Guilherme Paladino: ‘A democracia da China’
Revolucionando
conceitos, assim como afirma ter construído um “socialismo com características
próprias”, a China vem desenvolvendo, ao longo dos últimos 75 anos, um novo
modelo de democracia – diferente do qual as populações ocidentais estão
acostumadas, mas cujos resultados, na prática, são dignos de reflexão.
Para introduzir a
discussão sobre o assunto, relato aqui uma provocação feita pelo professor
Chang Fuliang (Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim) logo no início
de uma aula ministrada a jornalistas internacionais sobre a ‘Concepção de
Democracia Popular do Processo Integral’ na última semana. Em um slide, ele
exibiu definições de “democracia” em dicionários de espanhol e de chinês, a
saber: no Gran Diccionario De Uso Del Español Actual, afirma-se que
é um “sistema político mediante o qual os cidadãos elegem o Governo de seu país
por votação livre e secreta. É baseado na igualdade de direitos e deveres dos
cidadãos. [...]”; já o Dicionário Chinês Moderno diz que
democracia “refere-se ao direito do povo de participar na gestão dos assuntos
do Estado e dos assuntos sociais ou de expressar livremente opiniões sobre os
assuntos do Estado”. Após ler ambas as definições, o professor apontou: “[Na
definição chinesa] não se menciona a votação. Democracia é uma questão de
atitude”.
DAS
DINASTIAS À REVOLUÇÃO
Para começar a
entender a forma de pensar atual da China, é preciso voltar um pouco no tempo.
Vale lembrar o que era este país até o início do século XX: uma nação governada
por imperadores feudais, quase sempre fechada ao resto do mundo e com uma
população majoritariamente pobre, rural e analfabeta. É impossível
desconsiderar este contexto em qualquer análise sobre o que é o gigante
asiático na atualidade.
Soma-se a este
contexto o fato de que a origem da atual República Popular da China se deu após
um processo revolucionário que durou décadas e contou com grande adesão do
próprio povo chinês, com destaque à população do campo, e precisou enfrentar
inimigos militarmente poderosos tanto internos, como o governo da época
(liderado pelo Partido Nacionalista Kuomintang), quanto externos,
como o Império Japonês, uma das maiores potências asiáticas do período.
Levando tudo isso em
conta, e também considerando a tradição milenar chinesa de possuir Estados
fortes para administrar um território tão vasto e uma população tão volumosa
(muitas vezes ameaçada pelas violentas inundações do Rio Amarelo), começa a ser
mais possível entender a forma de administrar do Partido Comunista Chinês
(PCCh), seu poder hegemônico e sua concepção de democracia.
AS
DEMOCRACIAS
É certo que, para uma
pessoa distante que vê a situação chinesa a partir de um ponto de vista
ocidental (ou seja, que cresceu influenciada pela noção liberal de democracia),
soa contraditório um país se autoproclamar “democrático” e concentrar o poder
político em um mesmo partido há 75 anos. No entanto, vale sempre destacar que a
democracia representativa burguesa – modelo atualmente vigente na maioria dos
países do mundo – não é o único modelo possível e histórico deste sistema
político. Inclusive, é radicalmente distinto do que era a democracia na Atenas
antiga, por exemplo (e, ainda assim, as sociedades ocidentais atuais gostam de
se apropriar da imagem da democracia ateniense como se fossem as únicas
legítimas representantes de seu legado).
Para o PCCh, a
democracia não deve somente se resumir a uma votação para eleger representantes
do povo a cada número determinado de anos (como, na prática, é o que acontece
em boa parte dos países ocidentais). O verdadeiro poder para o povo, na
concepção chinesa, consiste em gerir o Estado de forma a elevar as condições de
vida da população ao aprimorar as condições econômicas, culturais, educativas,
de segurança e de infraestrutura do país.
Vale também ponderar
que, na realidade dos fatos, apesar de o PCCh ser hegemônico na China, trata-se
de um partido de 99 milhões de membros – dos quais, mais de 30% são operários e
trabalhadores rurais –, que internamente conta com intensos debates de opiniões
e que já passou por relevantes mudanças de posicionamento ao longo de sua
história no poder. É um organismo vivo, não um bloco de concreto que permanece
imutável independentemente da circunstância. Além disso, apesar de os critérios
de seleção terem ficado mais exigentes ao longo dos últimos 12 anos, qualquer
cidadão chinês tem a possibilidade de se filiar ao PCCh, ascender na hierarquia
do partido e exercer o poder político no país.
A
REPRESENTAÇÃO POPULAR
Mesmo isso não sendo
um fato de conhecimento comum, sim, também existe o direito a voto na China. Os
cidadãos são responsáveis por eleger seus representantes locais (em cidades
maiores, a eleição é para o distrito; em cidades menores, a eleição é para o município).
A partir disso, estes representantes elegem os representantes das instâncias
superiores, como para os governos municipais, provinciais e, enfim, o Congresso
Nacional do Povo e o Governo Nacional do Povo. As eleições locais, inclusive,
registram mais de 900 milhões de votantes e os candidatos podem ser de qualquer
um dos nove partidos políticos do país ou até mesmo independentes (sem partido
político).
Desta forma, as
decisões superiores não são tomadas apenas pelo ‘líder supremo’ e impostas ao
povo de qualquer maneira. A redação de propostas precisa passar por diferentes
grupos e instâncias de autoridade e, por fim, receber a aprovação do acima
mencionado Congresso Nacional do Povo, mais importante órgão do poder
legislativo, que é composto por 2.980 membros – eleitos para mandatos de cinco
anos –, sendo que mais de 800 não pertencem ao PCCh. De forma complementar ao
CNP, também existe a Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, o
principal órgão consultivo político da China, que conta com participação de
operários, trabalhadores urbanos e rurais, grupos representantes das 55
minorias étnicas chinesas, religiosos, entre outros, e tem a função de discutir
os problemas do país e recomendar melhorias ao PCCh e aos órgãos
nacionais.
Para além da votação
para eleger representantes da estrutura burocrática dos órgãos representativos
oficiais, a participação do povo também se dá em outras etapas do processo
político chinês. Por exemplo, a elaboração dos planos quinquenais conta com etapas
em que se abre espaço às sugestões da população – de acordo com o
portal Xinhua, mais de um milhão de comentários de internautas chineses foram
recebidos durante a elaboração do 14º Plano, em 2020 – e, além disso, foram
realizadas consultas offline e simpósios com legisladores nacionais e
conselheiros políticos para recolher sugestões.
PODER AO
POVO ALÉM DO VOTO – O discurso até agora pode parecer
bonito, mas, na prática, todo esse aparato cumpre o que se propõe a fazer? Na
verdade, são justamente os resultados que sustentam a ideia de democracia
construída pelo PCCh.
Em 1949, a expectativa
de vida dos chineses ao nascer era de 35 anos; hoje, é de 78. O índice de
analfabetismo naquela época era superior a 70%; atualmente, é de 3,2%. A taxa
bruta de matrícula no ensino superior era de 0,26% e, em 2023, chegou a 60,2%. Com
um PIB de US$ 17,71 trilhões, o país ocupa o posto de segunda maior economia do
planeta. O território nacional é quase inteiramente interconectado por
rodovias, ferrovias e vias aéreas, além de contar com alguns dos maiores
sistemas metroviários de todo o mundo. Em relação à segurança, um cidadão
chinês, atualmente, pode caminhar tranquilamente pelas ruas às 3 horas da
madrugada com a certeza de que não será assaltado. O direito ao aborto é
amplamente garantido às mulheres, que também aumentaram seus níveis
educacionais e sua participação no mercado de trabalho e na política ao longo
das últimas décadas.
Uma pesquisa de
2016 do Ash Center for Democratic Governance and Innovation,
de Harvard (EUA), concluiu que 95,5% dos chineses estavam "relativamente
satisfeitos" ou "muito satisfeitos" com o governo central
liderado pelo PCCh. Uma reportagem da Harvard Gazzette sobre o impressionante
nível de aprovação do governo chinês destacou ainda que, “em contraste com
esses resultados, a Gallup informou em janeiro de 2020 que sua pesquisa mais
recente sobre a satisfação dos cidadãos dos EUA com o governo federal revelou
que apenas 38% dos entrevistados estavam satisfeitos com o governo federal”.
Enquanto as
democracias ocidentais e o chamado “mundo livre” passam por cada vez mais
turbulências de ordem social e política, assistindo atônitos ao expressivo
crescimento da extrema direita e de ameaças à ordem institucional, a curva da
China rumo ao desenvolvimento segue mostrando uma tendência de subida. Neste
contexto, mais pessoas ao redor do mundo começam a ver o gigante asiático com
olhos menos desconfiados.
Durante boa parte de
nossa vida, fomos (e seguimos sendo) bombardeados com afirmações de que “a
China não é uma democracia”. Em última análise, de fato, as características da
democracia proposta pelo governo chinês podem não ser exatamente compatíveis com
as do sistema representativo liberal a que estamos acostumados. Contudo, parece
cada vez mais pertinente a reflexão sobre qual dos dois sistemas em debate
verdadeiramente se mostra eficiente em dar condições de bem-estar ao seu povo e
qual se mostra débil em atender às necessidades das pessoas que compõem seu
país.
¨ Militares da Rússia e China têm entendimento comum sobre
situação no mundo, diz MD russo
Os departamentos
militares da Rússia e da China têm pontos de vista comuns quanto aos processos
globais, disse o ministro da Defesa da Rússia, Andrei Belousov, em uma reunião
com Zhang Youxia, vice-presidente do Conselho Militar Central da China.
Belousov chegou a
Pequim no dia anterior (14) em uma visita oficial. No primeiro dia, ele
depositou uma coroa de flores no Monumento aos Heróis do Povo, na praça
Tiananmen, e teve uma conversa com o ministro da Defesa chinês Dong Jun.
"Ontem, tivemos
conversas muito informativas com o ministro da Defesa da República Popular da
China, e percebemos que temos pontos de vista comuns, uma avaliação comum da
situação e um entendimento comum do que precisamos fazer juntos", disse Belousov
hoje (15).
Ele observou que,
graças aos esforços dos líderes dos dois países, Vladimir Putin e Xi Jinping, a
Rússia e a China construíram uma parceria estratégica que se deve
"fortalecer e desenvolver".
O ministro disse
esperar que o dia de hoje em Pequim resulte em um trabalho frutífero e decisões
significativas e importantes.
Belousov também
lembrou que este ano a Rússia e a China comemoram o 75º aniversário do
estabelecimento de relações diplomáticas e, no próximo ano, o 80º aniversário
da vitória conjunta na Segunda Guerra Mundial.
"Temos uma
história conjunta, um longo caminho conjunto. Olhamos para o futuro com
confiança", concluiu o ministro da Defesa da Rússia.
Youxia, por sua vez,
ressaltou que a China e a Rússia precisam continuar a aprofundar a cooperação
entre as Forças Armadas dos dois países.
De acordo com ele, a
China está dando atenção especial à visita oficial do ministro da Defesa russo.
"Esta é sua
primeira visita à China após sua nomeação como ministro da Defesa, e estamos
organizando tudo e dando atenção especial a ela", disse Zhang Yuxia.
Ele também observou
que os ministros da Defesa da Rússia e da China mantiveram conversas muito
francas em Pequim no dia anterior (14) e chegaram a uma opinião comum sobre
muitas questões.
¨
UE se prepara para
resposta comercial chinesa após decisão do bloco sobre tarifas aos VEs, diz
mídia
Autoridades da União
Europeia (UE) estão se preparando para um ataque de ações comerciais
retaliatórias depois que uma equipe de autoridades chinesas encarregadas de
resolver uma disputa de tarifa de veículos elétricos (VE) foi levada de volta a
Pequim no fim de semana.
As tarifas de
importação punitivas do bloco europeu de até 35,3% sobre os VEs chineses devem
entrar em vigor até o final do mês, encerrando uma investigação antissubsídios
de um ano.
Apesar de ambas as
partes ponderarem a necessidade de entrar em acordo, os negociadores permanecem
a quilômetros de distância, segundo pessoas familiarizadas com as discussões
ouvidas pelo South China Morning Post (SCMP).
No sábado (12), o
Ministério do Comércio da China disse que suas autoridades retornaram a Pequim,
sem conseguir chegar a um acordo. "Até agora, as consultas não chegaram a
uma solução aceitável para ambos os lados", disse o ministério.
Os dois lados não
conseguem concordar sobre como os princípios básicos de um compromisso de preço
devem funcionar, muito menos quem pagaria o que, deixando pouca esperança de
uma resolução antes que as taxas dos VEs entrem em vigor já em novembro.
Ao longo das
negociações, no entanto, a China vinculou um acordo de investimentos futuros no
setor de veículos elétricos da Europa, dizendo que impostos mais baixos
liberariam liquidez para empresas chinesas construírem fábricas lá — o que
aparentemente não foi o suficiente para seduzir os tomadores de decisão
europeus.
As formas de
retaliação de Pequim, agora, são diversas. Já na semana passada, a China
introduziu tarifas ao conhaque e pegou a Comissão Europeia desprevenida. É
possível prever ainda um aumento de tarifa sobre carros de motor grande — o que
afetaria a Alemanha e a Eslováquia, que votaram contra as tarifas de veículos
elétricos.
Mesmo diante do
impasse e ainda à espera de desdobramento, a pressão chinesa também tem sido
vista no mercado como uma forma de impedir que a UE lance ainda mais ações
comerciais de alto nível contra a China, fazendo com que a polêmica entorno dos
VEs esgote o apetite dos Estados-membros por mais confrontos.
¨ BMW: Europa terá que cancelar proibição de motores a gasolina se
quer reduzir comércio com China
A Europa deve cancelar
seu plano de proibir novos carros que emitem combustíveis fósseis a partir de
2035 se quer reduzir a dependência da cadeia de fornecimento de baterias da
China, disse a BMW nesta terça-feira (15).
O CEO da BMW, Oliver
Zipse, disse que há muito tempo pressiona os reguladores para permitirem novas
tecnologias no setor, mas que o clima na Europa estava "tendendo para o
pessimismo", e que a região precisava de uma nova estrutura regulatória
para permanecer competitiva.
"Uma correção da
meta de 100% de veículos elétricos a bateria para 2035 como parte de um pacote
abrangente de redução de CO2 também daria aos OEMs europeus menos dependência
da China para baterias [...] [a fim de] manter o curso bem-sucedido, um caminho
estritamente independente de tecnologia dentro da estrutura política é
essencial", disse Zipse no Salão do Automóvel de Paris, segundo a Reuters.
Também em Paris, o
chefe da associação automobilística francesa PFA, não chegou a pedir a abolição
da proibição de 2035, mas disse que era necessário "voltar à mesa"
rapidamente para discutir a revisão das metas, atualmente programada para 2026,
relata a mídia.
Em março de 2023, os
países da UE aprovaram uma lei histórica que exigiria que todos os carros novos
tivessem zero emissões de CO2 a partir de 2035, proibindo efetivamente veículos
a diesel e gasolina, e 55% menos emissões de CO2 a partir de 2030, em comparação
aos níveis de 2021.
A discussão acontece
em meio a uma verdadeira guerra comercial entre a União Europeia e a China,
após o bloco europeu aplicar altas taxas na importação de veículos elétricos
chineses. Em retaliação, Pequim está estudando introduzir taxas sob os europeus
no setor de bebidas alcóolicas e laticínios.
A Alemanha, país de
Zipse, foi um dos apenas cinco países-membros da União Europeia que votou
contra as tarifas contra os chineses.
Fonte: Brasil
247/Sputnik Brasil
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