do Distrito Federal e o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica.

# III. Sansão no caso de descumprimento das normas

1. O crescimento real dos gastos primários deverá se reduzir em 50% no ano seguinte.
2. Estabelecimento de um piso orçamentário, não necessariamente exigível.
3. No caso de o resultado primário superar a meta, é permitida a utilização de parte dos recursos excedentes para investimentos.

Para tentar atingir o déficit zero previsto para 2024, o governo fez um restrito controle das despesas, adiando ao máximo inclusive aquelas de caráter social e dirigidas aos mais pobres. Ao final de novembro, finalmente, apresentou um conjunto de medidas com o objetivo de reduzir o gasto em R$ 70 bilhões nos próximos dois anos, com o objetivo de garantir as metas de resultados primários previstas no Arcabouço. Desse conjunto de propostas, destaco três que afetam diretamente a população mais pobre.

·       Mudança na política de valorização da salário mínimo

Em 2023 Lula retomou essa política, pois essa havia sido interrompida por Bolsonaro. Consistia em aumentar o salário mínimo considerando a inflação e o crescimento real do PIB dos dois últimos anos. Em seus primeiros governos, todos os estudos mostraram que essa política foi o principal instrumento para diminuir a desigualdade entre os ocupados e para aumentar a renda dos mais pobres (dado que a ele corresponde o piso dos benefícios sociais e que seu valor afeta positivamente a base da pirâmide salarial). A proposta é manter a regra do crescimento real pelo PIB, mas a variação estará dentro do marco fiscal, de um máximo de 2,5%.

·       Abono salarial

Hoje é pago anualmente aos trabalhadores do mercado formal que ganham até dois salários mínimo. A proposta é diminuir, ao longo do tempo, esse critério de acesso para 1,5 salário mínimo.

·       Benefício de Prestação Continuada

Pago a pessoas de 65 anos ou mais e a deficientes com renda per capita familiar igual ou inferior a 25% do salário mínimo. A proposta é incluir, no cálculo da renda per capita, a renda dos cônjuges e companheiros não conviventes e a renda dos irmãos, filhos e enteados conviventes (não só os solteiros).

Com essas e outras propostas, a adesão à ideia da primazia do déficit zero e de superávits se apresenta, agora, em outro nível, afetando diretamente políticas dirigidas aos mais pobres, e que haviam sido consideradas marca dos governos anteriores do PT. Em outras palavras, a adesão à tese da austeridade revela-se em sua totalidade.

A exigência do cumprimento das metas não poupa sequer as políticas sociais dos que mais necessitam. Uma escolha foi feita. E torna-se impossível se continuar dizendo que tudo isso decorre da desfavorável correlação de forças. Há coisas que não se propõe; há limites que não se transpõe.

 

¨      A especulação e a ganância mórbida. Por Alberto Cantalice

O mercado financeiro, principalmente os especuladores por voz própria ou por interpostas pessoas: seus porta-vozes nos grandes veículos de mídias atacam permanentemente o governo de Lula.

A sanha persecutória é tamanha, que com imensa desfaçatez “exigem” que o governo legitimamente eleito rasgue seu Programa de Governo.

O mote “O Pobre no Orçamento e o Rico no Imposto de Renda” venceu as eleições de 2022. Não o contrário.

É evidente que a equipe econômica ao formular o NAF, Novo Arcabouço Fiscal que foi chancelado pelo Congresso Nacional, buscava o equilíbrio das contas públicas por propugnar o déficit zero. Quanto menor o déficit,  menor será a rolagem e o aumento da dívida pública: o maior meio de concentração de renda e riqueza via juros, do mundo.

O mercado financeiro quando fala em endividamento omite as bilionárias reservas cambiais do país, hoje totalizando 360 bilhões de dólares. Que subtraida da dívida bruta coloca nossa dívida ao redor de 65% do PIB. Uma das menores do Grupo das 20 maiores economias em termos percentuais.

Então essa pressão por cortes nada mais é do que uma forma de tentar jogar o governo contra sua base social.

Não que não se tenha de passar um pente-fino nos Programas. A própria imprensa já relatou vários casos de recebimentos indevidos. E isso será feito como já disse os ministros das respectivas pastas.

Toda essa especulação faz lembrar o que disse certa vez John Maynard Keynes: “o amor pelo dinheiro como posse – o que difere do amor pelo dinheiro para gozar os prazeres da vida-será reconhecido como aquilo que é: uma paixão mórbida e meio repugnante, uma dessas propensões um tanto criminosas e patológicas que habitualmente se confiam, com um arrepio, ao especialista em doenças mentais”. 

 

¨      Reeleição de Lula e a dor de cabeça dos Faria Limers. Por Florestan Fernandes Jr

Nesta terça-feira (10/12), mal havia terminado a cirurgia para a drenagem de um hematoma entre o crânio e o cérebro do presidente Lula, o andar de cima já festejava a notícia. A bolsa subiu e o dólar chegou até a cair um pouco. Excitados, os homens do tal mercado já davam como certa a impossibilidade de Lula disputar a reeleição em 2026. 

Em resposta aos homens do mercado, utilizo um trecho de um dos sucessos de Rita Lee: “desculpe o auê, eu não queria magoar você”, mas o procedimento pelo qual Lula passou foi um sucesso. Ele está lucido e retorna ao trabalho na semana que vem. Portanto, no momento adequado, Lula vai decidir se irá ou não para um quarto mandato. 

Seja qual for a decisão, uma coisa é certa: a campanha de 2026 já está nas ruas e passa, obrigatoriamente, pelas articulações do presidente Lula.

No mais, é fundamental que nos próximos dois anos o governo acerte de vez a sua comunicação com o eleitor. Pesquisa Quaest divulgada hoje (11/12) traz números que comprovam isso. No quesito informação, 41% dos entrevistados dizem ter visto mais notícias negativas sobre o governo do que as positivas, que são apontadas por 32% dos pesquisados. Sobre os dois maiores acertos do governo Lula, 5% apontaram o Bolsa Família, o programa de transferência de renda criado por Lula há 21 anos. 

Em segundo lugar aparece a melhora na economia com 3%. E pasmem, 69% não sabem apontar nada de bom ou de ruim. Ou seja, 7 em cada 10 brasileiros não sabem, por exemplo, que a taxa de desemprego é a menor desde 2012. Ou ainda que, neste ano, o Brasil alcançou o segundo lugar no ranking do crescimento do PIB. Desconhecem que 8,7 milhões de brasileiros saíram da pobreza nos dois últimos anos. E não têm a menor ideia de que indústria e o comércio voltaram a crescer, que obras importantes de infraestrutura estão sendo entregues e que houve uma ampliação nos investimentos em educação, saúde e moradia. 

Por outro lado, a pesquisa Quaest demonstra que o país continua polarizado entre a esquerda e uma extrema-direita que, no poder, foi um desastre na área econômica, política e social.

A aprovação do trabalho do presidente Lula se mantém estável com 52% de aprovação contra 47% de desaprovação. 

Na semana passada, Lula reconheceu em um encontro do PT que seu governo tem errado na comunicação. Disse que pretende fazer como o ex-presidente do México Lopes Obrador: conversar todos os dias, através dos vários veículos de comunicação, com os brasileiros de baixo e do meio da pirâmide. 

Essa comunicação direta é fundamental e não pode mais ser uma dor de cabeça para o presidente.

 

Fonte: A Terra é Redonda/Brasil 247

 

Nenhum comentário: