sábado, 12 de outubro de 2024

Eleição em SP: mapas revelam disputa por nova classe média que votou em Marçal

Ricardo Nunes, Guilherme Boulos e Pablo Marçal não obtiveram vitória ampla em nenhuma região de São Paulo no 1º turno das eleições, desbancando a ideia de que áreas ricas e periféricas tiveram seus candidatos preferidos. A análise do LabCidade, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, também indica que o voto em Marçal se concentrou onde emerge uma nova classe média e média alta.

Nos dias seguintes à votação, as redes sociais foram tomadas por afirmações que Marçal, do PRTB, teria “levado” bairros ricos da zona leste da cidade, enquanto o prefeito Ricardo Nunes, que concorre à reeleição pelo MDB, teria vencido na periferia da zona sul.

Esses mapas, no entanto, enganam, segundo os pesquisadores do LabCidade. Nenhum candidato obteve mais de 45% dos votos em alguma zona eleitoral.

Nunes atingiu sua votação máxima em Cidade Ademar, com 35,8% dos votos. Boulos, do PSOL, registrou seu melhor desempenho na Bela Vista, região central, com 43,7% dos votos. Já Marçal obteve sua maior vitória em Anália Franco, na zona leste, com 34,6% da preferência dos eleitores.

“A falta de uma vitória folgada desmonta a ideia de que um ou outro candidato tenha ‘levado as periferias’ ou ‘levado os bairros ricos’ da cidade. Apesar de os votos parecerem mais distribuídos entre vários candidatos, é possível notar algumas concentrações espaciais de votos em alguns deles”, disse Pedro Rezende Mendonça, pesquisador do LabCidade e doutorando IME-USP, ao Intercept Brasil.

•        Onde Nunes e Boulos se destacaram

Na zona sul, Nunes concentrou votos na parte sudoeste, que reúne bairros de classe média e média alta como Moema e Campo Belo, e no extremo sul, que tem bairros de classes mais baixas como Cidade Dutra, Grajaú, Parelheiros e Marsilac.

Essas duas regiões têm dinâmicas diferentes, segundo a análise do LabCidade. O extremo sul, região marcada por processos conflitivos de urbanização, sempre esteve em disputa por organizações de base de esquerda e dinâmicas clientelistas ligadas aos processos de urbanização e controle de serviços públicos.

A boa votação de Nunes nessa região, portanto, sugere um movimento de ganho de votos ligados ao clientelismo, segundo o LabCidade, uma forma política típica do Centrão, com o qual Nunes e o vereador Milton Leite, atual presidente da Câmara dos Vereadores de São Paulo, têm ligação.

Boulos registrou sua maior concentração de votos na Bela Vista, região central da cidade, mas também teve votação expressiva nas periferias da zona leste, em São Mateus e Cidade Tiradentes, e na parte sudeste da zona sul, no Capão Redondo e Campo Limpo.

Esses bairros periféricos possuem uma herança histórica de organização popular por movimentos e siglas da esquerda e permanecem fiéis a essa tradição, aponta o LabCidade, embora haja pressão da ideia do empreendedorismo representada na figura de Marçal. A ideia de que a esquerda teria perdido força nas periferias precisa ser ponderada, segundo o estudo.

O voto em Boulos na região da Bela Vista também deve ser lido no contexto do bairro como tendo uma histórica presença da população negra, ligado à crescente organização de coletivos culturais, de acordo com a análise.

•        Marçal agrada ‘nova classe média e média alta’

A análise do LabCidade constatou que Marçal, apesar de não ter avançado para o segundo turno, teve a maior concentração de votos nas zonas leste, nos bairros do Tatuapé, Belém, Mooca e Anália Franco, e norte, na Vila Maria, Vila Medeiros e Vila Guilherme. Essas áreas já concentravam, em eleições anteriores, o voto bolsonarista.

De acordo com a análise, são regiões de uma “nova classe média e média alta” que se consolidou nas últimas duas décadas, e que vem sendo disputada por diferentes grupos. “Esta classe tem pressionado o espectro político conservador mais tradicional da cidade com o discurso e práticas empreendedoras e uma aversão ao sistema institucional consolidado desde a redemocratização do país,” observou Mendonça.

•        O voto rachado da elite

Nas eleições municipais de 2024, novas disputas dentro dos territórios considerados de elite e de baixa renda alteraram padrões vistos em eleições anteriores, apontou a análise do LabCidade.

Na elite, há um racha entre as classes que concentram os recursos econômicos e a elite intelectual. Na zona leste, bairros próximos à região central demonstram essa divisão dos votos da elite. No vetor sudoeste, região tradicional de concentração de renda, o voto se dividiu entre Nunes e Boulos, mas também houve votação relevante na candidata Tabata Amaral, do PSB.

A periferia também tem visto uma pulverização de votos em distintos perfis políticos. “Depois de décadas de políticas públicas, aumento do salário mínimo e consolidação geracional, hoje, essas áreas passam pelo momento de ascensão de práticas empreendedoras e grande investimento empresarial com impacto social, filantropia e inovação social”, disse Mendonça.

 

•        A urgência de resistir ao fascismo. Por Paulo Moreira Leite

"O candidato da mudança sou eu", lembra Guilherme Boulos. Ele tem razão.

“70% da cidade de São Paulo, incluindo os eleitores do Marçal, votaram pela mudança. Agora essa é uma nova eleição. No segundo turno tem dois caminhos. […]".

“Se você que está assistindo acha que São Paulo está uma cidade segura, se você se sente seguro andando com seu celular, você concorda com o meu adversário. Quem sabe que São Paulo pode mais, merece mais, está comigo e com a Marta. É isso que está em jogo nesse segundo turno”, acrescentou.

Com base nos números apurados no primeiro turno da eleição paulistana, quando uma maioria de eleitores e eleitoras recusou um segundo mandato ao prefeito de plantão, a derrota de Ricardo Nunes no segundo turno depende de um movimento amplo e definitivo.

Num pleito no qual graves denuncias de irregularidades e fraudes aguardam uma investigação séria, o atual prefeito não foi capaz de esconder fraquezas e dificuldades para ludibriar paulistanas e paulistanos.

Conseguiu uma vantagem de apenas 25.012 votos sobre o segundo colocado, fatia irrisória numa cidade com 9,3 milhões de eleitores.

A história da eleição de 2024 cobrará de todo cidadão e toda cidadã a obrigação de fazer sua parte para impedir a consumação de uma tragédia política comparável às maiores catástrofes do passado, processos destrutivos de longa duração que deixam dores e traumas para sempre.

Nestas eleições municipais, que ocorrem num momento de visível enfraquecimento da ordem democrática no país e no conjunto da América do Sul, o destino nacional se encontra diante de dias decisivos, que podem afetar o destino de várias gerações.

Derrotada por Lula no plano nacional, a extrema direita ataca no plano municipal. Vencida na disputa de cima para baixo -- a eleição presidencial --, faz o movimento de baixo para cima, a partir do pleito municipal. Pelo seu cálculo, pode dar no mesmo. A resposta social dirá quem tem razão.

Ponta de lança de um esforço de submissão e recolonização do país, o bolsonarismo de Nunes & Cia representa o mesmo retrocesso em toda linha.

Seu projeto vem embalado a caráter, mas o conteúdo é conhecido: beneficiar ricos e muito ricos, aliados submissos de sombrios regimes truculentos em expansão nesta difícil etapa da evolução humana, quando a ambição imperialista tenta destruir a soberania e o progresso dos povos em várias partes do mundo (basta ler os jornais).

É hora de conversar, compreender e reagir, organizando a resistência contra uma ameaça que pretende destruir avanços e conquistas do passado como primeiro passo para bloquear toda mudança positiva no futuro.

A esperança que sempre moveu os povos, mesmo nos tempos mais difíceis, não acabou nem vai morrer.

Alguma dúvida?

 

•        Boulos tem dois adversários no segundo turno. Por Alex Solnik

Nas eleições a prefeito de São Paulo de 2020, o Datafolha, entre o primeiro e segundo turnos, apontou Bruno Covas 54% e Boulos, 46%. O resultado final foi Bruno Covas 60%, Boulos 40% em votos válidos.

Ou seja: a situação de Boulos era melhor, então, do que a que mostrou o Datafolha, ele com 33% e Nunes, 55%. Algo como dois milhões de votos a menos em nove milhões de eleitores. É a maior diferença entre o primeiro e o segundo colocado em 24 anos.

A composição do eleitorado paulistano mudou.

Desde 1992, dividia-se em tucanos (um terço), petistas (um terço) e o outro terço oscilava ora para tucanos, ora para petistas.

O resultado do primeiro turno revelou um quadro diferente. Somados, os votos de Nunes mais Marçal bateram nos 60%, ou seja, 30% de votos tucanos e 30% de bolsonaristas. E Boulos também teve 30%, o teto do PT.

Por isso, no segundo turno, Boulos, que detém apenas os votos petistas (mas não todos), enfrenta dois adversários: tucanos e bolsonaristas.

Nem tucanos nem bolsonaristas costumam votar em petistas, quanto mais em candidatos do PSOL.

A rejeição de Boulos chegou a 58% porque à sua rejeição do primeiro turno somou-se a rejeição de Marçal, que não está no segundo turno.

Boulos herdou a rejeição de Marçal, mas não os votos, que, segundo o Datafolha, migraram 89% para Nunes.

A coligação de Nunes elegeu 36 vereadores; a de Boulos, 16.

Os números não têm ideologia, nem cor partidária.

São apenas números.

•        Lula diz que "voto não tem dono" e que “Boulos pode ganhar a eleição" em São Paulo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta sexta-feira (11), em entrevista à rádio O Povo/CBN, de Fortaleza, que o candidato à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (Psol), pode virar sobre o prefeito Ricardo Nunes (MDB) e vencer a eleição no segundo turno. Uma pesquisa divulgada pelo Datafolha na última quinta (10) mostra que Nunes lidera a disputa com 55% das intenções de voto, contra 33% de Boulos.

Segundo Lula, “o voto não tem dono”, e a campanha do psolista precisa utilizar o tempo de televisão e os debates para conquistar o eleitor. “O voto não tem dono. O votos nós temos que captar, conquistar. Toda vez que eu abrir a boca para falar, eu tenho que ter a noção de que eu tenho que conquistar alguém. Então o Boulos tem duas semanas, tem vários programas de televisão, vários debates para poder convencer as pessoas. E eu, se puder ajudá-lo, vou ajudá-lo a ganhar esta eleição, porque eu acho que ele pode fazer um bem muito grande para a cidade de São Paulo”, opinou.

No segundo turno, Guilherme Boulos deve apostar na sua imagem como o “candidato da mudança” para atrair o eleitorado que votou em Pablo Marçal (PRTB) no primeiro turno e demonstra insatisfação com a atual gestão da capital paulista. No primeiro turno, Boulos obteve 29,07% dos votos, um resultado próximo ao de Ricardo Nunes, que ficou com 29,48%. Pablo Marçal, por sua vez, alcançou 28,14%.

Outro ponto ressaltado por Lula foi a quantidade de pessoas que se confundiram na hora de votar e digitaram 13 na urna. “O Boulos pode ganhar as eleições. O Boulos é uma figura muito preparada. Nós tivemos um problema no primeiro turno. É muito difícil você convencer um petista, que estava habituado a votar no 13 desde 1980, a votar 50, a votar outro número. Tivemos 50 mil pessoas que votaram no 13. Eu inclusive gravei para o Boulos dizendo ‘olha, quem está habituado a votar no 13 tem que votar agora no 50 na cidade de São Paulo’”, disse.

•        Boulos coloca Marta Suplicy na linha de frente em nova fase da campanha

Marta Suplicy (PT) vai intensificar sua participação na campanha de Guilherme Boulos (Psol) para o segundo turno das eleições em São Paulo. A ex-prefeita, que ocupa a posição de vice na chapa, é vista por aliados como uma peça fundamental para expandir o eleitorado de Boulos nas áreas periféricas da cidade, informa a Folha de S. Paulo. Por isso, a partir de agora, Marta terá uma presença mais constante nas agendas de rua, modificando a estratégia adotada no primeiro turno, quando teve uma atuação discreta, aparecendo majoritariamente na propaganda televisiva.

Até o momento, a participação de Marta foi centrada em sua presença nas peças publicitárias, com o objetivo de suavizar a imagem de Boulos, que ainda enfrenta resistência em alguns segmentos sociais por seu histórico de militância no Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Nesta sexta-feira (11), ela foi um dos principais nomes na propaganda de rádio que marcou a estreia de Boulos no segundo turno.

No primeiro turno, Marta chegou a rebater as críticas que associavam Boulos a um "invasor de terras", defendendo sua trajetória como um líder comprometido com causas sociais. No entanto, a candidata a vice concedeu poucas entrevistas, afirmando que apenas Boulos teria a palavra pela chapa. Segundo integrantes da campanha, Marta manteve uma agenda independente, focada no apoio à vereança do PT, já que o partido não lançou um candidato próprio à prefeitura.

A campanha também justificou a discrição de Marta à sua idade — aos 79 anos, seria um desafio acompanhar o ritmo exaustivo das agendas diárias de Boulos. Agora, porém, os esforços se concentram em reverter o quadro eleitoral, já que, segundo a pesquisa mais recente do Datafolha, Boulos aparece com 29% das intenções de voto entre os mais pobres, atrás do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que tem 56%. O plano é que Marta, com sua experiência e reconhecimento público, relembre feitos de sua gestão à frente da cidade, como a criação dos Centros Educacionais Unificados (CEUs).

A aproximação entre Marta e Boulos é considerada estratégica pelos aliados do Psol e do PT, que se mostram confiantes na aliança. Para eles, a falta de rejeição ao nome de Marta entre os militantes de esquerda, mesmo com seu histórico recente de rompimentos, é um sinal positivo.

 

Fonte: Por Laís Martins, em The Intercept/Brasil 247

 

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