terça-feira, 3 de dezembro de 2024

O pacote fiscal de Haddad: custos imediatos e ganhos potenciais no futuro

O novo pacote fiscal anunciado pelo governo Lula, liderado na matéria pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi gerado para atender às demandas e pressões do capital financeiro-monopolista por maior arrocho, prejudicial ao desenvolvimento nacional e ao progresso social. O cantochão do combate ao gasto público, entoado em uníssono por todas as correntes neoliberais, faz-se ouvir altissonante pela voz de políticos reacionários, acadêmicos, operadores de mercado e da mídia empresarial, cada vez mais comprometida com os interesses desse capital num quadro de correlação de forças desfavorável às forças do progresso social e desenvolvimento nacional.

É óbvio que um governo progressista, vocacionado a promover a justiça social, como o presidente e a ex-presidenta Dilma provaram ser capazes nos mandatos que exerceram, tem como princípio a responsabilidade com as contas públicas e a judiciosa aplicação dos recursos, que é também uma condição sine qua non para a realização das políticas sociais. Mas não é disso que se trata na ofensiva em curso dos rentistas pelo arrocho e mais arrocho. O que pretendem os rentistas, parasitas nacionais detentores do capital financeiro, é uma austeridade fiscal que priorize seus ganhos em detrimento dos direitos sociais e do desenvolvimento nacional.

O “pacote Haddad” apresenta um conjunto de medidas visando a equilibrar as contas públicas, com cortes no gasto de 72 bilhões de reais nos próximos dois anos e uma previsão de redução de mais de 300 bilhões em um horizonte mais longo, até 2030.

O pacote foi apresentado politicamente e traz medidas que atendem a demandas históricas do povo brasileiro, principalmente dos movimentos sociais e trabalhistas organizados e cumprem promessas de campanha do presidente Lula. Destaca-se entre essas medidas a isenção do imposto de renda para quem ganha até 5 mil reais, beneficiando cerca de 26 milhões de trabalhadores, aliviando o peso tributário sobre os assalariados de renda média.

A tributação progressiva para os mais ricos é também uma medida de sentido social e político avançado. O conflito distributivista e tributário é um reflexo de uma luta social de maior envergadura e aponta uma perspectiva histórica. É um importante passo na direção da justiça tributária o aumento na alíquota para os que ganham acima de 50 mil reais por mês. A persistir, contribui no longo prazo para a redução das abissais desigualdades nacionais.

O governo do presidente Lula decidiu também cortar as injustificadas benesses ao grande capital, os famigerados subsídios, desonerações e renúncias fiscais. Pode-se afirmar o mesmo sobre o combate aos supersalários, distorções nas aposentadorias dos militares e demais regalias e prendas ofertadas aos baronatos incrustados no serviço público. É também positiva a sinalização de combater as bilionárias emendas parlamentares, uma excrescência da vida política e administrativa do Brasil.

Mas o pacote traz também medidas antissociais, que poderão gerar conflitos num quadro em que a esmagadora maioria pobre da população brasileira não tem margem de manobra para suportar cortes em sua já rebaixada condição de vida. O governo, embora tenha inegáveis méritos na promoção de políticas públicas visando à redução da pobreza extrema, não pode ficar desatento à crise social.

O pacote contém medidas como o estabelecimento de teto ao aumento real do salário mínimo em 2,5%. A medida reduz a velocidade da justa política de valorização do salário mínimo, que foi uma marca dos governos anteriores de Lula e da presidenta Dilma e se confronta diretamente com o movimento sindical que sempre teve essa valorização como uma bandeira fundamental. Travar o aumento do salário mínimo é um retrocesso que atingirá milhões de brasileiros, em especial categorias como trabalhadores rurais, comerciários e demais categorias do setor de serviços. Fazem parte do menu de maldades do pacote fiscal os cortes em programas essenciais como o Fundeb e as ameaças ao Benefício de Prestação Continuada (BPC).

Para além disso, há um evidente e perigoso descompasso entre cortes e benefícios. Enquanto os cortes começam imediatamente, os ganhos para as camadas mais pobres ficam para 2025 e ainda dependem de aprovação do Congresso, controlado por uma maioria reacionária, o que gera insegurança sobre sua implementação.

O pacote gerou reações intensas dos rentistas, exibindo a sua pantagruélica garganta e sua visceral ojeriza aos direitos sociais. A isenção do Imposto de Renda para os assalariados de até 5 mil reais por mês foi exibida como “prova” de irresponsabilidade fiscal e perda de foco no ajuste. Esta reação é uma demonstração clara de chantagem para condicionar o governo a adotar medidas mais alinhadas aos interesses do capital monopolista-financeiro, um comportamento que evidencia como esse capital se utiliza do poder de influência para impor seus interesses.

Os últimos dois dias foram marcados pela disparada do dólar, que atingiu o pico histórico, uma instabilidade que reflete a exigência de medidas draconianas contra o gasto social. O Banco Central, ainda sob o comando de Campos Neto, o sabotador geral da República quando age e também quando se omite e desaparece de cena. 

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tem desempenhado um papel prejudicial ao desenvolvimento econômico do Brasil. Sob sua gestão, a política monetária tem sido marcada por uma postura totalmente alinhada aos interesses do capital financeiro, em detrimento das necessidades do país.

A manutenção de juros elevados por períodos prolongados, mesmo diante de um cenário de desaceleração inflacionária evidencia seu inarredável compromisso com os especuladores e rentistas.

Ao invés de atuar como um aliado na construção de políticas que promovam o crescimento sustentável e o bem-estar social, Campos Neto se posiciona como um obstáculo ao desenvolvimento nacional. Sua conduta torna o Brasil refém de uma lógica que privilegia a concentração de riqueza em detrimento do progresso.

O Brasil não pode mais tolerar uma liderança como Campos Neto, que age como agente do mercado e adversário do desenvolvimento. É preciso responsabilizá-lo por uma política monetária lesiva aos interesses nacionais.

A situação econômica do país suscitará lutas sociais e políticas. Os movimentos sociais organizados precisam exercer protagonismo, defender os aspectos positivos do “pacote Haddad” e combater os negativos, reflexo da fúria do capital monopolista-financeiro. É preciso ter sempre como referência o interesse nacional e o papel do Governo e do Estado, cuja missão precípua é fomentar o desenvolvimento econômico e o progresso social.

 

•                        “Taxação dos ricos e isenção do IR, por ora, é só discurso”, diz Jeferson Miola

Durante participação no programa Giro das Onze, o analista político Jeferson Miola fez reflexões importantes sobre a proposta do governo Lula de isentar do Imposto de Renda os trabalhadores que recebem até R$ 5 mil. Miola destacou que, apesar do anúncio, a medida está condicionada à aprovação do Congresso e só deve ser implementada a partir de 2026. "Por ora, é apenas discurso. O governo depende de uma série de fatores para transformar isso em realidade", afirmou.

Miola avaliou que a proposta, que beneficiaria cerca de 36 milhões de brasileiros, está sendo apresentada em um contexto de forte pressão do mercado financeiro e de grupos políticos. Ele ressaltou que a política fiscal anunciada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, busca atender às metas do déficit zero, mas enfrenta limitações impostas pelo próprio governo ao aceitar o arcabouço fiscal como norte econômico.

"É uma situação paradoxal: o governo promete medidas que beneficiam os mais pobres, mas, ao mesmo tempo, está atado a compromissos que favorecem interesses do mercado e dos setores mais privilegiados", apontou Miola.

Outro ponto destacado foi a revisão do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Miola considerou a decisão de revisar as concessões como uma tentativa de economizar recursos, mas que pode afetar diretamente a população vulnerável. "O governo estima economizar R$ 2 bilhões por ano com o BPC, mas isso reflete a lógica de cortar onde afeta os mais pobres, enquanto grandes fortunas continuam intocadas", criticou.

Para Miola, a implementação da taxação sobre os ricos, anunciada pelo governo como um avanço na justiça tributária, também enfrenta desafios. Ele lembrou que o Brasil possui uma estrutura tributária regressiva, na qual os mais pobres arcam com a maior carga tributária proporcional à renda. "A ideia de que os ricos pagarão mais impostos ainda está longe de se concretizar. O sistema permanece extremamente desigual", afirmou.

Ao concluir sua análise, Miola sugeriu que o governo adote uma postura mais firme para mobilizar apoio popular em torno de suas bandeiras históricas. "Sem uma mobilização social forte, o governo corre o risco de ceder ainda mais às pressões do mercado, abandonando pautas que representam a essência de seu compromisso com os trabalhadores", alertou.

A fala de Miola resume o dilema enfrentado pelo governo Lula: como equilibrar as expectativas de justiça social com as amarras impostas pelo cenário econômico e político atual.

 

•                        “Se carga tributária aumentar, milhares de catadores serão empurrados para a informalidade", diz líder de associação

A reforma tributária, que está em curso no país, estabeleceu a proteção ao meio ambiente como um de seus princípios e determinou incentivos para atividades econômicas mais sustentáveis, de forma a alinhar a política tributária com as previsões constitucionais de proteção e preservação ambiental. Contudo, há pontos na sua regulamentação para serem aprimorados, de forma a aprofundar o fomento à reciclagem e a valorização do trabalho dos catadores de materiais recicláveis, em consonância com o que prevê a Constituição Federal e a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Em episódio especial do programa “Brasil Sustentável”, da TV 247, foi discutido o impacto da proposta em uma categoria muitas vezes esquecida: os catadores de materiais recicláveis. Em um contexto de reforma tributária, a proposta do PLP nº 68 pode representar grandes desafios para essa classe, especialmente no que diz respeito à carga tributária sobre as operações de compra e venda de recicláveis. O aumento dessa carga, se aprovado, pode dificultar ainda mais a vida dos catadores, tornando suas atividades praticamente inviáveis. Para discutir o impacto dessa reforma, entrevistamos Anderson Nassif, Diretor da Associação Nacional dos Catadores (Ancat), que traz detalhes sobre os possíveis prejuízos e soluções para o setor.

“Os catadores são responsáveis por 90% das embalagens pós-consumo que circulam no país", afirma Anderson. No entanto, esse trabalho primário, muitas vezes invisível, ocorre em uma "pirâmide invertida". Ou seja, embora a maioria dos materiais recicláveis passem pelas mãos dos catadores, financeiramente, eles são os mais frágeis e menos remunerados da cadeia.

Atualmente, muitas organizações de catadores enfrentam dificuldades para se manter dentro das conformidades legais, o que inclui o pagamento de tributos e impostos. "As cooperativas do setor já sofrem muito para sobreviver. Se a carga tributária aumentar, milhares de catadores serão empurrados para a informalidade, colocando em risco a continuidade de suas operações", explica. O apelo é claro: "Pedimos bom senso e que o processo de escuta seja levado a sério. A alíquota não pode ser superior ao que já pagamos, e, se mantida como está, a situação será menos danosa."

Embora existam incentivos na proposta de reforma tributária, os catadores não podem ser comparados com outros setores como o agronegócio, que possui mais apoio e recursos. "É preciso olhar para o lado social das cooperativas de catadores, que lutam duramente para sobreviver", alerta. No Brasil, a realidade é alarmante: além da grande informalidade, há uma enorme parcela de catadores trabalhando em condições precárias nos 3.000 lixões a céu aberto espalhados pelo país.

Uma das sugestões de melhoria no PLP nº 68 é a ampliação das operações envolvendo materiais recicláveis e catadores que poderão usufruir do crédito presumido. Atualmente, apenas as aquisições estão abarcadas, sendo ignorada a sistemática dessas operações, nas quais o material destinado à reciclagem pode percorrer um caminho complexo do catador até cooperativa, podendo ser objeto de uma relação de compra e venda ou da prestação de diferentes serviços, e somente após esse processo, o material é adquirido pela indústria para fins de reciclagem. A expansão das operações que podem utilizar o crédito presumido visa corrigir uma distorção da proposta atual, em que a indústria da reciclagem recebe um tratamento tributário diferenciado ao poder usufruir do crédito gerado na aquisição do material, enquanto a cooperativa ou associação de catadores sofre incidência ordinária da IBS e CBS, sem previsão de tratamento específico e, portanto, exposta ao pagamento da alíquota cheia dos tributos.

 

Fonte: Brasil 247

 

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