Gilberto Menezes Côrtes: Influência de Lula
é menor em prefeitura
No primeiro turno,
compromissos internacionais, agravados pela pane no avião presidencial na
decolagem na Cidade do México, que retardou sua volta ao Brasil, mantiveram o
presidente Lula um pouco distante das eleições municipais. Assustado com o
fraco desempenho do PT e dos partidos aliados da esquerda, enquanto o
conservador PSD, de Gilberto Kassab, ganhava musculatura em São Paulo (onde o
PT perdeu prefeituras que dominava há anos), assim como os partidos à direita,
como PP e PL, ganhavam mais expressão, Lula decidiu se engajar mais na campanha
do 2º turno. A uma semana do pleito, o presidente da República vai perceber,
mesmo em grandes centros urbanos como São Paulo - ontem, a chuva esperada, que
não veio na sexta-feira para gerar novo apagão que impulsionasse reação da
população contra o atual prefeito, impediu uma caminhada com o candidato
Guilherme Boulos -, Belo Horizonte, Fortaleza, Porto Alegre e Natal, que a
influência do governo federal é baixa nas eleições municipais.
Não que o governo
federal não tenha instrumentos para fazer políticas públicas que rendam
dividendos eleitorais. A questão é que o empoderamento dos deputados federais e
senadores no governo Bolsonaro, quando ele delegou ao Congresso o poder de
decisão sobre fatias crescentes do Orçamento Geral da União, reforçou o cacife
de lideranças políticas regionais. Lembro muito bem que há pouco mais de duas
décadas, no começo deste século, o então deputado federal Roberto Jefferson
(PTB-RJ) cevava seus currais eleitorais na região serrana do Rio de Janeiro com
doações de retroescavadeiras dentro da sua cota de emendas parlamentares. No
município onde tenho sítio, São José do Vale do Rio Preto-RJ, uma das fontes de
votos de Jefferson, as doações chegaram ao ponto de a prefeitura acumular mais
retros que tratoristas. Sendo da mesma marca, as peças de uma serviam para a
mais ativa. Com o Orçamento Secreto, o poder da caneta do senador ou deputado
federal se multiplicou e já vale mais que a de um ministro e até a BIC do presidente.
Outro fator que talvez
Lula e os partidos de esquerda, acostumados a crer que a catequese política se
faz em grandes comícios – quando as redes sociais oferecem aliciamento
automático e constante – não tenham percebido é a concorrência dos pastores
como “influencers eleitorais”. Os evangélicos, mais do que outros brasileiros,
deixam de se informar pelas mídias tradicionais (rádio, TV, jornais e sites), e
são levados pelos sermões semanais dos pastores. Duas a três vezes por semana,
um grupo de fieis se submete à catequese dos pastores que se dizem portadores
da palavra de Deus e exigem fidelidade ao dízimo. No interior e periferias, as
seitas evangélicas se multiplicam com mais agilidade do que a Igreja católica,
ou tradicionais denominações protestantes ou luteranas. O resultado é que os
pastores passaram a ter influência política cada vez maior nas eleições. Em
troca de apoios – nem todos são espaçosos e ostensivos como Silas Malafaia, da
Assembleia de Deus Vitória em Cristo –, trabalham em silêncio para ter isenção
fiscal em negócios da igreja.
Alguns pastores
praticamente faliram suas igrejas – a sede da Igreja Mundial do Poder de Deus,
de Valdemiro Santiago, o “pastor do chapéu”, no Brás (região central de São
Paulo), teve penhorados microfones, equipamentos de som, instrumentos, telões e
outros objetos usados durante os cultos religiosos, para pagar dívidas
contraídas pelo pastor. Caso clássico de socialização de prejuízos. Enquanto
isso, o pastor troca de chapéus, carros e aviões...
Lula fez esta semana
nova aproximação com pastores evangélicos. O ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, que busca todos os meios de melhorar a receita para enfrentar gastos,
incentivos e renúncias fiscais, sem desequilibrar o orçamento, deve ter sentido
um frio na espinha.
• Energia: quem sabe faz a hora
Depois de muito
suspense, o governo Lula arquivou a volta do horário de verão. A medida foi
cancelada por Bolsonaro, em 2019, sob o argumento de que a economia de energia
não era expressiva e os transtornos de acordar cedo, com o dia ainda escuro,
eram desgastantes para uma importante base de apoio do ex-capitão, como os
colegas de farda das Forças Armadas e as forças das PMs e bombeiros, além dos
trabalhadores que batem ponto às 7h.
Mas quem entende de
energia alerta que a antecipação de uma hora no horário de verão nas regiões
Sudeste, Sul, Centro-Oeste e Nordeste é importante para reduzir os riscos do
pico de energia que historicamente se dá no país entre as 18 e 19 horas. É o
período quando os trabalhos se encerram nos escritórios; o uso dos elevadores
consome muita energia e a chegada em casa gera novo pique de consumo com a
ligação de chuveiros elétricos, secadores de cabelo, ar-condicionado e “air
fryer”, os vilões da casa.
Com o “home office”,
caiu a demanda e a diversificação das fontes de energia elétrica (além das
usinas hidroelétricas e das termoelétricas movidas a gás natural, criadas na
crise que quase gerou racionamento em 2001) trouxe forte expansão na geração de
energia solar e eólica, o que diminuiu a participação hegemônica da energia
hidroelétrica. Uma gestão equilibrada das fontes de energia pode permitir
acumular mais água nos reservatórios das usinas. Para tal, campanhas para
orientar o consumo consciente seriam indispensáveis.
Mas veja este
paradoxo. Desde 1º de outubro, boa parte do país está sob o regime de bandeira
vermelha nível 2, a escala mais alta na tarifa de energia. Não se notou redução
do uso de lâmpadas ou ar-condicionado nas comunidades do Rio de Janeiro ou de
São Paulo. É que, como há predomínio dos “gatos”, as ligações clandestinas, uma
fatia dos consumidores não está nem aí. Ou melhor, é mais uma fatia da
sociedade contra o horário de verão.
Em conversa com um
amigo, engenheiro elétrico aposentado de Furnas, este me alertou que o uso de
fontes diversificadas de energia exige muito mais eficiência do Operador
Nacional do Sistema (O.N.S.) para administrar os despachos de carga para
atender as oscilações de demandas nos momentos de picos que são críticos para o
sistema nacional interligado do país, com despacho de energia da região Norte e
do Nordeste para o Sudeste por linhões de transmissão. O ONS dispõe de
computadores de última geração para fazer os ajustes no sistema, mas a
transferência de um agente importante como a Eletrobrás, que gerava 36% da
energia do país, para o setor privado torna mais necessário o entrosamento
entre todos os agentes. Um pequeno erro no despacho de carga pode levar a uma
derrubada em série do sistema. Com o horário de verão, o risco era mais
reduzido. Agora, todo cuidado é pouco.
• Como purificar a polícia
Esta semana, os
cariocas tiveram conhecimento de dois episódios que dão o que pensar sobre a
atuação das forças policiais no Estado do Rio de Janeiro, controladas que são
pelo governo estadual; as polícias militar e civil, os corpos de bombeiros e
ainda a polícia penitenciária. Para impedir que batalhões da PM e do Bope
interferissem numa tentativa de uma facção criminosa de invadir os domínios de
outra facção, esta composta majoritariamente por milicianos (ex-policiais e
bombeiros) que dominam o território de Rio das Pedras, a maior comunidade
vertical do Rio de Janeiro, dezenas de ônibus foram atravessados, e as chaves
retiradas pelos agentes do tráfico para tumultuar o tráfego na estrada que liga
o Itanhangá a Jacarepaguá. A região viveu um dia de caos.
No dia seguinte,
chamou a atenção a execução de um homem, na Zona Oeste, em uma caminhonete
Toyota Hilux. Apesar de blindado, o veículo foi alvejado por armamento pesado
disparado por assaltantes de moto. A surpresa foi a identidade da vítima:
tratava-se de um sargento da PM, que estava afastado das atividades de
patrulha, encostado na Diretoria Geral de Pessoal, conhecida como a “geladeira”
da corporação.
O salário de um
sargento da PM gira em torno de R$ 7 mil. Como ele poderia ter uma Hilux, que
custa cerca de R$ 200 mil, fora os custos da blindagem do veículo? Se comprado
a prestação, a picape exige 24 parcelas de R$ 3.700, fora a entrada e uma
prestação intermediária de R$ 48 mil. A blindagem do veículo, por temor de
execução por inimigos e adversários, indica que as relações perigosas que
levaram o sargento a ser encostado na “geladeira” da PM deveriam ter
determinado a sua expulsão. Isso se as corregedorias da PM e da polícia civil
fossem eficientes...
Tenho um amigo,
experiente jornalista em coberturas de fatos policiais, que diz simplesmente
que a linha de ação das corregedorias para investigar enriquecimento ilícito de
policiais deveria começar pela identificação dos donos dos carros estacionados
nos pátios dos quartéis e delegacias, ou no seu entorno. Imediatamente vai se
perceber o grau de corrupção nas polícias.
Fonte: Jornal do
Brasil
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