Campo chinês: modernização sem latifúndio
Com o estabelecimento
da República Popular da China, em 1949, o Partido Comunista liderado pelo
presidente Mao substituiu o sistema feudal de propriedade da terra pela
coletivização, um tipo de sistema de produção agrícola no qual vários
agricultores seriam envolvidos em propriedades como uma empresa conjunta.
Naquela época, a porcentagem da população rural era de 90%, enquanto a
população urbana era de 10%, o que significa que o sistema de produção agrícola
não era capaz de alimentar a população.
Durante o primeiro
plano quinquenal (1953–1957), foi formado um conjunto completo de sistemas de
serviços de suporte de máquinas agrícolas do nível central ao local e os
camponeses foram mobilizados para participar ativamente do uso de máquinas
agrícolas. No início da década de 1950, a China era uma aliada próxima da União
Soviética e aceitava o modelo econômico soviético, incluindo a propriedade
estatal de bens de capital, como matérias-primas, instalações, máquinas e
ferramentas usadas na produção de bens e serviços, fazendas coletivas e
manufatura industrial estatal. No entanto, o sistema econômico planejado
centralmente administrou as fazendas mecanizadas estatais e as estações de
tratores muitas vezes em contradição com a produção e gestão da economia
camponesa coletiva. Em 1958, o Estado decidiu eliminar o sistema operacional
centralizado das estações de tratores estatais e adotou um sistema
descentralizado para distribuir as tarefas e responsabilidades às comunas
populares. Em 1960, quase todas as estações de tratores foram transformadas em
estações de tratores de comunas populares. No entanto, devido a uma base
econômica fraca, muitas comunas não conseguiram atingir níveis de produção em
larga escala.
No final da década de
1970, a China inicia uma série de reformas no campo, começando pelo
desmantelando o sistema de terras comunais e a substituição pelo sistema de
responsabilidade familiar, disseminando terras agrícolas para os agricultores
com base em um princípio igualitário, resultando em milhões de pequenos
agricultores com lotes pequenos e fragmentados. A produção e distribuição de
máquinas agrícolas foram institucionalizados. Muitas novas indústrias nacionais
de máquinas agrícolas foram estabelecidas. Todo município passou a ter que
criar uma empresa municipal de tratores. A indústria de máquinas agrícolas foi
liberalizada e os agricultores começaram a usar máquinas agrícolas de forma
independente. O Estado reduziu e, às vezes, isentou os impostos as empresas de
máquinas agrícolas, visando sustentar sua produção. Providenciou o fornecimento
anual de milhões de litros de óleo diesel barato para reduzir o custo para os
agricultores e incentivar o uso de máquinas agrícolas. Além disso, continuou a
administrar o sistema financeiro sob uma economia planejada para fornecer
máquinas agrícolas para áreas rurais a um preço mais baixo. Estima-se que,
desde então, o agricultor tem subsídio de 70% no valor das máquinas.
A partir de 1978, a
China começou importar tratores de empresas dos EUA, como da John Deere, Case e
New Holland, bem como de japonesas como a Hitachi. A intenção do governo chinês
era alavancar a produção interna e, para isso, incentivou também a importação
de tecnologia. A estratégia de modernização da indústria chinesa de máquinas
agrícolas se apoiou na formação de joint ventures com grandes
multinancionais estrangeiras desse setor. Participaram deste movimento
corporações como a John Deere, New Holland e Caterpillar (EUA), Fiat e Goldoni
(Itália), Deutz (Alemanha), Yarman Farm (Japão), além da então União Soviética.
Em todos os casos, a transferência de tecnologia a empresas chinesas foi
condição essencial.
Durante as décadas de
1980 e 1990, o setor industrial nas áreas urbanas e costeiras apresentou um
rápido crescimento, com aumento dos salários reais e uma quantidade
significativa de mão de obra rural migrando para empregos não agrícolas. Com a
transferência de grandes quantidades de mão de obra rural para as áreas urbanas
e costeiras industrializadas para melhores oportunidades de emprego, a demanda
por máquinas agrícolas teve grande expansão no campo. E a mecanização da
agricultura em pequena escala passou a impulsionar a economia dos pequenos
agricultores, proporcionando um aumento substancial em sua renda, reduzindo o
custo de produção, acelerando e qualificando a operação agrícola e, assim,
aumentando os rendimentos. A rápida aplicação de máquinas agrícolas liberou os
agricultores a se transferirem para indústrias rurais fora da lavoura, gerando
um aumento nos salários não agrícolas. A mecanização agrícola permitiu que os
agricultores em empregos externos sustentem suas famílias em áreas rurais. Pequenos
agricultores também passaram a ganhar uma renda com o aluguel de suas máquinas
agrícolas.
Em 2004, a China
formulou sua lei de mecanização. Esta lei tornou possível uma implementação
total da mecanização para a produção de grãos. Seu principal objetivo era
pressionar produtores agrícolas e organizações de operações a utilizar máquinas
agrícolas avançadas. A lei declarou os procedimentos e medidas necessários para
o governo em sua implementação de políticas de mecanização para a produção,
inspeção, fornecimento, serviço pós-venda e utilização conjunta de máquinas
agrícolas. Foram definidas as tarefas e deveres do governo nacional, dos
governos provinciais, instituições de pesquisa, produtores de máquinas
agrícolas, provedores de serviços e governos locais. A lei introduziu
oficialmente uma política de subsídio direto de máquinas agrícolas para agricultores,
organizações de operações agrícolas e instituições financeiras para comprar
máquinas agrícolas avançadas. Vários subsídios de mecanização foram adotados
para apoiar a distribuição, produção, marketing, inspeção, serviço pós-venda e
treinamento do usuário final para máquinas agrícolas.
O estabelecimento de
serviços de aluguel de máquinas agrícolas, iniciado pela primeira vez em 2004,
passou a oferecer aos pequenos agricultores acesso a máquinas a custos
razoáveis. Os provedores de serviços de máquinas agrícolas são cooperativas
agrícolas, empresas e agentes especiais que alugam máquinas de aração,
semeadoras e colheitadeiras para pequenos agricultores. Desde então, a China
alcançou grandes melhorias na produtividade agrícola em termos de produção,
condições e rendimentos, melhorando a rápida absorção de máquinas agrícolas
para substituir a migração de trabalhadores agrícolas jovens e qualificados,
além de praticamente acabar com a pobreza rural.
O aumento na
mecanização agrícola aumentou a produtividade ao proporcionar o uso mais
eficiente de insumos agrícolas, como terra, água, fertilizantes, herbicidas e
pesticidas, induzindo precisão e pontualidade na aplicação. O índice de
mecanização também aumentou a variabilidade das safras e, ao aumentar a
pontualidade das operações agrícolas, a mecanização pode calcular a
sazonalidade precisa das safras, aumentando a utilização da terra e o nível de
cultivo. O padrão de produtos agrícolas verdes, de alta qualidade e de marca
passou a ser continuamente melhorado, com a diminuição da aplicação de
fertilizantes químicos e pesticidas.
A agricultura da China
é predominantemente de pequena escala, mas isso não leva necessariamente a uma
menor eficiência ou eficácia de sua produção agrícola. A China alimenta 22% da
população mundial usando apenas 7% de suas terras agrícolas, sendo o maior
produtor de grãos do planeta. O nível de mecanização abrangente do cultivo e da
colheita de safras na China aumentou de 32% em 2000 para 68% em 2020, dobrando
em duas décadas. A taxa de mecanização do cultivo e colheita das principais
culturas excede 70%, e mais de 80% nas principais culturas de grãos. As taxas
de lavoura, semeadura e colheita mecânica estão em 84%, 56% e 61%,
respectivamente. Atualmente, cerca de 87% da agricultura camponesa na
China tem mecanização. E planeja-se atingir um nível de mecanização abrangente
completo (100%) do cultivo de safras já nos próximos anos.
O poder total das
máquinas agrícolas na China evoluiu de apenas 184,000 kw em 1952, 117,5 milhões
de kw em 1978 e 1,06 bilhões de kw em 2021. A indústria de máquinas agrícolas
tem crescido constantemente nos últimos anos, com mais de 10.000 empresas de fabricação
e 20.000 de distribuição, muitas voltadas ao pequeno produtor. Um sistema
operacional abrangente foi estabelecido, cobrindo fabricação, componentes,
peças, vendas e serviços. Ocorre o fortalecimento dos grandes grupos
nacionais, inclusive a partir da formação de conglomerados controlados
diretamente pelo governo central. E, nessas condições, as empresas chinesas têm
conseguido controlar o seu mercado interno de tratores, colheitadeiras e outros
equipamentos para a agricultura, além de passar a ser uma potência exportadora
de diversas máquinas agrícolas.
A China está tentando
mecanizar completamente a cadeia geral de produção agrícola, do pequeno ao
grande. Trata-se de um processo complexo e ainda ocorrem irregularidades na
cadeia de produção agrícola. O nível de mecanização no estágio de produção tem
sido muito maior do que nos estágios de pré e pós-produção. Além disso, o nível
de mecanização é desigual entre as regiões, sendo compreensivelmente maior nas
regiões economicamente mais desenvolvidas do que nas áreas economicamente menos
desenvolvidas (isso é, maior no sudeste do que no oeste da China), nos tipos de
culturas (sendo maior no arroz do que no trigo e no milho) e nas práticas
agrícolas (onde a aplicação de máquinas agrícolas na lavoura é muito maior do
que na colheita e processamento). Apesar de desequilíbrios, nas últimas seis
décadas, a China obteve incontestáveis avanços na mecanização rural, sendo uma
ferramenta fundamental e um objetivo estratégico para a construção de um
sistema agrícola socialista moderno no país.
Com base na
experiência chinesa, os países em desenvolvimento nos estágios iniciais de
mecanização com um grande número de pequenos agricultores (como o Brasil que
não chega a 13% de mecanização da agricultura familiar), podem extrair algumas
lições fundamentais sobre a mecanização da agricultura de pequena escala.
Diversos países no Sul Global com agricultura de pequena escala ainda não
exploraram o potencial da mecanização, principalmente devido a uma
interpretação errônea de que apenas a mecanização em larga escala oferece
benefícios. A mecanização é frequentemente vista como indigna na agricultura de
pequena escala. Há uma perspectiva comumente aceita de que máquinas agrícolas
são adequadas apenas para terras agrícolas de grande escala, impedindo que pequenos
agricultores se beneficiem da mecanização. Se assim fosse, a probabilidade de
possuir máquinas agrícolas estaria conectada ao tamanho das terras agrícolas.
E, para tornar a situação mais difícil, os pequenos agricultores em países em
desenvolvimento estão na extremidade inferior da escala econômica,
frequentemente atingidos pela pobreza crônica e sua menor eficiência de
produção resulta em menores rendas.
É preciso construir
uma teoria de mecanização apropriada na agricultura de pequena escala. Máquinas
agrícolas adequadas às condições locais, como o tamanho da terra, a inclinação
da terra, características do solo, tipo de cultura ou com uma relação custo-eficácia
para os agricultores influenciarão a decisão de adotar máquinas na agricultura
de pequena escala. A escala da mecanização depende principalmente da escala das
terras agrícolas: máquinas grandes para grandes fazendas e máquinas pequenas
para pequenas fazendas. Otimizar a escala da máquina e da terra é uma das
tarefas críticas no esforço para obter o melhor da mecanização, sendo uma das
falhas mais críticas da mecanização na maioria dos países em desenvolvimento,
devido a um equívoco de que as máquinas agrícolas só são lucrativas em grande
escala.
Para concluir, é
preciso enfatizar que a mecanização agrícola da agricultura de pequena escala é
a chave para reduzir a subnutrição e a fome. É crucial uma intervenção
consistente dos governos para aumentar a produtividade das áreas rurais desta
forma. Em primeiro lugar, o desenvolvimento da mecanização deve se basear em um
sistema de autossuficiência. O estabelecimento de uma indústria de fabricação
de máquinas agrícolas locais deve ser a prioridade para o desenvolvimento da
mecanização, em especial máquinas compactas. Os governos precisam encorajar os
fabricantes locais por meio de vários incentivos. Em segundo lugar, as
cooperativas de serviços agrícolas que alugam máquinas representam um modelo
adequado que permite que pequenos agricultores acessem máquinas para suas
necessidades a um preço razoável. Leis, políticas de subsídios e incentivos de
serviços de aluguel de máquinas agrícolas são todos mecanismos eficazes para
aumentar a acessibilidade de máquinas agrícolas para pequenos agricultores. Em
terceiro lugar, instituições de treinamento, como universidades, devem
trabalhar em estreita colaboração com os agricultores, os formuladores de
políticas e outras partes interessadas para facilitar uma rápida introdução de
máquinas agrícolas. Essas lições podem ser adaptadas e aplicadas em outros
contextos, contribuindo para o desenvolvimento da agricultura familiar e de
pequena escala em diferentes regiões.
Apesar de muitos
defenderem que o benefício total da mecanização pode ser obtido apenas
aplicando-a à agricultura em larga escala, vemos que a China realiza uma
mecanização bem-sucedida na agricultura em pequena escala por meio da aplicação
de políticas, estratégias e medidas de incentivo. Para outros países, fica o
desafio de aplicar firmemente políticas mecanização agrícola apropriada à
escala, desempenhando um papel vital na melhoria da segurança alimentar,
combate à inflação, erradicação da pobreza rural e contribuir para o
desenvolvimento econômico nacional.
¨ Brasil se torna 'nova Índia' na oferta de serviços de tecnologia
para mercado internacional
O Brasil, agora visto
como um destino estratégico para offshoring de tecnologia da informação (TI),
atrai investimentos de grandes players globais e está se posicionando como a
"nova Índia" em serviços de tecnologia, dizem profissionais do setor.
O país está se
consolidando como um importante polo para o offshoring de serviços de
tecnologia, com mais de 20 aquisições de empresas brasileiras do setor desde
2020, totalizando quase R$ 9 bilhões.
Offshoring de TI é a
prática de contratar serviços de TI de companhias localizadas em outros países.
Isso inclui atividades como desenvolvimento de software, suporte técnico,
infraestrutura e outros serviços tecnológicos, realizados por profissionais de fora
da empresa contratante.
De acordo com o jornal
O Globo, o movimento é impulsionado pela qualidade da mão de obra e proximidade
cultural e geográfica com os principais mercados, como Estados Unidos e Europa,
tornando o país sul-americano uma alternativa à Índia.
Companhias globais,
como a japonesa NTT DATA e a indiana Marlabs, têm adquirido empresas
brasileiras para expandir suas operações no país. A mídia cita que o conflito
na Ucrânia e a fragilidade de outras regiões durante a pandemia também
contribuíram para a expansão do Brasil nesse mercado.
A igc partners, uma
boutique especializada em fusões e aquisições, tem sido responsável por
intermediar muitas dessas transações. Nos últimos quatro anos, a companhia
concluiu 17 operações no setor de tecnologia, movimentando R$ 4,48 bilhões. Até
o início de 2024, a IGC planeja finalizar mais duas transações com investidores
estrangeiros.
"O Brasil está se
transformando na nova Índia para serviços de tecnologia offshoring", disse
Daniel Milanez, CEO e co-fundador da igc partners, ouvido pelo jornal.
Empresas brasileiras
de tecnologia, que antes estavam fora do radar dos investidores, agora atraem
grande interesse, especialmente com a crescente demanda por soluções
tecnológicas inovadoras em setores como bancos digitais.
Até o começo do ano
que vem, o igc partners deve concluir pelo menos mais duas transações nessa
área, com um fundo e uma companhia estrangeira estratégica que ainda não está
presente no Brasil.
"Já temos quatro
conversas com memorandos de entendimento assinados, preço e estrutura definidos
em fase de diligência. E outras dez conversas em andamento", afirmou
Rafael Frugis, sócio do igc e responsável pelos negócios na área de serviços de
tecnologia.
A transformação no
setor bancário e a necessidade de modernizar seus sistemas contribuíram para o
aquecimento do mercado, com grandes aquisições, como a da Zup pelo Itaú. Além
disso, empresas como Boticário, Ambev e Alpargatas também entraram no mercado fazendo
aquisições estratégicas, acrescenta a mídia.
Fonte: Por Fernando
Marcelino, em Outras Palavras/Sputnik Brasil
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