terça-feira, 30 de setembro de 2025

O Renascimento da Sociedade Civil e o Silêncio que Precede a Voz

Há momentos raros na história em que a sociedade civil desperta de sua apatia e se mobiliza em torno de causas verdadeiramente civilizatórias. Esses momentos são preciosos — e, quando ocorrem, revelam o potencial transformador da consciência coletiva.

Sempre me causou temor o movimento das massas. A “besta das ruas”, como já foi chamada, costuma se mover mais facilmente pelo ódio do que pela razão. Linchamentos, discursos de barbárie e mobilizações motivadas pelo ressentimento sempre foram mais eficazes para agitar a malta do que causas nobres. Mas há exceções. E é nelas que reside a esperança.

Foi assim nas marchas contra a guerra do Vietnã, no final dos anos 1970. No Brasil, nas manifestações pelas Diretas-Já. E hoje, vemos a mobilização mundial contra o genocídio em Gaza reunir a parcela mais consciente da opinião pública ocidental. Não é apenas contra o genocídio, mas contra todas as bestas que infestaram o mundo com sua selvageria e desumanidade.

No Brasil recente, os abusos do bolsonarismo provocavam reações nos setores bem informados, mas eram recebidos com silêncio pela maioria da população. Muitos se indignavam, mas calavam-se para evitar confrontar a agressividade militante dos bolsonaristas. Esse silêncio, por sua vez, alimentava ainda mais a ousadia da ultradireita e das organizações criminosas acampadas na Câmara Federal.

Um bom laboratório para observar essa dinâmica são os grupos de WhatsApp. Em um grupo familiar que acompanho, inicialmente apenas os bolsonaristas se manifestavam. Após alguns conflitos, decidiu-se evitar discussões políticas. Então, uma pessoa criou um novo grupo, com viés progressista. Aos poucos, a maioria migrou para esse novo espaço — inclusive senhoras sem formação política, mas que se sentiam mais à vontade para expressar suas opiniões.

O fato novo das passeatas do último domingo foi a decisão da “coluna do meio” de sair do acomodamento. Esse despertar ocorreu em meio a uma série de manifestações civilizatórias e de afirmação das instituições:

  •  A ofensiva da Polícia Federal contra esquemas de lavagem de dinheiro;
  •  A postura firme do Ministro Flávio Dino contra as emendas Pix;
  •  O encerramento do julgamento da trama golpista de 8 de janeiro;
  • O desmonte da quadrilha que atuava no ICMS de São Paulo.

Ao mesmo tempo, o bolsonarismo seguia estimulando reações:

  • As ameaças de Donald Trump; 
  • As declarações absurdas de Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo.

O ápice foi a sequência de discursos de Lula em Nova York — na ONU e em fóruns paralelos — rompendo a cortina de silêncio imposta pela grande mídia. A atuação proativa da Secretaria de Comunicação, especialmente nas redes sociais, foi decisiva para amplificar essa mensagem.

O resultado foi um efeito cascata extraordinário. Aqueles que antes se calavam, supondo serem minoria, agora se veem abrigados por uma ampla rede de solidariedade.

No dia seguinte ao discurso histórico na ONU, Lula concedeu uma entrevista. Indagado sobre o avanço da ultradireita, formulou um diagnóstico que soou como autocrítica. O ponto central é que, no poder, a esquerda tende a focar na gestão e na resposta às demandas sociais, muitas vezes negligenciando a construção de narrativas capazes de mobilizar corações e mentes — espaço que a ultradireita ocupa com eficácia.

O desafio agora é manter viva essa chama de mobilização civilizatória. Porque quando a sociedade civil desperta, ela não apenas reage — ela transforma. E pode ter chegado o momento de discutir o realinhamento das instituições brasileiras, a recomposição da democracia e reorganização institucional.

Há a necessidade de uma ampla reforma do Estado brasileiro, conduzidas de dentro para fora, mobilizando os cidadãos empenhados em preparar o país para um novo futuro. O papel da Justiça, do Supremo, a subordinação das Forças Armadas ao poder civil, a revisão das leis anti-drogas, a criação de um novo direito do trabalho. Enfim, uma enorme lição de casa, só possível quando se vislumbra o renascer da cidadania.

¨      Eliana Alves Cruz: Cabelos pretos, brancos e lutas eternas

Centenas de milhares de brasileiros e brasileiras pelo país protestando contra um dos projetos mais descaradamente desonestos dos últimos tempos. Uma Proposta de Emenda à Constituição indecente, pois pretendia — entre outros absurdos —, deixar para o Congresso a decisão de abrir ou não processos criminais contra parlamentares, blindando-os. A PEC da blindagem estava pronta para ser enfiada goela abaixo de uma sociedade enojada, farta, saturada, de impunidade ao longo de sua história.

Apesar do tema espinhoso (na esteira da PEC da blindagem vinha também o exaustivo tema da anistia), foi bonito de ver. Lá estavam nossos grandes artistas. Cantoras, cantoras, atores, atrizes, escritores, enfim… gente que deu ao país trilha sonora, rosto, estilo, histórias para contar e se orgulhar. Gente que traduz com talento a alma brasileira em sua arte.

Bonita a arena pública tendo no alto Gilberto Gil, Chico Buarque, Ivan Lins, Djavan, Caetano Veloso, Paulinho da Viola e outros que chegaram à oitava década de vida, depois de brigarem muito pela democracia, sofrendo na pele toda a truculência e desejo de morte de uma ditadura real. O que dizer da incrível vitalidade de Benedita da Silva (83) e Luíza Erundina (90)?

Deveriam servir de meta de disposição e alegria de viver, mas… Apesar de tudo isso, há quem ache engraçado debochar da idade destas personagens e mais. Há quem ache que existe uma relação direta entre a cidadania que ninguém perde o direito de exercer apenas porque completou uma idade avançada e a omissão de artistas mais jovens. A cobrança pelo posicionamento destes, não exclui àqueles. Muito pelo contrário!

Num tempo em que tanto se fala em bem-estar, culto à saúde etc. e tal, passar dos oitenta conseguindo empunhar um violão por horas de pé em um show, ter a cabeça ativa e criativa para lembrar letras que nos embalaram por décadas e criar outras, contribuir com pensamentos, presenças, posturas… é uma dádiva que uma geração brilhante de artistas nacionais alcançou.

Todo mundo diz que o Brasil ama juventude. Não é verdade. Uma parcela de Brasil parece obcecada por uma falsa ideia de jovialidade eterna que é morta, cheia de ideias adoecidas, de imagens retocadas incessantemente por procedimentos e imóvel para o que realmente interessa para o bem próprio e coletivo.

A teimosia e a conveniência de políticos de uma nação do tamanho do Brasil em não saírem da irresponsabilidade característica da adolescência, têm feito um estrago significativo ao mesmo tempo que tem demonstrado um tremendo ridículo. Se Nelson Rodrigues aí estivesse poderiam ampliar seu célebre conselho “Jovens, envelheçam” para “Jovens e velhos, envelheçam”!

Quem dera todos pudessem envelhecer, completar mais tempo sobre a Terra caminhando com autonomia, exercendo por completo a cidadania e humanidade. Quem dera muitas gerações “caminhando contra o vento, sem lenço nem documento” “vendo o dia raiar sem lhe pedir licença”.

Não existe direito que esteja para sempre conquistado. Então, envelheçamos todos e todas com disposição de luta.

¨      Para Haddad, Brasil precisa de uma classe dirigente que não pense apenas em dinheiro

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, avalia que o Brasil ainda busca consolidar uma classe dirigente que não esteja subordinada aos interesses da elite socioeconômica dominante, e que possa, assim, pensar em um projeto de longo prazo que vá além da simples acumulação de bens materiais.

Haddad pondera que, de tempos em tempos, projetos políticos que buscam consolidar uma nova classe dirigente que se desvencilhe da dominação da elite econômica são alvo de movimentos autoritários e reacionários. Citou como exemplos o suicídio de Getúlio Vargas, a deposição de João Goulart e a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Durante entrevista ao podcast 3 Irmãos, no último sábado (27), Haddad afirmou que essa desejada classe dirigente – em contraponto à classe dominante – não precisa ser homogênea do ponto de vista ideológico, mas deve necessariamente pensar um projeto de País. Segundo ele, o Governo do Brasil faz parte dessa busca pela construção de uma classe dirigente.

“Nós estamos num País absurdamente desigual. Nós precisamos começar a fazer alguma coisa para o povo crescer, ascender”, disse o ministro.

Questionado sobre o que fazer diante de grupos econômicos que tentam se apropriar de conquistas sociais, ou revertê-las, Haddad comentou:

“Primeiro, falta uma classe dirigente no Brasil. Eu te digo o porquê: nos países capitalistas, você tem uma classe dominante, que é a proprietária, vamos dizer assim, dos meios de produção – das terras, das máquinas, das fábricas – mas, nos países mais civilizados, há a classe dirigente, que nem sempre está capturada pela classe dominante. Que consegue enxergar mais longe o destino do País”.

Haddad prosseguiu, destacando as dificuldades de a classe dominante brasileira aceitar o surgimento de uma classe dirigente. “Porque a classe dominante tem medo de uma classe dirigente mais autônoma dos interesses particulares de cada um. E não tem país grande no mundo sem uma classe dirigente. [Não há] Desenvolvimento pra valer, visão de longo prazo, um destino grandioso para a nação, que não tenha uma classe dirigente”, disse.

“São aquelas pessoas que não estão apenas pensando em acumular dinheiro. Estão pensando em construir um País. Por isso que existe classe política dirigente. Estão pensando no longo prazo; esse é o tesão do cara. Não estou pensando em grana, eu quero estar num projeto nacional, eu quero construir um País”, completou o ministro.

<>< Embate antigo

Em retrospectiva, Haddad destacou que esse embate se dá desde a abolição legal da escravatura e da proclamação da República. Segundo ele, foram episódios da formação do Brasil em que o Estado – que deveria ser liderado pela classe dirigente – foi capturado pelas forças proprietárias dos meios de produção. Ou melhor, foi “doado”.

“O pessoal fala que no Brasil a abolição da escravidão não teve indenização. Mas teve. O Estado brasileiro foi transferido para a classe dominante brasileira. A monarquia foi para a Europa e deixaram o Estado na mão da classe dominante”, argumentou. “E essa classe dominante jamais aceitou a formação de uma classe dirigente. O Estado foi transferido a título de indenização: ‘acabou a escravidão, mas tomem aqui o Estado brasileiro. Vocês tocam'”.

Já a proclamação da República, buscada havia mais tempo por grupos e movimentos, chegou depois da abolição e intermediada pelo Exército, mantendo o acordo de posse do Estado pela classe dominante.

Ainda segundo Haddad, toda vez que esse acordo é colocado em xeque, há uma tentativa de golpe. “A fragilidade da democracia no Brasil se deve ao fato de que toda a vez que o povo quer se apossar democraticamente do Estado, no sentido fazer valer seu destino, seu sonho, tem uma ameaça”.

¨      Gilberto Kassab e o projeto de poder do PSD. Por Rodrigo Botelho Campos

A ação política parece muitas vezes com um jogo em que cada um faz o seu “esquema tático” para alcançar seus objetivos. Este jogo tem estratégia, tática, treinador, atacantes e defensores. Se consolidou até numa “Teoria dos jogos”…

Gilberto Kassab, um jogador, anunciou publicamente há algum tempo aquilo que está acontecendo no PSD, senão vejamos: a defesa da priorização pela reeleição de Tarcísio ao governo paulista e, consequentemente, a desistência de disputar a presidência em 2026; a vontade dele, G. Kassab ser vice para disputar o governo de SP em 2030 e Tarcísio a presidência (sem Lula na cédula); a candidatura de Eduardo Paes (PSD) ao governo do RJ; e a indicação de que Ratinho Jr (PSD) é o nome para disputar a presidência em 2026, recentemente acolhido como alternativa para ser apoiado por setores do “centrão”.

A novidade é a anunciada filiação de Mateus Simões no PSD para ser candidato a governador de MG (com mais fundo partidário e tempo de TV que teria no Partido Novo). Afinal, ser forte no segundo estado em termos eleitorais é uma meta de todos os que disputam o poder eleitoral. Consentâneo com este consistente movimento é a hipótese de R. Zema ser guindado à condição de candidato a senador por MG. Eleito, pode ser o vice de Tarcísio em 2030, reeditando a política do “café com leite” em pleno século XXI.

Isto tudo, plausível, demonstra que G. Kassab é um estrategista habilidoso, pois falou publicamente quase tudo isto há pelo menos um ano. Anunciou que Lula tinha tudo para ser reeleito, transformando 2026 num momento de acumulação de forças para 2030.

Não tromba com Lula, até ajuda tacitamente, mas não terá compromisso com o PT em 2030…lança Ratinho Jr. para ser puxador de legenda e eleger governadores e parlamentares para chegar com mais musculatura daqui 5 anos pois, tudo indica, em 2026 Lula pode ser reeleito, quiçá no primeiro turno.

O PSD pode construir uma opção político-ideológica à direita, diferenciado do radicalismo bolsonarista proto-fascista, que o PSDB perdeu a oportunidade de reeditar após sucumbir à ofensiva da ultra direita após a derrota de Aécio Neves. Tudo ao centro evaporou na evidenciação da polarização planetária direita X esquerda no contexto da nova guerra fria também no Brasil.

O PSD poderá ser a partir de 2030 o grande adversário do PT. Pode ser um “revival” da polarização PT X PSDB que durou décadas. Aliás, certa época se cogitou a fusão PT/PSDB mas o deputado federal Jutahy Magalhães fez um comentário sutil: “o PT e o PSDB não devem se fundir, pois surgirão opções à esquerda e à direita”.

A derrota do bolsonarismo em 2022; o impedimento do golpe de Estado em 2023; o julgamento e o sentenciamento de JB, ex presidente, e oficiais generais, nunca antes acontecido no Brasil; desdobramentos da retomada da política em sentido amplo com a hábil composição carregada de simbolismo da chapa de Lula com Alckmin, pode ter nesta nova quadra da história que se avizinha uma polarização dentro do campo democrático, isolando a ultra direita. Fascistas, não passarão!

O povo brasileiro poderá dar a Lula o quarto mandato no primeiro turno como um presente pela sua luta histórica. Assim, eleito, terá oportunidade de ajudar o PT a preparar o futuro, pois o maior adversário já está se organizando!

Vamos adiante, lutando!

 

Fonte: Jornal GGN/Viomundo/O Cafezinho

 

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