'Precisamos odiar os ultraprocessados para
deixar de comê-los', diz autor de best-seller sobre indústria de alimentos
O médico e escritor
Chris van Tulleken defende que, em prol da saúde pública, alimentos
ultraprocessados recebam o mesmo tratamento dado aos cigarros.
Infectologista do
Hospital de Doenças Tropicais de Londres, professor da Universidade College
London, no Reino Unido, e apresentador de alguns programas na BBC, ele também é
autor do livro Gente Ultraprocessada - Por que Comemos Coisas que Não São
Comida, e Por Que Não Conseguimos Parar de Comê-las (Editora Elefante).
A obra virou
best-seller, ganhou prêmios e foi recentemente traduzida e lançada em
português.
Mas as conexões do
trabalho de van Tulleken com o Brasil são bem mais antigas.
Isso porque o conceito
de ultraprocessados foi desenvolvido pela equipe liderada pelo epidemiologista
brasileiro Carlos Monteiro, professor da Faculdade de Saúde Pública da
Universidade de São Paulo (USP) — que, inclusive, assina o prefácio do novo
livro.
O médico britânico
confessa que duvidou do conceito de ultraprocessados de início e achava que os
malefícios apontados nos estudos estavam relacionados apenas aos excessos de
gordura, açúcar e sal presentes em muitos desses produtos.
Para colocar a ideia à
prova, ele resolveu se submeter a uma pesquisa, em que radicalizou a própria
dieta e passou a comer basicamente alimentos ultraprocessados.
Entre muitos outros
detalhes e informações contidas no livro, ele detalha tudo que passou durante a
experiência.
Em entrevista à BBC
News Brasil, van Tulleken sugere que países e governos tomem ações mais
contundentes para diminuir o consumo de ultraprocessados entre a população.
Na opinião dele, as
grandes redes alimentícias vão destruir as culinárias tradicionais nos próximos
50 anos — e não há muito o que as pessoas individualmente possam fazer para
mudar esse cenário (ou a própria dieta).
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=Confira os principais trechos da entrevista a seguir.
• Você tem uma formação em infectologia e
virologia molecular. De onde surgiu o interesse acadêmico e científico pela
alimentação?
Chris van Tulleken -
Ainda como um jovem médico, trabalhei em países de renda baixa e média,
especificamente na África Central e no Sudeste Asiático. E, como
infectologista, testemunhei crianças morrendo por causa de doenças infecciosas.
Muitas dessas crianças
morreram porque seus pais foram convencidos a comprar fórmulas infantis, muitas
vezes sem condições financeiras, e eles não tinham acesso à água potável para
prepará-las. Muitas vezes, eles também não sabiam como fazer o preparo dessas
fórmulas.
Esse foi o meu
primeiro contato com a indústria alimentícia, sobre a qual faria investigações
no futuro.
Alguns anos depois, eu
participei de alguns programas da BBC nos quais comecei a focar nos
determinantes comerciais da saúde, ou como algumas corporações, principalmente
as empresas que fabricam alimentos, afetam todos nós.
• Você se lembra da primeira vez que ouviu
o termo “alimento ultraprocessado”?
Van Tulleken - Sim,
isso aconteceu em 2009, quando uma produtora da BBC me encaminhou um artigo
científico enquanto estávamos produzindo um documentário sobre obesidade
infantil.
Esse artigo estava escrito
metade em português, metade em inglês, e havia sido publicado num periódico de
saúde brasileiro. Para mim, à época, não pareceu muito importante e ignorei o
assunto por um longo tempo.
Quando finalmente li o
artigo, senti que ali estava a explicação para tudo. Esse foi meu instinto.
Na sequência, fiz
muitas outras leituras e transformei esse tema no meu objeto de pesquisa como
cientista. Passados alguns anos, posso dizer que aquele meu instinto inicial
estava correto e o conceito de ultraprocessado de fato explica como esses
alimentos nos prejudicam
• No livro, você diz que duvidou do
conceito de ultraprocessados, pois achava que os danos relacionados a muitos
alimentos poderiam ser causados pelo excesso de sal, gordura e açúcar. Quais
foram os motivos que levantaram essa suspeita?
Van Tulleken - Como
mencionei, meu primeiro instinto foi que aquele conceito explicava tudo. Mas,
num segundo momento, pensei: será que ele realmente é verdadeiro? Ou será que o
prejudicial desses alimentos é o sal, o açúcar e a gordura?
É difícil explicar a
emoção que senti nesse momento, mas foi um misto de curiosidade com ceticismo.
• Depois desses anos de pesquisa, na sua
opinião, qual a forma mais simples de explicar o que é um ultraprocessado?
Van Tulleken - Se você
pegar um alimento e precisar ler a lista de ingredientes, provavelmente estará
diante de um ultraprocessado.
E, se nessa lista,
aparecem ingredientes que você não encontra em qualquer cozinha ou despensa,
definitivamente está diante de um ultraprocessado.
Esse conceito é uma
maneira de descrever a maioria dos produtos que são feitos por corporações
alimentícias transnacionais.
Há algumas exceções. A
Nestlé, por exemplo, fabrica um cereal de trigo que não é tecnicamente um
ultraprocessado.
Mas a maioria dos
produtos que garantem dinheiro para Nestlé, Danone, Pepsico, Kraft Heinz,
Coca-Cola, Mondelez e outras dessas empresas são ultraprocessados.
Estou conversando com
você de um quarto de hotel e aqui na minha frente há um cesto com uma barra de
castanhas, uma barra de chocolate, chicletes e um pacote de nozes e castanhas
temperadas. Tudo isso é ultraprocessado.
• No livro, você faz comparações entre a
indústria alimentícia e a indústria do tabaco, e também entre ultraprocessados
e cigarros. Na sua visão, quais são as semelhanças e as diferenças entre esses
dois setores e esses dois produtos?
Van Tulleken - Bem,
essas indústrias não são apenas semelhantes. Elas são a mesma coisa.
Em meados dos anos
1980, uma das maiores companhias de cigarro do mundo, a RJ Reynolds, comprou a
Nabisco, uma enorme empresa alimentícia.
Nessa mesma época, a
Philip Morris [indústria tabagista] comprou a General Foods [de alimentos].
Falamos, então, dos
mesmos conglomerados [embora essas empresas tenham sido desmembradas e mudado
de mãos nas décadas seguintes]. Eles usam as moléculas testadas em laboratório
para os cigarros, como os aromatizantes, nos alimentos. Eles usaram as mesmas
técnicas de marketing e as mesmas redes de distribuição para vender comida que
é viciante e danosa, do mesmo modo que fizeram com os cigarros.
Essa comparação,
portanto, é muito legítima.
Hoje em dia, essas
empresas são controladas pelos mesmos investidores institucionais e seguem se
comportando de maneira parecida.
Para mim, é muito
importante que as pessoas entendam que a indústria tabagista não é excepcional
ou um caso único.
Comida, cigarro,
álcool, apostas, combustíveis fósseis e remédios, todos eles são governados
pelo mesmo rol. E todos precisam de algum tipo de regulamentação, com algumas
nuances para casos específicos.
• Nós comumente pensamos que a obesidade
está relacionada a uma conta matemática, que envolve o consumo de calorias, por
meio da alimentação, e o gasto delas, através da atividade física. Essa equação
faz sentido?
Van Tulleken - Quando
pensamos em casos extremos, como um ciclista que faz o Tour de France ou um
nadador olímpico, é claro que eles queimam mais calorias do que uma pessoa
comum.
Mas ser mais ativo não
altera de maneira significativa o número de calorias que você queima.
O que isso significa?
Bem, se um brasileiro desistir de seu trabalho sedentário no Rio de Janeiro
como médico ou jornalista e decidir viver na floresta, num estilo de vida
ancestral, provavelmente ele não vai queimar muitas calorias a mais.
Essa observação parece
contraintuitiva, eu sei, mas ela vem de estudos de altíssima qualidade.
O que as evidências
recentes nos mostram é que um indivíduo, como eu, vai queimar 3 mil calorias
por dia, independentemente se vivo como um caçador-coletor ou se decido
investir na minha carreira de médico e escritor.
E isso explica o
porquê de o exercício ser tão benéfico para nós. Quando fazemos atividade
física, nós meio que “roubamos” essa queima de calorias de outras partes do
corpo.
Ou seja, eu tenho que
tirar energia que seria usada para outras coisas, como a ansiedade, a
inflamação e a produção de altos níveis de hormônios reprodutivos.
O exercício é bom para
nós porque gastamos menos energia com coisas como ansiedade ou inflamação. Mas
ele não chega a modificar significativamente o número de calorias que
queimamos.
No meu capítulo
favorito do livro, explico que a maioria dos estudos que falam o contrário — ou
seja, que nós queimamos mais calorias quando fazemos exercícios — foram
patrocinados pela indústria das bebidas açucaradas.
Ou seja, nós temos
evidências boas e independentes dizendo que o exercício não queima mais
calorias — e um conjunto de estudos que diz o contrário, mas que foi financiado
pela indústria das bebidas açucaradas.
• Ainda sobre essa questão, nos últimos
anos vimos a ascensão e o aumento da popularidade de remédios para tratar a
obesidade. No seu ponto de vista, esses fenômenos — aumento do consumo de
ultraprocessados, crescimento da obesidade e surgimento de novos remédios para
lidar com o excesso de peso — estão de alguma maneira interligados?
Van Tulleken - O
interesse privado não faz dinheiro se resolver a crise da obesidade. Claro,
haveria um grande benefício em termos de saúde pública e economia, mas isso não
beneficia as corporações.
A indústria
alimentícia nos vende comida que engorda porque eles precisam fazer isso. Essa
é a única maneira deles lucrarem. Eles precisam vender alimentos que levam a um
excesso de consumo, a um exagero, para que possam fazer mais e mais dinheiro.
Imagine uma empresa
alimentícia que vendesse comida para satisfazer as pessoas. Ou seja, os
consumidores não precisariam comprar grandes quantidades, apenas o necessário.
Como essa companhia poderia competir?
Acredito que a
indústria alimentícia precisa vender esses produtos para que elas próprias
continuem a existir.
Nesse contexto, faz
muito sentido que as empresas farmacêuticas proponham e vendam soluções para
esse problema na forma de novos medicamentos.
A comparação que faço
aqui é entre o cigarro, a quimioterapia e o câncer de pulmão.
Não é como se a
indústria do tabaco e as farmacêuticas tivessem se reunido algum dia para
combinar: olha, eu causo o câncer e você cria a cura para essa doença.
Claro, é muito
importante celebrar a existência da quimioterapia, que ajuda a tratar muitos
pacientes. Isso é excelente. Assim como é importante ter drogas antiobesidade,
porque elas podem ajudar muitas pessoas.
Mas a quimioterapia
não pode nos distrair da terrível tragédia de saúde causada pelo cigarro, que
vai muito além do câncer.
O mesmo vale para os
remédios que tratam a obesidade. Eles funcionam relativamente bem, mas não são
a solução para todos os problemas relacionados àquilo que comemos. Essas drogas
não curam a ansiedade, a depressão, o câncer, a inflamação, as doenças intestinais
e os problemas cardiovasculares.
Não deveríamos nunca
deixar as pessoas doentes para só depois cuidar delas. Seria muito mais barato
e efetivo melhorar a dieta de crianças, regulamentar a indústria alimentícia e
incentivar que todos vivam de forma saudável.
Isso é algo factível,
basta apenas limitar o poder da indústria alimentícia.
• No livro, você diz que não deseja passar
recomendações de dieta ou mudar a alimentação de ninguém. Por que você tomou
essa decisão?
Van Tulleken - O livro
faz uma reflexão sobre o tema, mas não tem a pretensão de oferecer dicas
práticas para o dia a dia. E o primeiro motivo disso é porque não existem
soluções para o indivíduo.
Eu, inclusive, convido
as pessoas a lerem o livro enquanto comem alimentos ultraprocessados. Ao final,
muitos leitores me disseram que não queriam mais ingerir aquilo.
A verdade é que, mesmo
assim, não existe uma solução. Por mais que a pessoa se sinta enojada com esse
tipo de comida, é praticamente impossível evitá-la no dia a dia.
Você trabalha num
escritório da BBC em Londres, e a comida vendida aí é ultraprocessada. Mesmo se
você sair do prédio e decidir fazer uma refeição em algum estabelecimento nas
proximidades, a grande maioria deles vai vender apenas ultraprocessados.
Esses alimentos estão
nos postos de gasolina, nos aeroportos e praticamente em todo o lugar. Eles nos
cercam, não importa onde vamos. E, muitas vezes, os ultraprocessados são a
única comida que as pessoas conseguem pagar nos supermercados. Então, me parece
um tanto cruel sugerir que elas deixem de consumi-lo.
Parte da minha decisão
de não indicar mudanças de dieta vem dessa falta de esperança, de não achar
muito gentil dizer às pessoas para mudar.
Estou verdadeiramente
interessado no sistema alimentar. E desejo que o livro reduza a vergonha e o
estigma que as pessoas sentem em relação à comida.
Eu conversei com
muitos cientistas que trabalham na indústria alimentícia, e eles são muito
claros ao dizer que fazem uma engenharia para alterar a comida, de modo que a
gente não consiga parar de comê-la.
Então meu livro tem
como objetivo dizer que o problema não está nas pessoas, mas em todo o sistema.
Com isso, quero dizer que, se você não consegue deixar de comer esses produtos,
não precisa se punir.
• Mas existe algum lugar do mundo em que
essa regulamentação sobre os produtos ultraprocessados funciona? Na sua visão,
quais seriam as maneiras de mudar esse sistema?
Van Tulleken - Chile,
México e Argentina têm políticas públicas muito boas neste sentido. O Brasil
também está desenvolvendo coisas interessantes.
Recentemente, dei uma
palestra na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e um colega mexicano que
estava na plateia comentou que, apesar de todos os alertas incluídos nas
embalagens e de todos os impostos sobre ultraprocessados em voga no país, as
pessoas ainda sofriam com obesidade.
Na minha visão,
precisamos nos valer dos mesmos meios utilizados para o controle do tabaco.
Precisamos de um sistema de alerta nas embalagens que seja maior que as
logomarcas das empresas ou dos produtos. Precisamos taxar de forma agressiva os
piores alimentos. Precisamos banir qualquer propaganda. E precisamos proibir a
venda deles para as crianças.
Em última análise,
precisamos pensar em maneiras de limitar o poder dessas corporações, porque
esse sistema atual é ruim para todo mundo. É ruim para os negócios e para a
economia. É ruim para quem é saudável ou quem sofre com doenças. É ruim para as
empresas de pequeno e médio porte que fazem comida boa.
Ah, e também
precisamos nos livrar dos conflitos de interesse.
No Reino Unido, o
British Medical Journal acabou de publicar uma análise sobre o Comitê
Científico Consultivo de Nutrição [um grupo que fornece subsídios para as
políticas públicas sobre alimentação do país].
Os dados mostram que
65% dos membros do comitê receberam dinheiro de indústrias alimentícias, de
empresas como Coca-Cola, Nestlé e Danone.
Ainda no Reino Unido,
o Science Media Centre [um grupo que faz assessoria de imprensa relacionada a
temas científicos] é ou já foi patrocinado por Nestlé e Procter & Gamble.
Temos departamentos de
pesquisa e cientistas sempre citados pela imprensa que recebem verbas de
Pepsico, Mars e Nestlé.
Há médicos,
influencers e organizações de saúde, como a Fundação Britânica de Nutrição, que
são financiadas por Coca-Cola e outras companhias.
Ou seja, enquanto não
encararmos esse dinheiro da indústria alimentícia como algo sujo, não vamos
acabar com todos esses conflitos de interesse.
• Você vê alguma diferença na forma de
atuação dessas empresas alimentícias em países ricos e pobres?
Van Tulleken - O
problema é global, acontece em todos os lugares. Vou te dar um exemplo prático.
Em 2016, a rede de pizzarias Domino's abriu 1.281 novas lojas, ou uma a cada
sete horas, a maioria delas fora dos Estados Unidos. Atualmente, a Índia possui
ao redor de 1.500 unidades de Domino's.
No oeste da África,
vemos o crescimento do Kentucky Fried Chicken (KFC) e de outras grandes redes
de fast food. O mesmo acontece na China.
Em todos os lugares,
crianças pequenas tomam cada vez mais fórmulas infantis, que são piores em
termos de saúde quando comparadas à amamentação.
O projeto da indústria
de alimentos ultraprocessados parece querer destruir todas as dietas
tradicionais. Na Itália, as cafeterias viraram Starbucks e as pizzarias foram
convertidas em Pizza Hut. O mesmo acontece no Brasil, no Reino Unido, nos
Estados Unidos…
Mesmo lugares com
culturas gastronômicas muito fortes, como Itália, França e Espanha, ficam cada
vez mais vulneráveis.
Ou nós limitamos o
poder dessas corporações da mesma maneira que fizemos com a indústria do
tabaco, ou todas as dietas tradicionais serão destruídas nos próximos 50 anos.
• Por que você decidiu submeter a si mesmo
a uma experiência de consumo de ultraprocessados?
Van Tulleken - Bom, eu
quis ser o primeiro paciente da pesquisa que estamos conduzindo sobre o
assunto.
Sinceramente, eu não
achei que o fato de aumentar o consumo de ultraprocessados mudaria algo em
minha vida.
Mas, na prática, tive
efeitos muito significativos na saúde, o que está totalmente alinhado com a
literatura científica publicada sobre o assunto.
• Você detalha todos esses efeitos no
livro, mas poderia dizer quais emoções sentiu durante a experiência?
Van Tulleken - A
primeira semana foi bastante divertida. Mas, a partir da segunda, comecei a me
sentir mais cansado, porque os ultraprocessados são muito salgados. E isso
causa desidratação e constipação, pois eles também são pobres em fibras.
Ou seja, eu acordava,
comia mais do que precisava e dormia de novo. Daí acordava durante a noite com
vontade de ir ao banheiro, fazer xixi, e beber água. Mas parei de fazer cocô
regularmente. Ou seja, minha bunda começou a doer e meu sono ficou cada vez pior.
Daí, como você come
mais durante o dia, sente que não tem controle sobre a dieta. Me senti horrível
nessa segunda semana de experiência.
Mas só percebi isso
quando parei de ingerir comida ultraprocessada.
Nós vemos esse
comportamento nas crianças. Quando estão com fome, elas não verbalizam esse
sentimento. Elas simplesmente ficam mais nervosas, bravas e irritadas com todo
mundo.
E eu senti o mesmo.
Ficava furioso com meus familiares e me tornei uma pessoa difícil de conviver.
Mas achava que o problema era sempre os outros, nunca eu mesmo.
Porém, no meio da
experiência, uma cientista brasileira falou uma frase que mudaria tudo. Ela me
disse: “Isso que você está comendo não é comida de verdade”.
Essa frase girou uma
chave no meu cérebro. A partir daquele momento, não tive mais vontade de comer
ultraprocessados.
Esse, aliás, foi outro
motivo para convidar os leitores a continuar comendo ultraprocessados enquanto
leem o livro.
• Mas, ao fim do experimento, você
realmente conseguiu deixar de comer ultraprocessados?
Van Tulleken - Eu
deixei de comê-los quase que completamente. Eventualmente até perdi peso, mas
não posso prometer que isso vai acontecer com todas as pessoas.
No entanto, se você
for capaz de eliminar os ultraprocessados, existe alguma evidência que isso
pode ser útil para o processo de emagrecimento.
Mas, na minha opinião,
a única maneira de eliminar os ultraprocessados de nossas dietas é começar a
odiá-los.
Por isso que o livro
foi escrito de um modo para que você odeie esse sistema alimentar, em vez de
odiar a si próprio.
• E como foi a reação à publicação do
livro no Reino Unido? Como as empresas mencionadas reagiram?
Van Tulleken - O livro
se tornou popular no Reino Unido e sou muito grato por isso. E a indústria
reagiu de duas maneiras diferentes.
O primeiro contato que
recebi foi do McDonald's. Eles enviaram um email, que pensei ser um processo
judicial ou uma liminar para recolher os livros das gráficas e das lojas.
Mas, na verdade, eles
me fizeram um convite para virar embaixador da marca.
Na sequência, todas as
empresas alimentícias me ofereceram enormes somas de dinheiro para dar
palestras. Algo como US$ 50 mil [R$ 283 mil, na cotação atual] para conversar
com eles por uma hora.
Obviamente, disse não
para todos esses convites.
Logo depois, começaram
a aparecer processos jurídicos e queixas legais contra a editora que publicou o
livro.
Felizmente, o livro
foi escrito com muito cuidado e passou por muitas leituras de diversos
advogados antes da publicação. Então nenhum desses processos foi bem-sucedido.
Mas não deixa de ser
estressante lidar com essas queixas e gastar horas para respondê-las.
Fonte: BBC News Brasil
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