Antes e
depois: como a França conseguiu reconstruir Notre-Dame em 5 anos
As
novas imagens da catedral de Notre-Dame de Paris foram transmitidas ao vivo
pela TV na sexta-feira (29/11), durante visita do presidente francês Emmanuel
Macron, mostrando ao público pela primeira vez a área interna do edifício desde
que grande parte dela foi destruída ou danificada em um grande incêndio, em
2019.
Da
torre aos vitrais, ela foi completamente transformada. Não foi apenas uma
reforma após o incêndio, mas uma revisão completa, incluindo a remoção de
décadas de resíduos e fuligem acumulados desde a última restauração.
A
catedral gótica não ficou pronta para receber fiéis e visitantes durante os
Jogos Olímpicos deste ano na capital francesa, como teria desejado Macron, mas
reabrirá ao público no dia 7 de dezembro.
A
seguir, conheça algumas das principais características do trabalho de reparo e
como ele foi alcançado.
• O retorno da torre
O
colapso da torre foi o clímax do incêndio de 2019. Muitas pessoas pensaram que
ela era medieval, mas, na verdade, a original foi retirada na década de 1790
porque era considerada perigosa.
A
substituta da original, que queimou há cinco anos, foi colocada décadas depois
como parte de uma reconstrução neogótica conduzida pelo arquiteto Eugène
Viollet-Le-Duc.
Desta
vez, os carpinteiros usaram uma mistura entre o tradicional e o computadorizado
para projetar e construir a enorme base de madeira.
Ela
foi içada para sua posição pelo maior guindaste da Europa, então uma estrutura
de andaime foi montada, permitindo que os trabalhadores encaixassem a
estrutura.
Como
o resto do telhado, a torre é revestida com chumbo. No topo, um novo galo
dourado foi instalado para substituir o original que caiu no fogo. Ele foi
recuperado, mas estava muito danificado para voltar.
Dentro
do novo galo estão relíquias sagradas, incluindo um espinho da Coroa de
Espinhos da catedral e um pergaminho com os nomes de 2.000 pessoas que
trabalharam na reforma.
• Calcário luminoso
A
característica mais marcante da catedral reformada é a luminosidade das pedras.
Isso porque todos os blocos de calcário foram limpos ou, em algumas partes,
substituídos.
A
pedra de substituição foi obtida em pedreiras no norte da França. Especialistas
conseguiram detectar pequenas características na pedra original — como certos
fósseis — que os ajudaram a determinar a origem geográfica.
A
grande maioria da alvenaria estava intacta, mas coberta não apenas por antigas
camadas de poeira e sujeira do passado, mas também fuligem e pó de chumbo do
fogo. Para limpá-la, foram usados aspiradores de alta potência e, em seguida,
um spray que descascou a alvenaria para remover a sujeira.
No
geral, cerca de 40.000 metros quadrados de pedra foram limpos.
Para
reconstruir o teto abobadado abaixo de onde a torre estava, os pedreiros
tiveram que reaprender os princípios da arquitetura gótica — usando uma
estrutura de madeira para colocar as pedras no lugar e coroando tudo com a
pedra angular.
• Teto de madeira
No
incêndio, o telhado de madeira queimou — todos os 100 metros dele. Nenhuma das
madeiras de 800 anos sobreviveu. Mas a decisão foi tomada rapidamente para
substituí-las o mais fielmente possível — com carvalho das florestas da França.
Por
feliz coincidência, um arquiteto chamado Remi Fromont havia conduzido um estudo
aprofundado da estrutura da madeira como parte de sua tese universitária. Isso
serviu de modelo para carpinteiros.
Cerca
de 1.200 carvalhos tiveram que ser encontrados. Eles deveriam ser retos, livres
de nós, e com 13 metros de comprimento.
Grande
parte da madeira foi serrada à mão e depois lapidada com a ajuda de machados,
assim como as vigas eram no século 13.
Ao
todo, há 35 "fermes" (estruturas triangulares que suportam o peso) ao
longo do edifício.
• Gárgulas escaneadas
digitalmente
Muitas
das esculturas externas – incluindo as famosas (mas não medievais) gárgulas e
quimeras – foram danificadas por mangueiras de alta pressão usadas para
combater o fogo. Muitas já estavam em más condições por causa da poluição.
Uma
oficina foi montada em frente à catedral para consertar e, quando necessário,
substituir essas estátuas. Cinco das gárgulas (produtos da imaginação de
Viollet-le-Duc) foram escaneadas por computador e, em seguida, refeitas em
calcário.
Dentro
da catedral, as esculturas mais famosas – como A Virgem do Pilar e O Voto de
Luís 13 – saíram ilesas. Mas todas foram limpas e receberam pequenos reparos.
As
muitas pinturas da catedral também retornaram à vida. Elas incluem os
"Mays" – cenas enormes da vida de Cristo, que eram um presente anual
para a catedral no século 17 dos ourives de Paris.
• O retorno da cor
Uma
das mudanças mais notáveis na catedral é o retorno da cor ao coro e a muitas
das capelas laterais.
Aqui,
novamente, o incêndio ofereceu uma oportunidade de redescobrir as glórias que
jaziam sob décadas de sujeira e fuligem.
Azuis,
vermelhos e dourados ressurgiram, combinando-se com a cremosidade do calcário
rejuvenescido para criar uma leveza que deve estar muito mais próxima da
experiência original.
Isso
também vale para os vitrais. Eles estavam intactos, mas sujos. Eles foram
desmontados, removidos, limpos e devolvidos. As grandes rosáceas foram deixadas
em paz.
Mais
uma vez, muito do que o visitante vê hoje não é realmente medieval, mas o
produto da imaginação medieval de Viollet-le-Duc.
• 8 mil tubos do grande
órgão foram limpos
O
grande órgão, construído no século 18, não foi afetado pelo calor ou pela água
na noite do incêndio. O que causou isso foi o acúmulo de uma poeira amarela -
monóxido de chumbo - em seus canos.
Toda
a estrutura - 12 metros de altura, seis teclados, 7.952 canos, 19 caixas de
vento - foi desmontada e levada para oficinas fora de Paris.
Forros
de couro de ovelha foram substituídos e novos controles eletrônicos foram
adicionados. Após a reinstalação, o instrumento foi reajustado - uma tarefa que
leva vários meses, pois cada cano é minuciosamente alterado.
No
dia 7 de dezembro, as primeiras palavras do Arcebispo de Paris ao entrar na
catedral recuperada serão: "Desperte, ó órgão, que o louvor a Deus seja
ouvido!".
Os
oito sinos da torre norte também foram removidos em 2023 - uma operação enorme
devido ao seu tamanho. Eles foram limpos e tratados e, em seguida, devolvidos
algumas semanas atrás. O maior dos sinos é chamado Emmanuel.
• Novos cálices e altar de
bronze
Os
visitantes também notarão uma mudança no layout litúrgico da catedral, cujo
altar, púlpito e assentos foram todos destruídos. Um altar de bronze simples
foi criado, com novos cálices para os sacramentos.
Há
1.500 novas cadeiras de madeira para a congregação e um novo relicário atrás do
coro para segurar a Coroa de Espinhos.
Novas
vestimentas também foram criadas para o clero pelo designer Jean-Charles de
Castelbajac.
• A revelação de estrutura
do século 13 enterrada
O
trabalho de restauração em Notre-Dame foi uma bênção para os arqueólogos, que
puderam acessar áreas subterrâneas que datam de centenas de anos antes da
construção da catedral.
Entre
os muitos conjuntos de ossos que eles encontraram estavam aqueles que se
acredita pertencer ao poeta renascentista Joachim du Bellay.
Outra
grande descoberta foram os restos cuidadosamente enterrados do crivo medieval,
que originalmente separava a parte sagrada da igreja da congregação.
Essa
divisória de pedra de 11 metros, construída no século 13, tinha esculturas
ricas e coloridas retratando a vida de Cristo. Foi desmontada no século 18 após
uma mudança nas regras da igreja.
Mas
o clero certamente esperava que os restos fossem redescobertos porque as partes
parecem ter sido colocadas com muito cuidado sob o solo. Espera-se que elas
possam ser reunidas e colocadas em exposição.
• O que vem depois?
Apesar
do sucesso da reforma, o trabalho não está completo.
Ainda
há andaimes ao redor de grande parte da extremidade leste e, nos próximos anos,
as paredes externas da abside e da sacristia precisarão de tratamento.
Também
há planos para redesenhar a esplanada e criar um museu no vizinho hospital
Hôtel-Dieu.
Fonte:
BBC News Paris
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