Ângela
Carrato: Os militares terroristas e os terroristas do ”mercado”
A
semana que passou já entrou para a história do Brasil por dois motivos: o
relatório final da Polícia Federal sobre os atos golpistas incriminando
Bolsonaro e mais 36 pessoas, a maioria militares de alta patente, e as reações
do chamado “mercado” ao pacote de cortes de gastos anunciado pelo governo Lula.
Mesmo
a mídia corporativa os tratando como assuntos separados, eles precisam ser
analisados em conjunto, pois o objetivo era e continua sendo o mesmo:
inviabilizar um governo que tem compromisso com os interesses da maioria da
população.
A
leitura das 884 páginas do relatório da PF, das quais o ministro Alexandre de
Moraes retirou o sigilo, permitindo que todos tenham acesso à sua integra,
deixa nítida uma trama complexa, que não se limitou aos atos terroristas
acontecidos em dezembro de 2022, quando da diplomação de Lula, ou à tentativa
de golpe de estado em 8 de janeiro de 2023.
A
trama retroage a 2019 e mostra como Bolsonaro, duas dezenas de militares e
vários civis articularam para se manter no poder por meio de atos violentos.
Se
bem sucedido, o golpe de 2023 seria mais truculento do que o de 1964, aquela
noite escura que durou 21 anos. Estava previsto até um campo de concentração
para opositores, nos moldes do nazismo, na Alemanha, e do que fez Pinochet, no
Chile.
A
trama trazida a público destrincha articulações que começam em meados do
governo Bolsonaro e chegam até o atentado terrorista acontecido há pouco mais
de duas semanas, em Brasília, quando um bolsonarista pretendia explodir o STF,
matar o ministro Moraes e acabou vítima dos explosivos que portava.
Se
não fosse a suspensão do sigilo a este relatório, a mídia corporativa
continuaria afirmando que o último atentado foi fruto da atuação de um “lobo
solitário”, como apressadamente (ou convenientemente?) desde o primeiro momento
se referiu ao tal de Tio França.
Continuaria
tratando o assunto de forma superficial e fazendo coro com Bolsonaro e os
demais golpistas por anistia.
Apesar
da gravidade dos fatos relatados e comprovados, a divulgação que a mídia
corporativa fez desse relatório foi longa mas sem qualquer aprofundamento.
O
Jornal Nacional, da TV Globo, principal noticiário do país, por exemplo, passou
longe de apresentar reportagens próprias, de manchetes chamativas e das
reconstituições que utilizou para criminalizar, sem provas, Dilma Rousseff ou o
próprio Lula.
Qualquer
um, minimamente informado, sabe que notícias e manchetes exaustivamente
repetidas pelo JN e demais veículos da mídia corporativa ao longo de meses e
anos foram fundamentais para inocular o ódio que ainda persiste na sociedade
brasileira em relação ao PT e aos seus líderes, sem esquecer que serviram para
respaldar o golpe que derrubou Dilma, em 2016, e a prisão de Lula, em 2018.
Dois
dias após a divulgação, o relatório final da PF sumiu das manchetes. O mínimo
que a mídia deveria ter feito, depois da vergonha de não ter realizado
reportagens investigando o 8 de janeiro ou o último atentado em Brasília, era
caprichar nas repercussões, ouvindo políticos, empresários, lideranças
sindicais e movimentos sociais sobre assuntos tão graves como a tentativa de
implantar uma ditadura no Brasil e as articulações para assassinar Lula, seu
vice, Geraldo Alckmin, e Alexandre de Moraes.
Como
nada disso está sendo feito, fica evidente que há deliberação do “andar de
cima” para abafar o assunto.
Já
as propostas contidas no pacote fiscal anunciadas pelo governo na quarta-feira
imediatamente viraram manchetes.
O
“mercado” age de forma terrorista para desacreditar a política econômica do
governo e a mídia, sua aliada, bate bumbo e tenta convencer o seu “respeitável
público” que a economia brasileira entrará em colapso se tais medidas se
concretizarem.
Para
se tornar realidade, essas medidas precisarão ser aprovadas pelo Congresso
Nacional. Dificilmente a votação acontecerá agora, pois estamos às vésperas do
recesso de natal e final de ano.
No
entanto, desde já, a mídia não para de repercutir apenas junto ao “mercado” e
aos seus adoradores os riscos para a economia brasileira de quem ganha até R$ 5
mil por mês ficar isento do imposto de renda, de os super-ricos passarem a
pagar impostos, de alguns privilégios dos militares serem reduzidos e,
principalmente, de o governo adotar medidas de maior controle e fiscalização em
relação aos programas sociais ao invés de desvincular os pisos constitucionais
destinados à saúde e à educação do patamar previsto.
Tão
terroristas quanto os terroristas que tentaram impedir a posse de Lula para um
terceiro governo é essa atitude do “mercado”, codinome adotado pela mídia para
os super-ricos, aquele 1% que controla perto de 50% da riqueza nacional e que
não aceita qualquer mudança nesta condição.
É
importante lembrar que as famílias que controlam a mídia corporativa brasileira
fazem parte deste 1%.
Não
por acaso, assuntos sobre política e economia sempre são abordados
separadamente por esta mídia, induzindo o cidadão comum a acreditar que não se
articulam.
Só
que esta articulação fica nítida quando se observa os objetivos últimos da ação
terrorista de Bolsonaro, da turma em seu entorno e os da campanha do “mercado”,
orquestrada pela mídia, contra as medidas anunciadas por Lula.
Se
os militares terroristas não admitiam a posse de Lula para um terceiro mandato,
os terroristas do “mercado” pretendem inviabilizar o seu mandato,
possibilitando assim o retorno ao Planalto de um extremista de direita. O nome
que conta com a preferência dessa turma é o ex-pupilo do próprio Bolsonaro, o
governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Não
que Bolsonaro já seja, aos olhos do “mercado”, carta fora do baralho, mesmo
inelegível e diante de sua dificílima situação. As chances de não ser condenado
cada vez mais se aproximam de zero.
Mesmo
assim, ele sempre será uma espécie de reserva estratégica dos bilionários para
manterem seus privilégios.
Ele
sabe disso e daí os apelos patéticos que têm feito em prol de anistia a
Alexandre de Moraes, ao STF ou mesmo a admissão de que pretende fugir caso sua
prisão seja decretada.
Ele
iria para os Estados Unidos ou para a Argentina e de lá tentaria manter a
lealdade do “gado”?
Mesmo
num tempo marcado por mentiras, distorções e fake news, não deixou de soar
absurda a entrevista que concedeu ao ultraconservador jornal estadunidense The
Wall Street, em que apela a Trump para que imponha sanções à economia
brasileira, caso seja condenado.
A
entrevista dá bem a medida do “patriotismo” do ex-capitão. Como sanções
econômicas penalizam a população como um todo, ele está se lixando com futuro
dos brasileiros, desde que se safe dos crimes que cometeu.
Por
mais truculento que seja, dificilmente Trump embarcará numa canoa dessas,
porque, a cumprir o que promete, desde o primeiro momento jogará o seu país num
enorme conflito interno, com a deportação de milhões de imigrantes.
Some-se
a isso que sua imagem ficará profundamente abalada junto a governos aliados da
Europa e de outras partes do mundo, se interferir na vida de um país
democrático para salvar a pele de um notório criminoso, pretendente a ditador.
Para
quem tem memória curta, a Cúpula do G-20, no Rio de Janeiro, ainda estava
acontecendo, quando a Polícia Federal prendeu quatro militares e um integrante
da própria PF, acusados de atentarem contra a democracia brasileira. Eles
continuam presos e são peças-chave no relatório final da PF sobre os atos
golpistas.
Voltando
aos terroristas do “mercado”, a pancadaria contra as medidas fiscais anunciadas
pelo governo continua dando o tom das manchetes. Na quinta-feira, um time de
ministros capitaneado por Fernando Haddad, da Fazenda, se reuniu com a mídia
para apresentar detalhes do pacote e corrigir o que ele chamou de “informações
equivocadas” que circularam depois que o anúncio foi feito em rede nacional.
Com
a paciência que o caracteriza, o ministro Haddad explicou que o objetivo do
governo é garantir economia superior a R$ 70 bilhões aos cofres públicos entre
2025 e 2026. Até 2030, o valor pode passar dos R$ 320 bilhões, segundo cálculos
feitos pelo governo.
Suas
palavras e dados, pelo visto, não foram considerados, uma vez que o “mercado”
manteve o dólar em forte alta, chegando a bater no pico de R$ 6,00, o maior da
história.
Ao
contrário de mostrar como não há motivo para esta alta, uma vez que o PIB deve
crescer 3%, pelo segundo ano consecutivo, superando a maioria dos países, que a
taxa de desemprego é de 6,2%, indicando quase pleno emprego, que o Brasil tem
recebido enorme fluxo de investimento externo, a mídia insiste em falar somente
na “alta recorde do dólar”.
Ao
invés de dar nome aos bois, responsabilizando o Banco Central, dirigido pelo
bolsonarista Roberto Campos Neto, por permitir tal descontrole em relação ao
dólar, a mídia, porta-voz dos terroristas do mercado, responsabiliza as medidas
anunciadas pelo governo Lula, pregando mais uma deslavada mentira à população
brasileira.
Mentira
que em nada fica a dever ao apoio, hoje por ela esquecido, a Bolsonaro e sua
turma durante os quatro anos em que esteve à frente do Palácio do Planalto.
Cabe
ao Banco Central vender dólar para conter ataques especulativos ao real.
Em
pelo menos duas oportunidades, Campos Neto fez isso durante o governo
Bolsonaro. Agora, cruza os braços e deixa o dólar subir às alturas, mesmo o
país dispondo de reservas no valor de US$ 372 bilhões, o chamado fundo
soberano, acumulado em sua maior parte nos governos Lula e Dilma.
Some-se
a isso que o “teto de gastos”, principal regra fiscal criada em 2016 pelo
governo golpista Temer, que limita o crescimento das despesas à inflação do ano
anterior, permanece defendido e aplaudido pelos “terroristas” do mercado, como
forma para golpear o governo Lula 3 pela via econômica.
Vale
lembrar que o mesmo “arcabouço fiscal” foi alterado cinco vezes durante o
governo Bolsonaro, sem que o “andar de cima” ou a mídia, sua porta-voz, fizesse
qualquer alarde ou ameaçasse o ex-capitão com impeachment, apesar dos mais de
100 pedidos neste sentido recebidos pelo presidente da Câmara dos Deputados,
Arthur Lira, que os arquivou.
O
orçamento que Lula herdou de Bolsonaro para seu primeiro ano de gestão era uma
verdadeira trava para um governo que prometeu recolocar o Brasil nos trilhos da
justiça social e do desenvolvimento. O terceiro governo Lula herdou um país
quebrado e com a administração pública destroçada.
Alguém
se recorda de a mídia corporativa ter feito o balanço do Brasil que os
golpistas Temer e Bolsonaro legaram a Lula?
Recordo-me
é de como essa mídia elogiou e continua elogiando o ex-ministro da Economia,
Paulo Guedes, que ameaçou colocar uma granada no bolso dos funcionários
públicos. Vejo como essa mídia faz de tudo para que Haddad se assemelhe a
Guedes e como se mostra irritada por isso não acontecer.
Quando
Lula, ao contrário de cortar em programas sociais e nas verbas para educação e
saúde, que atingiriam em cheio os mais pobres, apresenta soluções que reduzem
gastos e evita penalizar esses setores, o “terrorista” mercado, através da
mídia, sua porta-voz, vai para cima do governo a fim de emparedá-lo.
Lula
sabe disso e não por acaso parte das medidas propostas depende de aprovação do
Congresso Nacional.
Não
será fácil para a mídia continuar mentindo e responsabilizando a isenção de
imposto de renda para parcela da classe média como culpada por uma crise
econômica que não existe ou escondendo o seu apoio a que os super-ricos, dos
quais é parte, sigam sem pagar impostos, mantendo o Brasil no topo dos países
mais desiguais do mundo.
Está
previsto para a terça-feira (10/12) manifestação em todo o país contra a
anistia a Bolsonaro e aos golpistas.
A
manifestação está sendo convocada por todas as centrais sindicais, CUT e CTB à
frente, e conta com o apoio de uma infinidade de movimentos sociais. Esses atos
devem funcionar como espécie de prévia do que acontecerá em 2025, envolvendo
não apenas a questão da anistia.
Tão
importante quanto colocar Bolsonaro e demais golpistas na cadeia é desmontar a
tentativa de manter Lula refém do “arcabouço fiscal”, o golpe neoliberal
aplicado pelos golpistas à economiae trava o desenvolvimento brasileiro.
2025
será, portanto, um ano crucial. O povo, que andava sumido das ruas, deve voltar
a elas e não será fácil para o “andar de cima” e a sua mídia continuar
espalhando mentiras e promovendo terrorismo econômico.
• Barroso defende
responsabilização de quem atenta contra a democracia
O
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, disse nesta
quinta-feira (14) que as explosões ocorridas na frente da sede do tribunal
revelam a necessidade de responsabilização de quem atenta contra a democracia.
Durante
abertura da sessão desta tarde, Barroso disse que as explosões demonstram a
tentativa de deslegitimar a democracia no Brasil.
“A
gravidade do atentado de ontem nos alerta para a preocupante realidade que
persiste no Brasil – a ideia de aplacar e deslegitimar a democracia e suas
instituições. Reforça também e, sobretudo, a necessidade de responsabilização
de todos que atentem contra a democracia”, afirmou.
O
presidente também disse que o episódio mostra a periculosidade das pessoas com
as quais a Corte lida.
“Apesar
de estarmos no calor dos acontecimentos e no curso das apurações, precisamos,
como país e sociedade, de uma reflexão profunda sobre o que está acontecendo
entre nós”, declarou.
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Anistia
Barroso
também citou os atos golpistas de 8 de janeiro e sinalizou ser contra a anistia
aos condenados pela Corte.
“Relativamente
a este último episódio, algumas pessoas foram da indignação à pena, procurando
naturalizar o absurdo. Não veem que dão um incentivo para que o mesmo tipo de
comportamento ocorra outras vezes. Querem perdoar sem antes sequer condenar”,
completou.
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Gilmar Mendes
O
ministro Gilmar Mendes, decano da Corte, afirmou que as explosões não se tratam
de um fato isolado. Segundo o ministro, o discurso de ódio, o fanatismo
político e a indústria de desinformação foram “largamente estimulados” pelo
governo anterior, de Jair Bolsonaro.
“As
investidas contra a democracia têm ocorrido explicitamente, à luz do dia, sem
cerimônia nem pudor. Condutas como as de ontem, juntam-se a diversas outras já
vivenciadas”, disse.
Mendes
também aproveitou para defender a regulação das redes sociais e também rechaçou
a possiblidade de anistia dos condenados pelo 8 de janeiro.
“A
meu sentir, a revisitação dos fatos que antecederam aos ataques de ontem é
pressuposto para a realização de um debate racional sobre a defesa de nossas
instituições, sobre a regulação das redes sociais e sobre eventuais propostas
de anistiar criminosos”, completou.
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Ataque
Vídeo
das câmeras de segurança do STF mostram o chaveiro Francisco Wanderley Luiz
atirando artefatos explosivos em direção à escultura A Justiça, que fica em
frente ao prédio da Corte e, em seguida, acendendo outro no próprio corpo.
Momentos antes, o carro dele também explodiu no estacionamento próximo ao Anexo
IV da Câmara dos Deputados.
Fonte:
Viomundo/Agencia Brasil
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