‘Polarização
política impulsiona liderança de Mamdani em NY’, diz dirigente socialista
No dia
4 de novembro, Nova York, a capital de Wall Street, poderá eleger um jovem
prefeito socialista, mulçumano, imigrante e
contundente defensor da Palestina. Aos 33 anos, Zohran Mamdani lidera, com
ampla margem,
todas as pesquisas de intenção de votos, colocando a esquerda em outro patamar
nos Estados Unidos.
Segundo
Jana Silverman, professora de Relações Internacionais da UFABC e dirigente da
organização política de Mamdani, os Socialistas Democráticos da América (DAS),
a campanha eleitoral em Nova York vem promovendo o “autorreconhecimento das
pessoas como classe trabalhadora, sobretudo os mais jovens”.
A Opera
Mundi Silverman disse que foi surpreendida com o resultado das primárias
eleitorais. Para ela, a polarização política “não será o problema, mas a
saída”. Ela também aponta que a candidatura e Zohran é importante não só do
ponto de vista eleitoral, mas também no plano institucional e sindical.
“Ele é
jovem, dialoga bem nas redes sociais, mas vem ganhando apoio porque sua
mensagem é fazer a cidade funcionar para a classe trabalhadora. Há um processo
de autorreconhecimento das pessoas como trabalhadoras, sobretudo dos jovens que
terminam a graduação e não sabem no que vão trabalhar”, afirmou.
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Leia a entrevista com Jana Silverman na íntegra:
·
Jana, para situar os leitores brasileiros, nós
gostaríamos que você começasse explicando quem é Zohran Mamdani e como ele
surgiu no cenário político norte-americano.
Jana
Silverman:
Zohran Mamdani é deputado estadual em Nova York e um militante orgânico da
nossa organização política Socialistas Democráticos da América
(DAS).
Ele se auto identifica como socialista e está liderando as pesquisas para a
prefeitura de Nova York. Ele foi eleito pela primeira vez como deputado
estadual em 2021 e está no seu segundo mandato, após se reeleger com uma margem
grande de votos.
Ele
concorre pelo Partido Democrata, mas é importante destacar que a DAS não
pertence à legenda. Nós não somos uma tendência, mas uma organização totalmente
separada, com direção própria e, inclusive, estamos debatendo a criação do
nosso próprio partido. O que fizemos foi usar a linha eleitoral dos democratas
para disputar as eleições, porque, pelas regras eleitorais dos Estados Unidos,
é muito difícil criar partidos com possibilidade real de vitória.
Zohran
é, portanto, uma das nossas lideranças, como as deputadas Alexandria O´Casio
Cortez e Rashida Talib, a única palestina deputada federal do país. O senador
Bernie Sanders é também muito próximo de nós, embora não seja membro da DAS.
É
importante situar esta eleição no contexto da esquerda norte-americana que teve
seu antes e depois com a candidatura presidencial de Bernie Sanders, em 2016.
Ela consolidou um novo movimento de esquerda socialista no país e foi ali que
Mamdani e muitos outros jovens apareceram. Cerca de 70% a 80% dos militantes da
DSA tem entre 25 e 35 anos.
Nossa
organização existe desde os anos 80 e sempre foi muito pequena, com 3 mil a 4
mil filiados. Nos últimos dois anos conseguimos mais de 60 mil filiados e hoje
beiramos os 100 mil. Em Nova York, temos mais de 10 mil filiados que pagam
mensalidade e exercem uma militância ativa.
·
Qual o cenário das pesquisas e dos apoios a Mamdani a
pouco mais de um mês das eleições?
A
margem de vitória está entre 14% e 22%, dependendo da pesquisa. É muito alta.
Nas pesquisas de intenção de voto, Zohran vence Eric Adams, o atual prefeito
que concorre como independente; o ex-governador de Nova York, Andrew Cuomo, que
perdeu nas primárias e se lançou como independente; e um candidato do Partido
Republicano, Curtis Sliwa, uma figura altamente folclórica do Guardian Angels,
um grupo de motociclistas que perseguia os moradores de rua.
A
extrema direita sabe que, com o voto disperso entre esses três, Zohran vai
ganhar de lavada. Então, Trump ofereceu dinheiro, cerca de 7 milhões
de dólares, para o Sliwa sair das eleições e nos bastidores dizem que ele
também prometeu um cargo de embaixador para o atual prefeito sair da disputa.
Por enquanto, os três se mantém, o que torna muito improvável uma derrota do
Zohran.
Em
termos de apoios, em teoria, após a vitória nas primárias, todos do Partido
Democrata deveriam apoiá-lo automaticamente, mas isso tem sido um processo. As
figuras mais proeminentes da esquerda já o apoiaram, como Sanders e outros
nomes locais. Zohran conversou com pessoas que não foram contatadas nas
primárias, como representantes empresariais, do mercado imobiliário e outras
figuras mais centristas.
No
âmbito nacional, muita gente está prestando atenção nele, pois o Partido
Democrata entrou em colapso. Nós tivemos uma vitória importante na semana
passada, com a o apoio da governadora do estado de Nova York, Kathleen Courtney
Hochul. Basicamente, está faltando duas ou três figuras, inclusive o líder do
Partido Democrata no Senado, que é de Nova York, Chuck Schumer.
Zohran também conta com apoio de 80%
dos sindicatos,
os mais conservadores apoiam outro candidato. Ele é jovem, dialoga bem nas
redes sociais, mas vem ganhando apoio porque sua mensagem é fazer a cidade
funcionar para a classe trabalhadora. Há um processo de autorreconhecimento das
pessoas como trabalhadoras, sobretudo dos jovens que terminam a graduação e não
sabem no que vão trabalhar.
·
Como vocês conseguiram essa façanha?
A
campanha começou a partir de uma avaliação do contexto com Donald Trump e a
percepção de que o centro político representado por Kamala Harris e outros,
além de Joe Biden, não tinha mais chão. Nós, então, decidimos ir por Nova York,
onde temos uma melhor correlação de forças.
Lançamos
a campanha sem pensar, muito mais por uma questão de propaganda, pela mesma
razão que pretendíamos ter um candidato à esquerda nas eleições de 2028. No
entanto, ela tomou uma proporção que não
imaginávamos.
A mensagem de Mamdani chegou nos ouvidos do eleitorado.
Vencemos
as primárias do Partido Democrata não porque tínhamos dinheiro, mas porque
apostamos na mobilização e não somente nas redes sociais. Dentro e fora da DAS,
os que abraçaram a campanha foram orientados a conversar com outras pessoas
próximas e a criar uma rede. Com isso, nós mobilizamos 50 mil voluntários, sem
receber sequer um lanche para bater de porta em porta; e chegamos em mais de 1
milhão de residências em Nova York, explicando diretamente para os eleitores a
candidatura de Zohran.
Nós
conseguimos mobilizar o voto de pessoas que normalmente não votam,
principalmente jovens, descendentes de asiáticos e a comunidade
muçulmana. E a vitória de Zohran foi contra todas as expectativas, porque o
candidato oponente nas primárias era o ex-governador, super conhecido e com
apoio da máquina estatal e da elite financeira de Nova York.
·
Quais as bandeiras da candidatura Mamdani?
Em seu
mandato como deputado estadual, ele esteve muito engajado em temas que se
transformaram nas bandeiras de campanha, que está ancorada na classe
trabalhadora e
em propostas que visam diminuir o custo de vida para os trabalhadores em Nova
York, uma cidade muito cara de se viver. São três propostas principais:
expandir o sistema de creches públicas para os trabalhadores; oferecer ônibus
de graça todos os dias da semana; e congelar os preços de aluguel para um 1
milhão de apartamentos que permitem uma certa regulamentação, chamados “rent
control”.
No seu
primeiro mandato, Mamdani chegou a fazer uma greve de fome para ajudar os
taxistas que, diante da concorrência com o Uber, pediram uma regulamentação
melhor para os trabalhadores. Ele também vem atuando, desde sempre, na pressão
pela construção de mais moradias populares e no controle sobre os preços do
aluguel e teve um papel importante na lei que regula esses preços.
Há
outras propostas, como a de criar uma espécie de supermercados públicos, com
preços subsidiados para cesta básica e gerenciados pela própria cidade. No que
diz respeito à segurança pública, ele propõe uma equipe de serviço social para
atender as pessoas em situação de rua, em vez de ter a polícia envolvida, no
sentido de descriminalizar a atenção.
Outra
grande questão é a Palestina. Zohran é muito ligado a isso e está à frente de
outro projeto de lei, ainda não aprovado, chamado “Não coma o meu dinheiro”,
que visa retirar qualquer investimento em bônus para Israel dos fundos de
pensão dos trabalhadores do estado de Nova York. Uma pauta totalmente ligada ao
movimento Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS). Aliás, o apoio ao BDS é uma
das condições para ser militante da DSA.
·
E os ataques de Donald Trump contra Mamdani e da extrema
direita. Como você avalia isso?
Ele já
recebeu ameaças de morte, o que é preocupante porque tem muita gente doida
andando armada nos Estados Unidos e há uma onda de violência política. Zohran
precisou aumentar sua segurança pessoal, mas acreditamos que qualquer tentativa
viria muito mais pelo que chamamos de “lobo solitário” do que por um movimento
organizado.
Em
relação ao Trump, ele chegou a dizer que iria deportar Mamdani e o
chamou várias vezes de comunista. Nós achamos o máximo isso, porque retorna
em apoio. Na prática, o governo norte-americano não pode fazer nada contra ele,
que é um cidadão e não pode ser deportado.
É
importante destacar que a política migratória de Trump é a que mais impacta
hoje, e não apenas os imigrantes, mas todo o país. Os bairros onde os
imigrantes residiam em Nova York, Chicago e Boston perderam a vida. Os
restaurantes, as lojas, os supermercados frequentados por eles estão vazios.
Eles
sentem medo de sair de casa porque o ICE, a polícia migratória, está
sequestrando as pessoas nas ruas como fizeram na época da ditadura no Brasil. E
não são os criminosos, como contrariamente Trump alegou, é qualquer um. Quem
tem ponto na carteira de motorista e é imigrante virou criminoso.
Essas
pessoas sendo sequestradas e levadas para os cárceres privatizados. Elas ficam
incomunicáveis, em lugares totalmente inóspitos, sem acesso a comida e água
potável por semanas, meses; e sem acesso a advogados até serem deportadas.
O clima
é de medo total e particularmente, em Nova York, isso
tem muita força porque
é uma cidade cuja maioria dos moradores não nasceram na cidade, muitos são
imigrantes, mas vários vêm de outros estados norte-americanos. Neste sentido,
Zorah tem apoio porque ser o candidato que mais vai combater as políticas do
Trump. Ele fará todo o possível para impedir que a polícia secreta e de
imigração atuem nos prédios públicos como escolas e hospitais.
O
prefeito atual está deixando isso acontecer, é conivente com Trump e está com
uma intenção de votos muito baixa, entre 3% e 4%. Adams foi eleito pelo Partido
Democrata, mas se reelegeu como independente dada sua proximidade com o atual
presidente.
·
As pessoas costumam dizer que não há esquerda nos Estados
Unidos. O que você diria sobre isso?
Essa
pergunta eu te respondo no dia 1º de janeiro 2026, com Zohran Mamdani como
prefeito de Nova York. Aí vamos ver se tem esquerda ou não.
Mamdani
é o nosso primeiro candidato com força real de vitória, mas estamos lançando
outros nomes e disputando a prefeitura nas capitais de Minneapolis (Minnesota),
em Providence (Rhode Island) e teremos uma candidata para o governo de
Wisconsin. Nem todos têm a mesma probabilidade de vencer, mas estamos lançando
as nossas candidaturas.
A
questão eleitoral é apenas uma perna. Você não anda sem a outra perna que é o
enraizamento no movimento sindical e nos movimentos sociais e, sobretudo, o
movimento em solidariedade à Palestina, porque este é o novo dever prioritário
e um peso na consciência norte-americana. Sem o dinheiro dos
Estados Unidos, esse genocídio não estaria acontecendo.
¨
Eric Adams desiste da corrida para prefeito de Nova York
O
prefeito da cidade de Nova York, Eric Adams, anunciou no domingo que está
abandonando sua tentativa vacilante de vencer a reeleição, pouco mais de um mês
antes do dia da eleição, transmitindo a mensagem em um vídeo nas redes sociais ao som de My
Way.
Adams,
que estava atrás nas pesquisas, foi eleito como democrata , mas concorreu à reeleição como
independente após ser indiciado por acusações federais de corrupção, que
foram retiradas pelo governo Trump em troca de sua
cooperação em operações de imigração.
Em sua
declaração em vídeo, sentado nos degraus da residência do prefeito ao lado de
uma fotografia de sua falecida mãe, Adams disse que foi impossível para ele
montar uma campanha vencedora, culpando "a constante especulação da mídia
sobre meu futuro" e uma decisão do conselho financeiro de campanha da
cidade de reter milhões de dólares em fundos correspondentes devido a doações
suspeitas.
Eric
Adams fala sobre sua desistência da reeleição, em Nova York, em um vídeo
publicado nas redes sociais no domingo. Fotografia: Eric Adams/X/Reuters
Ele
também reconheceu ter perdido a confiança de alguns nova-iorquinos após ser
acusado de corrupção, mas alegou que as acusações eram injustas. "Fui
acusado injustamente porque lutei por esta cidade e, se tivesse que fazer isso
de novo, lutaria por Nova York novamente", disse Adams, sem explicar como
a suposta obtenção de contribuições
ilegais de campanha e viagens de luxo de estrangeiros para si mesmo era do
melhor interesse dos nova-iorquinos.
A
retirada de Adams reduz a disputa pela liderança da maior cidade do país para
uma disputa tripla entre a candidata democrata, Zohran
Mamdani , o ex-governador, Andrew Cuomo , e o candidato republicano, Curtis
Sliwa.
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Adams nega ter recebido oferta de emprego de Trump em troca de sua desistência
da corrida para prefeito
Eric
Adams, o prefeito de Nova York, negou ter conversado com Donald Trump sobre receber um emprego no governo em
troca de abandonar sua campanha de reeleição.
O
Politico noticiou na quarta-feira
que Adams recebeu uma oferta para um cargo no Departamento de Habitação e
Desenvolvimento Urbano dos EUA, citando uma pessoa com conhecimento direto da
oferta. O prefeito se reuniu com a equipe do presidente durante sua visita à
Flórida na segunda-feira, segundo a fonte.
O New
York Times também informou que os
assessores de Donald Trump "discutiram a possibilidade" de dar um
cargo a Adams na tentativa de frustrar as ambições políticas de Zohran Mamdani,
a socialista democrata de 33 anos que atualmente é a favorita para ser eleita
prefeita em novembro.
Segundo
o Times, "intermediários" de Trump conversaram com
"associados" de Adams sobre a possibilidade de abandonar a disputa.
Adams, que se mostrou profundamente impopular entre os eleitores democratas de
Nova York e concorre como candidato independente, está atrás de Mamdani nas
pesquisas e está minando o apoio do ex-governador de Nova York Andrew Cuomo , também candidato independente.
Há uma
sugestão de que, se Adams, um democrata centrista, e o candidato republicano,
Curtis Sliwa, desistissem da disputa, Cuomo poderia consolidar apoio suficiente
para desafiar Mamdani. O New York Times noticiou que houve conversas no governo Trump sobre também
encontrar um emprego para Sliwa, a fim de tirá-lo da disputa.
“O
prefeito Adams deixou claro que não responderá a todos os boatos que surgirem”,
disse Todd Shapiro, porta-voz de Adams, ao Guardian.
Ele não
conversou nem se encontrou com o presidente Donald Trump sobre a corrida para
prefeito. O prefeito está totalmente comprometido em vencer esta eleição, com
milhões de nova-iorquinos se preparando para votar.
“Seu
histórico é claro: a criminalidade diminuiu, os empregos aumentaram e ele tem
defendido consistentemente as famílias trabalhadoras. O prefeito Adams está
focado em consolidar esse progresso e ganhar mais quatro anos para continuar a
trabalhar em prol do povo de Nova York.”
Sliwa
disse ao Politico que não havia falado com a Casa Branca e que não gostaria de
um emprego de qualquer maneira.
“Não
fui contatado pela Casa Branca e não estou interessado em um emprego na Casa
Branca”, disse ele em um comunicado.
“Meu
foco está aqui em Nova York. Sou o único candidato de um partido importante que
pode derrotar Mamdani e estou comprometido em levar essa luta até o dia da
eleição. O povo de Nova York merece um prefeito que realmente se importe.”
Enquanto
isso, Mamdani tem se esforçado para ressaltar as associações de seus rivais com
Trump, que é profundamente impopular na cidade de Nova York.
“As
notícias de hoje confirmam: Cuomo é a escolha de Trump para prefeito. A Casa
Branca está considerando vagas para Adams e Sliwa para limpar o campo”,
escreveu ele no X. “Os nova-iorquinos estão cansados de política
corrupta e acordos secretos. Não importa quem
concorra, entregaremos um futuro melhor em 4 de novembro.”
Na
terça-feira, uma pesquisa revelou que Adams tinha 9% dos votos na eleição –
Mamdani tinha 42%, Cuomo 26% e Sliwa 17%.
Fonte:
Opera Mundi/The Guardian

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