quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Guilherme Paladino: ‘A democracia da China’

Revolucionando conceitos, assim como afirma ter construído um “socialismo com características próprias”, a China vem desenvolvendo, ao longo dos últimos 75 anos, um novo modelo de democracia – diferente do qual as populações ocidentais estão acostumadas, mas cujos resultados, na prática, são dignos de reflexão.

Para introduzir a discussão sobre o assunto, relato aqui uma provocação feita pelo professor Chang Fuliang (Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim) logo no início de uma aula ministrada a jornalistas internacionais sobre a ‘Concepção de Democracia Popular do Processo Integral’ na última semana. Em um slide, ele exibiu definições de “democracia” em dicionários de espanhol e de chinês, a saber: no Gran Diccionario De Uso Del Español Actual, afirma-se que é um “sistema político mediante o qual os cidadãos elegem o Governo de seu país por votação livre e secreta. É baseado na igualdade de direitos e deveres dos cidadãos. [...]”; já o Dicionário Chinês Moderno diz que democracia “refere-se ao direito do povo de participar na gestão dos assuntos do Estado e dos assuntos sociais ou de expressar livremente opiniões sobre os assuntos do Estado”. Após ler ambas as definições, o professor apontou: “[Na definição chinesa] não se menciona a votação. Democracia é uma questão de atitude”.

DAS DINASTIAS À REVOLUÇÃO

Para começar a entender a forma de pensar atual da China, é preciso voltar um pouco no tempo. Vale lembrar o que era este país até o início do século XX: uma nação governada por imperadores feudais, quase sempre fechada ao resto do mundo e com uma população majoritariamente pobre, rural e analfabeta. É impossível desconsiderar este contexto em qualquer análise sobre o que é o gigante asiático na atualidade.

Soma-se a este contexto o fato de que a origem da atual República Popular da China se deu após um processo revolucionário que durou décadas e contou com grande adesão do próprio povo chinês, com destaque à população do campo, e precisou enfrentar inimigos militarmente poderosos tanto internos, como o governo da época (liderado pelo Partido Nacionalista Kuomintang), quanto externos, como o Império Japonês, uma das maiores potências asiáticas do período.

Levando tudo isso em conta, e também considerando a tradição milenar chinesa de possuir Estados fortes para administrar um território tão vasto e uma população tão volumosa (muitas vezes ameaçada pelas violentas inundações do Rio Amarelo), começa a ser mais possível entender a forma de administrar do Partido Comunista Chinês (PCCh), seu poder hegemônico e sua concepção de democracia.

AS DEMOCRACIAS

É certo que, para uma pessoa distante que vê a situação chinesa a partir de um ponto de vista ocidental (ou seja, que cresceu influenciada pela noção liberal de democracia), soa contraditório um país se autoproclamar “democrático” e concentrar o poder político em um mesmo partido há 75 anos. No entanto, vale sempre destacar que a democracia representativa burguesa – modelo atualmente vigente na maioria dos países do mundo – não é o único modelo possível e histórico deste sistema político. Inclusive, é radicalmente distinto do que era a democracia na Atenas antiga, por exemplo (e, ainda assim, as sociedades ocidentais atuais gostam de se apropriar da imagem da democracia ateniense como se fossem as únicas legítimas representantes de seu legado).

Para o PCCh, a democracia não deve somente se resumir a uma votação para eleger representantes do povo a cada número determinado de anos (como, na prática, é o que acontece em boa parte dos países ocidentais). O verdadeiro poder para o povo, na concepção chinesa, consiste em gerir o Estado de forma a elevar as condições de vida da população ao aprimorar as condições econômicas, culturais, educativas, de segurança e de infraestrutura do país. 

Vale também ponderar que, na realidade dos fatos, apesar de o PCCh ser hegemônico na China, trata-se de um partido de 99 milhões de membros – dos quais, mais de 30% são operários e trabalhadores rurais –, que internamente conta com intensos debates de opiniões e que já passou por relevantes mudanças de posicionamento ao longo de sua história no poder. É um organismo vivo, não um bloco de concreto que permanece imutável independentemente da circunstância. Além disso, apesar de os critérios de seleção terem ficado mais exigentes ao longo dos últimos 12 anos, qualquer cidadão chinês tem a possibilidade de se filiar ao PCCh, ascender na hierarquia do partido e exercer o poder político no país.

A REPRESENTAÇÃO POPULAR

Mesmo isso não sendo um fato de conhecimento comum, sim, também existe o direito a voto na China. Os cidadãos são responsáveis por eleger seus representantes locais (em cidades maiores, a eleição é para o distrito; em cidades menores, a eleição é para o município). A partir disso, estes representantes elegem os representantes das instâncias superiores, como para os governos municipais, provinciais e, enfim, o Congresso Nacional do Povo e o Governo Nacional do Povo. As eleições locais, inclusive, registram mais de 900 milhões de votantes e os candidatos podem ser de qualquer um dos nove partidos políticos do país ou até mesmo independentes (sem partido político).

Desta forma, as decisões superiores não são tomadas apenas pelo ‘líder supremo’ e impostas ao povo de qualquer maneira. A redação de propostas precisa passar por diferentes grupos e instâncias de autoridade e, por fim, receber a aprovação do acima mencionado Congresso Nacional do Povo, mais importante órgão do poder legislativo, que é composto por 2.980 membros – eleitos para mandatos de cinco anos –, sendo que mais de 800 não pertencem ao PCCh. De forma complementar ao CNP, também existe a Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, o principal órgão consultivo político da China, que conta com participação de operários, trabalhadores urbanos e rurais, grupos representantes das 55 minorias étnicas chinesas, religiosos, entre outros, e tem a função de discutir os problemas do país e recomendar melhorias ao PCCh e aos órgãos nacionais. 

Para além da votação para eleger representantes da estrutura burocrática dos órgãos representativos oficiais, a participação do povo também se dá em outras etapas do processo político chinês. Por exemplo, a elaboração dos planos quinquenais conta com etapas em que se abre espaço às sugestões da população – de acordo com o portal Xinhua, mais de um milhão de comentários de internautas chineses foram recebidos durante a elaboração do 14º Plano, em 2020 – e, além disso, foram realizadas consultas offline e simpósios com  legisladores nacionais e conselheiros políticos para recolher sugestões.

PODER AO POVO ALÉM DO VOTO – O discurso até agora pode parecer bonito, mas, na prática, todo esse aparato cumpre o que se propõe a fazer? Na verdade, são justamente os resultados que sustentam a ideia de democracia construída pelo PCCh.

Em 1949, a expectativa de vida dos chineses ao nascer era de 35 anos; hoje, é de 78. O índice de analfabetismo naquela época era superior a 70%; atualmente, é de 3,2%. A taxa bruta de matrícula no ensino superior era de 0,26% e, em 2023, chegou a 60,2%. Com um PIB de US$ 17,71 trilhões, o país ocupa o posto de segunda maior economia do planeta. O território nacional é quase inteiramente interconectado por rodovias, ferrovias e vias aéreas, além de contar com alguns dos maiores sistemas metroviários de todo o mundo. Em relação à segurança, um cidadão chinês, atualmente, pode caminhar tranquilamente pelas ruas às 3 horas da madrugada com a certeza de que não será assaltado. O direito ao aborto é amplamente garantido às mulheres, que também aumentaram seus níveis educacionais e sua participação no mercado de trabalho e na política ao longo das últimas décadas.

Uma pesquisa de 2016 do Ash Center for Democratic Governance and Innovation, de Harvard (EUA), concluiu que 95,5% dos chineses estavam "relativamente satisfeitos" ou "muito satisfeitos" com o governo central liderado pelo PCCh. Uma reportagem da Harvard Gazzette sobre o impressionante nível de aprovação do governo chinês destacou ainda que, “em contraste com esses resultados, a Gallup informou em janeiro de 2020 que sua pesquisa mais recente sobre a satisfação dos cidadãos dos EUA com o governo federal revelou que apenas 38% dos entrevistados estavam satisfeitos com o governo federal”.

Enquanto as democracias ocidentais e o chamado “mundo livre” passam por cada vez mais turbulências de ordem social e política, assistindo atônitos ao expressivo crescimento da extrema direita e de ameaças à ordem institucional, a curva da China rumo ao desenvolvimento segue mostrando uma tendência de subida. Neste contexto, mais pessoas ao redor do mundo começam a ver o gigante asiático com olhos menos desconfiados.

Durante boa parte de nossa vida, fomos (e seguimos sendo) bombardeados com afirmações de que “a China não é uma democracia”. Em última análise, de fato, as características da democracia proposta pelo governo chinês podem não ser exatamente compatíveis com as do sistema representativo liberal a que estamos acostumados. Contudo, parece cada vez mais pertinente a reflexão sobre qual dos dois sistemas em debate verdadeiramente se mostra eficiente em dar condições de bem-estar ao seu povo e qual se mostra débil em atender às necessidades das pessoas que compõem seu país. 

 

¨      Militares da Rússia e China têm entendimento comum sobre situação no mundo, diz MD russo

Os departamentos militares da Rússia e da China têm pontos de vista comuns quanto aos processos globais, disse o ministro da Defesa da Rússia, Andrei Belousov, em uma reunião com Zhang Youxia, vice-presidente do Conselho Militar Central da China.

Belousov chegou a Pequim no dia anterior (14) em uma visita oficial. No primeiro dia, ele depositou uma coroa de flores no Monumento aos Heróis do Povo, na praça Tiananmen, e teve uma conversa com o ministro da Defesa chinês Dong Jun.

"Ontem, tivemos conversas muito informativas com o ministro da Defesa da República Popular da China, e percebemos que temos pontos de vista comuns, uma avaliação comum da situação e um entendimento comum do que precisamos fazer juntos", disse Belousov hoje (15).

Ele observou que, graças aos esforços dos líderes dos dois países, Vladimir Putin e Xi Jinping, a Rússia e a China construíram uma parceria estratégica que se deve "fortalecer e desenvolver".

O ministro disse esperar que o dia de hoje em Pequim resulte em um trabalho frutífero e decisões significativas e importantes.

Belousov também lembrou que este ano a Rússia e a China comemoram o 75º aniversário do estabelecimento de relações diplomáticas e, no próximo ano, o 80º aniversário da vitória conjunta na Segunda Guerra Mundial.

"Temos uma história conjunta, um longo caminho conjunto. Olhamos para o futuro com confiança", concluiu o ministro da Defesa da Rússia.

Youxia, por sua vez, ressaltou que a China e a Rússia precisam continuar a aprofundar a cooperação entre as Forças Armadas dos dois países.

De acordo com ele, a China está dando atenção especial à visita oficial do ministro da Defesa russo.

"Esta é sua primeira visita à China após sua nomeação como ministro da Defesa, e estamos organizando tudo e dando atenção especial a ela", disse Zhang Yuxia.

Ele também observou que os ministros da Defesa da Rússia e da China mantiveram conversas muito francas em Pequim no dia anterior (14) e chegaram a uma opinião comum sobre muitas questões.

 

¨      UE se prepara para resposta comercial chinesa após decisão do bloco sobre tarifas aos VEs, diz mídia

Autoridades da União Europeia (UE) estão se preparando para um ataque de ações comerciais retaliatórias depois que uma equipe de autoridades chinesas encarregadas de resolver uma disputa de tarifa de veículos elétricos (VE) foi levada de volta a Pequim no fim de semana.

As tarifas de importação punitivas do bloco europeu de até 35,3% sobre os VEs chineses devem entrar em vigor até o final do mês, encerrando uma investigação antissubsídios de um ano.

Apesar de ambas as partes ponderarem a necessidade de entrar em acordo, os negociadores permanecem a quilômetros de distância, segundo pessoas familiarizadas com as discussões ouvidas pelo South China Morning Post (SCMP).

No sábado (12), o Ministério do Comércio da China disse que suas autoridades retornaram a Pequim, sem conseguir chegar a um acordo. "Até agora, as consultas não chegaram a uma solução aceitável para ambos os lados", disse o ministério.

Os dois lados não conseguem concordar sobre como os princípios básicos de um compromisso de preço devem funcionar, muito menos quem pagaria o que, deixando pouca esperança de uma resolução antes que as taxas dos VEs entrem em vigor já em novembro.

Ao longo das negociações, no entanto, a China vinculou um acordo de investimentos futuros no setor de veículos elétricos da Europa, dizendo que impostos mais baixos liberariam liquidez para empresas chinesas construírem fábricas lá — o que aparentemente não foi o suficiente para seduzir os tomadores de decisão europeus.

As formas de retaliação de Pequim, agora, são diversas. Já na semana passada, a China introduziu tarifas ao conhaque e pegou a Comissão Europeia desprevenida. É possível prever ainda um aumento de tarifa sobre carros de motor grande — o que afetaria a Alemanha e a Eslováquia, que votaram contra as tarifas de veículos elétricos.

Mesmo diante do impasse e ainda à espera de desdobramento, a pressão chinesa também tem sido vista no mercado como uma forma de impedir que a UE lance ainda mais ações comerciais de alto nível contra a China, fazendo com que a polêmica entorno dos VEs esgote o apetite dos Estados-membros por mais confrontos.

¨      BMW: Europa terá que cancelar proibição de motores a gasolina se quer reduzir comércio com China

A Europa deve cancelar seu plano de proibir novos carros que emitem combustíveis fósseis a partir de 2035 se quer reduzir a dependência da cadeia de fornecimento de baterias da China, disse a BMW nesta terça-feira (15).

O CEO da BMW, Oliver Zipse, disse que há muito tempo pressiona os reguladores para permitirem novas tecnologias no setor, mas que o clima na Europa estava "tendendo para o pessimismo", e que a região precisava de uma nova estrutura regulatória para permanecer competitiva.

"Uma correção da meta de 100% de veículos elétricos a bateria para 2035 como parte de um pacote abrangente de redução de CO2 também daria aos OEMs europeus menos dependência da China para baterias [...] [a fim de] manter o curso bem-sucedido, um caminho estritamente independente de tecnologia dentro da estrutura política é essencial", disse Zipse no Salão do Automóvel de Paris, segundo a Reuters.

Também em Paris, o chefe da associação automobilística francesa PFA, não chegou a pedir a abolição da proibição de 2035, mas disse que era necessário "voltar à mesa" rapidamente para discutir a revisão das metas, atualmente programada para 2026, relata a mídia.

Em março de 2023, os países da UE aprovaram uma lei histórica que exigiria que todos os carros novos tivessem zero emissões de CO2 a partir de 2035, proibindo efetivamente veículos a diesel e gasolina, e 55% menos emissões de CO2 a partir de 2030, em comparação aos níveis de 2021.

A discussão acontece em meio a uma verdadeira guerra comercial entre a União Europeia e a China, após o bloco europeu aplicar altas taxas na importação de veículos elétricos chineses. Em retaliação, Pequim está estudando introduzir taxas sob os europeus no setor de bebidas alcóolicas e laticínios.

A Alemanha, país de Zipse, foi um dos apenas cinco países-membros da União Europeia que votou contra as tarifas contra os chineses.

 

Fonte: Brasil 247/Sputnik Brasil

 

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