segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

Entenda porque “taxação de super ricos” de Haddad é uma falácia

Como explicamos aqui o anúncio do pacote fiscal foi apresentado de forma diluída em meio a uma suposta “maior reforma da renda da nossa história”, visando assim facilitar a aceitação do ajuste fiscal que irá atingir brutalmente as camadas populares, com os cortes em benefícios sociais como Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada (BPC), Abono Salarial e limitação do reajuste anual do salario mínimo. Dentre as medidas demagógicas apresentadas pelo ministro está a alteração das alíquotas do Imposto de Renda (IR). No pronunciamento, Haddad prometeu ampliação da faixa de isenção do imposto para quem recebe até R$5 mil mensais e aumentar a arrecadação de quem recebe mais de R$50 mil. Em suas palavras “quem tem renda superior a R$50 mil por mês, pagará um pouco mais”.

Primeiro é preciso dizer que a dita “reforma da renda” e a ampliação da faixa de isenção do IR entraria em vigor apenas em 2026, tendo ainda de tramitar pelo Congresso, com grandes chances de ser barrada, servindo por ora apenas ao propósito inicial de mitigar o impacto da opinião pública sobre o anúncio do ajuste fiscal, que deve atingir mais de 70% da população pelos próximos 6 anos. Vale lembrar também, que mesmo sendo aprovada no congresso, ainda há a chance de ser derrubada posteriormente pelo STF, uma vez que, devido ao Arcabouço Fiscal, pode ser considerada inconstitucional.

Ainda assim, no dia seguinte ao pronunciamento, defensores do governo propagavam o ajuste fiscal como uma ação de “justiça social”, enaltecendo a “taxação dos super ricos” e a “reforma tributária”.

O mercado internacional, por sua vez, vociferou nas bolsas de valores aumentando o valor do dólar e cobrando que o ajuste fiscal se restringisse a sua real natureza, atender os interesses do mercado financeiro e ao pagamento da dívida pública. A reação escandalosa destes capitalistas, não se admira, são alertas para que o governo Lula não saia da risca do Arcabouço Fiscal, tal como lhes fora prometido.

Porém, é preciso dizer, que esse escândalo dos milionários e mega empresários, nacionais e internacionais, em nada é atestado de que está ocorrendo de fato uma taxação das grandes fortunas. Chamar as mudanças das alíquotas para quem recebe mais de R$50 mil de “taxação de super ricos” ou de “grandes fortunas” é uma completa falácia demagógica, intencionalmente confusa, mas que pode ser comprovada pelo próprio Haddad.

Ao ser questionado na coletiva de imprensa sobre como seria esta nova alíquota a resposta do ministro da fazenda foi:

“Pessoas que têm renda e hoje *não pagam imposto*, uma renda superior a 50 mil reais por mês, ou seja, 600 mil reais por ano, elas vão passar a pagar *o mínimo*. O que significa isso? (...) ela [a pessoa] vai somar o que ela recebeu, a receita, e vai calcular 10% desse valor que ela recebeu, de todas as rubricas. Vamos supor que ela tenha uma receita anual de 1 milhão de reais, ou 600 mil reais pra pegar o começo da escadinha. Aí ela vai fazer a pergunta: ‘eu paguei 60 mil de Imposto de Renda? Não, eu paguei 35 mil’. Então eu vou ter que recolher 25 mil pra completar os 60. O mesmo vale para a pessoa que ganhou 1 milhão. Agora suponha que ela ganha 600 mil reais e ela pagou 80 mil de Imposto de Renda, aí ela não é atingida pela medida”. [grifo nosso]

Ou seja, o que de fato foi anunciado não é aumentar a alíquota das pessoas que recebem mais de R$600 mil por ano, nem R$1 milhão, nem de nenhum milionário, super rico ou grandes fortunas, nem se quer “um pouco mais” como foi anunciado no pronunciamento em rede nacional. Quem recebe acima de R$50 mil, independente do valor que seja, seguirá na faixa de alíquota atual de 27,5%, porém sendo obrigados a pagar apenas um *mínimo* de 10%(!).

Isso mesmo, a medida anunciada no pacote fiscal estabelece um *mínimo* de 10%, uma vez que existem inúmeros meios para que empresários e super ricos adquiram isenção de IR, de tal forma que nunca se alcança os 27,5% estipulado em lei. Ou seja, a “reforma da renda” anunciada por Haddad nem sequer obriga super ricos, milionários e capitalistas a pagarem alíquota atualmente vigente e ainda autoriza que estes sigam pagando alíquotas menores do que deveriam, através de recursos de isenção de impostos. Pesquisas estimam que, nos casos de cargas e tributos pagos por empresas para acionistas, quem ganha acima de R$1 milhão já paga cerca de apenas 10%. Desta forma nada muda do que já ocorre na prática para acionistas, por exemplo.

Não se trata de “taxação de grandes fortunas”, mas sim a continuidade da desigualdade tributária e desoneração dos empresários e capitalistas. Fato é que no Brasil os milionários pagam proporcionalmente menos impostos do que a classe média, sendo que o grupo de 0,2% mais ricos é o que proporcionalmente menos paga de impostos. Da mesma forma que, quem ganha R$8 milhões por ano, ou R$666 mil mensais, (0,01% mais rico da população brasileira) paga uma alíquota média de apenas 12,9%, o mesmo percentual de um trabalhador que recebe R$6 mil por mês. Mesmo que a “reforma da renda” do governo Lula seja aprovada na câmara e no senado, nada disto irá mudar.

Outro meio de revelar a falácia de chamar este pacote fiscal e a “reforma da renda” de “justiça social” e “taxação das grandes fortunas” é a pesquisa da Tax Justice Network que revela que o Brasil poderia arrecadar em torno de R$260 bilhões por ano somente com a aprovação de um imposto sobre as grandes fortunas, com alíquotas de míseros 1,7% a 3,5% sobre bens materiais e fundos bancários.

Enquanto isto, o pacote fiscal de Haddad está cortando na carne de pessoas de baixa renda, idosos, pessoas com deficiência (PCDs) que recebem até ¼ de salário mínimo, para economizar R$70 bilhões em dois anos. Assim, as reações do mercado financeiro em nada atestam qualquer tipo de justiça social, ou real taxação de grandes fortunas. Ademais, todo o ajuste fiscal servirá para enriquecer os banqueiros e super milionários internacionais donos da dívida pública, através do Arcabouço Fiscal.

Por fim, o intuito desta medida demagógica em meio ao pronunciamento serviu ao propósito de, momentaneamente, disfarçar o enorme ajuste fiscal que recairá sobre os mais pobres. Dos R$327 bilhões, mais da metade (R$171,9 bilhões), será cortado de gastos com benefícios sociais, como Bolsa Família, BPC e Abono Salarial, além de restringir o aumento do salário mínimo em, no máximo, 2,5%. Soma-se a isto R$42 bilhões que sairão dos recursos do Fundeb destinados às escolas de período integral.

O capital financeiro quer se apossar de cada centavo que puder tirar da classe trabalhadora. Para a burguesia e grandes capitalistas, nossas aposentadorias e a previdência social são uma fonte de lucro para seu acionistas, a dívida pública é seu mecanismo de investimento e o Arcabouço Fiscal é o compromisso do governo de conciliação de classes de Lula de que seguirá redirecionando os recursos públicos para os bolsos desses empresários.

"Eequilíbrio fiscal” e o “crescimento sustentável” são os lemas da frente ampla, proferidos pela boca de Haddad, que exigem a espoliação e destruição sistemática da vida da classe trabalhadora e das pessoas mais pobres. Para que as contas da burguesia e do capital financeiro fechem no verde, as nossas devem fechar no vermelho. O pacote de austeridade fiscal do Haddad é a continuidade do despejo da crise internacional capitalista nas costas da classe trabalhadora, e nada mais.

A disparidade tributária histórica e absurda que se mantém no Brasil não será corrigida em conciliação com "os mercados" e o capital financeiro. A luta por uma efetiva taxação progressiva das grandes fortunas, que possa colocar esse dinheiro a serviço dos interesses da maioria das população, precisa também ser pela revogação do Arcabouço Fiscal. Essas batalhas tem que ser travadas em enfrentamento direto com os grandes capitalistas, a partir da força da classe trabalhadora organizada.

<><> Taxação dos mais ricos vai compensar rombo com nova isenção do IR, projeta Haddad

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem declarado que a isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil não vai provocar rombo nas contas públicas. O motivo é que virá acompanhada de uma taxação para quem ganha mais de R$ 50 mil.

Ambas as medidas fazem parte do pacote que será enviado pelo governo federal ao Congresso, centrado no corte de gastos. Haddad espera economizar mais de R$ 71,9 bilhões até 2026 e R$ 327 bilhões até 2030 com o conjunto.

A isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil foi uma das principais promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2022. Até o momento, ela contempla aqueles que ganham até dois salários mínimos, o equivalente a R$ 2.824.

Além disso, a proposta prevê uma tributação menor para quem tem renda de até R$ 7,5 mil. Segundo o Ministério da Fazenda, a medida vai contemplar, ao todo, 26 milhões de pessoas e terá um impacto de R$ 35 bilhões.

Por outro lado, a proposta cria um imposto mínimo de 10% sobre aqueles que ganham mais de R$ 50 mil mensais. Segundo a equipe econômica, são cerca de 100 mil pessoas. Haddad pontuou que hoje, para o 1% mais rico do país, a alíquota efetiva é de 4,2% e, para o 0,01% mais rico, de 1,75%.

“Qualquer aumento da taxa de isenção do Imposto de Renda tem que vir acompanhado de uma compensação. Ou seja, o projeto de lei que vai ser encaminhado pressupõe neutralidade tributária. Não se trata de mexer com o nível da arrecadação de impostos. Trata-se de buscar justiça tributária”, disse Haddad.

A expectativa do governo é que as medidas sejam analisadas e aprovadas pelo Congresso ao longo do ano de 2025 e entrem em vigor a partir de 1º de janeiro de 2026, junto com a reforma tributária, cuja regulamentação ainda tramita no Legislativo.

<><> Benefícios tributários

O pacote do Ministério da Fazenda ainda prevê a possibilidade de vedar a  criação, majoração ou prorrogação de benefícios tributários a qualquer setor da economia.

A possível medida seria incluída nos gatilhos do arcabouço fiscal para caso haja déficit primário - o governo gastar mais do que arrecadar - ou redução das despesas não-obrigatórias, como investimentos, a partir de 2025. Assim, no ano seguinte, ficaria proibida a concessão de novos benefícios tributários.

•                        Governo já conta com STF para taxar “super-ricos” se Congresso resistir

O governo já conta, nos bastidores, com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) como fator de pressão para aprovar no Congresso Nacional o ponto mais polêmico do pacote de medidas econômicas: a isenção de Imposto de Renda para trabalhadores com renda de até R$ 5 mil mensais e a taxação dos “super-ricos”.

Em linhas gerais, a equipe econômica estima que a taxação de quem ganha acima de R$ 50 mil mensais (R$ 600 mil por ano) compensará integralmente, em termos orçamentários, as renúncias tributárias com o aumento da isenção de IR.

Um dos temores do mercado, no entanto, é que só a “bondade” (a isenção do IR até R$ 5 mil) seja aprovada pelo Congresso. E que a tributação maior dos “super-ricos”, a parte da “maldade” na história, seja barrada ou esvaziada durante a tramitação legislativa.

Aí vem a “dobradinha” do Executivo com o Judiciário. O governo olha para o Supremo Tribunal Federal (STF) como uma espécie de fiador das duas medidas simultaneamente. Por quê?

Para responder, é preciso lembrar a novela da desoneração da folha de pagamento, que foi prorrogada pelo Congresso até 2027 e depois vetada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O veto foi derrubado e instalou-se um impasse, com os parlamentares barrando medidas compensatórias sugeridas pelo governo.

Aí veio uma decisão do STF que mudou os rumos da discussão. O Supremo definiu que novos gastos ou desonerações precisam ser integralmente compensados. A novela só terminou quando a Câmara e o Senado apontaram de onde sairia dinheiro para bancar a desoneração por mais tempo.

Para auxiliares presidenciais, vale o mesmo raciocínio agora: se o Congresso aprovar a “bondade” (isenção de IR até R$ 5 mil) e rejeitar a “maldade” (taxação dos super-ricos), o governo contará com o STF para dizer que isso não pode, que isso não dá. Que é preciso, sempre, apontar compensações para novos gastos ou renúncias tributárias.

No fim das contas, trata-se de o governo agir, agora, calculando com uma ajudinha do Supremo, amanhã.

•                        Aumento da faixa da isenção do IR transforma natureza de pacote fiscal de Haddad

A isenção do Imposto de Renda (IR) para aqueles que ganham até R$ 5 mil jogou uma bomba nas expectativas do mercado em relação ao pacote gestado no Ministério da Fazenda de Fernando Haddad — e a questão é matemática.

Com a perspectiva de cortes que tenham impacto de R$ 25 bilhões e R$ 35 bilhões em 2025 e 2026, respectivamente, o contingenciamento teria impacto nulo caso a isenção vá à frente.

A proposta pode ter um impacto de renúncia de arrecadação de R$ 45 bilhões anual nas contas do governo, segundo a área de políticas fiscais e estudos especiais do Santander.

Ou seja: ao invés de representar um alívio para as contas públicas, o pacote se transformaria em mais um ônus para o Estado, sobreonerando as contas da União em R$ 20 bilhões no primeiro ano e R$ 10 bilhões em 2026.

Atualmente isenção é aplicada apenas para pessoas que tenham uma renda de até dois salários mínimos — equivalente a R$ 2.824 por mês.

 

Fonte: Esquerda Diário/O Tempo/CNN Brasil

 

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