Varoufakis: “É possível derrotar Israel”
Em 2 de outubro, às
vésperas do aniversário de um ano do genocídio em Gaza, o
ativista e escritor francês Frank Barat teve esta conversa com o
economista Yanis Varoufakis na
qual ele reflete sobre as implicações de um ano de violência e o papel das
potências mundiais, especialmente os Estados Unidos, na perpetuação do
conflito. Ele analisa a representação da situação pela mídia, o contexto
histórico do sionismo e a importância de movimentos como o Boicote,
Desinvestimento e Sanções (BDS). Varoufakis também enfatiza a necessidade de
esperança, e nos ajuda a entender que as opressões não podem ser compreendidas
ou derrotadas isoladamente. Não podemos enfrentar o genocídio na Palestina nem
dizer “nunca mais, para ninguém” sem entender que ele é consequência de uma
hidra de mil cabeças: o colonialismo, o patriarcado e o capitalismo. Todos os
três geram violência, morte e desapropriação de muitas pessoas, para que outras
possam acumular. Dinheiro, mas, acima de tudo, poder. A libertação da Palestina
só acontecerá se conseguirmos remover o véu e apontar para o coração da besta.
Então, seremos libertados.
LEIA A ENTREVISTA:
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Olá, Yanis. Estamos
muito próximos ao aniversário de um ano do início do genocídio em Gaza. Hoje é
dia 2 de outubro. E, talvez ingenuamente, pensamos que um ano depois não
estaríamos mais falando sobre o genocídio e poderíamos falar sobre um
cessar-fogo. Mas Israel enlouqueceu e começou a bombardear Gaza, o Líbano, o
Iêmen e a Síria. Falo do uso de bombas de uma tonelada, bombas “burras”, como
eles as chamam, em áreas civis. Eu me senti derrotado nos últimos dias. Qual é
a sua análise da situação atual?
A maioria das pessoas
não é nem muito boa nem muito ruim. Foi isso que Hannah Arendt nos ensinou. E,
no entanto, vemos pessoas que não são necessariamente más totalmente
sequestradas pela mentalidade genocida. Vocês viram aquele navio de cruzeiro
que saiu de Tel Aviv com turistas, com mulheres espectadoras, cujo objetivo era
navegar por Gaza para ver a destruição de perto e pessoalmente, para aplaudir
as bombas caindo sobre o povo de Gaza? Mas antes de nos deixarmos consumir pelo
pessimismo e pela tristeza, é importante não perder de vista o que está
acontecendo. E devemos sempre buscar a verdade em uma fonte confiável. Você
sabe que Netanyahu foi a Washington recentemente para delinear sua política de
escalada da guerra e obter o aval do governo Biden, o que ele claramente
obteve. Mas antes que entrasse no avião para voar para os Estados Unidos, o
Knesset (parlamento) aprovou uma resolução, uma declaração. Ela dizia
textualmente, e vou citar apenas um parágrafo: “O Knesset de Israel se opõe
veementemente ao estabelecimento de um Estado palestino a oeste do (rio)
Jordão”. Ou seja, do rio até o mar, nenhum Estado palestino. “A criação de um
Estado palestino no coração da terra de Israel representa um perigo existencial
para o Estado de Israel e seus cidadãos, perpetua o conflito
israelense-palestino – é claro – e desestabiliza a região”.
Há apenas um mês, a
Corte Internacional de Justiça determinou que a ocupação israelense das terras
palestinas a oeste do Rio Jordão é – essa é a linguagem da Corte Internacional
de Justiça – claramente ilegal. A Assembleia Geral das Nações Unidas votou esmagadoramente
em apoio à Corte Internacional de Justiça e conclamou Israel a se retirar dos
territórios palestinos, inclusive de Jerusalém Oriental. Não podemos nos
esquecer do que se trata. Aqui temos Israel, determinado, e não se trata apenas
de Netanyahu. Não vamos nos concentrar em Netanyahu, porque quando você tem uma
votação no Knesset — que, se bem me lembro, foi algo como 69 votos contra 8 — a
favor dessa declaração essencial de que “do rio ao mar não haverá palestinos”,
e é assim que não haverá conflito palestino, é claro, se você se livrar dos
palestinos, não haverá conflito entre Israel e os palestinos.
É disso que se trata.
Para entender tudo, temos de combinar essa recente decisão do Knesset com algo
que David Ben Gurion, o primeiro primeiro-ministro de Israel, disse nos túmulos
de israelenses que, na década de 1950, que foram baleados por palestinos não me
lembro exatamente em que ano, muito perto da cerca com Gaza. Ben Gurion foi ao
funeral e fez um elogio aos israelenses mortos, o que é fascinante porque
começa como você e eu teríamos começado, dizendo: “Não fiquem com raiva dos
palestinos que atravessaram a fronteira e mataram seu povo. Nós teríamos feito
o mesmo se estivéssemos no lugar deles. Nós os expulsamos de suas terras e os
colocamos lá. Nós lhes negamos esperança. Negamos a eles qualquer possibilidade
de voltar para suas casas no futuro. Portanto, isso é algo que temos de
aceitar”. Até aqui tudo bem, certo? E então, nesse infame discurso de Ben
Gurion, ele continua… Ele não segue o caminho humanista, que é encontrar uma
maneira de reconciliar essas pessoas. Ele diz: “Temos de continuar expandindo,
temos de estar armados e temos de matá-los antes que eles nos matem, porque
eles têm uma raiva justa contra nós. E se quisermos manter Israel, um Estado
majoritariamente judeu, somente para o povo judeu e com o direito de retorno
para pessoas que nunca estiveram na região por mil anos, enquanto essas pessoas
das quais nos livramos e colocamos atrás da cerca de Gaza não têm nem mesmo o
direito de visitar suas casas. Agora, é claro, eles vão nos matar, então temos
que matá-los primeiro”. Em conjunto, o discurso de Ben Gurion – antigo, de
1950, em um túmulo de pessoas que foram mortas por palestinos de Gaza – e a
recente decisão do Knesset de que, do rio ao mar, não haverá Estado palestino,
essencialmente, que se houver palestinos remanescentes eles serão escravos
assalariados sem direitos em um Estado de apartheid, bem, aí está a resposta
para tudo o que está acontecendo. Todo o resto são apenas detalhes bobos.
·
Você ouve Biden e seu
Departamento de Estado dizendo, dia após dia, “não queremos que as coisas
agravem-se na região”. No dia seguinte, Israel faz (o ataque) dos bushwhackers,
matando membros do Hezbollah. Biden diz: “Não amplie o conflito ”. No dia
seguinte, é com walkie talkies. Biden diz: “Não amplie”. Eles
bombardeiam e matam Nasrallah da maneira mais horrível, matando centenas de
civis. O que significa, na prática, quando uma potência diz “não amplie a
escalada”, mas, na realidade, não toma nenhuma medida, e sim o contrário: envia
cada vez mais armas? E como nós, o povo, devemos reagir a isso?
Minha avó me ensinou
desde muito cedo que você deve julgar as pessoas não pelo que elas dizem, mas
pelo que elas fazem. Se você continuar armando o agressor sem impor nenhuma
condição, e depois fizer um discurso distinto… Biden não imaginou que Bibi Netanyahu
seguiria o seu conselho. Biden não é um homem estúpido. Ele pode ser muito
velho e quase senil, mas é inteligente o suficiente para saber que não há
maneira possível…. Netanyahu nunca escondeu isso. Sua intenção sempre foi
violar qualquer possibilidade de um Estado palestino em qualquer lugar perto de
Israel ou em qualquer outro lugar do mundo. Ele adoraria que os palestinos
fossem absorvidos por outros países árabes e se tornassem jordanianos,
sauditas, o que fosse. A própria noção de uma nação palestina é uma ameaça à
supremacia de um Estado judeu que não é responsável perante ninguém pelos
palestinos, seja porque eles foram eliminados ou porque foram assimilados por
jordanianos, marroquinos ou egípcios. Netanyahu sempre foi claro. Mas, em
última análise, Biden também foi. Biden, durante toda a sua carreira, por
décadas, tem sido um sionista confesso. E ele tem todo o direito de fazer isso.
Mas temos a obrigação de entender o que isso significa. Não significa ser
pró-judeu. Não significa se preocupar com a vida dos judeus. Não significa
simpatizar com uma nação, o povo judeu, que vem sendo perseguido na Europa há
séculos. Eu sou tudo isso.
Ser sionista significa
aceitar, aderir ao que dizem os colonos brancos, “uma terra sem povo para um
povo sem terra”. Isso é o sionismo: nós viremos como povo judeu, como
sionistas, para a terra da Palestina, que é uma terra sem povo. Eles não são os
primeiros a fazer isso. Os britânicos, quando foram para a Austrália, ao
chegarem, encontraram cinco milhões de aborígenes. Mas imediatamente, para fins
legais, declararam-na terra nullius, uma terra sem povo. Esse
é o início do genocídio. E então começaram a eliminar os aborígenes. E como não
eram pessoas, não era assassinato, não era genocídio. Era como eliminar
cangurus. No momento em que você adota uma mentalidade sionista, de que a terra
da Palestina é uma terra sem povo, bem, o próximo passo é eliminá-los. Quando
Biden diz que é um sionista, ele está dizendo que adota a agenda de Netanyahu e
do Estado israelense: apartheid na melhor das hipóteses e, na pior, eliminação,
genocídio.
A tragédia dos Estados
Unidos é que não são uma democracia, são uma oligarquia com um sistema de
partido único que tem duas variantes, como Twiddledum e Twiddledee [gêmeos do
romance de Lewis Carrol Alice Através do Espelho]. Se Trump for
eleito ou Kamala Harris for eleita, não faz diferença alguma, porque esse
Estado profundo é um Estado de partido único. Esse Estado de partido único está
totalmente comprometido com o projeto sionista. É consistente com vários
interesses das forças econômicas que se escondem por trás do Estado de partido
único em Washington. Um dos interesses, é claro, é usar Israel como uma enorme
base (militar) americana no Oriente Médio para manter os árabes divididos, para
manter seus governos em desacordo com seu próprio povo.
Em segundo lugar,
porque a macroeconomia dos Estados Unidos, e estou falando aqui como
economista, é absolutamente dependente de seu orçamento militar. O orçamento
militar dos EUA é seu programa de investimento, de estímulo macroeconômico.
Quando, em 1991, a União Soviética entrou em colapso, houve conflitos no
Congresso, as empresas farmacêuticas não queriam que todo o dinheiro fosse para
o setor de armas. Gostariam de obter dinheiro para si. Era difícil justificar a
manutenção do orçamento militar no nível em que estava no meio da Guerra Fria.
Ele foi reduzido. Imediatamente, houve uma enorme crise econômica em 1991. E o
que aconteceu?
Os Estados Unidos
invadiram o Iraque. Saddam Hussein era o homem deles. Ele estava lá, “cabrón”,
para usar uma expressão de Roosevelt, que costumava chamar… ele chamava um
ditador latino-americano de “cabrón”, e dizia: “mas ele é
o nosso cabrón”. Saddam Hussein era o “cabrón” deles. Disseram a ele
para desencadear uma guerra muito letal contra o Irã quando o país saiu da
esfera de influência dos EUA com o aiatolá Khomeini. Dois milhões de pessoas
morreram nessa guerra a mando dos Estados Unidos, e Saddam Hussein era seu
agente. Colocaram-no em dívida com o Kuwait, que estava pagando pela guerra.
Após o fim da guerra, o Kuwait exigiu o dinheiro de volta. Os Estados Unidos
sussurraram ao ouvido de Saddam Hussein através do embaixador americano no
Kuwait: “Se você tomar o Kuwait, não nos importaremos”. Era uma forma de
seduzi-lo a entrar no jogo para que pudessem atacá-lo. E mesmo depois que o
exército de Hussein perdeu a guerra para os invasores norte-americanos, é
sabido que a Força Aérea Americana recebeu ordens de esvaziar todos os seus
mísseis de cruzeiro no deserto apenas, apenas para poder comprar um novo
estoque. Esse é outro motivo pelo qual Israel e as constantes guerras no
Oriente Médio são essenciais para os Estados Unidos. Agora eles também têm a Ucrânia.
Essas guerras são essenciais para o equilíbrio macroeconômico. Há muitas razões
pelas quais os Estados Unidos estão completamente ligados ao sionismo. Robert
Fisk, de quem tenho certeza de que se lembram, o maravilhoso jornalista
britânico que passou a maior parte de sua vida no Líbano e nos arredores,
descobrindo o papel letal do Ocidente no Oriente Médio, comentou certa vez que
a libertação da Palestina é importante não apenas porque os palestinos serão
libertados se sua luta for bem-sucedida, mas porque é a única maneira de os
norte-americanos serem livres. A liberdade palestina é, segundo ele, um
pré-requisito para a libertação dos americanos de um regime que usa o Oriente
Médio, da mesma forma que usa a Ucrânia, ou a nova Guerra Fria contra a China,
para manter seu próprio povo com uma venda nos olhos.
·
O que você está
dizendo é que tanto os Estados Unidos quanto Israel precisam desse estado de
guerra permanente, precisam encontrar um novo inimigo toda vez que um
desaparece. Ontem, o Irã respondeu a meses de provocações de Israel. Se
olharmos para a grande mídia, veremos uma inversão da realidade, dizendo que é
o Irã que está provocando Israel. Sabemos que Netanyahu quer entrar em guerra
com o Irã. Minha opinião é que é muito
importante para Israel continuar sendo a única potência nuclear do Oriente
Médio.
Minha resposta é que
devemos sempre usar fontes israelenses e judaicas. Todos os israelenses que
conheço têm uma percepção positiva de Ben Gurion, mesmo que não concordem com
ele politicamente. Cite-o. Pense na carta de Albert Einstein, publicada em um jornal
dos Estados Unidos, na qual dizia estar seriamente preocupado com os políticos
fascistas israelenses, que iriam criar exatamente o que estão criando agora.
Que os defensores do genocídio, os apologistas do genocídio e os facilitadores
do genocídio se oponham a Ben Gurion e Albert Einstein. Acho que essa é a
resposta para sua pergunta. Quanto ao que o primeiro-ministro jordaniano diz,
não me surpreende, porque a Jordânia tem jogado o jogo de Washington na região
de forma contínua e consistente. Ela tem falado da boca para fora sobre os
direitos dos palestinos. Não há dúvida de que eles estão chateados com Israel,
mas não estão dispostos a levantar um dedo para fazer qualquer coisa que se
oponha seriamente ao apartheid e ao genocídio na área a oeste
do rio Jordão. Esses regimes foram cooptados pelos EUA.
Pense no Egito. A
brutalidade do regime egípcio. Neste momento, há centenas de milhares de presos
políticos sob o comando desse ditador, Sisi, o “Generalíssimo”, o “Franco do
Egito”, como eu o chamo. E isso é um grande demérito, uma grande desvantagem para
o povo palestino, porque os apoiadores de Israel adoram apontar a corrupção dos
regimes árabes e como eles não se importam com os palestinos. Não é só isso… Eu
me oponho a essa narrativa de que são 50 e tantos Estados árabes contra Israel.
Os Emirados Árabes Unidos, o Marrocos e o Egito, fizeram a paz com Israel
enquanto Israel fazia a limpeza étnica dos palestinos. Anwar Sadat começou a
fazer isso na década de 1970, quando assinou a paz com Israel sem nenhuma
condição para os palestinos. Portanto, os palestinos são constantemente traídos
por seus próprios parentes no mundo árabe. Eles sabem disso, entendem isso. E é
por isso que o Irã ganhou destaque, porque é um Estado islâmico não árabe. Acho
que agora há uma situação esquizoide. Uma situação que torna muito difícil para
mim comentar sobre o que está acontecendo no Irã e no Oriente Médio em geral.
Deixe-me especificar o que quero dizer com isso. Sinto imensa simpatia pelas
mulheres do Irã, que vivem sob um apartheid de gênero. Meus colegas no Irã são
contra o regime. Eu apoio minhas colegas que são contra o regime. Ao mesmo
tempo, esse regime é o único que apoia os palestinos contra o genocídio, no
contexto do genocídio. E eles têm sido muito, muito comedidos. Você tem razão.
Eles demoraram a retaliar quando Israel bombardeou e matou monstruosamente seus
líderes, os líderes do Hezbollah e assim por diante. Vocês se lembram de alguns
meses atrás, quando foi isso? Eles até mesmo anunciaram quando atacariam Israel
para que Israel, Grã-Bretanha, França, Jordânia, Arábia Saudita e Estados
Unidos, é claro, abatessem seus mísseis porque queriam que fosse… um efeito de
teste, dizendo “não podemos deixar de agir, mas, ao mesmo tempo, não queremos
escalar”. Portanto, temos esse comportamento extremamente contido do regime
iraniano fora do país, e o apartheid de gênero, o autoritarismo e o
fundamentalismo islâmico dentro do país. Esse é outro impedimento.
Nós, esquerdistas,
costumávamos nos deleitar com a ideia de que, digamos, em 1936, 1937, havia “os
mocinhos” e “os bandidos”. Nós, os socialistas e a União Soviética, a união dos
socialistas, a República Soviética contra os nazistas, contra os fascistas e
assim por diante. Bem, isso não existe mais. No final das contas, o Irã é o
único apoiador consistente dos palestinos, ao mesmo tempo em que se comporta
internamente de uma maneira que não posso aceitar. Temos que exalar alguma
esperança, porque corremos um risco muito sério de deprimir a todos. Acho que,
no final, é o que está acontecendo em Israel que determinará se os palestinos
terão uma chance. É verdade que os movimentos pacifistas e progressistas em
Israel estão dizimados. Eles próprios temem por suas vidas. Estou em contato
constante com pessoas em Israel, judeus israelenses, que temem por suas vidas
porque defendem o fim do genocídio. Eles não podem nem mesmo dizer a palavra
genocídio sem serem ameaçados, perderem seus empregos, serem espancados, presos
e assim por diante.
Mas você sabe, eu sou
um eterno romântico. Os jovens que fazem parte do genocídio, movidos pela
adrenalina, em algum momento passarão noites sem dormir com a lembrança dos
corpos dos bebês que assassinaram ou que foram assassinados na frente deles.
Isso os assombrará da mesma forma que os soldados da Guerra do Vietnã, quando
voltaram para os Estados Unidos, reviveram muitas vezes o que haviam feito.
Eles mudaram suas mentes. Pessoas como Oliver Stone, que lutou no Vietnã e
depois voltou e se tornou um ativista contra a guerra.
Essa é, em minha
opinião, a maior fonte de esperança, a resiliência do povo palestino.
Solidariedade internacional e mudanças na sociedade israelense. Porque,
convenhamos, Israel está sendo destruído pelas pessoas que o governam. Para que
serviu Israel? Havia intelectuais progressistas, mulheres escritoras, autores,
poetas, músicos de uma ampla tradição humanista judaica, europeia, mas também
africana. A rica cultura judaica. Isso era uma coisa. Agora, há os colonos, os
colonos da Cisjordânia que estão super-representados no governo com pessoas
como Smotrich e esses maníacos genocidas. Eles estão assumindo o controle do
governo e são um perigo claro e presente para os israelenses humanistas,
progressistas e educados de Haifa.
·
Também vemos a
economia israelense sofrendo imensamente por causa de um ano de genocídio. A
classificação de crédito de Israel foi rebaixada. Seu produto interno bruto
está sofrendo uma forte contração. Dezenas de milhares de empresas fecharam. Um
número crescente de empregos foi transferido para fora do país. E ainda há a
reputação de Israel em escala global. Acabei de ler há alguns dias uma
declaração da Progressive International, uma organização que você ajudou a
fundar: “A violência chocante do regime israelense é uma reminiscência dos
últimos suspiros do apartheid sul-africano, que intensificou sua guerra contra
Angola, Moçambique e Namíbia, à medida que se desintegrava”.
Como na África do Sul,
a libertação dos palestinos é um pré-requisito para a libertação dos
israelenses. Os israelenses vivem com medo e sempre viverãom enquanto fizerem
parte de um regime genocida. O pior medo de um agressor é que outro agressor o
intimide. A violência gera medo na parte que exerce essa violência. Para
concluir essa analogia com a África do Sul, temos o dever de fazer o que
fizemos durante o movimento antiapartheid, o período que levou à libertação, à
libertação de Nelson Mandela e ao fim do apartheid. Boicote, Desinvestimento e
Sanções. O movimento BDS tem a receita certa para acelerar o processo que você
está descrevendo. Assim como foi essencial boicotar, desinvestir e sancionar a
África do Sul. O regime não teria entrado em colapso sem isso. Foi somente
quando o Barclays, a Ford e a Fiat decidiram que não poderiam mais suportar as
críticas e a perda de prestígio perante a opinião pública ocidental.
Quando deixaram a
África do Sul. Os líderes do regime sul-africano não podiam viajar, não podiam
enviar seu dinheiro para o exterior, não podiam usar a riqueza que extraíam da
população negra como bem entendessem. Foi então que sua determinação vacilou. Temos
de fazer o mesmo. Infelizmente, algumas pessoas, e também alguns centristas,
não apenas da extrema direita, na Alemanha, nos Estados Unidos, na
Grã-Bretanha, estão tentando retratar o BDS, o Movimento de Boicote,
Desinvestimento e Sanções, como racista e antissemita. Gente, tomem juízo! O
objetivo do BDS é a não-violência. Aqui você tem apartheid. O Knesset decide
que não haverá nenhum Estado palestino a oeste do Jordão, contra a posição
ocidental de que deveria haver um segundo Estado a oeste do Jordão.
E o que o BDS diz? Não
vamos fazê-lo com armas e bombas, mas vamos fazê-lo através de meios pacíficos,
como boicote, desinvestimento e sanções. E você chama essas pessoas de
antissemitas? O que eles deveriam fazer? Cometer suicídio para… fazer o quê? No
final, as forças, os governos e as potências ocidentais também são humilhados,
porque continuam a insistir numa solução de dois Estados que Israel e o Knesset
decidiram que nunca acontecerá. Então decida-se. Você quer violência, guerra ou
BDS? Não existe uma terceira opção.
Fonte: Yanis
Varoufakis, em entrevista a Frank Barata, no El Salto |
Tradução: Glauco Faria, em Outras Palavras
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