Instituto
de Tony Blair se alia à Oracle e promove implementação de IA no Brasil
A “era
da IA” é inevitável, e por isso governos de todo o mundo devem digitalizar seus
serviços, permitir o compartilhamento de dados e fechar “parcerias” com
entidades privadas. Esse é o discurso que baseia a atuação do Tony Blair
Institute for Global Change, ou TBI, fundado pelo ex-primeiro-ministro
britânico de mesmo nome. Em agosto de 2024 o TBI iniciou um processo de
aproximação com o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGISP)
do Brasil prometendo “apoiar” o governo brasileiro na implementação do Plano
Nacional de Inteligência Artificial (PBIA), lançado em julho do ano passado
para impulsionar o desenvolvimento da tecnologia no Brasil.
Documentos
acessados pela Agência Pública revelam como a organização recém chegada no
Brasil conquistou espaço dentro do Ministério e se articulou para fechar uma
parceria com a pasta, cujos termos ainda não foram tornados públicos.
Apesar
de dizer oferecer “consultoria técnica” e conselhos de “experts
internacionais”, o instituto tem relações próximas com a Oracle, empresa de
softwares e IA. Entre 2021 e 2023, a fundação pessoal de Larry Ellison,
confundador, presidente do conselho e diretor de tecnologia da empresa e um dos
homens mais ricos do mundo, investiu 130 milhões de dólares no instituto (cerca
de 690 milhões de reais) e já prometeu investir mais 218 milhões de dólares
(mais de 1 bilhão de reais). É o que demonstra uma investigação do projeto A
Mão Invisível das Big Techs, uma coalizão de 17 organizações de jornalismo
trabalhando em 13 países, liderada pela Agência Pública e pelo Centro
Latinoamericano de Investigación Periodística (CLIP), para investigar o lobby
das Big Techs ao redor do mundo.
No
início deste ano, o Tony Blair Institute convidou a ministra Esther Dweck para
um evento no qual o bilionário Larry Ellison defendeu que os governos precisam
“unificar todos os seus dados para que possam ser consumidos e utilizados pelo
modelo de IA”. A fala ocorreu durante um debate entre Blair e Ellison no World
Governments Summit, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. A ministra não
compareceu. O email para que ela reservasse a data destacou o estabelecimento
de parcerias entre o TBI, governos e setor privado, mas não citou que o
empresário e financiador do instituto estaria por lá.
“A
Oracle e a TBI são inseparáveis”, disse um ex-consultor sênior do instituto no
Reino Unido ao Lighthouse Reports, que também é membro da aliança investigativa
transnacional A Mão Invisível das Big Techs. “Quando se trata de política
tecnológica, o papel do TBI é ir às economias em desenvolvimento e vender a
elas as tecnologias de Larry Ellison”, disse. “É difícil expressar o quão
profundamente conectadas as duas [organizações] estão”, disse outro
ex-funcionário do instituto. Hoje, Ellison é o segundo homem mais rico do mundo
— ele chegou a superar Elon Musk e ocupou o primeiro lugar no ranking por
algumas horas em 10 de setembro.
O grupo
chegou oficialmente ao Brasil no fim do primeiro semestre do ano passado. Ao
longo de pouco mais de um ano, teve ao menos 21 encontros com autoridades
públicas. O próprio Tony Blair veio ao país e esteve presente nos encontros com
membros do alto escalão, como o presidente Lula, as ministras da gestão, Esther
Dweck, e do meio ambiente, Marina Silva, além de integrantes do Ministério das
Relações Exteriores. As reuniões foram mapeadas a partir de dados da Agenda
Transparente, uma ferramenta da Fiquem Sabendo, e registros de comunicação
entre janeiro de 2023 e abril de 2025, acessados via Lei de Acesso à Informação
pela Pública.
Desde
que assumiu seu terceiro mandato, Lula já se reuniu duas vezes com Blair. Na
primeira, em setembro de 2023, os líderes debateram o papel do Brasil na
governança global e o combate à pobreza. Na segunda, que ocorreu em julho de
2024, quando o Instituto Tony Blair estava iniciando seus trabalhos no país, os
dois falaram da volta do Partido Trabalhista ao poder no Reino Unido, após 14
anos de governos conservadores. A reportagem solicitou acesso a atas, notas ou
gravações dos encontros, mas a Presidência afirmou que esses documentos não
existem.
Como
principal rosto da fundação, a ida do ex-primeiro-ministro a países onde o TBI
se instalaria também se repetiu em outros países, como no Quênia e na
Indonésia.
No
Brasil, a aproximação que mais rendeu foi com o ministério de Dweck,
responsável por 14 das 21 reuniões. Desde que chegaram ao Brasil, os
funcionários do instituto pediram encontros, convidaram a ministra para eventos
internacionais e enviaram propostas de colaboração. Em diversos momentos, o TBI
reiterou que o grupo já estava instantaneamente pronto para “apoiar” na
definição de objetivos, na “transformação” digital do Estado e no fornecimento
de “consultoria técnica sobre estratégia, política e implementação de
fundamentos tecnológicos” ligados ao PBIA ou a outros objetivos do ministério.
O
instituto manteve diálogo com diferentes secretarias do ministério ao mesmo
tempo, com foco na Secretaria de Governo Digital (SDG) e na Secretaria
Extraordinária de Transformação do Estado (SETE). Por vezes, se reunia com uma
de manhã, e com a outra pela tarde.
A
insistência gerou frutos, e a última reunião do TBI registrada na agenda dos
funcionários do ministério, em 6 de junho deste ano, indica o possível
estabelecimento de uma “parceria” entre a SETE e o grupo. O Ministério não
respondeu aos questionamentos da Pública sobre os termos da colaboração, disse
apenas que interagiu com o instituto, mas que a parceria “não foi formalizada”.
Um assessor também afirmou que não há diálogo “no momento” com o instituto em
razão de uma “mudança de foco da gestão”.
Um
porta-voz do Instituto Tony Blair também disse que “não há projeto” com o
ministério, que não fizeram “nenhuma recomendação sobre nenhum fornecedor”, e
que as posições políticas do grupo estão disponíveis publicamente, como neste
link.
Para o
diretor e fundador do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife
(IP.rec), André Fernandes, a utilização de um grupo de sociedade civil para
defender os interesses de uma empresa “burla a regra do jogo”. Ele explica que
a função da sociedade civil é defender o interesse coletivo, não o privado, e
que esses grupos podem acabar “chancelando” interesses empresariais e
caracterizando-os como “neutros”, quando não o são.
Fernandes
também destaca que há “uma série de assimetrias” no acesso ao governo federal,
que tem privilegiado empresas e organizações grandes ou do Norte Global. “É
mais fácil para eles chegarem como Instituto Tony Blair e conseguirem agendas
com todos os níveis de poder, municipal, estadual e federal, do que a gente”,
explicou. Em outros países, o apoio oferecido pelo TBI levou à aparente
promoção dos produtos da Oracle, como revelou reportagem do Lighthouse Reports
e Democracy for Sale, parte desta investigação transnacional. Em agosto de
2024, uma publicação do instituto sobre o uso de dados públicos de saúde do
Reino Unido pela IA disse que havia “boas razões” para usar um sistema
administrado pela Oracle. O grupo também disse que utilizar um sistema administrado
pela rival Palantir seria “uma opção controversa”. O TBI segue atuando para
permitir o uso dos dados do sistema público de saúde no Reino Unido. Leia a
reportagem completa.
Em
resposta à Pública, o porta-voz do instituto afirmou que o “TBI e Oracle são
duas entidades separadas. Colaboramos com a Oracle para apoiar o trabalho que
fazemos em alguns dos países mais pobres do mundo, e temos orgulho disso. (…) O
TBI não defende os interesses comerciais da Oracle, nem de nenhum fornecedor de
tecnologia.” A Oracle se recusou a comentar quando contatada pelo especial A
Mão Invisível das Big Techs. A Larry Ellison Foundation, que fez as doações ao
TBI, também não respondeu a um pedido de comentários.
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A chegada no Brasil
Fundado
pelo ex-primeiro-ministro britânico em 2016, o Instituto Tony Blair é uma
organização sem fins lucrativos que busca “ajudar governos e líderes a
transformar ideias ousadas em realidade” por meio do aconselhamento em
estratégia e construção de políticas públicas, com foco no “poder da
tecnologia”. A princípio, o instituto tinha como ideal “fazer com que a
globalização funcione” para a maioria da população mundial, e mais recentemente
o uso de tecnologias como a IA passou a integrar a missão do grupo. Tony Blair
foi primeiro-ministro do Reino Unido entre 1997 e 2007 e liderou o Partido
Trabalhista entre 1994 e 2007.
Atualmente,
a entidade emprega quase mil funcionários, atuantes em 45 países — um
crescimento grande em comparação com maio de 2024, quando divulgava ter mais de
800 funcionários.
Em maio
do ano passado, o TBI dizia que estava “nos estágios iniciais de colaboração
com o governo brasileiro, tendo se envolvido em discussões construtivas” sobre
“análise e aconselhamento em política externa” e “clima e finanças
sustentáveis”. Um dos motivos da criação do escritório brasileiro foi o
“período crucial” que o país viveria por presidir o G20, a COP 30 e o BRICS,
indicou o diretor interino Pedro Simão, que antes era diretor do TBI em
Moçambique, na África Oriental.
No
Brasil, o instituto firmou parcerias com o Centro Brasileiro de Relações
Internacionais (CEBRI), um think thank de relações internacionais, e com a
empresa Colab, que fornece tecnologias para digitalizar serviços públicos e
“conectar os cidadãos às prefeituras”. As instituições estariam “desempenhando
um papel importante no apoio ao governo no avanço da tecnologia e da
transformação digital”, disse a associada e consultora global, Alejandra
Finotto, que morou por sete meses no Brasil para “fortalecer” a versão local do
TBI. A aliança com entidades locais tem auxiliado o instituto a construir
relações e participar de eventos, como a Expo Curitiba 2025 em março, onde o
TBI promoveu um painel sobre “IA e a transformação digital a serviço dos
cidadãos” , graças ao auxílio da Colab.
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Aproximação com o Ministério da Gestão
A
relação entre o Ministério da Gestão e o Instituto Tony Blair começou longe de
Brasília – em Nova York. O primeiro contato por e-mail do TBI com o ministério
foi um convite à ministra Esther Dweck para um evento com palestrantes de “alto
nível” sobre IA e “identidade digital”, que discutiria “como os setores público
e privado podem trabalhar juntos para aproveitar as oportunidades e mitigar os
riscos dessa tecnologia”. O evento aconteceu durante a Assembleia Geral da
Organização das Nações Unidas, em 24 de setembro do ano passado. O convite
avisava que a mesa redonda seria “fechada”, “não aberta para mídia nem
público”.
Dweck
não pôde participar, mas enviou uma representante: a secretária adjunta de
Governo Digital, Luanna Roncaratti, que se tornou um dos pontos focais da
relação entre o TBI e o ministério. Além do Brasil, estiveram presentes
ministros da Serra Leoa, Ruanda, Etiópia e Nigéria, e empresários das empresas
de verificação biométrica e autenticação, iProov e Tech5, além da empresa de
tecnologia Cybernetica e da de cartão de crédito e pagamentos, Visa. O evento
ocorreu no prédio da Visa, mas foi organizado pelo TBI.
O
ministério publicou uma matéria sobre a participação da secretária. De acordo
com o texto, o evento foi centrado em “casos de sucesso e nos desafios na
utilização da identidade digital para proporcionar melhores serviços públicos
aos cidadãos”.
Convite
enviado pelo TBI ao ministério, obtido via Lei de Acesso à Informação.
Seis
dias depois, o diretor interino Pedro Simão enviou uma carta de agradecimento
em nome do TBI pela participação da secretária. Simão reforçava que “a
digitalização dos serviços públicos e o uso de IA pelos governos também são
áreas centrais para o Instituto” e disse que já estava “apoiando algumas
entidades governamentais” no Brasil, como a equipe do Embaixador André Aranha
Corrêa do Lago, que se tornou em janeiro de 2025 o presidente da COP 30.
Menos
de um mês depois, Simão mandou outro email, destinado à assessoria
internacional do ministério, com Roncaratti e outros servidores em cópia. Pediu
uma reunião no fim de outubro para dar “continuidade à interação” com a
secretária e “levar uma primeira apresentação sobre possíveis áreas de apoio do
Tony Blair Institute ao MGI”, por exemplo, na “implementação de algumas
iniciativas estruturais do MGI no terceiro eixo do Plano IA para o Bem de
Todos”, que promove o uso da inteligência artificial para a melhoria dos
serviços públicos. O plano prevê o desenvolvimento de uma nuvem soberana para
os dados públicos e a capacitação de servidores para o uso da IA.
A
reunião aconteceu virtualmente e contou com a participação de quatro
funcionários do ministério — entre eles Roncaratti e a coordenadora do Plano
Nacional de Inteligência Artificial, Thaciana Cerqueira. Do lado do TBI,
participaram Simão e outros três integrantes da versão brasileira do instituto,
além de Johan Harvard e Lindsay Strouse, da equipe inglesa. Em resposta a um
pedido de LAI da reportagem, o ministério afirmou que não produziu atas ou
registros em áudio ou vídeo do encontro.
Mas os
e-mails obtidos pela Pública mostram que o TBI saiu animado. Poucas horas após
o fim da reunião, Simão enviou mais uma mensagem: “Ficamos muito satisfeitos
com o alinhamento demonstrado durante a reunião, que abre excelentes
perspectivas para uma parceria de alto impacto”. Ele enviou a apresentação
feita na reunião e pediu feedbacks. Finalizou: “Estamos à disposição e prontos
para iniciar o apoio de imediato.”
A
reportagem solicitou acesso ao anexo do e-mail, mas o Ministério negou o pedido
por considerá-lo um “documento preparatório”, destinado “a subsidiar a tomada
de decisão quanto a uma eventual parceria futura”.
O
ministério não respondeu, e, menos de duas semanas depois, Simão cobrou. Disse
também que o TBI já estava preparando um “diagnóstico” sobre uma das questões
discutidas na reunião, como “ponto de partida” para um possível apoio. O
diretor interino adiantou também que, no final de novembro, Tony Blair
planejava vir a Brasília e gostaria de se reunir com a ministra. O consultor
sênior do TBI e ex-ministro da Índia, Rajeev Chandrasekhar, também viajaria ao
país e estaria disponível para “brainstormings estruturados, workshops internos
ou reuniões diretas com membros seniors”.
Quando
as reuniões com os representantes internacionais da organização foram marcadas,
Simão agradeceu e reforçou: “O Tony está bastante entusiasmado e com
expectativas para essa reunião e em poder apoiar a agenda da Ministra”.
Foi a
segunda vinda do ex-primeiro-ministro ao Brasil em menos de seis meses, e a
terceira desde o início do mandato de Lula.
Após as
reuniões, que ocorreram em 25 e 27 de novembro, Simão pediu mais uma reunião
“para alinharmos os novos passos”. O encontro aconteceu em janeiro de 2025,
quando a parceria começou oficialmente a ser desenhada. Depois de mais três
reuniões entre janeiro e fevereiro, o TBI mandou um rascunho de um Memorando de
Entendimento, documento que formaliza os termos de uma colaboração entre entre
duas ou mais partes, e disse que os representantes do instituto estavam
“abertos e flexíveis” para ajustá-lo.
O
e-mail indica que a parceria incluiria um investimento de “recursos” do
instituto, pois Simão afirmou que optou “por não quantificar, neste momento, os
recursos que o TBI alocará para esse escopo”. Mas disse que isso também seria
conversado. Luana encaminhou o documento para avaliação da equipe três minutos
depois. Após mais duas reuniões em fevereiro — ambos os encontros não foram
publicados nas agendas oficiais —, o Ministério retornou com uma “proposta de
minuta de normativo para institucionalização do Núcleo de IA”, que também não
foi compartilhada com a reportagem por ser um documento preparatório. Em
retorno à reportagem, a assessoria do ministério disse que as reuniões foram
feitas como corpo técnico do ministério, sem participação da alta gestão.
A
reportagem questionou o ministério sobre qual seria o objetivo e destinação do
recurso, se a quantidade foi definida, e se existem regras para o ministério
receber dinheiro de organizações privadas, mas não teve resposta.
O TBI
também promoveu um workshop voltado a servidores do ministério em 14 e 15 de
abril. O treinamento contou com a participação de oito participantes do TBI,
entre eles, Pedro Simão, e 16 do ministério — das secretarias de Governo
Digital, de Serviços Compartilhados e de Transformação do Estado. A primeira
proposta de treinamento apresentada pelo grupo, ainda em novembro, era de um
evento com cerca de 1h30 de duração, que faria um “brainstorming estruturado
acerca da Estratégia de Implementação”, impacto e ganhos rápidos do PBIA.
Entretanto, o treinamento só ocorreu em abril do ano seguinte, com duração de
dois dias.
Pedro
Simão enviou a proposta em 21 de março prometeu que levaria uma “equipe de
experts seniores em diversas áreas” que viajaria a Brasília para “realizarmos
sessões de trabalho conjuntas e avançarmos em alguns pontos críticos que vocês
destacaram na implementação do Plano IA para o Bem de Todos”.
Em
retorno ao pedido de acesso a documentos sobre o workshop, o ministério disse
que não houve produção de registros, mas adicionou que a reunião foi híbrida e
abordou “os desafios do Brasil em temáticas relacionadas à governança digital
voltadas para dados e inteligência artificial”.
Mais
tarde, ao fim do segundo dia de workshop, a agenda pública dos servidores da
Secretaria Extraordinária para a Transformação do Estado registra mais uma
reunião com o TBI, mas não indica a pauta abordada. A secretaria também se
reuniu separadamente com o instituto no dia 27 de fevereiro.
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TBI contratou funcionário para implementar IA
Enquanto
as negociações avançavam com o ministério, o instituto se adiantou e saiu em
busca de um profissional para efetuar os acordos da parceria futura. Em 10 de
março, abriu uma vaga para Gerente Sênior de IA e Transformação Digital. De
acordo com o anúncio no LinkedIn, o escolhido iria “colaborar com as partes
interessadas, incluindo o Governo do Brasil, para ajudar a desenvolver e
implementar planos, estratégias e políticas e apoiar na entrega de soluções
relacionadas ao uso de IA e aceleração de uma transformação digital mais ampla
no país, incluindo consultoria sobre tópicos como infraestrutura pública
digital”.
A
descrição cita a “orientação no desenvolvimento e implementação do Plano
Nacional de Inteligência Artificial”, como uma das principais responsabilidades
do futuro gerente e diz que o profissional deverá “trabalhar próximo de órgãos
governamentais a fim de moldar políticas e regulações para ajudar a fornecer
serviços públicos mais eficientes e em maior qualidade, promover a adoção
responsável de IA e beneficiar a população brasileira”.
O
escolhido para o cargo foi Ricardo Vilella, que tem feito carreira em empresas
de tecnologia: trabalhou como Gerente de Programas e Parcerias de Políticas
Públicas na Meta entre junho de 2020 e maio de 2024, quando seguiu para o
Google, onde foi Gerente Sênior de Extensão Cívica de agosto de 2024 até junho
de 2025, data em que iniciou seu trabalho no TBI. O Núcleo Jornalismo, que
também é membro desta investigação transnacional, mapeou que 15 grandes
plataformas de tecnologia empregam 75 profissionais para construir relações com
autoridades públicas e moldar e barrar legislações que afetem os interesses das
empresas.
Vilella
leva ao recém fundado TBI a proximidade com atores públicos com quem já tinha
contato quando trabalhava no Google. Em outubro do ano passado, por exemplo,
ele foi o responsável por oferecer um treinamento de IA para servidores da
liderança da Câmara e representou a empresa no 1º e no 2º seminários de
comunicação do Partido Liberal, em Brasília e em Fortaleza, conforme
registraram reportagens da Pública.
Além da
vaga ocupada por Vilella, o TBI já havia aberto outras cinco vagas no Brasil,
assim que chegou ao país, em junho de 2024. “Buscamos agentes de transformação
para se juntar à nossa crescente equipe no #Brasil e fazer parte da nossa
expansão pelas Américas”, disse postagem do instituto. Na época, entretanto,
não havia cargos ligados à IA, mas à discussão sobre clima e política externa.
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A era da IA?
As
apresentações feitas aos funcionários brasileiros mostram a visão entusiasta do
TBI sobre a inteligência artificial e o avanço das tecnologias digitais. Em 15
de janeiro deste ano, por exemplo, em uma reunião com a Secretaria
Extraordinária para a Transformação do Estado do Ministério de Gestão sobre a
transformação do Estado no Brasil, os representantes do instituto defenderam
que “a tecnologia torna este o momento mais emocionante – e impactante – para
governar”.
O grupo
também trata a chegada do que chamam de “era da IA” como inevitável, como
mostra um convite recebido pela ministra Dweck para um evento promovido pelo
instituto na França, sobre como governar na “era da IA”. “A IA está inaugurando
uma nova era de oportunidades e desafios para governos em todo o mundo. Como
eles devem responder?”, perguntava o convite, recebido no início deste ano.
Dweck não compareceu.
“Estamos
à beira da revolução mais transformadora desde a Revolução Industrial do século
19”, disse Blair sobre a IA, após destacar, entretanto, que não é especialista
no assunto.
“A
história mostra que, na verdade, não existe nenhuma tecnologia inevitável. Elas
são fruto de decisões tomadas. Então, assim, se existe todo esse esforço para
vender, já é uma prova de que não é inevitável, sabe?”, rebate o professor e
pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal
de Pernambuco, Paulo Faltay.
Ele
alerta que a noção da “inevitabilidade tecnológica” tem sido produzida “dentro
desses lobbies e dessas ferramentas de pressão, especialmente junto de gestores
e parlamentares, que às vezes, têm até uma boa intenção, mas são seduzidos por
esse discurso de um solucionismo tecnológico”, explica.
Ex-funcionários
do TBI ouvidos pelo Lighthouse Reports afirmaram que a abordagem “otimista em
relação à tecnologia” da organização levou a falha em reconhecer potenciais
desvantagens ou perigos das soluções tecnológicas, e dois disseram que seções
sobre riscos em relatórios começaram a ser removidas por superiores. Nas
apresentações do instituto acessadas pela Pública, não havia citação a riscos
decorrentes da possível transformação digital do Estado.
“A
lógica é reproduzir o Vale do Silício, não pensar quais são os problemas
brasileiros efetivamente”, avalia Fernandes, do IP.rec.
Por
Laura Scofield - Colaboração: Sérgio Spagnuolo, Beatriz Ramalho da Silva, da
Agencia Pública

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