sábado, 12 de outubro de 2024

MSF pede proteção de civis e profissionais de saúde em meio aos bombardeios israelenses no Líbano

À medida em que os ataques israelenses se intensificam no Líbano, as unidades de saúde nas áreas mais afetadas pelos bombardeios aéreos estão sendo forçadas a fechar. Isso está levando a consequências devastadoras para os civis e para seu acesso à assistência médica.

As equipes de Médicos Sem Fronteiras (MSF) estão trabalhando incansavelmente para garantir a continuidade do atendimento nas instalações existentes, ao mesmo tempo em que ampliam as atividades para atender às necessidades que estão surgindo do conflito em andamento. No entanto, por causa dos intensos ataques aéreos israelenses, fomos forçados a suspender algumas atividades em áreas altamente afetadas. Continuamos a adaptar nossas atividades para fornecer às pessoas os cuidados de saúde de que necessitam.

MSF pede a todas as partes no conflito que poupem civis, instalações médicas e profissionais de saúde no Líbano para garantir que os serviços de saúde vitais possam atender adequadamente às necessidades médicas urgentes da população.

"Dada a intensidade da violência, danos nas estradas e a falta de garantias de segurança, atualmente não conseguimos chegar a todas as áreas afetadas no Líbano, apesar do crescente aumento das necessidades médicas e humanitárias", diz François Zamparini, coordenador de emergência de MSF no Líbano.

Na semana passada, MSF foi forçada a fechar completamente sua clínica no campo palestino de Burj el Barajneh, nos subúrbios ao sul de Beirute. Também tivemos que suspender temporariamente nossas atividades em Baalbek-Hermel, no nordeste do Líbano. Essas são áreas fortemente afetadas pelos ataques.

“Reabrimos parcialmente nossa clínica em Hermel esta semana para garantir que os pacientes recebam seus medicamentos, fornecendo a eles um estoque de dois a três meses de remédios essenciais, dependendo da gravidade de seu estado de saúde e dos riscos médicos”, acrescenta Zamparini.

Pacientes nessas áreas já são vulneráveis, lutando para acessar os cuidados de saúde dos quais precisam desesperadamente. O fechamento de instalações médicas os deixou sem os serviços essenciais de que precisam, especialmente as pessoas que vivem com doenças crônicas.

As equipes médicas de MSF também continuam impossibilitadas de operar adequadamente no sul do Líbano devido à falta de garantias de segurança para nosso pessoal.

“Um dos hospitais que planejamos apoiar e para o qual doamos medicamentos e kits de trauma, em Nabatiyeh, a apenas alguns quilômetros da linha de frente ativa, foi atingido em 5 de outubro”, explica Zamparini.

Uma equipe médica móvel de MSF, que vinha apoiando ativamente centros de saúde em Nabatiyeh e em outras áreas próximas à fronteira libanesa desde novembro de 2023, foi forçada a interromper suas atividades. A equipe, que antes conseguia acessar áreas próximas à fronteira, não consegue mais fazê-lo e está atualmente limitada a operar apenas até Saida, que fica a cerca de 50 quilômetros ao norte da fronteira sul, onde as necessidades são mais urgentes.

Nas últimas duas semanas, ataques israelenses provocaram a morte de pelo menos 50 paramédicos. Isso eleva o número total de profissionais de saúde mortos desde outubro do ano passado para mais de 100, conforme relatado pelo Ministério da Saúde Pública do Líbano. Os pesados bombardeios israelenses também prejudicaram o acesso a cuidados médicos em todo o Líbano. Em 1º de outubro de 2024, seis hospitais e 40 centros de saúde fecharam suas portas, pois a intensidade dos combates tornou impossível trabalhar sem garantias de segurança, de acordo com o Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA).

O conflito armado está piorando uma crise humanitária em andamento, agravando as necessidades já existentes. O sistema de saúde do Líbano já estava sobrecarregado pela crise econômica do país, o que causou a saída do país de muitos profissionais de saúde e sobrecarregou a capacidade e os recursos das instalações médicas. Os centros de saúde locais, operando no limite, agora enfrentam uma pressão cada vez maior ao tentar atender às crescentes necessidades médicas das pessoas deslocadas.

A quantidade de pessoas que tiveram de deixar seus locais originais de moradia no Líbano supera significativamente a capacidade do país de fornecer abrigo adequado, com mais de 1 milhão de pessoas deslocadas, de acordo com o ACNUR. A maioria dos abrigos onde as pessoas buscam segurança está em condições terríveis. Para responder a essa situação, MSF enviou 12 equipes médicas móveis para várias regiões do país, incluindo Beirute, Monte Líbano, Saida, Trípoli, Bekaa e Akkar. Essas equipes estão fornecendo primeiros socorros psicológicos, consultas médicas gerais e suporte de saúde mental, além de doar colchões, kits de higiene, refeições quentes e água limpa. No entanto, as necessidades das pessoas são muito maiores do que podemos atender.

“Devemos garantir a continuidade do cuidado para aqueles em necessidade”, enfatiza Zamparini. “Pedimos a todas as partes que respeitem o direito humanitário internacional. Civis e infraestrutura civil, instalações médicas e profissionais de saúde não devem ser alvos. Sua segurança deve ser garantida.”

<><> Resposta de MSF à crise humanitária no Líbano

Em resposta à escalada contínua do conflito e aos intensos bombardeios israelenses no Líbano, Médicos Sem Fronteiras (MSF) enviou 12 equipes médicas móveis para várias regiões do país, incluindo Beirute, Monte Líbano, Saida, Trípoli, Bekaa e Akkar. Essas equipes estão oferecendo primeiros socorros psicológicos, consultas médicas gerais, medicamentos e suporte à saúde mental.

MSF também está distribuindo itens essenciais, como cobertores, colchões e kits de higiene, além de fornecer água por caminhões para escolas e abrigos onde as pessoas deslocadas se reuniram. Além disso, estamos oferecendo refeições quentes e água potável para centenas de famílias deslocadas.

MSF também doou combustível e kits de trauma para vários hospitais, posicionou 10 toneladas de suprimentos médicos e treinou mais de 100 profissionais de saúde para atendimento a traumas e gerenciamento de vítimas em massa em todo o país.

¨      MSF é forçada a interromper atendimento a crianças com desnutrição no campo de Zamzam, no Sudão

Médicos Sem Fronteiras (MSF) foi forçada a interromper o tratamento ambulatorial de 5 mil crianças com desnutrição aguda, incluindo 2.900 com desnutrição aguda severa, no acampamento de deslocados de Zamzam, em Darfur do Norte, no Sudão. A suspensão se deve ao bloqueio que já dura meses, promovido pelos dois lados em conflito, na entrega de alimentos, medicamentos e outros suprimentos essenciais.

Com o estoque de suprimentos reduzido, a organização teve que suspender o atendimento ambulatorial no final de setembro. Apenas o hospital de MSF, com 80 leitos, continua funcionando no acampamento, para tratar as crianças com maior risco de morte.

“Há uma necessidade urgente de um fornecimento em massa de produtos nutricionais e alimentos para ajudar a população, que se encontra atualmente em uma situação catastrófica”, alerta Michel-Olivier Lacharité, coordenador de emergência de MSF no Sudão.

“MSF apela às diversas partes envolvidas, aos governos, aos aliados das partes em conflito, às Forças de Apoio Rápido, Forças Armadas Sudanesas e às Forças Conjuntas, para que facilitem a entrega de ajuda humanitária ao acampamento”, pede Lacharité.

Alguns suprimentos chegaram ao acampamento nas últimas semanas, incluindo materiais médicos que MSF conseguiu transportar, mas as quantidades permanecem muito abaixo das necessidades de quem sofre de desnutrição no acampamento de Zamzam, que tem uma população de aproximadamente 450 mil pessoas.

<><> Crise de desnutrição em Zamzam é catastrófica

O Comite de Revisão do quadro integrado de classificação de segurança alimentar (IPC, na sigla em inglês) concluiu, em agosto, que uma grave crise nutricional estava em andamento no acampamento de Zamzam. As próprias avaliações de MSF concluíram que 30% das crianças estavam com desnutrição em várias pesquisas realizadas no início deste ano, estimando que, em média, uma criança morria de causas relacionadas à desnutrição a cada duas horas.

Como a situação em Zamzam hoje também limita a capacidade de MSF de coletar novos dados, a taxa atual de mortalidade entre as crianças não é conhecida.

“Nos últimos dias, vimos alguns sinais positivos, com caminhões chegando após meses de bloqueio quase completo em torno do acampamento. No entanto, essas quantidades são insuficientes”, explica Lacharité.

“Esses são sinais positivos, e podemos ver que as partes em conflito reconhecem a gravidade da situação e estão começando a permitir a chegada de caminhões. Mas se quisermos ter uma resposta massiva, as organizações de ajuda humanitária também terão que intensificar significativamente seus esforços”, acrescenta ele. “E todos os atores diplomáticos que negociam com as partes envolvidas no conflito terão que convencê-las a garantir que essa entrega continue nos próximos meses.”

Por exemplo, para fornecer um mês de suprimentos alimentares de emergência (ou seja, cerca de 500 calorias por dia por pessoa) para as 450 mil pessoas em Zamzam, seriam necessários 2 mil toneladas de suprimentos e 100 caminhões por mês para entregá-los.

 

¨      Como Brasil tem comunidade libanesa maior do que a população do Líbano?

O terceiro voo de repatriação de brasileiros do Líbano chegou a São Paulo na quinta-feira (10/10) em uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) com 218 passageiros a bordo. Os três primeiros voos de repatriação do Líbano já trouxeram ao Brasil 674 pessoas e 11 animais de estimação.

O Líbano é o país que abriga o maior número de brasileiros no Oriente Médio, com uma comunidade estimada em 21 mil pessoas.

Os esforços para resgatar alguns desses cidadãos, que solicitaram repatriação em meio ao conflito entre Israel e Hezbollah, chamaram a atenção para as profundas ligações entre o Brasil e o Líbano.

Além dos brasileiros vivendo no país, a relação também é fortificada pela enorme comunidade de libaneses e descendentes de libaneses que migraram para nosso país desde o final do século 19.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 12.336 libaneses residiam no Brasil em 2010, data do último censo com resultados divulgados. Essa cifra correspondia a 2,9% do total de estrangeiros no país naquele momento.

Mas quando se fala da comunidade libanesa no Brasil, os números estimados são muito maiores. Entre cidadãos e descendentes, a Associação Cultural Brasil-Líbano fala em algo em torno de 8 milhões de pessoas.

Isso faz do Brasil o país com a maior comunidade de libaneses e descendentes do mundo, à frente até mesmo da população do próprio Líbano, que é de cerca de 5,5 milhões atualmente.

Mas como os dois países construíram laços tão fortes, apesar da distância e das diferenças culturais que os separam?

•        A diáspora libanesa

O grande fluxo da migração libanesa ao Brasil data do final do século 19. O primeiro navio com destino ao porto de Santos saiu de Beirute em 1880.

Na época, o que hoje é conhecido como o Líbano encontrava-se sob o domínio do Império Turco-otomano e um sentimento de descontentamento com a situação política, econômica e religiosa motivou um processo de emigração.

“Muitos cristãos sofriam perseguição religiosa, ao mesmo tempo em que o trabalho e as terras ficavam cada vez mais escassos”, reconta Nouha B. Nader, diretora Cultural da Associação Cultural Brasil-Líbano.

Oswaldo Truzzi, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e especialista em sociologia das migrações, explica que a entrada de bens industrializados baratos chegados principalmente da Inglaterra e da França na mesma época também impulsionou a onda migratória.

“Uma ampla gama de bens manufaturados começou a inundar os mercados locais, minando a produção domiciliar e em pequena escala de diversas famílias no interior do país”, diz. “Isso fez com que muitas famílias passassem a enviar alguns de seus membros para o exterior para ajudar no sustento.”

Truzzi afirma ainda que a mudança no regime de alistamento militar do Império Otomano, que se tornou obrigatório por volta do ano de 1909, antes da eclosão da Primeira Guerra Mundial, também motivou muitos homens jovens a deixarem o país.

Por fim, também se atribui ao imperador Dom Pedro 2º parte da responsabilidade. O último monarca do Império do Brasil teria, durante uma visita ao Líbano em 1876, divulgado o país para a população local.

“Ele contou à população local que o Brasil era a terra da riqueza e da prosperidade, onde havia boas perspectivas de trabalho”, diz Nader.

Segundo a diretora da Associação Cultural Brasil-Líbano, os jornais da época noticiaram amplamente a informação, o que também ajudou a construir uma imagem positiva do país entre a população.

•        Destino: América

A grande maioria dos libaneses que deixaram sua terra natal no final do século 19 e início do 20 se dirigiu às Américas.

O grupo era formado principalmente por cristãos, que foram atraídos para a região também pela proximidade religiosa.

Entre 1870 e 1930, os registros são de cerca de 330 mil migrantes que deixaram o que na época era chamado de Bilad al Sham ou “Grande Síria” (territórios que hoje abrangem a Síria, o Líbano, os territórios palestinos e Israel), segundo o Centro Khayrallah para Estudos da Diáspora Libanesa da Universidade Estadual da Carolina do Norte.

Cerca de 120 mil desses migrantes foram para os EUA e outros 210 mil seguiram para a América do Sul, principalmente para Argentina e Brasil.

Naquele momento, os documentos não distinguiam a origem exata dos imigrantes, o que dificulta a contabilização exata da diáspora libanesa.

Mas segundo Oswaldo Truzzi, inicialmente a maior leva se dirigiu para os EUA, onde acreditavam haver melhores oportunidades econômicas.

Aos poucos, porém, o sucesso das famílias que escolheram o Brasil como novo lar passou a atrair cada vez mais interessados, fazendo com que a comunidade crescesse.

Entre 1884 e 1933, 130.000 sírios e libaneses entraram no Brasil pelo Porto de Santos, segundo o pesquisador Jeffrey Lesser, professor de história e diretor do Programa de Estudos Latino-Americanos e Caribenhos da Emory University.

É desta época a abertura do primeiro consulado brasileiro em Beirute, em 1911.

“O Brasil da época não tinha uma classe média desenvolvida. Tínhamos os donos das terras e uma população mais pobre, descendente dos ex-escravizados”, diz o sociólogo Oswaldo Truzzi. “Isso deu espaço para que os libaneses se consolidassem na área comercial e experimentasse uma ascensão econômica e mobilidade social.”

A comunidade se fixou principalmente no estado de São Paulo, onde um centro comercial já começava a se desenvolver em torno da economia cafeeira. Mas alguns libaneses também fixaram residência em Minas Gerais, no Rio de Janeiro e, em menor escala, em outros estados, como o Amazonas, para onde alguns libaneses se deslocaram durante o ciclo da borracha.

Após a primeira onda migratória, o Brasil recebeu pelo menos outras duas grandes ondas de libaneses: uma delas entre 1921 e 1940, também de maioria cristã, e uma segunda entre 1941 a 1970, com maioria de imigrantes muçulmanos fugindo dos conflitos sectários em seu país natal.

O fluxo diminuiu desde então, mas o Brasil segue recebendo libaneses, especialmente do sul do país.

•        Retorno para o Líbano

Ao mesmo tempo, alguns dos libaneses e descendentes que mantiveram família no Líbano acabaram retornando, formando então uma comunidade brasileira no país do Oriente Médio.

“Alguns se mudaram definitivamente, outros vão e vem na medida que as oportunidades aparecem”, explica Truzzi. O pesquisador diz ainda que muitos desses imigrantes brasileiros acabam por fomentar os laços entre Brasil e Líbano atuando na área de exportação e importação entre os dois países.

Entre janeiro e setembro de 2024, o Brasil exportou o equivalente a US$ 345,9 milhões ao Líbano e importou US$ 1,4 milhão.

Nouha Nader, da Associação Cultural Brasil-Líbano, afirma que muitos descendentes de libaneses deixaram o país e voltaram ao Líbano durante as décadas de 1980 e 1990, quando o Brasil entrou em uma crise econômica que só seria dispersada com a consolidação do Plano Real.

“Os libaneses e seus descendentes que viviam aqui, muito dependentes do comércio, decidiram então retornar ao Líbano carregando consigo suas raízes brasileiras”, diz. “A maioria encontra-se no Vale do Bekaa, onde falam português e comem a comida daqui.”

Nader também cita a existência da Avenida República do Líbano na cidade de São Paulo e de uma Rua Brasil próxima ao porto de Beirute, assim como vários outros intercâmbios culturais e artísticos como parte dos fortes laços entre as duas nações.

 

Fonte: MSF.org/BBC News Brasil

 

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