Paulo Kliass: O risco Haddad
Desde a divulgação dos
resultados das eleições de outubro de 2022 tornou-se sistemático o
questionamento a respeito de quais seriam as verdadeiras intenções de Lula no
que se refere à política econômica de seu terceiro mandato. Por vários momentos
havia dúvidas quanto ao alinhamento do Presidente com relação à agenda
tipicamente ajustada com os interesses do financismo, tal como têm sido
propostas e encaminhadas as medidas de seu Ministro da Fazenda (MF). Fernando
Haddad convenceu o chefe quanto à necessidade de não revogar o teto de gastos
introduzido na Constituição por Temer em 2016, tal como debatido durante a
campanha eleitoral. A solução final foi a inclusão de um dispositivo na PEC da
Transição, ainda no final de 2022, por meio do qual o novo governo se
comprometia em aprovar uma Lei Complementar tratando daquilo que passou a ser
conhecido por Novo Arcabouço Fiscal (NAF).
Haddad tentou
convencer Lula, no começo de 2023, a não incluir no reajuste do salário mínimo
os ganhos de crescimento do PIB, para além da reposição inflacionária. Mas
nesse caso, o responsável pela área econômica foi obrigado a obedecer ao
Presidente, que não aceitou o recuo proposto em relação a uma de suas promessas
mais simbólicas. Em compensação, o chefe do governo não avançou em suas
ponderações quanto às dificuldades de cumprir com a meta de zerar o déficit
primário em 2024. Em um momento no ano passado Lula chegou a dizer que seria
muito complicado o governo perseguir tal objetivo de política fiscal. Esse foi
um dos assuntos em um café da manhã com jornalistas realizado no mês de outubro do ano passado.
(…) Tudo que a gente
puder fazer para cumprir a meta fiscal a gente vai cumprir. O que eu posso
dizer é que ela não precisa ser zero, o país não precisa disso. Eu
não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue a começar o ano fazendo
corte de bilhões nas obras que são prioritárias para esse país. Eu acho que
muitas vezes o mercado é ganancioso demais e fica cobrando uma meta que ele
sabe que não vai ser cumprida. E se o Brasil tiver déficit de 0,5%, de
0,25%, o que é? Nada” (…)
Lula tem muita
experiência acumulada no comando de equipes de governo e sabe exatamente os
riscos e as consequências envolvidas com esse tipo de programa de austeridade.
No entanto, ele optou por deixar o barco seguir e no final de tudo a equipe da
Fazenda foi vitoriosa nas disputas internas palacianas. Ou seja, além de manter
o NAF intacto, Haddad conseguiu obter de Lula o aval para perseguir uma meta
fiscal inexequível. Valem todas as hipóteses para tentar explicar as razões de
tal postura passiva do chefe do governo. A mais recorrente refere-se à tal da
“correlação de forças” no interior do Congresso Nacional. Mas se é verdade que
a atual composição do nosso parlamento é das mais conservadoras das últimas
décadas, o fato é que não seria uma meta contemplando um déficit, como
ponderava Lua na conversa acima descrita, que iria complicar avida do governo.
Inclusive pelo fato de 2024 ser um ano com eleições municipais e os
parlamentares de todos as tendências veem com bons olhos mais recursos para
serem aplicados em suas bases.
·
Lula hesita e Haddad avança com a
austeridade.
Mais à frente, tendo
em vista a obsessão do Presidente do Banco Central (BC) com a manutenção da
SELIC em níveis estratosféricos, um grupo cada vez mais amplo de economistas
progressistas lançou uma proposta para minorar o arrocho monetário. Tratava-se
simplesmente de flexibilizar meta de inflação pelo voto do Conselho Monetário
Nacional (CMN). Como o Comitê de Política Monetária (COPOM) utiliza esse índice
para estabelecer a taxa referencial de juros, tratava-se de tornar a meta para
o crescimento dos preços mais realista com a realidade da inflação. Com isso,
retirar-se-ia o principal argumento das forças do financismo em sua batalha
permanente por uma SELIC elevada. Caso Lula quisesse também se valer de tal
estratégia, bastaria orientar seus 2 ministros membros do CMN (Fazenda e
Panejamento) a votarem nesta direção. Mas nada foi feito neste sentido.
A partir do início do
presente ano ganhou espaço nos grandes meios de comunicação o debate a respeito
da sucessão de Roberto Campos Neto na presidência do BC. Ao invés de pautar uma
discussão efetiva a respeito das alternativas de política monetária e também
quanto às próprias funções do órgão regulador e fiscalizador do sistema
bancário e financeiro, Haddad se limitou a fazer campanha aberta para que o
nome escolhido pelo chefe para o cargo fosse o seu Secretário Executivo no
MF. Lula chegou a considerar publicamente a possibilidade de outros
nomes, com mais experiência
(…) “Na hora que eu
tiver que escolher o presidente do Banco Central vai ser uma pessoa
madura, calejada, responsável, alguém que tenha respeito pelo cargo que exerce
e alguém que não se submeta a pressões de mercado, e que faça aquilo que
for de interesse de 213 milhões de brasileiros” (…)
E convenhamos que uma
pessoa com apenas 42 anos de idade e que nunca havia assumido nenhuma função no
governo federal antes deste mandato não se encaixa exatamente nas definições
oferecidas por Lula na entrevista acima. Houve muita especulação a respeito de
quem estaria dentre as opções, em especial no quesito maturidade. Um dos nomes
sempre lembrados para o cargo era o do economista André Lara Resende. Porém,
mas uma vez, Lula se curvou à sugestão de Haddad e indicou o nome de Gabriel
Galípolo para ser sabatinado pelo Senado Federal. Trata-se de alguém com ampla
aceitação junto aos representantes do sistema financeiro e que apenas tem
endossado nos últimos tempos as propostas do pessoal da Faria Lima a respeito
de suas futuras funções. Ou seja, com muita certeza teremos um presidente no BC
com mandato de 4 anos que, ao contrário do que pretendia Lula, estará
permanente submetido às pressões do mercado das finanças.
·
Acenos e agrados ao financismo local e
global.
Ainda por influência
de Haddad, Lula tem dado sinais efusivos e entusiasmados com pautas de agrado e
interesse do financismo local e global. Esse foi o caso, por exemplo, do encontro fora da agenda oficial que o presidente brasileiro
manteve em Nova Iorque com dirigentes das agências de risco. Na viagem tradicional para marcar o início dos trabalhos da
assembleia geral da ONU em setembro, ele se reuniu com representantes das
empresas Moody’s e da Standard & Poor’s. Não restam dúvidas de que tal
gesto inusitado teve por intenção prestigiar a política de austeridade fiscal
de seu governo e solicitar uma melhora nas notas atribuídas por tais empresas
de rating aos papéis brasileiros no mercado financeiro.
Em outra jogada de
grande envergadura, o Ministro da Fazenda convenceu Lula a receber em audiência os
presidentes dos principais bancos privados do País. O encontro foi marcado por uma distribuição farta de elogios
da banca ao trabalho da equipe econômica, em especial a Fernando Haddad. Ao
conceder, de forma excepcional, um tratamento tão diferenciado ao povo do
parasitismo financeiro, o Presidente da República decidiu por sinalizar para o
conjunto da sociedade sua opção preferencial. Ao contrário dos tempos passados
em que começou sua militância no movimento sindical, ao lado dos setores
progressistas da Igreja Católica, agora a sua opção mais relevante não está
sendo pelos pobres.
Ora, com esse balanço
parcial de quase 2 anos deste terceiro mandato, o Ministro da Fazenda tem todas
as razões para seguir apostando que está muito bem cotado e prestigiado junto
ao Chefe do Palácio do Planalto. Até o presente momento, com exceção de um ou
outro puxão de orelhas, Lula tem assegurado a Haddad o essencial das demandas
apresentadas pelo colaborador. Esta suposta tranquilidade tem permitido ao
ocupante da pasta da Fazenda caminhar com autonomia ainda maior em temas
polêmicos e controversos.
·
Haddad se sente fortalecido e solta o
verbo.
Em entrevista concedida com exclusividade a uma jornalista da
Folha de São Paulo, tudo indica que Haddad tenha se sentido
mais à vontade para avançar avaliações e pautas. As perguntas eram formuladas
sem a preocupação de lhe criar nenhuma saia justa. Pelo contrário, as questões
eram aquilo que se chama no jargão do voleibol de “levantadas de bola”
generosas para ele apenas cortar. A tranquilidade era tanta que o ministro até
se permitiu cometer alguns sincericídios. Esse foi o caso do arcabouço fiscal,
quando ele reconheceu aquilo que seus críticos sempre alertamos, mas os
defensores chapas brancas nunca aceitaram. Ele assumiu, por exemplo, que o NAF
é, na verdade, um teto de gastos.
(…)
Nós estabelecemos um teto de gastos determinando que a despesa não
pode crescer acima de 70% da receita. E dentro do limite de 2,5%. (…)
Indagado a respeito do
suposto problema com o crescimento da dívida pública, Haddad assume o lado da
banca sem nenhuma dificuldade nem ponderação:
(…) A Faria
Lima [avenida de SP onde se concentram agentes do mercado
financeiro] está, com razão, preocupada com a dinâmica do gasto daqui para
a frente. E é legítimo considerar isso com seriedade. (…) O que a Faria Lima
está apontando —na minha opinião, com algum exagero em relação ao preço dos
ativos brasileiros — é que a dinâmica [dos gastos] para a frente é preocupante.
Pode ter impacto na dívida [que a União tem que fazer para financiar seus
gastos]. E o governo tem que tomar providências. A Fazenda está com isso
na mesa, 100%. (…)
Ora, se agregarmos a
tais afirmações todas as declarações oferecidas por integrantes do segundo
escalão dos ministérios da Fazenda e do Planejamento, fica mais do que claro
que a estratégia é mesmo a de atacar os pisos constitucionais para saúde
educação, além da desvinculação dos benefícios previdenciários em relação ao
salário mínimo. A jornalista perguntou se o Ministro levava a Lula as suas
preocupações. Haddad não vacilou um segundo sequer em exibir sua opção
austericida e ainda colocou Lula a seu lado na edição das maldades. Na verdade,
trata-se de um reconhecimento a posteriori da natureza
conservadora e restritiva do NAF, além do fato por nos alertado desde o início
de que havia uma bomba implícita no modelo que não tardaria muito tempo a
explodir.
(…) Falo o seguinte: o
mercado está entendendo que a soma das partes – a soma do salário mínimo,
saúde, educação, BPC – é maior do que o todo. Ou seja, vai chegar uma hora em
que esse limite de 2,5% [de crescimento da despesa em relação ao da receita] não
vai ser respeitado. Ainda que a receita responda, o arcabouço fiscal não
vai funcionar se a despesa não estiver limitada. Eu falo para o presidente
exatamente o que estou falando para você. (…)
Enfim, este é – em
toda a sua plenitude – o risco Haddad. O fator de perigo que pode conduzir o
Brasil a um ponto de não retorno às esperanças apontadas pelos constituintes na
Carta aprovada em 1988. O Ministro da Fazenda está convencido da necessidade e
da correção da pauta ortodoxa e liberaloide do povo da Faria Lima. Na verdade,
trata-se de retomar a linha de continuidade dos sucessivos programas de ajustes
e reformas estruturais que foram iniciados logo depois da promulgação da nova
Constituição. Os governos Collor e Fernando Henrique Cardoso lançaram as bases
da privatização, da liberalização e da institucionalização da austeridade
fiscal. Os governos Lula e Dilma pouco fizeram para reverter tal quadro. Depois
do “golpeachment” de Roussef, Temer e Bolsonaro retomaram o tema da destruição
do Estado e do desmonte das políticas públicas.
·
Lula precisa isolar o risco Haddad.
Infelizmente, até o
presente momento Lula 3.0 tampouco fez alguma coisa para reverter o quadro do
desastre anterior. Pelo contrário, a depender da pauta conduzida pelo Ministro
da Fazenda, estamos estendendo a ponte para a continuidade do elo perdido do
neoliberalismo. A linha implementada atualmente é quase um copiar/colar do nada
saudoso programa do PMDB, a Ponte para o Futuro. Um desastre que o Partido dos Trabalhadores e as forças
progressistas sempre criticaram. Aí é que reside o risco Haddad. Finalizar o
trabalho de retirar as bases estruturais que possam sustentar algum modelo de
arremedo de Estado de Bem Estar social em nossas terras para o Brasil.
Na condição de
Presidente da República, a última palavra sempre estará com Lula. Se ele
continuar bancando o risco Haddad, o futuro lhe cobrará, em termos políticos e
eleitorais, as consequências nefastas de tal opção equivocada.
¨
Ideologia e gestão.
Políticas compensatórias e políticas estruturantes. Por Francisco Celso Calmon
Assertivas do
Lula: “A fome no mundo não é falta de dinheiro. É falta de vergonha na
nossa cara “.
“Há
trilhões de dólares navegando pelos céus, enquanto 733 milhões de pessoas vão
dormir sem ter o que comer. O que falta não é dinheiro, mas vergonha dos que
governam o mundo”.
“A
fome não se resolve com caridade, mas com políticas públicas sólidas e
investimento no povo pobre. O Bolsa Família foi a prova disso, e continuamos a
usá-lo para acabar com a fome novamente no Brasil”.
##
Será que a questão é
subjetiva, moral, de caráter e personalidade? Ou objetiva, do sistema econômico
capitalista e sua democracia burguesa? Será que líderes com vergonha na cara
resolveriam o problema mundial da fome?
Discursos que tocam e
emocionam os povos, porém, não tocam na estrutura do problema e o caminho para
reformas estruturantes.
A sociedade no sistema
capitalista não tem condições e capacidade de auto-organização, daí porque o
Estado é necessário. E qual é o seu papel senão o de garantir o desenvolvimento
para a satisfação de todos, conforme suas necessidades e capacidades, à luz do
que estabelece a Constituição e as leis do Estado de direito.
As forças produtivas e
o modo de produção não conseguem planejar autonomamente o desenvolvimento e
crescimento econômico do país, não há mecanismos para isso.
Sobreviver abraçado ao
mercado ou morrer asfixiado pelos juros, o governo deve sair fora desse jogo
perde, perde.
Cercado por fora,
minado por dentro, Lula permanece sem estratégia.
A sociologia de
esquina que afirma que os novos trabalhadores não querem carteira assinada,
estão se referindo aos trabalhadores que ficaram tanto tempo em situação
precária de sobrevivência e que não sabem os direitos que uma carteira assinada
assegura, como: férias, 13o salário, previdência social, FGTS,
seguro-desemprego, e estão fazendo da via encontrada de sobrevivência como
única boia de salvação. Também os terceirizados que não tiveram escolhas, ou
aceitavam ou demissão.
Num cenário de 120
milhões de brasileiros na insuficiência alimentar e 33 milhões na miséria,
reformas enfiadas goela abaixo pelo traidor Temer e pelo genocida Bolsonaro,
precarizaram o mundo do trabalho, produziram traumas, marcas, fraquezas,
desesperanças, e com quase dois anos de governo o povo não voltou a sonhar com
um projeto de nação – pois não há, nem produzido pelo governo e nem pelos
partidos do campo progressista.
É absolutamente falsa
a dicotomia entre gestão e ideologia, suscitada pelo prefeito reeleito de
Recife.
Gestão é a capacidade
político-administrativa, enquanto ideologia são os valores e concepções de
sociedade e mundo.
A ideologia orienta a
gestão em princípios, valores e vetores, mas não substitui a gestão, assim como
a gestão não É ISENTA DE IDEOLOGIA, mesmo que não visível, a gestão
inexoravelmente está a serviço de alguma ideologia.
A chamada gestão
pragmática é uma forma de encobrir a política e a ideologia que convém,
geralmente, às classes dominantes.
Se a disputa for de
capacidade de gestão, voltaremos ao tecnocratismo que dominou uma época o
Brasil, e nada mais foi do que a técnica a serviço do sistema e de suas elites
mandatárias.
A disputa de
concepções e ideias é a única maneira de fazer o contraditório explícito com o
neonazifascismo bolsonarista.
O anseio da pequena
burguesia de uma sociedade sem contradições, conflitos de classes, é uma
quimera perigosa e pelega, principalmente por parte de uma juventude política,
formada em institutos e escolas criadas por milionários americanos.
A práxis bolsonarista
é impregnada de ideologia.
Desde a queda do muro
de Berlim, a burguesia e seus representantes vêm pregando o fim da história, o
fim das contradições e fim da luta de classes, a diluição do contraponto à
ideologia das classes dominantes, de forma a que não haja alternativa ao capitalismo,
a sua política neoliberal, ao imperialismo, como se tudo fosse normal e
inevitável, e do qual não há saída senão mertiolates e band aids para as chagas
que o sistema produz.
A polarização só não
interessa a Globo e o seu sonho da 3ª via.
Os candidatos de
esquerda neste segundo turno deveriam assumir a polarização entre a
extrema-esquerda bolsonarista e a esquerda democrática, entre o fascismo e a
social-democracia, entre o crime organizado/milicianos e a segurança da
população periférica abandonada pelo estado. Entre uma PM que mata mais de 20
jovens, pretos e periféricos, por dia no Brasil e a necessidade de uma polícia
desmilitarizada e protetora da cidadania.
No Brasil não há falta
de dinheiro, o que há é gasto exorbitante com pagamento dos juros. Consciente
disso e com o Lula tem vergonha na cara, desejamos e esperamos uma política de
desconcentração e distribuição de rendas em cumprimento aos mandamentos CONSTITUCIONAIS.
No ensejo de vitórias,
desejo ao presidente Lula pronta e total recuperação.
Fonte: Jornal GGN
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