"Taxa das blusinhas" já em vigor.
Como fica preço final?
Quem compra pela
internet produtos de varejistas internacionais como
Shein, AliExpress e Shopee pagará mais caro a partir desta
quinta-feira (01/08), quando entra em vigor o imposto de importação para itens
de até 50 dólares, conhecido popularmente como "taxa das blusinhas".
A medida é defendida
pelos varejistas nacionais, que alegavam concorrência desleal, e também
interessa ao governo, que terá aumento de arrecadação. Mas
incomoda milhões de brasileiros que criaram o hábito de comprar produtos
baratos e variados nessas plataformas de comércio eletrônico e agora terão que
desembolsar mais.
Abaixo, explicamos
como calcular o impacto do novo imposto no preço final do produto. A
simulação usa como exemplo uma compra de R$ 100 (17,82 dólares na cotação desta
quarta-feira) e foi feita com auxílio de Gustavo Masina, presidente do
Instituto de Estudos Tributários (IET).
·
Valor final antes da "taxa das
blusinhas"
As compras de até 50
dólares (incluído o valor do frete e do seguro) de varejistas internacionais
estavam isentas do imposto de importação federal.
Elas pagavam apenas o
Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) estadual, com
alíquota unificada de 17%.
O ICMS considera como
base de cálculo o preço final do produto já com o imposto. Para calcular o
preço final, a fórmula é a seguinte: preço do produto na loja dividido por
0,83.
Uma compra de R$ 100
ficava com o preço final de R$ 120,48.
Para descobrir o
valor pago de ICMS, multiplica-se o valor final por 0,17, o que dá R$ 20,48 –
uma alíquota efetiva de 20,48%.
·
Valor final com a "taxa das
blusinhas"
Para compras de até 50
dólares, o imposto de importação agora é de 20%, e ele incide antes do ICMS.
Desta forma, uma
compra de R$ 100 pagará então R$ 20 de imposto de importação.
Sobre o valor de R$
120, incidirá o ICMS de 17%. Usando a mesma fórmula acima, o preço final será
R$ 144,58 – R$ 24,10 mais caro do que antes.
A alíquota total
efetiva dos dois impostos somados será de 44,58%.
·
Por que o imposto de importação será
cobrado?
Originalmente, a
isenção de imposto de importação de itens de até 50 dólares valia somente para
remessas entre pessoas físicas. Produtos comprados de empresas, em tese, eram
sujeitos a imposto de importação de 60%.
O governo federal
percebeu que varejistas internacionais estavam se aproveitando da isenção
para vender produtos aos brasileiros sem pagar o imposto de importação,
indicando uma pessoa física como remetente. A Receita Federal identificou, por
exemplo, que uma única pessoa havia enviado mais de 16 milhões de pacotes
internacionais para o Brasil.
Em abril de 2023, no
início do terceiro mandato de Luiz
Inácio Lula da Silva, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad,
disse que estudava medidas para que os itens vendidos por empresas pagassem o
imposto devido. Em seguida, o secretário da Receita Federal, Robinson
Barreirinhas, afirmou que o governo preparava uma medida provisória para acabar
com a isenção até o valor de 50 dólares.
O anúncio provocou
muita repercussão negativa para o governo. A primeira-dama, Janja Lula da
Silva, logo negou em suas redes sociais que os consumidores teriam que pagar
imposto sobre esses itens mais baratos. O governo recuou da proposta e passou a
buscar uma solução alternativa que controlasse de alguma forma as remessas
feitas pelos varejistas internacionais.
Em julho de 2023, o
governo lançou o Remessa Conforme, um programa que garantia a isenção para
remessas de até 50 dólares feitas por varejistas internacionais cadastrados no
sistema do governo. Na época, a Receita estimou que a perda de arrecadação com
o programa seria de R$ 35 bilhões até 2027.
A pressão dos
varejistas brasileiros para cobrar imposto de importação sobre essas remessas
internacionais continuou. E em maio deste ano, a cobrança do imposto foi
incluída no texto da medida provisória que criou o Programa Mobilidade Verde e
Inovação (Mover) durante sua tramitação no Congresso.
O imposto de
importação não tinha relação com o Mover, mas entrou no texto como um
"jabuti", algo desvinculado do tema principal da proposta. Lula disse
que poderia vetar, mas após negociações entre o Congresso e o governo chegou-se
ao acordo de cobrar uma alíquota de 20% de imposto de importação sobre esses
itens.
A Câmara aprovou o texto em 29 de maio, e o Senado, uma semana depois. Em
27 de junho, o texto foi sancionado por Lula.
Medicamentos estão
fora da nova regra. Para remessas de 50 dólares a 3 mil dólares, vale o imposto
de importação de 60%, mas é concedido um desconto de 20 dólares na taxação.
·
Varejo pede imposto mais alto
O Instituto para
Desenvolvimento do Varejo (IDV), que representa grandes empresas como Magalu,
Renner e Netshoes, considerou a adoção do imposto de importação de 20% um
"primeiro passo", mas defende uma alíquota ainda maior para reduzir o
que considera uma "desigualdade tributária" entre as empresas que
operam no Brasil e os varejistas internacionais asiáticos.
"O imposto de
importação mais o imposto estadual resultam em um total de 44%. Ajuda, mas não
resolve. Se importarmos um produto pela importação regular, regida pela Receita
Federal, a carga tributária total será em torno de 80% a 90%", afirma à DW
o presidente do IDV, Jorge Gonçalves Filho.
"Ainda estamos na
metade do caminho. Há milhares de empregos e empresas em risco, que ainda
poderão fechar. Vamos ver a resposta do mercado", diz. "Estamos em
busca de uma isonomia tributária."
Masina, do IET,
considera que a "taxa das blusinhas" foi "adequada" para
reduzir a desigualdade que havia entre as importações isentas e as vendas
internas tributadas. "Embora não sirva para igualar as cargas tributárias,
ao menos reduziu as diferenças".
A Associação
Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX), por exemplo, defende um imposto de
importação de 45% a 50% para esses itens.
Há reclamações do
setor também sobre o programa Remessa Conforme. O IBV, a ABVTEX e a Associação
Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) divulgaram em maio uma
nota conjunta na qual afirmaram ser necessário "equalizar os privilégios e
prazos aduaneiros previstos dentro do Programa Remessa Conforme, uma vez que
não há por que se conceder nenhum tipo de privilégio para os sites estrangeiros
em relação ao setor produtivo nacional".
¨ Brasil quer emplacar imposto sobre super-ricos no G20
Em reunião no Rio de Janeiro
na penúltima semana de julho, os ministros das Finanças do G20 declararam seu empenho em tributar os super-ricos.
"Respeitando plenamente a soberania fiscal, iremos nos esforçar por
trabalhar em conjunto a fim de garantir que indivíduos muito ricos sejam
efetivamente tributados", constou da declaração final conjunta.
O Brasil, que
atualmente detém a presidência do grupo, sugeriu que os bilionários fossem
tributados em pelo menos 2% da sua fortuna ao ano. Essa medida permitiria gerar
receitas adicionais de 200 bilhões a 250 bilhões de dólares, que poderiam ser
utilizadas na luta contra a pobreza e na proteção do clima.
<><> Brasil
quer assumir papel pioneiro
A proposta brasileira
foi elaborada pelo economista francês Gabriel Zucman. Ele conta que a ideia de
trazer o imposto mínimo global para os super-ricos para o G20 nasceu em
fevereiro. Exigências semelhantes já haviam sido feitas no Fórum Econômico
Mundial de Davos deste ano, algumas delas pelos próprios bilionários.
Agora o Brasil queria trazer para a mesa do G20 sua contribuição para uma
cooperação internacional mais estreita em questões fiscais, explica o
economista e fundador do Observatório Fiscal da UE em Paris.
Zucman atribui ao G20
os progressos dos últimos dez anos no tocante à troca automática de informações
sobre dados bancários e à tributação mínima global para as grandes empresas.
"O Brasil se perguntou: 'O que é que vem agora?' E eu respondi que devia
haver um imposto mínimo global para os super-ricos."
<><> Mais
riqueza = menos impostos
Zucman se refere
ao grupo relativamente pequeno de
cerca de 3 mil bilionários em todo o mundo que, tendo em conta suas posses,
pagaram até agora impostos individuais baixos demais, ou seja, apenas 0,3%
do patrimônio, na média global.
Se considerarmos a
carga fiscal total, um bilionário pagaria cerca de 20%. Em comparação, a carga
fiscal para as classes baixa e média em países como a Alemanha ou a França é de
40% a 50%.
"Trata-se de uma
injustiça fundamental: os mais ricos, que poderiam contribuir mais, têm a carga
fiscal efetiva mais baixa", afirma Zucman. "A minha proposta de um
imposto mínimo sobre o rendimento individual para os multimilionários, de 2% do
seu patrimônio, deve garantir que eles não paguem menos do que os seus
motoristas, os seus empregados domésticos ou o restante da população. Porque
ninguém concorda que os bilionários paguem menos do que o restante de
nós."
<><> Dinheiro
frequentemente investido em empresas
Embora haja certa
controvérsia sobre quantos bilhões alguns super-ricos, como Donald
Trump, realmente possuem, na maioria dos casos é
relativamente fácil calcular os seus ativos.
Cerca de metade da
riqueza dos bilionários do mundo é investida em ações de empresas cotadas na
bolsa, enquanto a outra metade é investida principalmente em participações em
empresas privadas, que podem ser avaliadas. "Não estou dizendo que teremos
uma avaliação absolutamente perfeita. Haverá sempre casos excepcionais, como o
de Trump, em que é difícil. Mas podemos chegar a um valor de referência
razoável."
A tributação dos
multimilionários recebe grande aprovação em nível mundial, afirma Zucman.
Sua esperança aumenta diante da rapidez com que foi aceito o intercâmbio
global de informações sobre dados bancários, já introduzido por mais de 100
países. A questão foi negligenciada por bastante tempo, até que os ministros
das Finanças do G20 a incluíram na sua agenda em 2013.
Atualmente constata-se uma redução da evasão fiscal transfronteiriça em
dois terços.
<>< "Massa
crítica" de países precisa participar
Também não é
necessário que todos os países participem. "Só precisamos de uma massa
crítica de países, como os grandes países europeus, juntamente com o Brasil e a
África do Sul, para introduzir a tributação dos seus bilionários. E que também
tributem os bilionários de outros países que pagam muito pouco no seu país [de
origem] e cujos ativos podem ser acessados no estrangeiro."
O Brasil quer ter a
proposta pronta par a cúpula do G20 no Rio de Janeiro, em novembro. Zucman
acredita que as negociações sobre pormenores técnicos avançarão rapidamente no
palco oficial.
Foram necessários
cerca de dez anos para elaborar a tributação mínima global das empresas. A
expectativa do economista é que o imposto para os multimilionários chegue mais
cedo, pois será possível aproveitar a experiência adquirida com a tributação
das empresas: "Já não precisamos reinventar a roda, mas sim adaptar
os processos aos super-ricos."
A proposta de Zucman
não é utópica, mas provavelmente será difícil de implementar em escala
global, avalia Nelson Marconi, da Escola de Administração de Empresas da
Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. É importante que alguns grandes países
tomem a iniciativa, e um acordo no âmbito do G20 pressionaria o resto do mundo
a introduzir gradualmente esse imposto a nível global, crê o economista.
Marconi está convicto
de que o sucesso do imposto mínimo seria um grande passo para o Brasil se
posicionar como um ator global de justiça social: "Avançar nesse
debate é muito importante para a imagem progressista que o governo brasileiro
quer projetar no exterior."
Fonte: Deutsche Welle
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