quinta-feira, 1 de agosto de 2024

Quase metade dos casos de demência poderiam ser prevenidos, diz estudo

Quase metade dos casos de demência no mundo poderiam ser prevenidos ou retardados ao evitar fatores de risco desde a infância até o fim da vida, conforme mostra um novo estudo apresentado pela The Lancet nesta quarta-feira (31) na Conferência Internacional da Associação de Alzheimer (AAIC 2024).

Segundo a pesquisa, abordar 14 fatores de risco modificáveis — ou seja, que poderiam ser evitados com mudanças no estilo de vida ou tratamentos específicos — na infância e ao longo da vida poderia reduzir os casos de demência no mundo, contrariando as tendências de aumento da condição globalmente.

Com base nas últimas evidências disponíveis, o relatório mostra que 7% dos casos de demência estão associados ao colesterol ruim na meia-idade (40 anos), enquanto 2% dos casos estão relacionados à perda de visão não tratada na vida adulta.

Esses dois fatores foram somados aos outros 12 já identificados pela Comissão Lancet em 2020: níveis mais baixos de educação, deficiência auditiva, pressão alta, tabagismo, obesidade, depressão, sedentarismo, diabetes, consumo excessivo de álcool, lesão cerebral traumática, poluição do ar e isolamento social. Esses fatores foram associados a 40% de todos os casos de demência.

Segundo o novo estudo, a deficiência auditiva e o colesterol alto são os fatores de risco associados à maior proporção de pessoas que desenvolvem demência no mundo, juntamente com o menor nível educacional no início da vida e o isolamento social na vida adulta.

O relatório foi desenvolvido por 27 especialistas mundiais em demência e pede aos governos planos para lidar com os riscos ao longo da vida para a demência, argumentando que quanto mais cedo abordar e reduzir os fatores de risco, melhores serão os resultados no futuro.

Para isso, o documento descreve um conjunto de mudanças de políticas e estilo de vida para prevenir e gerenciar a demência.

“Nosso novo relatório revela que há muito mais que pode e deve ser feito para reduzir o risco de demência. Nunca é muito cedo ou muito tarde para agir, com oportunidades de causar impacto em qualquer fase da vida”, diz a autora principal do estudo, Gill Livingston, professora da University College London, no Reino Unido, em comunicado à imprensa.

“Agora temos evidências mais fortes de que uma exposição mais longa ao risco tem um efeito maior e que os riscos agem mais fortemente em pessoas vulneráveis. É por isso que é vital que redobremos os esforços preventivos em relação àqueles que mais precisam deles, incluindo aqueles em países de baixa e média renda e grupos socioeconômicos desfavorecidos. Os governos devem reduzir as desigualdades de risco tornando estilos de vida saudáveis o mais alcançáveis possível para todos”, completa.

<><> Ações para reduzir os riscos de demência em todo o mundo

Para reduzir o risco de demência ao longo da vida, o relatório descreve 13 recomendações a serem adotadas por governos e indivíduos. São elas:

•        Fornecer a todas as crianças educação de boa qualidade e ser cognitivamente ativo na meia-idade;

•        Disponibilizar aparelhos auditivos para todos aqueles com perda auditiva e reduzir a exposição a ruídos nocivos;

•        Detectar e tratar o colesterol LDL (considerado ruim) alto na meia-idade, por volta dos 40 anos;

•        Tornar a triagem e o tratamento para deficiência visual acessíveis a todos;

•        Tratar a depressão de forma eficaz;

•        Usar capacetes e proteção para a cabeça em esportes de contato e em bicicletas;

•        Priorizar ambientes comunitários de apoio e moradias para aumentar o contato social;

•        Reduzir a exposição à poluição do ar por meio de políticas rigorosas de ar limpo;

•        Ampliar medidas para reduzir o tabagismo, como controle de preços, aumento da idade mínima de compra e proibições de fumar;

•        Reduzir o teor de açúcar e sal em alimentos vendidos em lojas e restaurantes.

“Estilos de vida saudáveis que envolvem exercícios regulares, não fumar, atividade cognitiva na meia-idade (incluindo educação formal externa) e evitar o excesso de álcool podem não apenas reduzir o risco de demência, mas também retardar o início da demência”, afirma Livingston.

“Portanto, se as pessoas desenvolverem demência, provavelmente viverão menos anos com ela. Isso tem enormes implicações na qualidade de vida dos indivíduos, bem como benefícios de economia de custos para as sociedades”, completa.

<><> Avanços em pesquisa e necessidade de mais suporte

O relatório também discute os avanços em relação ao diagnóstico preciso, como os exames de sangue que usam biomarcadores sanguíneos, e ao tratamento, como os anticorpos anti-amiloides β.

Outro ponto discutido pelo documento é a necessidade de mais suporte para pessoas que vivem com demência e para suas famílias. Os autores enfatizam que, em muitos países, intervenções eficazes conhecidas por beneficiar pessoas com demência ainda não estão disponíveis ou são uma prioridade, incluindo intervenções de atividade que proporcionam prazer e reduzem os sintomas neuropsiquiátricos.

Os autores observam que, embora quase todas as evidências para demência ainda venham de países de alta renda, agora há mais evidências e intervenções de países de baixa e média renda, mas as intervenções geralmente precisam ser modificadas para melhor apoiar diferentes culturas, crenças e ambientes.

•        Veja qual mudança na dieta pode reduzir em 20% o risco de demência

O risco de demência aumentou em 14% quando as pessoas consumiam cerca de 28 gramas de carne vermelha processada por dia — o equivalente a pouco menos de duas porções de 85 gramas por semana — em comparação com pessoas que comiam apenas cerca de três porções por mês, de acordo com um novo estudo preliminar.

No entanto, o risco de demência caiu 20% para as pessoas que substituíram essa pequena porção diária de carne vermelha processada por uma porção diária de nozes e leguminosas.

Carnes vermelhas processadas, como bacon, salsicha, cachorro-quente e frios, geralmente contêm níveis mais altos de sódio, nitratos e gordura saturada. Consumir maiores quantidades dessas carnes tem sido fortemente associado ao desenvolvimento de câncer de cólon e outros tipos de câncer, diabetes tipo 2, doenças cardíacas e derrame, mostram estudos.

“Há muito que podemos fazer para reduzir os riscos de demência, começando com ações que são bem conhecidas para reduzir os riscos de doenças cardiovasculares”, diz Walter Willett, professor de epidemiologia e nutrição na Harvard T.H. Chan School of Public Health, em Boston, Estados Unidos.

“Ainda há aspectos a serem compreendidos em mais detalhes”, afirma Willett em um e-mail. “Por exemplo, parece que alguns alimentos podem ser particularmente importantes de incluir, e gostaríamos de entender os ingredientes ativos específicos, mas não precisamos esperar todos os detalhes para agir.”

O estudo foi observacional e só pode mostrar uma associação, e não necessariamente causa e efeito, explica David Katz, especialista em medicina preventiva e de estilo de vida que não participou do estudo.

“No entanto, as associações são muito provavelmente causais, porque os principais fatores de risco para o Alzheimer e o declínio cognitivo são os fatores de risco para doenças cardiovasculares, com os quais o consumo de carne processada está fortemente ligado”, diz o especialista em um e-mail. Katz é o fundador da organização sem fins lucrativos True Health Initiative, uma coalizão global de especialistas dedicados à medicina de estilo de vida baseada em evidências.

<><> Cada porção adicional de carne vermelha processada aumentou o risco

Um resumo do estudo, que está sob revisão para publicação, foi apresentado na quarta-feira (31) na Conferência Internacional da Associação de Alzheimer de 2024, em Filadélfia, nos Estados Unidos.

A cada dois a quatro anos, durante mais de três décadas, os pesquisadores coletaram dados alimentares de mais de 130.000 participantes do Nurses’ Health Study, uma das maiores investigações sobre fatores de risco para doenças crônicas em mulheres, e do estudo complementar Health Professionals Follow-Up Study, que investigou os mesmos fatores de risco em homens.

Homens e mulheres foram questionados sobre a frequência com que consumiam uma porção de carne vermelha processada, que poderia ser duas fatias de bacon, um cachorro-quente, dois pequenos gomos de salsicha ou kielbasa, ou sanduíches de salame, mortadela ou outros embutidos.

Os participantes do estudo também foram questionados sobre a frequência com que consumiam nozes e leguminosas, como uma colher de sopa de manteiga de amendoim; 28 gramas de amendoins, nozes ou outras nozes; um copo de 240 ml de leite de soja; meia xícara de vagens, lentilhas, feijões, ervilhas ou feijões-lima; ou uma porção típica de 85 gramas de tofu ou proteína de soja.

“Esses são alimentos anti-inflamatórios, então você pode imaginar que eles têm muitos benefícios além de reduzir as carnes processadas com toxinas, nitratos e sódio, que não são bons para você”, explica Maria Carrillo, diretora científica da Associação de Alzheimer, que não participou do estudo.

Além do declínio cognitivo de 14% associado a aproximadamente duas porções por semana de carne vermelha processada, o estudo encontrou um risco aumentado relacionado a cada porção adicional.

Cada porção diária adicional acrescentou 1,61 anos extras de envelhecimento cognitivo para a cognição global e 1,69 anos extras de envelhecimento cognitivo na memória verbal, de acordo com o estudo.

“A cognição global fornece uma visão geral ampla da função cognitiva. Ela pode ajudar a capturar o impacto geral dos fatores dietéticos e de estilo de vida na saúde cognitiva”, afirma autora principal do estudo, Yuhan Li, assistente de pesquisa na Channing Division of Network Medicine do Brigham and Women’s Hospital em Boston, em um e-mail.

“A memória verbal refere-se à memória para informações apresentadas verbalmente. Ela é um importante preditor da doença de Alzheimer”, diz Li, que conduziu o estudo enquanto era estudante de pós-graduação na Harvard T.H. Chan School of Public Health.

<><> Dicas para reduzir o consumo de carnes processadas e vermelhas na sua dieta

Simplesmente substituir produtos de origem animal por produtos à base de plantas não resulta automaticamente em uma dieta saudável. Como o estudo ilustra, o resultado pode depender dos tipos de alimentos que você consome como substituto.

Em vez de se concentrar nos benefícios e malefícios de alimentos específicos saudáveis para o coração, tente focar em um padrão alimentar geral, orienta Christopher Gardner, professor de medicina na Stanford Prevention Research Center, na Califórnia, que dirige o Nutrition Studies Research Group do centro. Ele não participou do estudo.

“Quando se tratava de um único nutriente saudável para o coração, você poderia simplesmente injetar esse nutriente nos alimentos e afirmar que é um alimento saudável, o que não era verdade”, diz Gardner em uma entrevista anterior à CNN Internacional.

“Ou se há um superalimento como as sementes de chia, você poderia pegar um alimento realmente pouco saudável e polvilhar sementes de chia nele e dizer: ‘Ah, agora estou protegido’. Não, isso precisa fazer parte de um padrão geral de alimentação saudável.”

Planos alimentares premiados, como o Mediterrâneo e o DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension), são mais um estilo de vida do que uma chamada “dieta”, dizem os especialistas. Ambos se concentram em uma culinária simples e à base de plantas, com a maior parte de cada refeição focada em frutas e vegetais, grãos integrais, feijões, nozes e sementes.

O consumo de carne vermelha é limitado. Em vez disso, as dietas enfatizam o consumo de peixes oleosos saudáveis, ricos em ácidos graxos ômega-3 que são bons para o cérebro, juntamente com carnes magras, como aves e lombo de porco.

Uma maneira fácil de começar uma dieta com menos carne, segundo os especialistas, é cozinhar uma refeição por semana à base de feijões, grãos integrais e vegetais, usando ervas e especiarias para adicionar sabor. Quando uma noite por semana se tornar fácil, acrescente duas, e construa suas refeições sem carne a partir daí.

Quando incorporar carne, use pequenos pedaços de frango ou fatias de carne magra para dar sabor a uma refeição à base de vegetais, como um refogado.

Outro passo fácil, dizem os especialistas, é substituir grãos refinados por grãos integrais. Escolha pão e macarrão de trigo integral e substitua o arroz branco por arroz integral ou selvagem.

 

Fonte: CNN Brasil

 

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