sexta-feira, 25 de outubro de 2024

Consequências da homofobia: LGBTQIA+ e saúde mental

As consequências da homofobia são velhas conhecidas da população LGBTQIA+ no mundo todo. Ao longo da vida, pessoas homossexuais e/ou transexuais – lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgênero, dentre outras à margem do espectro binário de orientação sexual e identidade de gênero – são forçadas a enfrentar uma série de adversidades. Pressão familiar, relações sociais afetadas, bullying, expulsão de casa e exclusão de espaços religiosos, por exemplo, compõem uma pequena parcela da ampla gama de problemas que caem na conta da homofobia.

<><> Histórico da luta anti-homofobia

Na década de 1960, a população LGBTQIA+ enfrentava um sistema jurídico anti-homossexual nos Estados Unidos. Poucos eram os lugares públicos que aceitavam abertamente a entrada e a permanência de gays, lésbicas e travestis. No entanto, o Bar Stonewall Inn era um deles.

Em 28 de junho de 1969, os frequentadores do bar, vítimas constantes de ataques violentos e extorsão policial em um de seus únicos espaços de lazer, finalmente se revoltaram e reagiram à brutalidade sofrida. A data acabaria por se tornar um marco histórico da luta anti-homofobia. Tal evento inspirou movimentos de libertação e reivindicação de direitos no mundo todo.

Em 1973, a Associação Americana de Psiquiatria retirou o “homossexualismo” da lista de transtornos mentais. Isso após décadas de estudos científicos fracassarem em associar a orientação sexual-afetiva a distúrbios de ordem psiquiátrica. No entanto, somente em maio de 1990 a Organização Mundial de Saúde seguiu o exemplo e excluiu a homossexualidade da lista internacional de doenças.

Não é à toa que a terminologia incorreta ainda é tão presente no vocabulário popular. Afinal, o sufixo “ismo” é associado a condições patológicas. Até o final do século passado, a própria ciência estabelecia, erroneamente, a orientação homossexual como doença.

<><> No Brasil

No Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a reconhecer a união estável entre casais homossexuais como entidade familiar em maio de 2011. Ao final de 2019, o país foi o 43º do mundo a criminalizar a homofobia. Os avanços e conquistas da população LGBTQIA+, no entanto, podem ser incômodos para muita gente. Segundo levantamento do Grupo Gay da Bahia, publicado em 2019, a violência homofóbica mata uma pessoa a cada 26 horas no país.

A marginalização e o preconceito se voltam ainda mais violentamente contra transexuais, transgêneros e travestis. Esse grupo registra a baixíssima expectativa de vida de 35 anos no Brasil – metade da média nacional.

No século 21 a transgeneridade e o amor por pessoas do mesmo sexo/gênero ainda são vistos por parte da sociedade brasileira como uma anomalia. Embora após décadas de empenho de movimentos de defesa dos direitos humanos.

Sobretudo, essa visão é reforçada por determinados grupos religiosos. Alguns deles, infiltrados em instituições públicas, como o Congresso Nacional e a Câmara dos Deputados, atuam para dificultar ou impedir o acesso da população LGBTQIA+ a direitos civis básicos.

<><> Como a homofobia afeta a saúde mental?

A Mental Health Foundation, instituição de promoção à saúde mental do Reino Unido, afirma que, segundo estatísticas, pessoas homossexuais e transexuais estão mais suscetíveis a doenças psiquiátricas do que heterossexuais. Os motivos? Consequências da homofobia: desigualdades, desvantagens sociais e discriminação.

Estudos revelam que membros da comunidade LGBTQIA+ são mais propensos a experimentar uma série de problemas de saúde mental. Depressão, ansiedade, pensamentos suicidas, automutilação e abuso de álcool e substâncias são alguns exemplos recorrentes. Essa prevalência pode ser atribuída a diversos fatores, entre eles discriminação, isolamento e homofobia.

<><> Menor qualidade de vida

Além disso, eles correm um risco maior de sofrer crimes de ódio em comparação com pessoas heterossexuais. Entre a população afetada, as mais atingidas pela violência também fazem parte de outros grupos minoritários – étnicos e negros, em particular. E, de acordo com o Instituto Nacional de Estatísticas Britânico (ONS, da sigla em inglês), em 2015, as métricas de qualidade de vida dos membros da comunidade LGBTQIA+ eram mais baixas do que as registradas por pessoas heterossexuais.

<><> Transtornos mentais

Em 2007, um estudo conduzido pelo pesquisador Ilan H. Meyer, do Departamento de Ciências Sociais e Médicas da Universidade de Columbia (EUA), também se debruçou sobre a prevalência de transtornos mentais em pessoas LGBTQIA+. Segundo o autor, os estigmas e as discriminações que rodeiam essas minorias criam em seu entorno um ambiente socialmente hostil. Isso favorece o desenvolvimento de problemas de saúde.

O estudo descreve os processos de estresse vivenciados por lésbicas, gays e transexuais. Estes processos incluem experiências de rejeição, homofobia internalizada e eventos de preconceito, entre outros.

<><> Depressão

Uma pesquisa realizada na Universidade do Estado de Michigan, conduzida por professores de Sociologia da instituição e publicada na revista The Gerontologist, em 2020, reforça as informações apresentadas e acrescenta um dado ainda mais preocupante: membros da comunidade LGBTQIA+ têm mais chances de desenvolver demência na velhice. O estudo explica que estresse e depressão, prevalentes nessas pessoas, são fatores de risco para o prejuízo cognitivo ao longo da vida.

<><> Comprometimento cognitivo

O trabalho foi o primeiro a usar uma amostra nacional (com recorte estadunidense) e uma ferramenta de triagem para avaliar as disparidades de saúde cognitiva entre pessoas LGBTQIA+ e heterossexuais. Com isso, os pesquisadores descobriram que, em média, os LGBTQIA+ eram mais propensos a se enquadrar nas categorias de comprometimento cognitivo leve ou demência precoce em comparação com outros adultos da mesma faixa etária, mas heterossexuais.

A equipe também testou fatores sociais e de saúde específicos, como condições físicas e mentais, estilo de vida saudável e conexões sociais. O único fator relacionado às diferenças cognitivas para as minorias sexuais foi a depressão.

Para o professor Ning Hsieh, responsável por liderar o estudo, a desigualdade social torna grupos menos privilegiados, mais propensos a desenvolver deficiência cognitiva. Ele sugere que uma sociedade mais justa e tolerante com orientações sexuais e identidades de gênero diversas pode ajudar a prevenir a demência e reduzir a carga crescente de problemas de saúde mental.

<><> Homofobia é uma doença?

Em 2015, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Roma Tor Vergata, na Itália, ousou ao publicar um controverso estudo. Ele levantava a possibilidade de se estabelecer a própria homofobia como uma doença mental. Publicado no Journal of Sexual Medicine, o artigo foi o primeiro a sugerir que a verdadeira doença a ser curada seria a homofobia, que possivelmente estava associada a psicopatologias graves.

Embora o próprio estudo não tenha feito menção à homofobia como “doença”, os resultados revelaram algumas evidências que sustentam a hipótese de que o comportamento de pessoas homofóbicas apresenta, de fato, características de um distúrbio psiquiátrico. Para os pesquisadores, há uma associação notável entre aspectos disfuncionais da personalidade e a atitude homofóbica desse grupo. Eles concluem que o psicoticismo e os mecanismos de defesa imatura são capazes de predizer se alguém é ou não homofóbico.

<><> Quais são os impactos da homofobia na sociedade?

Entre abril e maio de 2020, em um contexto de pandemia do coronavírus, foi publicado um relatório com os resultados da pesquisa “Diagnóstico LGBT+ na pandemia”, organizada pelo coletivo #VoteLGBT em conjunto com a Box1824.

Em resposta à pergunta “Qual é a maior dificuldade que você está enfrentando durante o isolamento?”, 42,72% dos participantes disseram ter como principal preocupação a saúde mental. Em seguida, surgiram questões como as novas regras de convívio com 16,58%, solidão com 11,7%, e renda com 10,62%.

Os resultados da pesquisa revelam que a população LGBT+ está ciente das consequências que a homofobia pode impor sobre suas vidas.

Afinal, manter a mente em equilíbrio diante de tantos obstáculos – preconceito, falta de apoio familiar, exclusão dos espaços públicos, necessidade de se esconder sob uma máscara de conformidade social e enfrentamento a questões que envolvem a homofobia no cotidiano, como a discriminação no ambiente de trabalho e nas ruas – exige uma resiliência e o empreendimento de esforços com os quais, comumente, pessoas heterossexuais (especialmente não minorias) não têm de lidar no dia a dia.

<><> Falta de apoio familiar

Além disso, pessoas homossexuais afeminadas e, sobretudo, transexuais e travestis são frequentemente empurradas para a prostituição. Isso devido à ausência de suporte familiar e da impossibilidade, sustentada pela homofobia, de encontrar empregos formais. Aqui é possível traçar um paralelo com o machismo e a misoginia que permeiam a sociedade brasileira. Para o cidadão médio, quanto mais “afeminada” é a pessoa homossexual, menos dignidade ela merece.

Lésbicas, por sua vez, são alvos do chamado “estupro corretivo”, inclusive dentro da família. Não são incomuns casos em que os próprios pais, padrastos, tios ou outros familiares do sexo masculino cometem crimes de estupro contra mulheres lésbicas sob a justificativa de que “elas precisam aprender a gostar de homem”.

<><> Quais os desafios da homofobia no Brasil?

Em âmbito mundial, a ciência e os movimentos formados para assegurar direitos à população LGBTQIA+ têm atuado paralelamente e em conjunto. Assim, aumentam os esforços para encontrar soluções práticas e urgentes que dissolvam, ou pelo menos minimizem, as consequências da homofobia.

Os estudos que se debruçam sobre a prevalência de doenças de ordem psiquiátrica na comunidade LGBTQIA+ são importantes para o enfrentamento e o tratamento adequado dessas pessoas no campo da saúde. Da mesma forma, eles são essenciais para fundamentar políticas públicas capazes de proteger essa população de ataques, crimes de ódio, violências e humilhações.

Além disso, ações e campanhas de combate à homofobia e à violência contra pessoas LGBTQIA+, ainda escassas no país, não são somente necessárias: são urgentes. Afinal, é necessário que todo o mundo entenda que vidas dependem disso. No Brasil, uma vida a cada 26 horas pode ser salva, se nos unirmos contra a homofobia.

 

•        Sororidade: a importância da união entre mulheres

Afinal, o que é sororidade? Se você é mulher e tem o hábito de acompanhar páginas, grupos e referências feministas nas redes sociais, provavelmente já ouviu falar sobre sororidade por aí. A origem da palavra sororidade vem do latim soror, que significa irmã. O termo, em língua portuguesa, evoca a solidariedade e o apoio mútuo entre as mulheres, como alternativa feminina à fraternidade (frater, em latim, significa irmão).

<><> Onde surgiu a sororidade?

O conceito de sororidade começou a tomar forma com os movimentos feministas, sobretudo os norte-americanos, que passaram a se organizar politicamente nas décadas de 1960 e 1970. Para as teóricas e ativistas da chamada segunda onda do feminismo, todas as mulheres, sob o jugo da sociedade patriarcal, compartilham uma característica comum: elas compõem o “segundo sexo”, como estabeleceu Simone de Beauvoir.

Contra a opressão imposta ao gênero feminino, a sororidade é eleita pelas feministas da segunda onda como uma ferramenta de defesa e proteção às violências cotidianas, por meio da união entre as mulheres. A primeira obra a ser reconhecida como referência desse feminismo é, justamente, Sisterhood is powerful (“A sororidade é poderosa”), antologia publicada em 1970 pela norte-americana Robin Morgan.

A partir de 2010, a sororidade desponta como fundamento ético que sustenta o ideal das relações entre as mulheres do século XXI. Isso devido ao fomento do debate sobre o assunto e a popularização de conceitos-chave das diversas teorias de teor feminista. Tais popularizações foram estimuladas pela democratização das mídias sociais. Para além da teoria, o conceito alçou novos voos, alcançando meninas e mulheres de idades, classes, cores e trajetórias diferentes.

<><> “Vamos juntas?”: A sororidade como apoio mútuo entre mulheres

Em 2015, a jornalista Babi Souza criou o movimento “Vamos juntas?”, que não só viralizou nas redes sociais como acabou se tornando um símbolo de sororidade no Brasil. Inspirada pelo medo constante de andar sozinha nas ruas, vulnerável a assédios, abordagens agressivas e perseguições de homens mal-intencionados, Babi lançou nas redes uma proposta a todas as mulheres: “Quando estiver sozinha, olhe para os lados e procure outra mulher. Por que não vão juntas?”.

A ideia rompeu as barreiras da internet e rapidamente tomou os espaços públicos da cidade. No Twitter e no Facebook, por exemplo, pipocavam relatos de mulheres que encontraram em outras mulheres a segurança necessária para exercerem, em paz, o seu direito de ir e vir. O movimento deu origem ao livro Vamos juntas?, publicado em 2016 pela editora Galera, e inspirou garotas em todo o país a praticarem a sororidade em suas relações cotidianas.

<><> Qual é o foco da sororidade?

Segundo o Dicionário Online de Português, o substantivo feminino sororidade é definido como “relação de irmandade, união, afeto ou amizade entre mulheres, assemelhando-se àquela estabelecida entre irmãs”. Buscas pela palavra sororidade também retornam resultados como respeito, igualdade de gênero, empatia e aliança.

Em uma cultura que encoraja a rivalidade feminina e a busca por aprovação masculina a todo custo, a sororidade oferece um caminho mais saudável de conexão entre mulheres, promovendo identificação e reconhecimento entre pessoas que compartilham problemas semelhantes.

É importante destacar que sororidade não é “amar todas as mulheres”, e muito menos concordar com elas o tempo todo. Cada uma de nós é única e carrega narrativas, histórias e lutas diferentes. O ideal da sororidade deve ser buscado em consonância com as nuances biopsicossociais que distinguem nossas trajetórias individuais, como classe, raça, identificação de gênero, etnia, culturas e múltiplas formas de amar, sentir e perceber o outro e o mundo.

Na contemporaneidade, a união entre as mulheres pressupõe mais do que o reconhecimento da condição comum que nos aproxima – o “ser-mulher”. É preciso, sobretudo, enxergar também as características que nos distanciam umas das outras. Por isso, praticar a sororidade envolve assumir privilégios, dar voz a mulheres historicamente silenciadas, promover a escuta ativa e, acima de tudo, exercitar a empatia no seu dia a dia.

Segundo a renomada escritora e feminista nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie: “Qualquer um que entenda o que é o feminismo sabe que ele não busca divisão e, sim justiça. Ninguém que conhece a história do mundo pode dizer que as mulheres não foram excluídas. As mulheres foram excluídas porque eram mulheres.“

<><> Como agir com sororidade?

1.       Esqueça a velha e ultrapassada rivalidade feminina. Mulheres não são suas inimigas naturais. Lembre-se de que, como você, as outras mulheres recebem, em média, salários menores do que homens na mesma função; como você, costumam enfrentar triplas jornadas de trabalho; e, como você, todas já sofreram assédio, agressão sexual ou violência psicológica, em maior ou menor grau. Por isso, se existe um inimigo a combater, ele definitivamente não é outra garota. Para lidar com a desigualdade de gênero, é preciso apoio mútuo. Competir com mulher não está com nada!

2.       Escute, respeite, aprenda e assimile a fala de outras mulheres que vivem realidades diferentes da sua. Não concorda? Converse com educação. Às vezes, ficamos tão concentradas em defender uma verdade absoluta que acabamos perdendo a oportunidade de adquirir novos conhecimentos e descobrir lições valiosas de vida.

3.       Não meça o comportamento de outras mulheres pela sua régua – muito menos quando essa régua utiliza critérios diferentes para medir mulheres e homens. Às vezes, estabelecemos, mesmo inconscientemente, padrões morais e éticos machistas ao avaliar outras mulheres. Antes de criticar uma irmã, pare e pense: por que ela está agindo assim? Se ela fosse um homem, eu a julgaria tanto? Promova a ideia de irmandade feminina em suas avaliações e julgamentos.

4.       Não culpe mulheres vítimas pelas agressões que sofreram. Nada justifica violência, seja física, sexual ou psicológica. Se perceber que alguém precisa de ajuda, ofereça apoio e acolhimento, como gostaria que fizessem por você.

5.       Quando estiver na rua, preste atenção às mulheres que estão ao seu redor. Se notar que existe alguma em situação de risco, finja surpresa e a cumprimente: “Fulana, quanto tempo! Vamos tomar um café?”. Assim, você a ajuda a escapar de um eventual perigo e ainda tem a chance de ganhar uma nova amiga.

 

Fonte: eCycle

 

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