quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

Por que algumas pessoas não emagrecem com Ozempic

Os ensaios clínicos mostraram que as pessoas que tomam injeções de medicamentos para emagrecer, como Wegovy (semaglutida, que também é o princípio ativo do Ozempic) e Mounjaro (tirzepatida), perdem entre 16% e 21% do peso corporal. Mas os medicamentos não funcionam para todo mundo quando o objetivo é emagrecimento.

Nesses estudos, um grupo de participantes perdeu menos de 5% de seu peso corporal — a perda de peso de 5% ou mais é considerada "clinicamente significativa". Estes chamados não responsivos representavam de 10% a 15% dos participantes.

Evidências baseadas em relatos, fornecidas por especialistas em obesidade à agência de notícias Associated Press, sugerem que, fora dos limites altamente controlados dos ensaios clínicos, até 20% das pessoas não respondem bem aos medicamentos.

Mas por que isso pode acontecer?

Em primeiro lugar, é importante reconhecer que as causas da obesidade são multifacetadas.

Nossa compreensão da base genética da obesidade cresceu significativamente na última década, revelando que, para muitas pessoas, as variações genéticas têm um efeito significativo sobre seu peso.

Por exemplo, um estudo de 2021 descobriu que 0,3% da população do Reino Unido — o equivalente a mais de 200 mil pessoas — é portadora de uma mutação genética em parte do circuito cerebral que regula o apetite, o que leva a uma média de 17 kg de peso adicional aos 18 anos.

Essa variabilidade genética nas causas subjacentes da obesidade pode ser uma das explicações para o fato de algumas pessoas apresentarem uma resposta atenuada a esses medicamentos.

Também é importante reconhecer como estes novos medicamentos de combate à obesidade funcionam. Qualquer pessoa que tenha tentado perder peso por meio de dieta e exercício físico sabe que essas tentativas geralmente são acompanhadas de uma sensação crescente de fome e cansaço.

Esta é a resposta normal do corpo à perda de peso. O objetivo é proteger o que o cérebro considera seu peso corporal "normal", que para alguns pode estar na faixa da obesidade.

Os novos medicamentos para emagrecer funcionam desativando esta resposta fisiológica, facilitando a perda de peso por meio de mudanças na alimentação e exercícios.

Nos ensaios clínicos, os participantes recebem apoio para praticar exercícios e acesso a nutricionistas e psicólogos. Esses especialistas oferecem aos participantes suporte individualizado sobre as mudanças de estilo de vida necessárias para maximizar os benefícios desses medicamentos.

Este suporte raramente está disponível para as pessoas fora dos ensaios clínicos, e sua ausência pode limitar a eficácia dos medicamentos se as modificações necessárias no estilo de vida não forem apoiadas por especialistas.

Vários estudos tentaram identificar que fatores podem prever as respostas de perda de peso às injeções para emagrecer. Um fator comum para a perda de peso clinicamente significativa é um peso corporal inicial mais alto.

•                        Muito 'hype'

Desde que foram lançadas, o "hype" da mídia em torno das novas injeções para emagrecer fez com que a demanda aumentasse entre aqueles para os quais os medicamentos foram desenvolvidos (pessoas com obesidade) e aqueles que não são obesos, mas querem perder alguns quilos.

No Reino Unido, o Instituto Nacional de Excelência em Saúde e Atendimento (Nice, na sigla em inglês) estabelece diretrizes sobre que parâmetros clínicos são necessários para que um medicamento seja receitado.

No caso do Wegovy e Mounjaro, a pessoa deve ser obesa e ter pelo menos um problema de saúde relacionado à obesidade, como apneia do sono ou hipertensão.

Devido à falta de remédios alternativos eficazes para perda de peso e, provavelmente, devido à cobertura da mídia que esses medicamentos receberam, houve relatos de prescrição desses remédios para uso off-label (fora das indicações da bula) para pessoas que não atendem aos critérios do Nice.

Uma consequência provável disso é que pessoas com peso corporal inferior ao estipulado pelas diretrizes estão injetando esses medicamentos para perda de peso e, portanto, estão perdendo menos peso do que os estudos clínicos demonstraram.

Apesar da minoria de pessoas para as quais esses medicamentos não funcionam, sua introdução promete proporcionar benefícios significativos para a saúde de milhões de pessoas que antes tinham dificuldade para perder peso.

 

•                        Por que médicos desconfiam da utilidade de relógios e anéis inteligentes. Por Zoe Kleinman

A tecnologia dos relógios e anéis inteligentes é uma indústria multibilionária com foco acentuado no monitoramento da saúde.

Muitos produtos prometem monitorar com precisão rotinas de exercícios, temperatura corporal, frequência cardíaca, ciclo menstrual e padrões de sono, entre outros.

O secretário de Saúde britânico, Wes Streeting, falou sobre uma proposta para dar esses monitores a milhões de pacientes do serviço público de saúde (NHS) na Inglaterra, permitindo que eles monitorem, de casa, sintomas como reações a tratamentos de câncer.

Mas muitos médicos e especialistas em tecnologia são cautelosos sobre o uso de dados de saúde capturados por essas tecnologias.

No momento, estou testando um anel inteligente da empresa Ultrahuman. E, ao que parece, ele soube que eu estava ficando doente antes de mim.

O anel me alertou em um fim de semana que minha temperatura estava ligeiramente elevada e meu sono estava agitado. Ele me avisou que isso poderia ser um sinal de que eu estava ficando doente.

Eu resmunguei algo sobre os sintomas da perimenopausa e ignorei. Mas dois dias depois eu estava de cama com virose.

Eu não precisava de assistência médica, mas se eu tivesse precisado, os dados do meu anel inteligente teriam ajudado os profissionais de saúde com meu tratamento? Muitas fabricantes dizem que sim.

O anel inteligente Oura, por exemplo, oferece um serviço onde os pacientes podem baixar seus dados na forma de um relatório para compartilhar com seu médico.

<><> 'Monitoramento excessivo'

Jake Deutsch, um clínico dos EUA que também aconselha a Oura, diz que esses aparelhos "avaliam a saúde geral com mais precisão". Mas nem todos os médicos concordam que eles são genuinamente úteis o tempo todo.

Helen Salisbury, médica de uma clínica movimentada em Oxford, diz que ainda são poucos os pacientes que chegam com um dispositivo desses, mas ela percebeu que isso aumentou, e isso a preocupa.

"Acho que, para o número de vezes em que é útil, provavelmente há mais vezes em que é inútil, e me preocupa que estejamos construindo uma sociedade de hipocondria e monitoramento excessivo de nossos corpos", diz ela.

Salisbury diz que pode haver muitas razões pelas quais podemos obter dados temporariamente anormais, como um aumento da frequência cardíaca, seja por um problema em nossos corpos ou um mau funcionamento do dispositivo — e muitos deles não exigem investigação adicional.

"Estou preocupada porque estamos encorajando as pessoas a monitorar tudo o tempo todo e consultar o médico sempre que a máquina achar que estão doentes."

E ela faz outro comentário sobre o uso desses dados como "diagnóstico confiável" — um tumor cancerígeno, por exemplo, não será necessariamente sinalizado por um relógio ou um aplicativo, ela diz.

O que esses aparelhos fazem é incentivar bons hábitos. Mas a melhor mensagem que você pode tirar deles é o mesmo conselho que os médicos nos dão há anos.

"O que você pode realmente fazer é caminhar mais, não beber muito álcool, tentar manter um peso saudável. Isso nunca muda", acrescenta Salisbury

O Apple Watch é considerado o relógio inteligente mais vendido do mundo, embora as vendas tenham diminuído ultimamente.

A Apple não comenta, mas a gigante da tecnologia usa em seu marketing histórias reais de pessoas cujas vidas foram salvas pela função de monitoramento cardíaco do dispositivo, e, como anedota, eu também ouvi muitas delas. O que eu não ouvi, no entanto, é quantos casos de falsos positivos existem.

Em muitos casos, quando os pacientes apresentam seus dados aos profissionais de saúde, os médicos preferem tentar recriá-los usando seus próprios equipamentos, em vez de simplesmente confiar no que o aparelho capturou.

Há várias razões para isso, diz Yang Wei, professor associado em tecnologias na Nottingham Trent University. E todas são muito práticas.

"Quando você vai ao hospital e mede seu ECG [eletrocardiograma, um teste que verifica a atividade do seu coração], você não se preocupa com o consumo de energia porque a máquina está conectada à parede", diz ele.

"No seu relógio, você não vai medir seu ECG continuamente porque isso drenaria sua bateria."

Além disso, o movimento — tanto do aparelho em si no pulso, por exemplo, quanto o movimento geral da pessoa que o usa — pode "criar ruído" nos dados que ele coleta, ele acrescenta, tornando-o menos confiável.

Wei aponta para o anel no meu dedo.

"O 'padrão ouro' para medir a frequência cardíaca é do pulso ou diretamente do coração", ele diz. "Se você medir a partir do dedo, estará sacrificando a precisão."

É papel do software preencher essas lacunas de dados, ele diz. Mas não há um padrão internacional para esses aparelhos, nem para os sensores e software que alimentam esses dispositivos, nem para os dados em si, e até mesmo para o formato em que são coletados.

Quanto mais consistentemente um dispositivo for usado, mais precisos seus dados provavelmente serão.

Pritesh Mistry, pesquisador de tecnologias digitais no Kings Fund, concorda que há desafios significativos em torno da inclusão de dados atuais gerados por pacientes em nossos sistemas de saúde e acrescenta que a discussão já está acontecendo há vários anos no Reino Unido sem nenhuma resolução clara.

Ele diz que pode ser positiva a iniciativa do governo do Reino Unido de empurrar o atendimento para fora dos hospitais e para ambientes comunitários por meio desses aparelhos inteligentes.

"Mas sem essa base de sustentação da capacitação tecnológica em termos de infraestrutura e suporte à força de trabalho para ter as habilidades, conhecimento, capacidade e confiança, acho que será um desafio", acrescenta.

 

Fonte: Por Simon Cork, para The Conversation/BBC News

 

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