BRICS é cada vez mais visto como
grupo-chave para romper cadeias de dependência econômica
Líderes de dezenas de
países emergentes vão se reunir na cidade de Kazan, ao sudoeste da Rússia, para
discutir cooperação política, econômica e de segurança ao longo da próxima
semana durante a cúpula dos BRICS.
A XVI Cúpula do BRICS
começa a partir desta terça (22) e terá entre seus desafios a revisão de novas
adesões ao bloco, bem como o estabelecimento de mecanismos que permitam a
desdolarização e medidas necessárias para a consolidação da multipolaridade,
consideraram especialistas entrevistados pela Sputnik.
A cúpula, a ser
realizada na cidade russa de Kazan, teve a participação confirmada de um total
de 32 países. O lema da presidência russa dos BRICS em 2024 é
"Fortalecendo o Multilateralismo para o Desenvolvimento e Segurança Global
Equitativos".
Cada vez mais isolada
dos países ocidentais, a Rússia tem anunciado o encontro das economias
emergentes como seu maior evento de política externa, mas analistas acreditam
que não será fácil realizar qualquer acordo substancial.
Para analistas ouvidos
pelo site South China Morning Post, a expectativa em torno do encontro dos
BRICS envolve inclusive a possibilidade de se obter consenso e conquistas
cooperativas, uma vez que as expectativas em torno de um grupo com mais
membros, mercados e uma população maior são igualmente maiores.
Além disso, a cúpula
ocorre no momento em que a governança global encontra-se “severamente
enfraquecida” por conta da guerra em Gaza, e os BRICS podem ser uma “narrativa
alternativa” para países asiáticos, africanos e latino-americanos que queiram
se distanciar dos países ocidentais.
"Em um contexto
global em que os países em desenvolvimento lutam para quebrar as cadeias da
dependência econômica, o BRICS se apresenta como um grupo com um potencial
fundamental para alcançar uma maior independência", considerou o analista
boliviano Martín Moreira em entrevista à Sputnik.
Com isso, o BRICS
seria um esforço para desafiar inclusive o papel arraigado do dólar
norte-americano e o peso dos países ocidentais nas instituições internacionais
– das instituições de Bretton Woods ao Conselho de Segurança da ONU.
A reunião também seria
uma forma de a Rússia mostrar que continua sendo um país influente em termos
globais – desde a invasão à Ucrânia em 2022, a economia e o sistema financeiro
da Rússia passaram por diversas sanções por parte dos Estados Unidos e de outros
mercados ocidentais.
Tais medidas incluem o
banimento de instituições russas do Society for Worldwide Interbank Financial
Telecommunication (Swift), sistema de mensagens de pagamento internacional, que
efetivamente negou a eles acesso a mercados internacionais – e a cúpula dos
BRICS pode ser a abertura que a Rússia precisa para pressionar por um sistema
de pagamentos alternativo.
A associação não só
representa quase metade da população do planeta, mas também é responsável por
mais de 37% do PIB mundial. Para Wilmer Depablos, analista internacional e
ex-diplomata venezuelano, o grupo comercial já enfrenta o G7.
"A tendência para
2028, dita pelo próprio presidente Vladimir Putin, é que o BRICS se consolide e
atrás estará o G7, atrás estará o dólar, atrás estará o SWIFT e atrás estará a
hegemonia desse mundo unipolar que hoje enfrenta o nascimento do novo mundo
multipolar e plural", destacou.
O analista
internacional argentino Sebastián Schulz disse em diálogo com a agência que
entre os membros do BRICS, há um consenso de que atravessam atualmente um
"ponto de virada" a nível global.
"Não só a crise
do Ocidente está piorando, [mas também] a crise da hegemonia norte-americana,
com cada vez menos capacidade para disciplinar o mundo emergente e para
fornecer o que se chama de bens públicos globais ao resto da ordem
internacional", ele explicou.
Nesse sentido, o
economista e professor venezuelano Jorge Pérez destaca o potencial da aliança
para transcender o econômico e permitir alianças políticas, considerando os
desafios representados pelas disparidades internas do grupo.
No mesmo sentido,
pronunciou-se Schulz, destacou que apesar das disputas históricas que existem
entre os países que são membros ou aspiram a aderir ao grupo, como é o caso
entre Índia e Paquistão, há a convicção dos Estados sobre o papel da economia
global que a associação está desempenhando.
"A quantidade de
países que solicitaram adesão ao BRICS expressa a decisão de todas essas nações
de fazerem parte do debate para a estruturação de uma nova ordem internacional
e o reconhecimento do BRICS como um espaço legítimo para a realização desses
debates naquele espaço", destacou o especialista.
Neste sentido, o
especialista destacou que será necessário definir a forma como os países
candidatos à adesão ao grupo BRICS poderão acessá-lo, ou seja, se será massivo,
gradual, ou se uma nova categoria será emergir não como Estado-membro, mas como
um Estado associado. Por exemplo, Cuba solicitou recentemente a adesão como
"país parceiro".
Dora Isabel González,
acadêmica da Faculdade Mexicana de Estudos Superiores Acatlán da UNAM, afirmou
que o grupo está em um "processo de maturidade" em sua consolidação.
"É um contrapeso, mas vai depender muito do movimento que eles fizerem
porque também tem questões delicadas", afirma.
Na América Latina, o
BRICS representou uma oportunidade para os países em desenvolvimento
impulsionarem as suas economias.
"Um dos aspectos
mais esperançosos é a possibilidade de mais países latino-americanos, como a
Bolívia, entrarem no grupo. Este passo pode marcar o início de uma nova era de
multilateralismo, onde os países em desenvolvimento terão uma plataforma de intercâmbio
mais equitativa", considera Martín Moreira.
Para Schulz, a
integração da região, a qual considera uma das mais desiguais do mundo, ainda é
um desafio à cúpula do BRICS, devido aos processos de interferência dos EUA
através da promoção de golpes de Estado ou "golpes suaves" e lawfare
(guerra legal), entre outros.
<><> Passos
para a desdolarização
Outro dos principais
temas que serão abordados na cúpula será a consolidação dos mecanismos
monetários para o comércio entre os membros com foco na desdolarização.
"[Os mecanismos
monetários para conduzir o comércio sem depender do dólar devem ser] decididos,
considerando opções como o uso do yuan, a criação de uma moeda digital
lastreada em ouro ou de uma cesta de moedas, e um sistema de compensação
semelhante ao SWIFT, como a BRICS Bridge", comentou Emilio Hernández,
analista político, para a Sputnik.
Por sua vez, a
analista mexicana Dora Isabel González considerou que o BRICS "está se
distanciando do dólar e já procura modalidades mais frescas; estão saindo,
digamos, desta fronteira muito sólida" imposta pelo Ocidente.
Embora o presidente da
Rússia, Vladimir Putin, tenha expressado recentemente que neste momento não
está na agenda discutir o surgimento de uma moeda comum, na cúpula, serão
abordadas medidas para facilitar as transações.
¨ Brasil e Rússia discutem comércio e sistemas de pagamento no
Conselho Empresarial do BRICS
Encontro do Conselho
Empresarial do BRICS ocorreu neste sábado (19) em Moscou, na Rússia. O
vice-presidente de Assuntos Corporativos, Jurídicos e Compliance da BRF Brasil,
Bruno Ferla, representou o país e ressaltou também importância de parcerias na
área da indústria de tecnologia e fertilizantes.
"As discussões
foram realizadas basicamente em grupo, mas, em particular com a Rússia,
discutimos muitas barreiras comerciais e a indústria de fertilizantes.
Portanto, esses são tópicos que surgiram no grupo de trabalho de
agronegócio", disse Bruno Ferla à Sputnik.
Sobre os sistemas de
pagamento transfronteiriços, o representante brasileiro afirmou que o painel
explorou "a forma de integrar os países do BRICS", destacando sua
importância. "O sistema financeiro é algo que temos discutido muito. Mas
precisamos materializar algumas dessas etapas. Então, durante 2025, acho que
será o momento para fazermos isso", contou.
Ferla descreveu as
sanções financeiras que o Ocidente impôs ao comércio internacional com a Rússia
como um obstáculo para aumentar as exportações. Diante disso, defendeu que o
Brasil precisa trabalhar com a China, além da Rússia, para resolver a questão.
"Muitos tópicos
foram discutidos e acho que agora é o momento para as empresas também colocarem
suas necessidades no papel e materializá-las. Mas não há nada a esse respeito
que será assinado na cúpula da próxima semana", destacou.
<><> Brasil
priorizará agricultura, tecnologia e finanças durante presidência do BRICS em
2025
"Acredito que as
questões agrícolas são muito importantes para o Brasil e tentaremos colocá-las
no topo da lista para discussão. Mas também a tecnologia. Temos uma indústria
de tecnologia muito importante e todos os outros países do BRICS, especialmente
a Rússia e a China, também se desenvolveram bastante em termos de tecnologia.
Portanto, a tecnologia também estará presente", acrescentou.
Ferla destacou a
presidência da Rússia no BRICS, que termina no fim do ano, como
"impressionante". A cúpula dos líderes do grupo será realizada na
cidade de Kazan de 22 a 24 de outubro.
¨ Países do BRICS possuem mais de 20% das reservas de ouro
globais, calcula Sputnik
Mais de 20% das
reservas de ouro do mundo pertencem aos países do BRICS, sendo que a Rússia e a
China detêm a maior parte delas, calculou a Sputnik usando dados do Conselho
Mundial do Ouro (WGC).
Assim, no final do
segundo trimestre de 2024, o total das reservas mundiais de ouro era de 29,03
mil toneladas.
Dessas, 6,2 mil
toneladas, ou 21,4%, estavam na posse dos países do BRICS, com exceção do Irã e
da Etiópia, que não divulgaram seus dados.
A Rússia detém a maior
quantidade de ouro entre os países do BRICS – 2,34 mil toneladas. Isso
representa 8,1% das reservas mundiais e 37,6% das reservas do BRICS.
A China tem cerca de
2,26 mil toneladas, o que equivale a 7,8% do ouro mundial e 36,4% das reservas
dos dez países do BRICS.
Barras de ouro (imagem
de referência) - Sputnik Brasil, 1920, 06.09.2024
Panorama internacional
Preferência pelo ouro
por bancos centrais africanos: um novo e duro golpe para a hegemonia do dólar
6 de setembro, 20:40
Menos de 3% das
reservas mundiais de ouro são mantidas pelos demais membros da associação –
Índia, Arábia Saudita, Brasil, Egito, África do Sul e Emirados Árabes Unidos.
1.As reservas da Índia
no final do segundo trimestre deste ano atingiram 840,76 toneladas (13,5% de
participação no BRICS);
2.As reservas da
Arábia Saudita são de 323 toneladas (5,2%);
3.As do Brasil são de
129,7 toneladas (2,1%);
4.As do Egito são de
126,57 toneladas (2,03%);
5.As da África do Sul
são de 125,44 toneladas (2,02%);
6.As dos Emirados
Árabes Unidos são de 74,5 toneladas (1,2%).
Barras de ouro (imagem
referencial) - Sputnik Brasil, 1920, 03.09.2024
Panorama internacional
Mesmo com alta nos
preços, compras de ouro por bancos centrais têm maior nível desde janeiro
3 de setembro, 18:51
Ao mesmo tempo, entre
todos os países do mundo, as maiores reservas de ouro pertencem aos Estados
Unidos – 8,1 mil toneladas, ou quase um terço de todas as reservas mundiais.
Em seguida, vêm:
a Alemanha – 3,35 mil
toneladas (11,6%);
A Itália – 2,45 mil
toneladas (8,5%);
A França – 2,44 mil
toneladas (8,4%).
A Rússia completa os
cinco primeiros.
A pesquisa foi
efetuada às vésperas da 16ª Cúpula do BRICS em Kazan de 22 a 24 de outubro, o
principal evento da presidência russa da associação.
O BRICS é uma
associação interestatal criada em 2006. A Rússia assumiu a presidência do BRICS
em 1º de janeiro de 2024.
O ano começou com a
entrada de novos membros na associação: além da Rússia, Brasil, Índia, China e
África do Sul, o BRICS agora inclui o Egito, Etiópia, Irã, Emirados Árabes
Unidos e Arábia Saudita.
¨
Ranking universitário
do BRICS desafiará conceito ocidental da 'boa universidade', indicam analistas
A criação de rankings
de universidades dos países do BRICS foi tema do Fórum de Reitores do BRICS,
que ocorreu nesta sexta-feira (18) na cidade russa de Kazan. Pontos e
princípios de uma plataforma comum para a classificação foram debatidos no
encontro.
Professores
universitários que estão acompanhando e participando desse processo conversaram
com a Sputnik Brasil e ressaltaram que a iniciativa tem potencial inédito para
alavancar transferências tecnológicas e projetos colaborativos emancipatórios.
Diretor do Escritório
de Governança de Dados Institucionais (EGDI), da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG), o professor Dawisson Lopes integra a delegação da universidade
mineira que participa das discussões nos trabalhos preparatórios para a cúpula
dos chefes de Estado do BRICS.
Segundo ele, a
existência de um ranking do grupo tende a aumentar a visibilidade das
instituições de educação superior dessas nações, que nem sempre aparecem nos
rankings tradicionais, ocidentais, muito influentes no mundo atual.
"Serve também
para criar novos parâmetros, propor novas balizas e também para desafiar uma
visão muito estabelecida e forjada pelos europeus do que é ou do que deve ser a
boa universidade. Temos uma chance importante com essa ferramenta que vai sendo
proposta, de esculpir um novo conceito, uma nova ideia de boa universidade.
Cada uma das nossas instituições de educação superior colocar o seu tijolo na
construção, que deve ser coletiva", opinou o professor.
Doutor em ciência
política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e secretário de
universidades e formação integral do Centro de Integração e Cooperação
Rússia-América Latina (CICRAL), o cientista político Boris Perius Zabolotsky
chamou a atenção para o viés parcial dos rankings universitários hegemônicos.
"Os rankings
ocidentais e internacionais, como os QS World University Rankings e o Times
Higher Education (THE), costumam dar preferência a universidades do Ocidente e
anglo-saxônicas, espelhando práticas e prioridades acadêmicas focadas nos
países desenvolvidos", pontuou ele.
Zabolotsky apontou que
elementos como a publicação em periódicos em inglês e o financiamento para
pesquisas tendem a favorecer universidades americanas e europeias.
"Um ranking
voltado para o BRICS usaria critérios que considerem as particularidades desses
países, tais como desigualdade social, inovação, transferência de conhecimento
para o desenvolvimento nacional e o conhecimento dos povos originários", argumentou.
O ranking dos países
do BRICS tende ainda a favorecer as publicações nos idiomas locais e reconhecer
a relevância de projetos focados nas realidades de cada país, frisou o
cientista político.
"A classificação
BRICS poderia destacar a colaboração Sul-Sul e a função pública das
universidades no reforço de políticas sociais e industriais nos países do
grupo, espelhando uma estratégia mais ajustada às demandas específicas de cada
país", afirmou Zabolotsky.
O professor da UFMG
lembrou ainda que o incremento do intercâmbio entre parques técnicos,
científicos e acadêmicos dos países do grupo trará trocas significativas e
frutos concretos na seara do conhecimento tecnocientífico acadêmico.
"Quando se fala
em BRICS, a gente envolve algumas das principais academias do mundo, sobretudo
a chinesa e a russa, que têm universidades do mais alto nível, prêmios Nobel
acumulados e saberes já muito consolidados. Mas há também uma emergência muito
importante da academia iraniana, por exemplo, da academia indiana, da academia
sul-africana. As trocas estabelecidas entre esses países auxiliarão o Brasil na
busca pelo desenvolvimento socioeconômico da sua população […]. Países como
Emirados Árabes Unidos têm internacionalizado muito sua academia, e, portanto,
acho que as trocas que vão acontecer entre esses países levarão necessariamente
a um estágio superior de desenvolvimento das academias dos países BRICS."
Lopes salientou que a
UFMG tem desenvolvido uma série de iniciativas bilaterais com os países do
BRICS, entre eles a Rússia, com visitas de cortesia dos reitores e iniciativas
pontuais, como a de ensino da língua portuguesa para estudantes russos.
A Escola de Verão
Brasil-China em Estudos Jurídicos é outra iniciativa criada neste ano, destacou
também, que envolve estudantes da UFMG e de uma universidade chinesa, a
Huazhong University of Science and Technology (HUST), para se concentrar nos
conhecimentos jurídicos dos dois países.
Zabolotsky também
destacou que a iniciativa pode fortalecer um senso de pertencimento a um
"projeto comum de descolonização do internacional" e de
multipolaridade, frente ao legado do poder colonial, moderno e eurocêntrico.
"Essa produção de
conhecimento [ocidental] favorece as epistemologias e abordagens do Norte
Global e, ao mesmo tempo, coloca os países do Sul Global como reféns de um
modelo que não é feito para suas realidades", concluiu ele.
Fonte: Sputnik Brasil
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