sábado, 31 de agosto de 2024

Pressão de autoridades sobre X e outras redes não ocorre só no Brasil e veio para ficar, diz especialista

Nos últimos anos, o debate sobre a regulação e moderação de conteúdo nas grandes plataformas tecnológicas tornou-se cada vez mais acirrado. A pressão sobre essas empresas se mantém alta, e as discussões sobre como devem gerenciar o conteúdo e cumprir a legislação continuam a evoluir.

Casos recentes, como o confronto entre o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e o bilionário Elon Musk, proprietário do X (anteriormente Twitter), e a prisão do fundador do Telegram, Pavel Durov, na França, destacam a transformação crescente na relação entre governos e plataformas digitais, observa o brasileiro João C. Magalhães, professor de Mídia, Política e Democracia na Universidade Groningen, na Holanda, em entrevista à BBC News Brasil.

Magalhães explica que, antes vistas com mais indulgência, as grandes plataformas agora enfrentam uma abordagem mais crítica das autoridades, especialmente no que diz respeito ao conteúdo em suas redes.

"A mudança na abordagem governamental é um reflexo da crescente desconfiança pública e da percepção que os conteúdos compartilhados nessas redes contribuíram para graves crises sociais, como a erosão da democracia em vários países”, diz ele.

"Não imagino esses sentimentos mudando no curto ou médio prazo."

Magalhães observa uma clara divisão na percepção pública: a esquerda critica as plataformas por não moderarem o suficiente, enquanto a direita acusa de moderação excessiva.

"Essa polarização desgastou a autoridade das plataformas para resolver sozinhas problemas de moderação de conteúdo, como elas faziam antes, e forçou os governos a intervirem mais. Políticos estão cada vez menos dispostos a adotar uma abordagem 'laissez-faire' [algo como "não intervir"] em relação à regulação das plataformas", explica ele.

Magalhães lembra que, desde meados dos anos 2010, as plataformas enfrentam pressões da sociedade civil e de governos para controlarem de maneira mais rígida a produção de dados digitais e, principalmente, a liberdade de expressão dos usuários.

Essas pressões se concretizaram em leis como o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR) e a Lei de Serviços Digitais (DSA) da União Europeia, que estabelecem requisitos mais específicos sobre a gestão de dados e a moderação de conteúdos.

Até o fim da pandemia de covid-19, as plataformas responderam a essas pressões e novas leis ampliando suas práticas de moderação e investindo em sistemas automatizados de análise de conteúdo.

No entanto, Magalhães observa que, desde então, as plataformas começaram a questionar a viabilidade desse modelo.

"O custo financeiro elevado e a complexidade política envolvida na moderação têm levado algumas plataformas a buscar formas de reduzir a politização e encontrar um equilíbrio entre os requisitos regulatórios e a viabilidade econômica", afirma.

Recentemente, lembra o especialista, o Instagram e o Threads, plataformas controladas pela Meta, decidiram diminuir a amplificação de conteúdos políticos para aliviar as pressões regulatórias e evitar a politização excessiva.

"É um exemplo de como as plataformas estão tentando equilibrar a moderação eficaz do conteúdo com as pressões regulatórias, ao mesmo tempo em que buscam minimizar os custos", explica Magalhães.

"Em vez de dizerem ‘não vamos moderar’, esse tipo de medida visa diminuir a circulação de conteúdos que, em geral, forçam essas empresas a tomarem decisões contraditórias de moderação."

Futuro incerto

O futuro da moderação de conteúdo nas grandes plataformas de tecnologia permanece incerto, segundo Magalhães.

Ele ressalta que esse tipo de controle da liberdade de expressão por empresas privadas e globais é historicamente novo, e que não existe ainda um modelo claro de como isso deve ser feito.

"O dilema das plataformas é como moderar o conteúdo de maneira menos controversa possível, atender às exigências regulatórias, e manter as altas taxas de lucro", diz ele.

"É uma equação difícil de resolver, um campo de batalha complexo onde regulação, política e dinheiro se entrelaçam", acrescenta.

 

• Lula confronta Elon Musk e diz que o bilionário não está acima da soberania do Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que o bilionário Elon Musk deve respeitar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ao exigir a indicação de representantes legais da rede social X no Brasil. Caso contrário, a plataforma corre o risco de ser suspensa nesta sexta-feira, após o prazo para o cumprimento da ordem judicial do ministro Alexandre de Moraes, do STF, expirar.

“Todo e qualquer cidadão, de qualquer parte do mundo, que tem investimento no Brasil está subordinado à Constituição brasileira e às leis brasileiras. Portanto, se a Suprema Corte tomou uma decisão para o cidadão cumprir determinadas coisas, ou ele cumpre ou vai ter que tomar outra atitude. Não é porque o cara tem muito dinheiro que o cara pode desrespeitar. Esse cidadão é um cidadão americano, não é um cidadão do mundo. Ele não pode ficar ofendendo os presidentes, ofendendo os deputados, o Senado, a Câmara, a Suprema Corte… Ele pensa que é o quê?”, disse Lula em entrevista Rádio MaisPB nesta sexta-feira (30).

“Então é o seguinte: ele tem que respeitar a decisão da Suprema Corte brasileira. Se quiser, bem. Se não quiser, paciência. Se não for assim, esse país nunca será soberano. Esse país não é um país que tem uma sociedade que tem complexo de vira-lata, que porque o cara é americano a gente fica com medo. Não. Esse cara tem que aceitar as regras desse país. E se esse país tomou uma decisão através da Suprema Corte, ele tem que acatar. Se vale para mim, vale para ele”, completou.

Nesta quinta-feira (29), expirou o prazo dado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes para que o X nomeasse um representante legal no país sob risco de ter suas operações suspensas em caso de descumprimento. Moraes também determinou o bloqueio das contas da Starlink - empresa que também pertence a Elon Musk, visando assegurar o pagamento de multas aplicadas ao X pela não remoção de contas e perfis que atuam na disseminação de fake news, ataques às instituições e conteúdo golpista.

Em resposta, Musk disse que não irá cumprir a determinação para remover os perfis investigados e tentou intimidar Moraes, chamando o magistrado de "ditador malvado", "criminoso vestido de toga como uma fantasia de Halloween". O X, na noite desta quinta-feira (29), também sinalizou que não irá cooperar, afirmando que espera ser alvo de bloqueio em breve.

 

¨      Principal diferença do processo do “X” no Brasil é a migração para as redes, diz professor

O professor de Direito da Uerj Carlos Affonso Souza analisou durante o  WW o recente embate entre o bilionário Elon Musk e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), destacando as peculiaridades deste caso em relação a bloqueios anteriores de plataformas digitais no Brasil.

Segundo Souza, a principal diferença neste episódio é a migração do debate judicial para as redes sociais.

“Quando ela pula para as redes, a gente passa a jogar com as regras das redes sociais. E ao invés de a gente falar num recurso, numa petição, numa argumentação judicial, a gente passa a trabalhar com uma outra linguagem”, explicou o especialista.

<><> Histórico de bloqueios no Brasil

O professor relembrou casos anteriores de bloqueio de plataformas no país, como o WhatsApp, em 2015 e 2016, e o Telegram, no ano passado.

Nesses episódios, as empresas ou não conseguiam atender tecnicamente às demandas judiciais ou simplesmente não respondiam às comunicações da Justiça.

No caso atual envolvendo o X (antigo Twitter), Souza ressalta uma situação inédita: “Agora, no caso do X, a gente tem uma situação em que não é que a empresa não responde, a empresa vai a público dizer que não vai cumprir a ordem judicial”.

<><> Questionamentos e limites legais

O especialista enfatizou que não cabe ao X determinar o que é legal ou ilegal no Brasil.

“A nota do X diz que não vai cumprir as decisões porque as decisões não seguem a lei do Brasil. Bom, o tribunal que interpreta a constituição é o Supremo Tribunal Federal”, argumentou Souza.

Ele ressaltou que, embora as decisões judiciais possam ser questionadas, isso deve ocorrer dentro dos autos do processo.

A transposição desse debate para as redes sociais altera a dinâmica da discussão, substituindo argumentações jurídicas por memes, piadas e ataques pessoais.

Carlos Affonso Souza concluiu alertando para os riscos dessa nova dinâmica: “Quando Elon Musk coloca lá um meme que ataca o Alexandre de Moraes, nas redes é uma coisa. Se você fizer isso num processo judicial, você vai ganhar uma representação na ordem, na congregação de classe sobre esse tipo de atitude”.

 

•    Musk diz que serviço do Starlink será gratuito em meio a imbróglio no Brasil

O empresário Elon Musk disse, na quinta-feira (29), que o serviço da Starlink — empresa de internet via satélite — será gratuito até que a suspensão de suas contas seja resolvida.

“Muitas escolas e hospitais remotos dependem do Starlink, da SpaceX! A SpaceX fornecerá serviço de internet gratuitamente aos usuários no Brasil até que o assunto seja resolvido, pois não podemos receber pagamento, mas não queremos cortar o acesso de ninguém”, afirmou Musk pelo X (antigo Twitter).

O bloqueio das contas da Starlink aconteceu após determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). A ação foi decorrente da ausência de representantes do X no Brasil. Ambas companhias são de Musk.

O ministro havia mandado, na última quarta-feira (28), que fosse nomeado alguém para responder legalmente pela empresa. Caso a solicitação não fosse atendida, a pena seria a imediata suspensão do X.

Nesta quinta, o X anunciou que não irá cumprir a determinação do ministro. Agora, a expectativa é que Moraes suspenda a rede social no Brasil.

<><> Starlink continuará operando no país

Em comunicado, a operadora de internet anunciou que continuará operando seus serviços no país, mesmo após a decisão de Moraes.

Segundo a empresa, a medida poderá afetar a cobrança mensal dos serviços, mas que os clientes não precisam tomar “nenhuma atitude neste momento”.

“A Starlink está comprometida em defender seus direitos protegidos por sua Constituição e continuará a fornecer serviços a você — gratuitamente, se necessário — enquanto tratamos desse assunto por meios legais”, disse a companhia.

Também foi destacado pela Starlink seus serviços são oferecidos em diversas regiões do Brasil e conectam “mais de 250 mil clientes no Brasil — da Amazônia ao Rio de Janeiro — incluindo pequenas empresas, escolas e socorristas, entre muitos outros”.

Na manifestação, a Starlink também disse que a ordem de Moraes é infundada ao responsabilizar a empresa pelas multas — que diz serem inconstitucionais — contra o X. A empresa também disse que pretende tomar medidas legais a respeito.

“Esta ordem é baseada em uma determinação infundada de que a Starlink deve ser responsável pelas multas cobradas — inconstitucionalmente — contra X”, comentou a empresa. “Ela foi emitida em segredo e sem dar à Starlink qualquer um dos devidos processos legais garantidos pela Constituição do Brasil. Pretendemos abordar o assunto legalmente”.

 

• Embaixada dos EUA diz "monitorar" situação do X no Brasil e fala em “liberdade de expressão”

A Embaixada dos Estados Unidos no Brasil divulgou que está “monitorando” o embate entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e a rede social X, empresa norte-americana controlada pelo bilionário Elon Musk. A informação foi fornecida pela representação diplomática após o portal Metrópoles questionar o Departamento de Estado dos EUA sobre a possibilidade de o ministro Alexandre de Moraes suspender o X no Brasil.

Em nota oficial, a embaixada ressaltou o valor da "liberdade de expressão", descrevendo-a como “um pilar fundamental em uma democracia saudável”. Elon Musk e os bolsonaristas têm utilizado o falso pretexto da "liberdade de expressão" para atacar a soberania, a democracia e as instituições brasileiras

“A Embaixada dos EUA está monitorando a situação entre o Supremo Tribunal Federal e a plataforma X. Ressaltamos que a liberdade de expressão é um pilar fundamental em uma democracia saudável. Por política interna, não comentamos decisões de tribunais ou disputas legais”, afirmou a embaixada na nota enviada nesta sexta-feira (30).

O imbróglio se intensificou após a falta de cumprimento de ordens judiciais por parte da rede social, o que levou o ministro Alexandre de Moraes a considerar medidas severas, como a suspensão da plataforma em território brasileiro.

A embaixada americana optou por não comentar sobre outra questão levantada: a decisão de Moraes de bloquear contas da Starlink, outra empresa de Musk, para garantir o pagamento de multas aplicadas ao X.

• "Elon Musk não passa de um playboy mimado, prepotente e arrogante", dispara Gleisi

Presidente do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) saiu em defesa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que deverá suspender o X, antigo Twitter, no Brasil nas próximas horas, já que o dono da plataforma, o bilionário Elon Musk, se recusa a nomear um representante legal no país para submeter a plataforma à Justiça brasileira.

Gleisi afirmou que "Elon Musk não passa de um playboy mimado, prepotente e arrogante" e esclareceu que, ao contrário do que diz o bilionário no exterior e os bolsonaristas no Brasil, o país não vive sob clima de censura. O que acontece, destaca a parlamentar, é que Musk não quer respeitar a legislação do Brasil, e deverá responder por isso.

"Elon Musk não passa de um playboy mimado, prepotente e arrogante. Ele sim, apaixonado por ditaduras como a de 1964, sonha com nova interferência externa na defesa e soberania de países sul-americanos. A verdade é uma só: não existe censura no Brasil, há desobediência de um empresário estrangeiro às nossas leis. Para ele, a única coisa que importa é dinheiro e poder, custe o que custar", publicou Gleisi.

 

Fonte: BBC News Brasil/Brasil 247           

 

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