“Tramar
contra o Estado de Direito é gravíssimo e merece medidas rígidas”, diz advogado
Michel Saliba
Em
entrevista ao programa Boa Noite 247, transmitido pela TV 247, o advogado
Michel Saliba fez uma análise detalhada do relatório da Polícia Federal que
investiga a tentativa de golpe de Estado associada ao ex-presidente Jair
Bolsonaro e seus aliados. Saliba defendeu ações firmes contra os envolvidos,
criticou a impunidade histórica e avaliou os riscos políticos de medidas como a
prisão preventiva de Bolsonaro. “Tramar contra o Estado de Direito é um dos
delitos mais graves que temos”, afirmou.
O
advogado traçou um panorama histórico sobre as raízes do autoritarismo no
Brasil, apontando que setores saudosistas da ditadura militar sempre
representaram cerca de 30% do eleitorado. Ele relacionou esse apoio ao
fortalecimento de figuras como Jair Bolsonaro, especialmente após o desgaste
político causado pela Operação Lava Jato. “A Lava Jato trabalhou para destruir
a imagem não só de Lula e do PT, mas também de figuras como Marina Silva e
Geraldo Alckmin, facilitando a ascensão de Bolsonaro”, observou.
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Planejamento de golpe e riscos de fuga
Sobre
o conteúdo do relatório da Polícia Federal, Saliba destacou que a tentativa de
golpe não foi um ato improvisado, mas sim uma trama planejada desde 2019,
envolvendo militares e civis. Segundo ele, evidências como mensagens e
documentos revelam que Bolsonaro estava ciente e diretamente envolvido no
planejamento. “O relatório é assombroso. Ele traz provas contundentes de que
havia um esquema para desacreditar as urnas e preparar um golpe ainda antes da
posse de Lula”, explicou.
Quando
questionado sobre a possibilidade de fuga dos investigados, incluindo o
ex-presidente, Saliba foi categórico: “Apenas retirar os passaportes desses
envolvidos não é suficiente. Há o risco real de fuga, inclusive para países
como a Argentina, onde poderiam buscar asilo político.” Ele defendeu o uso de
medidas cautelares como tornozeleiras eletrônicas para monitorar os suspeitos,
especialmente aqueles com indícios mais robustos de envolvimento, como os
generais Braga Netto e Augusto Heleno.
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Impacto político e cautela com Bolsonaro
Embora
reconheça os crimes graves atribuídos a Bolsonaro, Saliba argumentou contra sua
prisão preventiva, citando razões políticas. “Ele usaria a prisão como trunfo
para se vitimizar e fortalecer sua base de apoio. É melhor expô-lo
publicamente, mostrando sua culpa, até que seja condenado definitivamente”,
ponderou. O advogado lembrou casos emblemáticos como o Mensalão e a prisão de
Lula para reforçar a necessidade de prudência em decisões que envolvem figuras
públicas de alta relevância política.
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Militares e sociedade civil sob suspeita
Saliba
também chamou atenção para o papel das Forças Armadas e de setores da sociedade
civil no apoio à tentativa de golpe. Segundo ele, há indícios de que
empresários e fazendeiros do Centro-Oeste e do Sul do país financiaram
mobilizações antidemocráticas, incluindo os atos de 8 de janeiro. “Esses
setores sabiam que a trama estava em curso. A impunidade histórica de militares
e civis que atentaram contra a democracia é a madrasta dessa repetição trágica
que vivemos no Brasil”, afirmou.
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Oito de janeiro: “uma tentativa desesperada”
Para
Saliba, os ataques de 8 de janeiro foram fruto do desespero após o fracasso de
planos mais ambiciosos. Ele criticou a leniência de autoridades militares que,
embora tenham rejeitado o golpe, não tomaram medidas legais contra os
conspiradores. “O que ocorreu em janeiro não foi algo espontâneo. Havia
cumplicidade de setores das forças de segurança, que preferiram assistir à
barbárie em vez de agir.”
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Perspectivas para o futuro
O
advogado concluiu sua análise com um tom cauteloso, afirmando que, mesmo com
punições exemplares, o Brasil ainda enfrentará desafios para consolidar sua
democracia. “Temos um número significativo de apoiadores da extrema direita,
que continuarão presentes. A impunidade histórica e a falta de delimitação
clara do papel dos militares na sociedade ainda são barreiras para o nosso
avanço democrático”, avaliou.
• Fatos muito graves e
aposta no caos, avalia historiador sobre golpe
“Os
fatos foram muito graves e não ficaram apenas no plano dos discursos e do
tensionamento político contra a democracia, mas apostaram e trabalharam pelo
caos social e pela volta da ditadura”. A avaliação sobre os fatos recentemente
revelados pela Polícia Federal a respeito da tentativa de golpe contra a
democracia do país é do historiador Marcos Napolitano, professor do curso de
História da Universidade de São Paulo (USP), pesquisador da Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e especialista na república
brasileira, com ênfase no período militar.
Para
Napolitano, o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Polícia Federal fizeram o que
deviam, “o que já é um avanço”, e agora é preciso aguardar a posição da
Procuradoria Geral da República (PGR), que vai decidir se abre ou não inquérito
para apurar as responsabilidades dos envolvidos na intentona golpista, urgida
sob o governo do então presidente Jair Bolsonaro.
O
historiador disse também que, uma das razões sobre o golpe não ter prosperado,
foi a existência de mais consensos liberal-democráticos nas instituições
políticas e jurídicas do que no passado. Mas, para ele, a principal razão para
o fracasso golpista foi a falta de organização e de apoio institucional,
principalmente por parte de setores liberais e da classe média, “que desta vez
não embarcaram na aventura, ao contrário de 2016” – quando a presidenta Dilma
Rousseff foi deposta pelo Congresso Nacional num controverso processo de
impeachment.
“Os
golpistas de 2022 tinham até um razoável apoio na sociedade, mas sem apoio
institucional nas Forças Armadas, nos grupos políticos organizados (partidos,
associações civis), na imprensa e no parlamento, golpes dificilmente prosperam.
Mas isso não diminui a gravidade do crime cometido contra a democracia por
lideranças civis e militares entre 2022 e início de 2023”, explicou Napolitano.
O
pesquisador disse ainda que a recente tentativa de golpe é “um filho, ainda que
indesejado, da crise política de 2015 e 2016 e do lavajatismo”. Conforme
Napolitano, “as lideranças e simpatizantes da extrema direita se animaram com o
golpe de 2016, que foi basicamente um golpe parlamentar com apoio social e
jurídico”. Mas, para ele, “ficaram com a sensação de que aquele trabalho não
foi bem feito, posto que Lula ainda podia voltar ao poder pela vida eleitoral”
Napolitano
recordou que houve vários golpes de Estado entre 1950 e 1964, “alguns muito
estapafúrdios e tresloucados”. “De tanto errar os golpistas aprenderam e se
organizaram melhor para 1964”, comentou. Por isso, o pesquisador acredita que é
preciso “ficar alerta, punir tentativas de golpes e não ficar no discurso
otimista de que ‘nossas instituições são forte’ ou ‘a sociedade não aceita mais
golpes de Estado”.
Para
dar bases mais sólidas para a democracia brasileira e inibir novas intentonas
golpistas, ele acredita que é preciso “fortalecer a crença na democracia e nas
formas negociadas de resolução de conflito no dia a dia do cidadão comum de
todas as classes e grupos sociais, nas escolas, igrejas, famílias e
vizinhanças”. Mas, ressalta: “isso é muito difícil em um país extremamente
desigual, violento e com uma cultura política autoritária resiliente entre os
próprios atores institucionais, inclusive”.
Também,
conforme Napolitano, é preciso que “as elites políticas de todas as ideologias
saibam isolar aventureiros e golpistas que surgem de quando em quando dentro do
próprio sistema político e que tenham seriedade para administrar o país de
maneira minimamente decente e republicana”. E conclui: “E, por fim, punir os
golpistas civis e militares de maneira exemplar e dentro dos marcos da lei”.
• "Por um triz,
evitamos o golpe, por um triz derrotamos o 8 de janeiro. Não podemos continuar
vivendo no limite", diz Genoino
José
Genoino, ex-deputado federal e ex-presidente do PT, participou de uma
entrevista na TV 247, conduzida por Dafne Ashton. O programa, intitulado
Conversa de Política, trouxe uma análise aprofundada sobre os recentes áudios
vazados que expõem planos golpistas ligados ao governo de Jair Bolsonaro.
Genoino destacou que o Brasil passou por um risco iminente de mergulhar em uma
ditadura militar, uma trama que, segundo ele, teve como base um projeto
golpista articulado entre setores militares e civis.
Durante
o programa, Genoino apontou a gravidade das revelações trazidas pelos áudios
divulgados, que mostram uma tentativa estruturada de rompimento da ordem
democrática. "Essa trama golpista faz parte de um projeto que tinha nas
Forças Armadas sua principal sustentação", afirmou, ressaltando que havia
uma clara divisão entre militares golpistas, omissos e aqueles que preferiram
"pagar para ver". Ele reforçou que a transição política e democrática
do Brasil deixou intocados os mecanismos de tutela militar, perpetuando um
risco à estabilidade democrática.
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Reforma e punição: os desafios internos
A
questão militar foi o ponto central da entrevista. Genoino argumentou que o
Brasil precisa enfrentar de forma decisiva a autonomia das Forças Armadas, que,
desde a redemocratização, têm mantido uma posição de tutela sobre os demais
poderes. "Se não discutirmos a reforma institucional e enfrentarmos a
tutela militar, continuaremos vulneráveis a aventuras autoritárias",
afirmou.
Ele
citou episódios recentes, como os acampamentos em frente aos quartéis e o
vandalismo dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023, como exemplos da
impunidade e da falta de controle sobre as forças militares. "As hidras
golpistas estão germinando dentro de um ambiente favorável de omissão e
conivência", alertou.
Genoino
também criticou a atuação do governo e do ministro da Defesa, José Múcio, que
minimizou as responsabilidades individuais e institucionais de militares
envolvidos em atos golpistas. "Não dá para reduzir isso a CPFs e CNPJs. É
preciso reformar a instituição e punir os envolvidos", reforçou.
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O papel da sociedade civil e do judiciário
Outro
ponto abordado foi a importância da mobilização popular para pressionar por
justiça e mudanças estruturais. Ele relembrou o grito "Sem Anistia",
entoado pela população durante a posse do presidente Lula, como um símbolo da
luta contra a impunidade. "Devemos transformar esse grito em uma agenda de
2024 e 2025", disse.
Genoino
elogiou o trabalho do ministro do STF Alexandre de Moraes, responsável por
conduzir as investigações sobre os envolvidos na tentativa de golpe. Contudo,
ele alertou para o risco de que forças conservadoras tentem enfraquecer ou
deslegitimar as ações do Judiciário. "Há um movimento sutil para diminuir
o alcance das punições e salvar figuras-chave do projeto golpista",
afirmou.
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"Por um triz": o impacto das revelações
A
retirada do sigilo sobre documentos e áudios relacionados às tentativas de
golpe trouxe novos elementos para a análise da crise política. Genoino destacou
que o fracasso da intentona golpista deve servir como um alerta para o Brasil.
"Por um triz, evitamos o golpe, por um triz ganhamos a eleição, por um
triz derrotamos o 8 de janeiro. Não podemos continuar vivendo no limite",
concluiu.
O
ex-deputado enfatizou que, além das reformas institucionais, é fundamental
aprofundar o debate sobre a democracia, mobilizar a sociedade e enfrentar a
herança autoritária que persiste nas estruturas do Estado. "Não se trata
apenas de entender o passado, mas de mudar o futuro", finalizou.
• A história completa do
golpe não será contada tão cedo. Por Ricardo Noblat
À
medida que avança a investigação sobre a tentativa de golpe para abolir com
violência o Estado Democrático de Direito, cresce a suspeita de que ainda
conhecemos muito pouco o que de fato aconteceu ou poderia ter acontecido. A
Polícia Federal deve guardar parte do que descobriu para revelar só mais
adiante.
Entre
as 884 páginas do relatório da Polícia Federal recém-divulgado, há uma mensagem
que é mais do que assustadora. Assinada pelo coronel Reginaldo Vieira de Abreu,
que servia no Palácio do Planalto, ela diz que havia um racha no Alto Comando
do Exército quanto a aderir ou não à proposta de um golpe.
O
Alto Comando do Exército é formado por 16 generais de quatro estrelas. Na
mensagem em áudio de Vieira de Abreu, que atuava como chefe de gabinete do
general Mário Fernandes, à época secretário-executivo da Secretaria-Geral da
Presidência, ele informava a um dos seus superiores não identificado:
–
Cinco [dos 16 generais] não querem [o golpe], três querem muito e os outros
[estão na] zona de conforto. Infelizmente. A lição que a gente deu para a
esquerda é que o Alto Comando tem que acabar.
Ele
não deu o nome dos três generais que queriam muito o golpe, nem explicou o que
queria dizer ao se referir a zona de conforto. Com certeza, um dos três
generais era Estevam Theophilo, que no final de 2022 reuniu-se com Bolsonaro e
se pôs à disposição da trama golpista, segundo o tenente-coronel Mauro Cid.
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É
mais do que razoável supor que os cinco generais contrários ao golpe saibam o
nome dos seus outros dois colegas golpistas não citados nem por Vieira de Abreu
nem por Mauro Cid. Eles também devem saber o significado da expressão “zona de
conforto”. Seria o equivalente a “em cima do muro” para ver no que tudo daria?
Não
contem com a ajuda dos generais legalistas para que se vá mais longe do que a
Polícia Federal já foi – e nem mesmo com o empenho da Polícia Federal para
desvendar o que possa causar maiores embaraços às Forças Armadas. Fala-se nos
quarteis e fora deles que tudo foi longe demais e que é melhor parar por aqui.
Há
uma linha vermelha invisível traçada no chão que os investigadores do golpe não
devem ultrapassar em hipótese alguma; se ultrapassarem, a casa vai balançar.
• Governo Bolsonaro pagou
viagens para indiciado pela PF mostrar suposta fragilidade da urna eletrônica,
aponta inquérito do golpe
As
investigações da Polícia Federal sobre o inquérito do plano golpista apontaram
que, em 2021, no governo Jair Bolsonaro (PL), o Ministério da Ciência e
Tecnologia pagou duas viagens de urgência para o engenheiro Carlos Rocha, com o
objetivo de mostrar suposta falta de segurança do sistema eleitoral brasileiro
contra fraudes. Dinheiro público – R$ 7,7 mil – foi usado para que Rocha
viajasse a Brasília (DF) se encontrar com o então titular do ministério e atual
senador Marcos Pontes (PL-SP) em duas datas: 23 de julho e 30 e julho de 2021.
A
PF indiciou o engenheiro, o político da extrema-direita e mais 35 pessoas na
investigação da trama golpista. O valor de quase R$ 8 mil foi para custear a
viagem do engenheiro. Presidido por Valdemar Costa Neto, o PL contratou Carlos
Rocha por R$ 1 milhão para fazer um relatório que apontou, sem provas, indícios
de fraudes nas urnas eletrônicas no 2º turno da eleição de 2022.
As
investigações apontaram que o plano golpista envolvia o assassinato do
presidente Lula, do vice Geraldo Alckmin e do ministro do Supremo Tribunal
Federal Alexandre de Moraes.
Após
o indiciamento da PF, a Procuradoria-Geral da República está analisando as
investigações. Caso opte pela denúncia, o caso será julgados em órgãos de
terceiro instância jurídica como o STF.
• “Não cabe aos criminosos
golpistas escolher quem os julgará”, escrevem juristas
Em
artigo assinado neste domingo (1) na Folha de S.Paulo, Pedro Serrano, advogado,
doutor em direito do Estado e professor de direito constitucional e de teoria
do direito (PUC-SP) e Fernando Hideo Lacerda, doutor em direito e professor da
Escola Paulista de Direito refutam a tese defendida pelo editorial do jornal
intitulado "Suspeitas graves exigem tanto rigor como equilíbrio" de
afastar o ministro Alexandre de Moraes da relatoria dos processos sobre a
intentona golpista da extrema direita liderada por Jair Bolsonaro.
Os
dois juristas afirmam que o editorial da Folha defende “uma compreensão
equivocada do princípio do juiz natural em face da própria natureza dos crimes
em apuração.”
“O
atentado contra o ministro Moraes não foi um ataque à sua pessoa, mas à figura
institucional que desempenhava papel central no funcionamento do Estado
democrático de Direito enquanto presidente do Tribunal Superior Eleitoral
durante as eleições e relator do inquérito das fake news no Supremo Tribunal
Federal. Afastá-lo da relatoria seria conceder aos investigados o poder de
manipular a jurisdição, violando o princípio constitucional do juiz natural”,
escrevem.
“Admitir
tal afastamento equivaleria a permitir que criminosos escolham seus julgadores.
Essa possibilidade criaria um precedente que ameaça a independência do
Judiciário e fragiliza a democracia. A questão é ainda mais relevante no
contexto atual, em que se apura uma clara tentativa de ruptura institucional”,
enfatizam.
“As
investigações da Polícia Federal revelaram que o atentado contra o ministro
Alexandre de Moraes foi uma etapa de um plano estruturado e coordenado, com
múltiplos núcleos de atuação, para subverter a ordem democrática e dar um golpe
de Estado, que tinha por objetivo final impedir a posse do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva e manter Bolsonaro no poder.”
Fonte:
Brasil 247/Metrópoles
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