Valério Arcary: Trump
é um neofascista?
"A
ave de rapina não canta.
A
desgraça não marca encontro.
A ignorância
e o vento são do maior atrevimento”, Provérbio popular português
##
Abriu-se um debate no mundo, inclusive na esquerda, se Trump é ou não um
neofascista. Este debate não é diletantismo. Exige rigor. Quais devem ser os
critérios para a classificação de um movimento político social como o MAGA
(Make America Great Again) e sua liderança? Devemos ser muito sérios quando
estudamos nossos inimigos. Quem não sabe contra quem luta não pode vencer.
A
qualificação de qualquer corrente política ou liderança de ultradireita como,
sumariamente, fascista pode ser uma generalização apressada, historicamente
errada e politicamente ineficaz. O fascismo é um perigo tão sério que devemos
ser serenos na sua definição. Toda a extrema-direita é radicalmente
reacionária. Mas nem toda a extrema-direita é fascista. É necessário avaliar,
ponderar e calibrar com cuidado nossos inimigos.
Mas
Trump é um neofascista. Ou um fascista da etapa histórica em que vivemos,
depois da restauração capitalista na ex-URSS. Enganam-se os que pensam que se
trata de um exagero. Trump é perigosíssimo. Mesmo considerando que seria
precipitado julgar a maioria dos seus eleitores como fascistas. O que é
qualitativo é que o núcleo dirigente do movimento foi se fascistizando nos
últimos anos.
Muitos
rejeitam a caracterização de Trump como fascista porque destacam as diferenças
históricas. Se formos excessivamente minuciosos até os movimentos políticos e,
ainda mais os regimes de Mussolini, Hitler, pior se incluirmos Salazar e
Franco, tinham importantes diferenças entre si. Analogias históricas são,
realmente, perigosas. Mas, se não forem ligeiras, ou seja, se respeitarem os
limites das comparações, descartando o que é secundário, podem ser educativas.
Em
primeiro lugar, é evidente que o neofascismo não é uma cópia do fascismo. O
fascismo foi considerado pelo marxismo dos anos 20 do século passado,
essencialmente, a forma política da contrarrevolução diante do perigo da
revolução europeia, ou seja, quando se precipitaram situações revolucionárias
que desestabilizaram os regimes democrático-liberais, no contexto da existência
da URSS, que inspirava a luta dos trabalhadores pelo poder. Cem anos depois, a
URSS não existe e não estamos nem remotamente diante de situações
revolucionárias, muito menos nos EUA. A diferença é abismal.
Em
segundo lugar, todos os partidos fascistas defendiam a necessidade de um regime
ditatorial totalitário. A eliminação das liberdades democráticas dos regimes
eleitorais era instrumental para destruir as organizações dos trabalhadores.
Mas o fascismo italiano não era igual ao nazismo alemão e sua obsessão
antissemita, ou ao franquismo espanhol e a preservação formal da monarquia, ou
o salazarismo português e seu fanatismo católico. Cada um tinha suas
peculiaridades. Movimentos fascistas em muitas outras nações, inclusive no
Brasil, o integralismo, existiram no mesmo período histórico. Mas, apesar de
suas nuances, todos eram expressões de uma mesma corrente e merecem a
qualificação de fascistas.
Acontece
que não estamos em uma etapa semelhante aos anos 30 do século passado, depois
da catástrofe da Primeira Guerra Mundial, depois da vitória da revolução russa
e da crise de 1929. Não estamos, desde a crise econômica mundial de 2008,
diante dos “anos 30 em câmara lenta”. Não há polarização entre revolução e
contrarrevolução. Não há perigo real e iminente de uma nova revolução de
outubro. Não obstante, à escala mundial, paradoxalmente, assistimos ao reforço
de uma extrema-direita com peso de massas e instinto de poder, nos últimos dez
anos. Por quê?
O neofascismo em um país central como os EUA não pode ser igual ao neofascismo
no Brasil. Tampouco pode ser igual ao fascismo de sociedades europeias dos anos
30. Em primeiro lugar, porque não responde ao perigo de revolução. Responde à
disputa pela preservação da supremacia norte-americana no mercado mundial e
sistema de Estados envenenando a consciência de dezenas de milhões com um
nacionalismo exaltado.
Responde
ao ressentimento de setores das camadas médias da classe trabalhadora diante do
empobrecimento. Responde ao racismo contra os imigrantes, ao rancor machista
contra uma nova onda feminista, à histeria homofóbica contra os LGBT’s, ao
negacionismo do aquecimento global.
Trump
é um caudilho. Sua candidatura foi a expressão de um movimento de massas
reacionário, apoiado por frações da burguesia, diante da lenta, porém, até
agora, ininterrupta decadência dos EUA no mundo.
Os
modelos teóricos para a métrica de avaliação se um movimento como o MAGA podem
ser vários. Mais simples ou mais complexos. Com mais ou menos critérios. Eis um
esboço de dez critérios:
a)
sua origem social;
b)
o que fez ou trajetória;
c)
o que defende: sua ideologia ou programa;
d)
qual é o seu projeto político?
e)
que relação manteve com as instituições, com o Congresso ou com as Forças
Armadas, portanto, sua posição diante do regime político?
f)
que relação manteve, respectivamente, com a classe dominante, e com a classe
trabalhadora?
g)
que tipo de partido ou movimento é o seu instrumento de luta?
h)
quem o apoia ou qual é sua base social, e a dimensão eleitoral de sua
audiência;
i)
quais são as suas relações e apoios internacionais;
j)
de onde vem o dinheiro ou quais são suas fontes de financiamento;
>>>>
Considerando estes dez critérios, podemos concluir que:
1.
Trump é milionário, mas de primeira geração, sua origem social foi, para
padrões norte-americanos, uma camada burguesa pequena ou média, ainda que
próspera do Queens, um subúrbio de Nova York. A procura de ascensão social
rápida através de negócios na construção civil e especulação imobiliária foi,
durante gerações, comum. Estudou na Wharton School na Pensilvânia, que exigia
um desempenho escolar inferior às carreiras de medicina, direito, engenharias.
Esta origem de classe explica algumas das obsessões de Trump: o racismo
rancoroso, o ressentimento social, o anticomunismo feroz, o nacionalismo
suburbano, o fascínio pelo modo de consumo da alta burguesia norte-americana, e
o rancor anti-intelectual.
2.
Não se deve julgar um líder político somente pelo que diz, mas pelo que faz. A
trajetória de Trump, durante os últimos quarenta anos, foi a de um empresário
aventureiro exibicionista folclórico e, depois de uma liderança messiânica que
assaltou e capturou o partido republicano ao longo de dez anos. Trump nunca
foi, intelectualmente, brilhante, como Obama, mas compensou os limites de sua
grosseria com uma audácia incontível e uma violência provocadora. Sempre foi um
desaforado boçal. Mas não se pode compreender o lugar que ocupa hoje,
conquistando incólume um segundo mandato presidencial, depois de ter cometido
inúmeros crimes, como o assalto semi-insurrecional contra o Capitólio em
janeiro de 2020, sem analisar os descalabros do governo Biden, e a impotência
de Kamala Harris para fazer a disputa ideológica durante a campanha.
3.
Trump responde à demanda de liderança forte face à decadência dos EUA no mundo;
de comando diante das pressões imigratórias que vêm da fronteira do México; de
ressentimento diante do desemprego, baixos salários e precários empregos dos
trabalhadores de renda média; de ruína de pequenos negócios e peso dos impostos
diante da regressão econômica; de pauperização diante da inflação dos custos da
habitação, educação, e saúde; de ordem diante do crime organizado; de
autoridade diante do impasse da disputa política entre as instituições; de
orgulho nacional diante da regressão econômica e ascensão da China. Não fosse
isso o bastante, conquistou visibilidade dando expressão à resistência de
ambientes sociais atrasados e reacionários à luta do feminismo, do movimento
negro e LGBT, ou até dos ecologistas.
4.
O projeto político de Trump é um regime bonapartista. Isto significa a
subversão do regime presidencialista democrático-liberal estabelecido nos EUA,
nos últimos duzentos anos. Bonapartismo, derivado de Bonaparte, inspirado pelo
modelo francês, significa um regime autoritário em que a presidência se eleva
acima das outras instituições, Congresso e Judiciário, e concentra poderes
excepcionais, em nome da defesa da unidade da nação. Essa é a importância do
slogan “Make America Great again”. Há vários tipos de bonapartismo. O projeto
de Trump, apoiado na mobilização de um movimento de massas de ressentidos e
desesperados, sugere o plano de um regime autoritário que, dependendo das
condições da luta político-social, pode anular os freios e contrapesos históricos
do regime democrático-eleitoral dos EUA.
5.
As relações de Trump com as instituições, tanto quanto é possível prever a
formação do governo até agora, indica uma forte presença dos quadros que lhe
são mais fiéis e leais, diferente da gestão entre 2016/20, quando incorporou
lideranças republicanas mais independentes. Trump não é, tampouco, somente um
líder autoritário que será neutralizado, facilmente, pela pressão dos
principais chefes capitalistas. Depois da vitória eleitoral, com maioria no
Congresso para realizar as emendas que desejar na Constituição, pleno suporte
no Exército, e cumplicidade da Suprema Corte, Trump estará legitimado para o
exercício do poder em condições que ninguém na presidência teve desde Roosevelt
na segunda guerra mundial.
6.
Trump vem improvisando um plano econômico e social híbrido, ao mesmo tempo,
protecionista e ultraliberal, com ênfase na agitação de tarifas alfandegárias,
e expulsão de pelo menos onze milhões imigrantes ilegais. Sua estratégia é
reposicionar os EUA no mercado mundial contra a China. Esta estratégia é
coerente com os planos estratégicos de uma fração capitalista yankee, mas não
pode ser aplicada sem que haja grande confronto social, porque há reservas em
movimentos sociais, como o sindical, estudantil, feminista, negro, LGBT e ambiental,
além de posições institucionais do partido democrata que mantém os governos em
Estados tão importantes como a Califórnia, Nova York e Illinois.
7.
Trump não se apoia em um partido fascista. Usou como instrumento eleitoral o
partido republicano que foi se fascistizando. Mas esta debilidade orgânica foi
compensada, amplamente, pela mobilização de um movimento de massas, o MAGA. E
não anula sua caracterização como neofascista. Ele poderá construir um partido
a partir do controle do Estado.
8.
A imensa maioria dos eleitores de Bolsonaro não é fascista. Mas isso não anula
que ele seja neofascista. Tampouco quer dizer que um núcleo duro, ainda que
minoritário dos seus eleitores, não seja fascista. O que define um movimento,
em primeiro lugar, é a sua direção. A audiência alcançada por Trump já é grande
e dinâmica o bastante para que esta corrente política seja, neste momento, de
longe a maior dos EUA. A previsão das pesquisas de uma eleição disputadíssima
não se confirmou. Trump venceu com folga em todos os estados pêndulos, os swing
states.
9.
Subestimar Trump, ou a capacidade de seu movimento se articular no terreno
internacional seria um grave erro. Existe uma Internacional de extrema direita
sendo construída no mundo, com financiamento robusto de alguns grandes grupos
econômicos, que respondem ao projeto de uma fração capitalista de oferecer
resistência à ascensão da China como potência protoimperialista.
10.
O financiamento da bilionária campanha eleitoral de Trump repousou no apoio do
Vale do Silício, da indústria do petróleo e gás, do complexo
militar-industrial, e de Wall Street. Elon Musk foi a figura pública deste
engajamento.
Em
resumo, o perigo é muito grande. A correlação de forças político-social teve
uma fortíssima inflexão reacionária. Vai ser preciso uma luta como nunca vimos.
¨
“O sionismo já está
interferindo nas eleições presidenciais de 2026”, diz Lejeune Mirhan
No
programa Bom Dia 247 da última segunda-feira (25), o professor
e sociólogo Lejeune Mirhan fez declarações contundentes sobre o impacto do
sionismo no cenário político brasileiro e a influência sobre as eleições
presidenciais de 2026. O comentário foi motivado pelo jantar promovido pela
Confederação Israelita do Brasil (Conib) no sábado (23), no clube Hebraica, em
São Paulo, evento que reuniu lideranças políticas de direita.Dando crédito
ao UOL, que trouxe detalhes do jantar, Mirhan ressaltou as
declarações do presidente da Conib, Claudio Lottenberg, que afirmou não ter
convidado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas indicou que “o futuro
presidente do Brasil está nessa sala”. A fala, acompanhada pelo apoio explícito
a nomes como os governadores Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ronaldo
Caiado (União Brasil-GO) e Claudio Castro (PL-RJ), gerou polêmica e
questionamentos sobre a neutralidade da entidade.
“O
sionismo já está interferindo nas eleições presidenciais de 2026”, afirmou
Mirhan. Ele destacou que, enquanto lideranças da direita buscam apoio em
eventos como o da Conib, o presidente Lula adota uma postura solidária ao povo
palestino, algo que o diferencia das figuras presentes no jantar. “Fico feliz
que o presidente Lula não tenha sido convidado para o jantar da Conib. Ele é
solidário ao sofrimento do povo palestino”, pontuou.
Ainda
segundo Mirhan, nomes como Tarcísio de Freitas e Ronaldo Caiado buscam, por
meio do apoio sionista, legitimar-se como lideranças da extrema-direita no
país. “Tarcísio e Caiado querem ser ungidos pelo sionismo, como os nomes da
extrema-direita”, afirmou.
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Contexto político do jantar
O
jantar da Conib reuniu não apenas governadores como Tarcísio, Caiado e Castro,
mas também outras figuras da direita, como o prefeito Ricardo Nunes (MDB-SP), o
senador Carlos Viana (Podemos-MG) e a deputada Carla Zambelli (PL-SP). Até
mesmo o ministro do Supremo Tribunal Federal André Mendonça, indicado por Jair
Bolsonaro, esteve presente.
Apesar
de indiciado pela Polícia Federal e inelegível até 2030, o ex-presidente Jair
Bolsonaro foi tema evitado no evento, que preferiu destacar o conflito
Israel-Palestina e a necessidade de uma nova liderança da direita. Governadores
como Tarcísio criticaram ações do Hamas em 2023 e questionaram a cobertura
internacional do conflito, enquanto Caiado reafirmou sua pré-candidatura à
presidência em 2026.
As
declarações de Lottenberg, ao declarar apoio a lideranças de direita e afirmar
que “o futuro presidente está nessa sala”, colocam em xeque a neutralidade
política da Conib. Em 2022, a entidade publicou manifesto declarando-se
apartidária, mas os recentes movimentos sugerem outra direção.
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Impacto na política brasileira
A
análise de Lejeune Mirhan reforça a preocupação com a crescente influência
externa em questões políticas nacionais e destaca o papel de Lula como
contraponto às alianças de direita. “O presidente Lula não se curva a esse tipo
de política de alinhamento automático. Ele mantém sua solidariedade ao
sofrimento palestino e sua independência nas relações internacionais”, concluiu
o analista.
O
episódio evidencia o quanto as alianças políticas e internacionais devem
influenciar as próximas eleições presidenciais, especialmente em um cenário
cada vez mais polarizado.
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Confederação Israelita desconsidera Bolsonaro e se aproxima de outros líderes
de direita
O
presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib), Claudio Lottenberg,
declarou apoio explícito a governadores de direita durante um jantar no clube
Hebraica, em São Paulo, neste sábado (23), marcado pela presença de figuras de
governadores como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ronaldo Caiado (União
Brasil-GO) e Claudio Castro (PL-RJ).
Sem
citar diretamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Lottenberg foi
incisivo ao criticar a posição do Brasil no conflito Israel-Palestina e
insinuou que o próximo presidente do país estaria presente. “Posso dizer o
seguinte: eu não convidei o atual presidente, mas o futuro presidente do Brasil
está nessa sala”, afirmou o presidente da Conib, de acordo com o UOL.
Além
dos governadores, outros políticos da direita participaram do encontro, como o
prefeito Ricardo Nunes (MDB-SP), o senador Carlos Viana (Podemos-MG) e a
deputada federal Carla Zambelli (PL-SP). O ministro do Supremo Tribunal Federal
(STF) André Mendonça, indicado para a Corte por Jair Bolsonaro (PL), também
esteve presente.
Ainda
conforme a reportagem, apesar do tom político, o evento foi marcado pela
ausência de defesas diretas a Jair Bolsonaro, indiciado pela Polícia Federal
por tentativa de golpe e inelegível até 2030. Tarcísio de Freitas e Claudio
Castro, aliados de Bolsonaro, optaram por focar no conflito Israel-Palestina,
enquanto Caiado, agora rompido com o ex-mandatário, reafirmou sua candidatura
presidencial para 2026.
Tarcísio,
em um dos discursos mais aguardados, criticou o ataque do Hamas em 2023 e a
cobertura da mídia internacional. Caiado, por sua vez, buscou um tom
conciliador em seu discurso e pregou a união da direita no pleito presidencial
de 2026. “Vamos nos unir para vencer essas eleições”, afirmou.
A
Conib, que se define como uma entidade plural e apartidária, vê-se agora
em meio a um debate sobre seu alinhamento político. Em 2022, a entidade
publicou um manifesto destacando sua neutralidade, mas as declarações de
Lottenberg no jantar colocam em xeque essa postura.
Enquanto
isso, figuras como Zambelli e outros aliados minimizam os efeitos do
indiciamento de Bolsonaro. A deputada afirmou que “indiciamento nada mais é do
que encontrar indícios” e que ainda não há condenação.
Fonte:
Correio da Cidadania/Reuters Brasil 247
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