quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Brasil seguirá linha da presidência russa no BRICS em 2025, diz Vieira

A 16ª Cúpula do BRICS, em Kazan, de 22 a 24 de outubro, marca a culminação da presidência russa do BRICS, mas com o ano passando, o momento em que o Brasil vai se tornar o presidente do grupo está se aproximando.

O ministro das Relações Exteriores brasileiro, Mauro Vieira, revelou, em uma entrevista à Sputnik, os vetores da política que o Brasil pretende desenvolver em sua próxima presidência do BRICS e no cenário mundial em transformação em geral.

Ampliação do BRICS: critérios para candidatos

Segundo o chanceler, o Brasil, durante sua presidência, quer seguir a linha atual que a Rússia, como atual presidente do agrupamento, exerce, aumentando os participantes do grupo.

Vieira disse que a posição brasileira na questão da expansão do BRICS permanece a de que todos os países que querem virar parte do grupo devem acatar os critérios dos países-membros atuais.

"É uma questão de coerência e de promover uma expansão que fortaleça o BRICS politicamente como voz influente no mundo", ressaltou.

Para alcançar esse objetivo, como uma das prioridades das discussões às margens da cúpula, Vieira considera o desenvolvimento e o estabelecimento desses critérios.

Um dos critérios a serem acatados, segundo o desejo brasileiro, é o da defesa da ampliação do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), o que permitiria fortalecer as posições do BRICS e de todo o Sul Global no cenário mundial.

Vieira lembrou que na última cúpula do BRICS, em Joanesburgo, as delegações concordaram que o Brasil, a África do Sul e a Índia deviam ter o direito de ocupar vagas em caso de ampliação do CSNU.

"Nossa posição é a de que a manifestação dos líderes, neste e em outros assuntos relevantes, deve orientar o processo de ampliação", enfatizou.

Tocando o tema da desdolarização e uso de moedas nacionais no comércio dentro do BRICS, o chanceler disse que, embora a questão precise de tempo para se desenvolver, o assunto "desperta grande interesse no presidente Lula, e o Brasil é favorável a que essa nova modalidade fique à disposição".

Ele confirmou que as experiências do Brasil mostraram que há uma possibilidade de realizar essas ideias.

<><> Amigos da Paz e sua capacidade de resolver conflitos

Anteriormente, o ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, disse que a China, o Brasil e outros países do Sul Global com ideias semelhantes pretendem criar a plataforma aberta Amigos da Paz para resolver a crise ucraniana.

Apesar de o assunto não estar na agenda oficial da cúpula, Vieira disse que está pronto para apresentar as ideias principais da proposta.

Porém agora não é o tempo próprio para organizar uma reunião da plataforma, já que é preciso tempo para ela atrair novos países que a avaliariam.

"Qualquer esforço bem-sucedido de abertura de diálogo depende da aceitação pelas partes diretamente envolvidas no conflito", acrescentou.

Quando perguntado sobre a possibilidade de participar na solução do conflito no Oriente Médio, Vieira sublinhou que, embora todas as tentativas de cessar-fogo em Gaza e no Líbano tenham falhado, a posição brasileira continua sendo a solução de dois Estados, um palestino e um israelense, estabelecida pelas Nações Unidas, como única fórmula para a paz na região.

<><> Consequências das eleições nos EUA

O Brasil não tem preocupações sobre os resultados das próximas eleições nos Estados Unidos.

Segundo ele, as relações entre os EUA e a América Latina têm sido formadas durante longo tempo e "são também maduras e muito sólidas", com grande envolvimento das sociedades dos países.

Elas não dependem apenas do líder em exercício, e por isso Vieira disse não esperar alguma mudança radical nas relações entre a região sul-americana e o país norte-americano.

•        'As negociações foram concluídas com êxito': diz sherpa brasileiro do BRICS sobre novos membros

Brasil mantém apoio à reforma do Conselho de Segurança da ONU como critério para adesão de novos países ao BRICS e aposta na categoria de países parceiros. Após dias de reuniões, o sherpa do Brasil no BRICS, embaixador Eduardo Saboia, revelou à Sputnik Brasil os principais avanços nas negociações.

Nesta terça-feira (22), representantes do Itamaraty finalizam as negociações sobre a nova expansão do BRICS e os termos da Declaração Final do grupo. Os resultados serão divulgados durante a Cúpula de Chefes de Estado de Kazan, a ser realizada entre os dias 22 e 23 de outubro.

O embaixador Eduardo Saboia, responsável pelas negociações no âmbito do BRICS, passou os últimos dias cumprindo agenda intensa na Reunião de Sherpas do grupo, iniciada no dia 17 de outubro. Em conversa com a Sputnik Brasil, o diplomata afirmou que a maratona de negociações foi concluída com sucesso.

Um dos pontos focais da agenda foi o estabelecimento de uma categoria de países parceiros do BRICS e seus respectivos critérios de admissão.

"A discussão de critérios para parceiros foi concluída exitosamente e ela inclui aspectos que nós consideramos importantes, como a ideia de que os países [parceiros do BRICS] não devem adotar sanções unilaterais, que devem ter relações amigáveis com todos os países do grupo e apoiar a reforma do Conselho de Segurança da ONU", disse Saboia à Sputnik Brasil.

Para o embaixador Saboia, a inclusão da reforma do Conselho de Segurança na agenda de negociações do BRICS coaduna com o objetivo do bloco de promover a reforma da ordem global.

"Esse é um aspecto importante, já que o BRICS será uma força de transformação da governança global. E essa transformação também requer a reforma do Conselho de Segurança. Portanto, isso foi aprovado", informou Saboia.

Apesar da cobertura midiática da Cúpula de Kazan estar focada na seleção de países candidatos a entrar no BRICS, o embaixador Saboia confirma que a inclusão de novos membros plenos na agremiação, por enquanto, não está na agenda.

"Não há uma discussão sobre a ampliação dos membros, […] o foco é na categoria de países parceiros, que participam das sessões em separado das de líderes e de ministros das Relações Exteriores. Essa é uma prática que já existe, e a categoria de países é uma maneira de organizar essa prática e de dar a ela maior previsibilidade", disse Saboia.

De fato, declarações recentes de autoridades como o presidente russo Vladimir Putin e o vice-ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Ryabkov, notam a necessidade de consolidar a entrada dos novos membros plenos do BRICS, como Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Irã, antes de iniciar uma nova rodada de expansão.

"Apesar de a questão dos critérios para países parceiros estar ganhando muita atenção, eu acho que o grande aspecto dessa reunião [em Kazan] é que estamos reunindo todos os novos membros. É a primeira vez que, em nível de líderes, reuniremos o BRICS ampliado", declarou Saboia. "E isso é um exercício muito importante, porque exige o debate sobre os assuntos que antes eram discutidos somente entre os cinco, e agora terão um espaço muito maior."

O sherpa brasileiro ainda notou os avanços realizados no setor financeiro, um tema caro para a presidência russa do BRICS. O tema estará na agenda dos chefes de Estado nesta quarta-feira (22) e será mantido na lista de prioridades durante 2025, ano em que o Brasil assume o comando do grupo.

"Houve um bom avanço na área de cooperação financeira. Os ministros das Finanças tiveram reuniões nesse ano de presidência da Rússia, e esse trabalho vai prosseguir", disse Saboia. "Essa área deverá receber um novo impulso agora com a reunião de líderes e que vai continuar da presidência russa para a presidência brasileira."

O representante do Itamaraty declarou estar otimista com a presidência brasileira do bloco, apesar da necessidade de acumular a função com a organização da Conferência das Partes do Clima, em Belém do Pará. Por isso, o Brasil planeja realizar a próxima Cúpula do BRICS já no primeiro semestre de 2025.

"O Brasil tem uma tradição de fazer presidências com bons resultados como, por exemplo, a fundação do Novo Banco de Desenvolvimento, [também conhecido como Banco do BRICS], que foi durante a presidência brasileira do BRICS [de 2014]", lembrou Saboia. "Mas como teremos a Conferência do Clima no fim do ano, achamos prudente realizar [a Cúpula do BRICS] já no primeiro semestre."

O representante do Itamaraty garantiu que o calendário apertado não prejudicará a liderança brasileira do bloco, que será exercida ao longo de todo o ano.

"Os temas da nossa presidência refletem as prioridades dos países do BRICS. Na presidência brasileira do G20, procuramos imprimir maior ênfase em alguns eixos: combate à pobreza e à fome, desenvolvimento econômico, sustentabilidade e reforma da governança global. Acredito que esses eixos estarão refletidos na presidência brasileira do BRICS. Mas lembro que é um trabalho coletivo e todos os países terão suas contribuições a dar na presidência brasileira", concluiu o embaixador Saboia.

Nesta terça-feira (22), os preparativos para a Cúpula de Chefes de Estado do BRICS seguem em Kazan, com as delegações focando na agenda bilateral. No período da manhã do horário local, o presidente russo Vladimir Putin se reuniu com a presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento, Dilma Rousseff.

Durante a tarde, o presidente russo deve realizar conversa telefônica com o seu homólogo brasileiro, que não pôde comparecer a Kazan por recomendação médica.

A agenda do presidente russo para esta terça (22) ainda inclui reuniões bilaterais com o presidente da China, Xi Jinping, da África do Sul, Cyril Ramaphosa, e com o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi.

•        Amorim diz que entrada da Venezuela no BRICS não é 'julgamento moral e nem político' e cita Turquia

Na segunda-feira (21), foi ventilado pela mídia brasileira que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria sinalizado a sua equipe internacional que o Brasil não apoiaria a entrada da Venezuela no BRICS.

Nesta terça-feira (22), Celso Amorim, principal assessor de política externa de Lula – o qual teve uma reunião ontem com o presidente – comentou sobre o assunto, afirmando que não se trata de "julgamento moral e nem político", uma vez que o importante é saber da capacidade política e diplomática de novos países integrarem o bloco, e não necessariamente se um Estado ou outro em especial.

"Talvez ainda não seja possível chegar a uma conclusão. Não estou preocupado com a entrada ou não da Venezuela, não estamos fazendo julgamento moral e nem político sobre o país em si. O BRICS tem países que praticam certos tipos de regime, e outros tipos de regime, a questão é saber se eles têm capacidade pelo seu peso político e pela capacidade de relacionamento, de contribuírem para um mundo mais pacífico", afirmou Amorim em entrevista ao jornal O Globo.

A Venezuela se candidatou para ingressar no organismo e, com a primeira cúpula do BRICS ampliado acontecendo hoje (22) e amanhã (23) em Kazan, na Rússia, a candidatura deve ser trazida à mesa.

"O Brasil quer fortalecer o BRICS, tivemos um aumento recente, estamos nos adaptando a esse aumento. A própria Arábia Saudita disse que ia entrar, foi em algumas reuniões, não foi a outras. Queremos que haja BRICS fortalecido, países que possam realmente contribuir para a paz pelo equilíbrio", argumenta o ex-chanceler.

Ao mesmo tempo, Amorim defendeu que não haja uma regra rígida, mas que a cúpula esteja aberta a países que tenham clara capacidade de relacionamento, o que compensaria nações de menor tamanho. O assessor citou o exemplo da Turquia, que não integra o grupo e faz contribuições efetivas.

"Não acho que deve ser restritivo, mas tem países que, pela sua capacidade de relacionamento, compensam tamanho pequeno e a partir dessa ideia podem ter um peso nas relações internacionais, influenciar na paz mundial, no desenvolvimento e na mudança da governança global."

Devido ao acidente doméstico ocorrido no último sábado (18), Lula cancelou a ida à Rússia e enviou o chanceler Mauro Vieira como chefe da delegação brasileira. O presidente participará da cúpula por videoconferência.

•        Brasil é contra as sanções à Rússia, entre os 2 países não há hostilidade, diz Amorim

As sanções contra a Rússia não são um instrumento eficaz de influência e não vão dar resultado, disse Celso Amorim, assessor especial da Presidência do Brasil para assuntos internacionais, em entrevista à mídia alemã às vésperas da cúpula do BRICS em Kazan.

Um jornalista alemão perguntou se o Brasil apoiava a imposição de medidas restritivas contra a Rússia.

Amorim respondeu que seu país não compartilha da opinião do Ocidente sobre essa questão, apontando para as relações amistosas e a ausência de hostilidade entre o Brasil e a Rússia.

"Temos relações normais com a Rússia. Somos contra as sanções", enfatizou Amorim.

Ao discutir a possível eficácia das sanções impostas à Rússia, ele chamou a atenção de seu interlocutor para o fato de a Europa Ocidental ser quem que mais sofre com elas, enquanto a economia da Rússia está crescendo.

"Hoje em dia, os EUA vendem combustível e gás caros para os europeus ocidentais, que precisam ser transportados por mar. Costumava ser mais barato por meio de um gasoduto da Rússia", indicou.

A 16ª Cúpula do BRICS será realizada em Kazan de 22 a 24 de outubro de 2024. Trinta e dois países confirmaram sua participação no evento, 24 dos quais serão representados por chefes de Estado.

Anteriormente, Aleksei Pushkov, chefe da Comissão de Política de Informação e Relações com a Mídia do Conselho da Federação (câmara alta do parlamento) da Rússia, disse que o crescente interesse na cúpula entre os líderes de vários países indica uma perda de fé nos "ideais" ocidentais.

<><> Forte presença de lideranças em Kazan mostra que Putin não está isolado, diz mídia dos EUA

Líderes de 32 países, assim como altos funcionários de organizações regionais e até mesmo o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, participarão da cúpula em Kazan.

A reunião é a primeira desde que o BRICS concordou em estender a filiação a seis nações adicionais na cúpula do ano passado na África do Sul. As novas adesões e a presença de grandes chefes de Estado — como Narendra Modi, Xi Jinping e Cyril Ramaphosa — mostram aos Estados Unidos que a Rússia e Vladimir Putin não são párias internacionais, escreve a Bloomberg.

O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, cancelou no domingo (20) seus planos de comparecer à cúpula após sofrer um ferimento na cabeça em um acidente em sua casa, mas ele participará por videoconferência na quarta-feira (22).

Nações que vão da Malásia e Tailândia até Nicarágua e Turquia — esta última, membra da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) — estão ansiosas para se juntar ao BRICS, embora seja improvável que haja um acordo sobre ampliação na cúpula.

A expansão do BRICS "é um sinal claro de que o equilíbrio global de poder está mudando", disse Alicia Garcia-Herrero, economista de Hong Kong e pesquisadora sênior no think tank Bruegel, citada pela mídia.

A influência do BRICS está crescendo. Seus membros respondem por 45% da população mundial e representam 36% do produto interno bruto (PIB) global — paridade de poder de compra —, superando os 29,3% do G7 e os 14,5% da União Europeia.

O Brasil sediará a cúpula do G20 no mês que vem, após a presidência da Índia no ano passado e antes da África do Sul, em 2025.

O fato de tantos países quererem se juntar ao grupo indica a crescente demanda por laços internacionais independentes do Ocidente, disse Fyodor Lukyanov, chefe do Conselho de Política Externa e de Defesa, um grupo de estudos que assessora o Kremlin.

"Por enquanto, todos querem apenas ver o que podem ganhar com isso", disse ele.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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