Carlos Vainer: A
retórica da intransigência
O
debate público provocado pela proposta de emenda constitucional da deputada Erika Hilton (PSOL)
para acabar com a escala de trabalho 6×1, na esteira do movimento VAT (Vida
Além do Trabalho) liderado pelo recém-eleito vereador carioca Rick Azevedo
(PSOL), tem levado a grande mídia corporativa, impressa ou televisada, a
oferecer um iluminado palco para que jornalistas, economistas e especialistas
de todo tipo ofereçam o espetáculo de seu consenso: não vai dar certo, não
funcionará, é inaceitável, é inviável.
Muita gente já chamou a atenção para o fato de que essa
encenação não é nova e que os conservadores, os porta-vozes do patronato, desde
sempre, cultivam o hábito de advertir a sociedade e os próprios trabalhadores
dos riscos de mudanças que pretendam promover, de alguma maneira, melhorias em
suas condições de trabalho e de vida.
A justiça exige que consideremos como patrono dessa
forma de manifestação do pensamento reacionário Nassau Senior (1790-1864),
renomado professor de Economia Política da Universidade de Oxford. Entre suas
mais celebradas “contribuições” às ciências econômicas encontra-se a “teoria da
abstinência”, segundo a qual a riqueza teria sua origem na privação de consumo:
os ricos deteriam riqueza porque haviam virtuosamente aceito abdicar de
consumir para acumular, enquanto os pobres viveriam na carência porque, em
virtude de uma incontrolável e imoral volúpia consumista, despendiam toda sua
renda no consumo.
O professor de Oxford, convicto malthusiano, também se
destacou na defesa da chamada “lei de ferro dos salários”, segundo a qual
existiria um fundo fixo para pagamento de salários e os trabalhadores
receberiam como remuneração o valor resultante da divisão do montante deste
fundo pelo total da população. Assim, se a população aumentasse, como de fato
aumentava, uma lei natural imporia inexoravelmente a redução progressiva dos
salários, sendo inúteis e inviáveis quaisquer pretensões de melhoria salarial.
Sua dedicação aos interesses patronais não foi
suficiente para que seu nome viesse a frequentar a história do pensamento
econômico, não tivesse sido imortalizado justamente por seu mais cáustico e
famoso crítico. Assim, embora sem citá-lo explicitamente, no capítulo “A Assim
Chamada Acumulação Primitiva” (O capital, Livro I, capítulo XXIV), em
que discute como foram criadas as condições da acumulação previamente à
implantação das relações sociais capitalistas, Marx escreve: “Essa acumulação
primitiva desempenha na Economia Política um papel análogo ao pecado original
na Teologia. Adão mordeu a maçã e, com isso, o pecado sobreveio à humanidade.
Explica-se sua [do capital] origem contando-a como anedota ocorrida no passado.
Em tempos muito remotos, havia, por um lado, uma elite laboriosa, inteligente e
sobretudo parcimoniosa, e, por outro, vagabundos dissipando tudo o que tinham e
mais ainda. A legenda do pecado original teológico conta-nos, contudo, como o
homem foi condenado a comer seu pão com o suor de seu rosto; a história do
pecado original econômico, no entanto, nos revela por que há gente que não tem
necessidade disso. Tanto faz. Assim se explica que os primeiros acumularam
riquezas e os últimos, finalmente, nada tinham para vender senão sua própria
pele. E desse pecado original data a pobreza da grande massa que até agora,
apesar de todo seu trabalho, nada possui para vender senão a si mesma, e a riqueza
dos poucos, que cresce continuamente, embora há muito tenham parado de
trabalhar”.
E Marx, ao longo do capítulo, com rica documentação
histórica, mostra como, ao invés de resultar de idílico e virtuoso exercício de
abstinência, a riqueza foi acumulada nas mãos de poucos graças à expropriação
dos camponeses, à legislação sanguinária que obrigou os expropriados a
submeterem-se ao trabalho para um patrão, à captura e tráfico de escravizados.
·
Marx e a “última hora de Senior”
A menção direta e explícita de Marx a Nassau Senior,
porém, aparece na 3a Seção – “A Produção da mais-valia
absoluta”, no capítulo sobre A Taxa de mais-valia, em sub-capítulo intitulado
“A Última Hora de Nassau Senior”. Antes de expor a tese de Nassau Senior, Marx
faz uma rápida apresentação da personagem:
Numa bela manhã do ano de 1836, Nassau W. Senior, afamado pela sua ciência econômica e belo
estilo (…), foi chamado de Oxford para Manchester para aí aprender
economia política em vez de a ensinar em Oxford. Os fabricantes elegeram-no
como esgrimista de serviço contra o Factory Act [Lei Fabril, de 1933],
recentemente publicada, e a ainda mais ousada agitação em torno das dez horas.
(…) O professor, por sua vez, estilizou a lição recebida dos fabricantes em
Manchester no panfleto Letters on the Factory Act, as it Affects the Cotton
Manufacture [Cartas sobre a Lei Fabril e como ela afeta a Manufatura do
Algodão], Londres, 1837. Nele pode-se ler, entre outras, a seguinte passagem
edificante”
E Marx prossegue com uma citação de Nassau Senior: “De
acordo com a lei atual, nenhuma fábrica que emprega pessoas com menos de 18
anos pode trabalhar mais de 11 1/2 horas por dia, isto é, 12 horas durante os
primeiros 5 dias e 9 horas aos sábados. A seguinte análise (!) mostra que em
tal fábrica todo o lucro líquido deriva da última hora.” (Marx, 1996, t. 2, p.
339).
Nassau Senior expõe um exemplo com o qual pretendeu
demonstrar que, numa jornada de 11 horas e meia, o valor produzido pelo
trabalhador nas primeiras 10 horas apenas reporia o valor do capital aplicado
(máquinas, matérias primas, salários, etc); a meia hora seguinte supriria a
deterioração (amortização) da fábrica e das máquinas. Donde, prova-se o que se
queria provar: “se as horas de trabalho fossem reduzidas uma hora por dia […] o
lucro líquido seria destruído”. E as consequências seriam trágicas: o
desaparecimento do lucro interromperia a acumulação capitalista, esta
interrupção impediria a continuidade do investimento do capital na produção, as
fábricas fechariam, os trabalhadores seriam lançados ao desemprego e à miséria.
Marx em poucas linhas desmonta a “demonstração” de
Nassau Senior, mostrando que se a jornada fosse reduzida, o capitalista
dispenderia menos em matérias primas, instrumentos de trabalho, amortizações,
etc. A consequência da redução de uma hora na jornada de trabalho seria uma
pequena redução do “lucro” (mais-valia) e não seu desaparecimento.
A história do capitalismo deu razão a Marx e enterrou
as teses de Nassau Senior… mas a lógica que presidia à argumentação deste
último parece permanecer mais viva que nunca.
·
Os epígonos de Nassau Senior
Apresentado como sociólogo especialista em relações de
trabalho, professor da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo e
doutor Honoris Causa da University of Wisconsin (EUA),
José Pastore é peremptório: “a redução da jornada de trabalho como está no
projeto em debate no Congresso Nacional não é viável”. Após estimar que esta
redução provocaria um aumento de 18% nos “custos do trabalho”, explica que isso
“faria com que as empresas tenham pela frente um enorme desafio. Algumas
tentariam passar isso para o preço, mas nem todas conseguem. Aquelas que não
conseguem talvez tenham que optar pela informalidade, que já é enorme no país,
de quase 40%.” (Pastore, 2024)
Ou seja: quem pagaria a conta não seriam os patrões,
mas os consumidores, em razão do aumento dos preços, e/ou os trabalhadores, que
veriam reduzir-se a oferta de vagas formais de trabalho. Ecoando Nassau Senior,
José Pastore profetiza o apocalipse: “uma boa parte [das empresas] simplesmente
quebraria. E isso destruiria uma quantidade de emprego monumental.”
No mesmo diapasão, editorial do jornal O Globo pretende
jogar água fria no entusiasmo dos defensores da PEC que imaginam “que, para dar
conta do trabalho, as empresas contratariam mais funcionários, reduzindo o
desemprego”. Nananinanão. Seria bom demais, mas não é isso que aconteceria,
“pois os empresários não teriam alternativa senão demitir e o emprego informal
cresceria” (O Globo, 2024a). Ou seja, o que nos dizem nesta passagem
não é que o desemprego aumentaria, mas que encolheria o emprego formal e
cresceria o emprego informal; em outras palavras, aumentaria a violação da
legislação do trabalho por parte dos empregadores… os mesmos que seguem sendo
amplamente beneficiados com desonerações e outras isenções tributárias de
bilhões de reais, sem contrapartida alguma.
Não deixa de ser notável que nem o sociólogo da USP,
nem o editorialista de O Globo admitam a hipótese de que os
patrões poderiam vir a ter uma pequena redução de sua taxa de lucro,
empregariam mais gente, pagariam mais salários, gerando mais renda, favorecendo
o aumento da procura de seus produtos e recuperando ao final a pequena perda
inicial. A falta de pejo é de tal ordem que se arvoram, de repente, em
defensores dos trabalhadores informais, lembrados não como modelos do tão
cultuado empreendedorismo, mas como aqueles que “menos têm direitos
trabalhistas” e veriam aumentar as desigualdades que os separam dos
trabalhadores formais. Que ardorosos combatentes contra a desigualdade, não é
mesmo?!
Deixemos de lado editorialistas e especialistas e vejamos
o que nos diz em viva voz o patronato. A Confederação Nacional da Indústria
ameaça: “reduzir a jornada de trabalho pode provocar uma onda de demissões”. O
presidente da Federação do Comércio de Minas Gerais prevê “uma quebradeira das
pequenas e médias empresas em todo o país”. O vice-presidente da Federação das
Indústrias do Rio de Janeiro vai mais longe e adverte contra o “risco ao
crescimento do país”. (Franco, 2024)
·
Sobre a evolução da produtividade do trabalho
Vale a pena examinar com mais atenção à maneira como
nossos Nassaus Seniores contemporâneos manipulam a discussão acerca da relação
entre redução da jornada de trabalho e produtividade do trabalho. Embora haja
abundantes evidências de que a redução da jornada de trabalho favoreceu um
incremento da produtividade do trabalho em vários países, em virtude do menor
desgaste, físico e mental e maior satisfação do trabalhador, o patronato e os
especialistas tupiniquins questionam estas evidências, fornecendo exemplos
duvidosos do contrário.
Em síntese, o que afirmam é que o aumento da
produtividade, caso ocorresse algum, estaria muito longe de poder compensar a
elevação de custos em que incorreriam os patrões – de “estratosféricos” 18%
segundo o professor da Universidade da USP e da University of Wisconsin “(O
Globo, 2024a), a mais de 20%, segundo Ulyssea (2024).
Mas ao centrar a atenção na questão da evolução futura
da produtividade que decorreria, ou não, da redução da jornada de trabalho,
escamoteiam um dado fundamental: a evolução da produtividade do trabalho desde
1988, quando os constituintes rejeitaram a proposta de uma jornada de 40 horas,
constante de Emenda Popular no. 3, subscrita pelo movimento
sindical, e inscreveram na Constituição as ainda vigentes 44 horas semanais.
Nas discussões acerca da evolução recente da
produtividade do trabalho no Brasil são muitos os dissensos e alguns poucos os
consensos. Entre os consensos, merece menção aquele que leva autores das mais
variadas opções teóricas e políticas a concordarem que o crescimento da produtividade
do trabalho entre nós tem sido pequeno e lento se comparado ao de outros
países. Entre os dissensos, o principal é aquele que opõe os ortodoxos, que
explicam o baixo crescimento do PIB pela baixa produtividade do trabalho, e
aqueles, heterodoxos, que ao contrário, atribuem ao baixo crescimento do PIB a
lenta evolução da produtividade do trabalho (Cavalcante & Negri, 2015, vol.
2).
Sejam quais forem as explicações para sua lenta
progressão, é fato inegável que a produtividade do trabalho cresceu. Este
crescimento teria sido da ordem de 30% entre 1995 e 2021, quando se considera o
valor adicionado por hora de trabalho (Veloso et al, 2024).Para o período mais
largo de 1981 a 2019 o crescimento teria sido de 40%, sendo que as quedas
decorrentes da pandemia começaram a ser recuperadas a partir de 2023 (Veloso et
al, 2024).
Assim, mesmo que se aceitassem os prognósticos
pessimistas de que os custos subiriam de forma estratosférica e a produtividade
permaneceria a mesma ou apenas levemente maior, o fato é que nos últimos 40
anos, desde a Constituição de 1988, a produtividade do trabalho avançou de 30 a
40%, sem que os trabalhadores tenham se beneficiado de reduções na jornada de
trabalho.
O dicionário Caldas Aulete informa
que argumento é o “raciocínio que se pretende baseado em fatos e em relações
lógicas (…) usado para se chegar a uma conclusão ou para justificá-la, para
convencer alguém de algo” (Aulete Digital). No caso que aqui se discute, a
pretensão de basear-se em fatos e relações lógicas certamente não se aplica.
·
A retórica da intransigência
Em que se basearia, então, a rejeição da proposta de
redução da jornada de trabalho? Sem evidências ou lógica nas quais se apoiarem,
o que levaria nossos especialistas, professores tão renomados como foi Nassau
Senior a sua época, a rejeitarem mudanças? O que os levaria a prognosticar de
que o efeito será o oposto do pretendido? (Ulyssea, 2024).
A resposta a esta pergunta está contida num precioso
pequeno livro de autoria de Albert Hirschman (1915-2012) intitulado A
retórica da intransigência. De forma rigorosa e consistente, o autor expõe
o modelo argumentativo que estrutura o pensamento reacionário, sintetizando-o
em três teses principais: a tese da perversidade, a tese da futilidade e a tese
da ameaça.
“De acordo com a tese da perversidade, qualquer ação
proposital para melhorar um aspecto da ordem econômica, social ou política só
serve para exacerbar a situação que se deseja remediar. A tese da futilidade
sustenta que as tentativas de transformação social serão infrutíferas, que
simplesmente não conseguirão “deixar uma marca”. Finalmente, a tese da ameaça
argumenta que o custo da reforma ou mudança proposta é alto demais, pois coloca
em perigo outra preciosa realização anterior”. (Hisrschman, 1992, p.15).
Concentremo-nos na tese da perversidade, pois é a que
mais recorrentemente tem sido acionada. Em primeiro lugar¸ Albert Hirschman
destaca que, via de regra, os reacionários raramente confessam sua ojeriza à
mudança proposta; ao contrário, geralmente se apressam a declarar sua simpatia
e sua concordância com os objetivos visados. Podemos imaginar o tom
condescendente e amigável com que anunciam sua concordância com o princípio.
“Sim, dizem eles, a proposta é interessante e os objetivos nobres. Todos
queremos avançar, não é mesmo? Quem poderia discordar de que as jornadas de
trabalho atuais muitas vezes são extenuantes e que seria importante
reduzi-las?”.
Imediatamente, porém, vem o contraponto: “O problema, e
há que reconhecer que os problemas existem no mundo real, nem sempre é fácil
concretizar as melhores intenções e a insistência pode acabar provocando
recuos, em vez de avanços.” É exatamente o que nos diz José Pastore: “A
motivação é ajudar o trabalhador, mas no fim das contas acaba prejudicando” (O
Globo, 2024a).
Alguns, mais sinceros, abrem o jogo, como Roberto
Campos Neto, presidente do Banco Central, que, no 12º Fórum Liberdade e
Democracia, que alardeia: “o Brasil precisa ter uma política pró-empresário”,
porque, afinal de contas, “a gente não consegue, aumentando as obrigações dos
empregadores, melhorar os direitos dos trabalhadores” (O Globo,
2024b).
Albert Hirschman vai ilustrar com vários exemplos os
contextos históricos em que os porta-vozes mais qualificados do pensamento
conservador contestaram a mudança. Assim, por exemplo, a universalização do
direito ao voto, ao invés de favorecer um governo mais representativo e
legítimo, abriria o caminho para a submissão da razão e da ordem à ignorância e
ao barbarismo das massas.
E como se estivesse participando de nosso debate atual,
o autor escreve que é na economia que a tese da perversidade mais se faz
presente: “Na economia, mais que em qualquer outra das ciências sociais, a
doutrina do efeito perverso está intimamente ligada a um dogma central da
disciplina: a ideia de um mercado que se autorregula. Na medida em que essa
ideia é dominante, qualquer política pública que tenha por meta mudar os
resultados do mercado, tais como preços ou salários, torna-se automaticamente
uma interferência nociva em processos benéficos de equilíbrio. Mesmo os
economistas favoráveis a algumas medidas de redistribuição de renda e riqueza
tendem a considerar as medidas de caráter “populista” (…) como
contraproducentes” (Hirschamn, 1992, p. 30).
Preciosa e reveladora a citação de Milton Friedman
(1912-2006), Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 1976 e papa da Escola de
Chicago, em cuja cartilha aprenderam o beabá e os segredos do mercado o
conhecido Paulo Guedes e renomados especialistas já citados: “as leis do
salário mínimo são talvez o caso mais claro que se pode encontrar de uma medida
cujos efeitos são precisamente o oposto dos pretendidos pelos homens de boa
vontade” (Capitalism and freedom, p.31).
·
A legalidade no estado democrático de direita
A inconformidade de Milton Friedman e dos neoliberais
com a existência de uma legislação fixando um salário mínimo e, de modo mais
amplo, de leis que disciplinem as relações de trabalho entre patrões e
empregados expressa a convicção de que a força de trabalho é uma mercadoria
como outra qualquer e que, como todas as demais mercadorias, deve ser
livremente comprada e vendida, sem intervenções “espúrias” que restrinjam a
liberdade dos indivíduos de contratar. É a isto que chamam de “livre
negociação” e é com base na convicção teórica dos economistas e no interesse
pragmático dos patrões que desensarilham suas baionetas para superar o que veem
como “rigidez” da legislação, em favor da “flexibilização”.
Ao criticar a “rigidez”, Gustavo Franco aciona a
já citada tese da perversidade: “A rigidez nas regras trabalhistas leva à
informalidade e segmentações perversas no mundo do trabalho, frequentemente
beneficiando uma elite sindical e discriminando minorias e imigrantes <…>
Faria muito mais sentido propor algo na direção de mais flexibilidade, e não
menos” (Franco, 2024). A proposta de reduzir a jornada, segundo Gustavo Franco,
iria na contramão da necessária “flexibilização” da legislação do trabalho,
imposta pela reforma da lei trabalhista de Michel Temer e celebrada por ele e
seus colegas.
A reforma (Lei No 13.467 de 2017), ocorrida logo após a
cassação do mandato da Presidente Dilma Roussef, revogou um conjunto de
conquistas consagradas na Consolidação da Lei do Trabalho e “flexibilizou” as
condições de contratação e emprego. Ela não cumpriu, entretanto, a promessa de
reduzir a informalidade no mercado de trabalho. Muito pelo contrário
Ou seja: sete anos após a salvadora reforma
trabalhista, o percentual de empregados sem carteira assinada aumentou de 3,9%
no setor privado e de 8,3% no trabalho doméstico, comprovando que
“flexibilização” não passa de fumaça para encobrir a dramática precarização do
trabalho.
Mas se deixamos de lado a patranha de que seria o
excesso de regulação que promoveria o crescimento da informalidade, o que chama
a atenção neste tipo de argumento é que ele supõe que uma lei relacionada às
relações de trabalho terá como efeito uma decisão ‘racional” e consciente dos
patrões de atuarem ilegalmente, contratando trabalhadores à margem da lei –
afinal, é disso que se trata quando se fala de contrato informal, de
trabalhador empregado sem carteira assinada.
Se alguém perguntar aos Francos, Pastores, Campos Netos
e outros próceres do pensamento reacionário se acreditam que os cidadãos devem
cumprir e exigir o cumprimento da lei, sem diferenças de classe, gênero, cor ou
religião, certamente responderão que sim, pois são autênticos democratas. Mas,
neste caso, eles não apenas afirmam que os patrões descumprirão a lei, como se
acomodam com esta infração aberta, deixando claro que, na verdade, somente
defendem o cumprimento daquelas leis que não desafiem as leis do livre mercado,
estas sim soberanas, impositivas, inquestionáveis, acima das leis dos seres
humanos.
E assim avança, entre nós, a implantação do estado
democrático de direita (ou deveríamos dizer da direita?), tolerante com as
ilegalidades contra o trabalhador, intolerante frente a qualquer tentativa de
submeter os capitalistas a regras e normas.
Fonte: A Terra é Redonda
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