Quem
é o juiz da decisão relâmpago, em 16 minutos, contra aposentados
O juiz
Glauco Coutinho Marques, que atuava na comarca de Gurinhém (PB), a cerca de 70
km de João Pessoa, é um dos alvos da investigação que deu origem à operação
Retomada, que apura descontos indevidos de aposentados.
O juiz
é citado em documento da operação como “figura central” dos fatos investigados
e contra quem recaem “as suspeitas de manipulação de atos de jurisdição”. A
defesa nega qualquer ilícito.
Na
época, ele atuava na comarca de Gurinhém, mas foi afastado cautelarmente no
final de 2024.
Documento
da operação obtido pela coluna mostra como um grupo de empresários, entidades,
advogados e servidores atuava junto ao Judiciário para conseguir decisões
favoráveis contra os interesses de aposentados.
A
investigação já identificou 11 associações e entidades que moveram 230 ações
coletivas na Paraíba. No total, cerca de 100 mil aposentados e pensionistas em
todo país foram atingidos e os descontos ilegais somam R$ 126 milhões.
Como
mostrou a coluna, Glauco foi responsável por uma decisão relâmpago que, por sua
rapidez, chamou a atenção dos investigadores. No caso, ele levou apenas 16
minutos para decidir em um processo.
“Em
alguns casos, aliás, tamanha foi a velocidade no curso do processo que, entre o
protocolo inicial e o julgamento, passaram-se apenas poucos minutos, como
ocorreu com o processo em que a petição inicial foi aviada às 11h10 do dia 08
de junho de 2024 (um sábado) e a sentença foi prolatada às 11h26 do mesmo dia”,
diz um dos documentos da apuração.
Segundo
a investigação, o grupo se valia da prática chamada de “fórum shopping”, quando
há uma escolha estratégica de um juiz ou Vara para julgar com o objetivo de
obter uma decisão favorável. No caso da Paraíba, o grupo utilizava a Vara na
cidade de Gurinhém e outras cidades.
Segundo
as apurações, a articulação junto a Glauco ficava a cargo de Hilton Neto, que
teria uma relação “estreitíssima” com o juiz. Ele é apontado como principal
articulador do esquema.
“Cabe a
ele, para muito além do exercício do mister advocatício, intermediar a
manipulação das decisões judiciais. Embora ele não figure diretamente como
patrono nas inúmeras de ações judiciais distribuídas ilegalmente no foro de
Gurinhém pelo grupo criminoso, serve como canal de contato do juiz com os
outros advogados envolvidos, em troca de vantagens financeiras, utilizando-se,
por vezes, de interpostas pessoas para fazê-lo”, diz trecho da decisão que
autorizou a 2ª fase da operação Retomada.
Segundo
o documento, Hilton também teria pago uma dívida de R$ 14 mil do juiz para
“quitar débito contraído pelo magistrado” com um servidor.
O ato,
contudo, aponta a investigação, não foi um fato isolado. Outros servidores do
foro de Gurinhém foram ouvidos pelo Ministério Público no curso das apurações e
um deles chegou a afirmar que entregou um cartão de crédito pessoal ao juiz
Glauco.
O
cartão, diz a decisão, foi encontrado no imóvel do juiz durante o cumprimento
de um mandado de busca e apreensão.
• Operação Retomada
A
operação Retomada, conduzida pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime
Organizado (Gaeco) do Ministério Público da Paraíba, em parceria com a
Controladoria-Geral da União (CGU), apura um suposto esquema que envolveria,
além do juiz, advogados, servidores públicos e associações fraudulentas que
faziam descontos indevidos de aposentados e pensionistas.
De
acordo com a CGU, decisões judiciais manipuladas na comarca de Gurinhém, na
Paraíba, promoviam diversas modalidades de irregularidades.
Uma
delas era a “suspensão dos descontos referentes a empréstimos consignados já
efetivados em contracheques de servidores, aposentados e pensionistas”. Dessa
forma, era liberada a margem para novos empréstimos consignados feitos por meio
das associações fictícias.
O grupo
também usava as decisões judiciais para excluir o registro negativo nos
cadastros de proteção ao crédito como o Serasa, liberando a obtenção de mais
empréstimos.
O Gaeco
e a CGU também descobriram ações na Justiça contra programas de fidelidade de
companhias aéreas. Com base nas decisões manipuladas, o grupo reativava
créditos expirados ou modificava o contrato com as empresas para gerar
benefícios aos seus integrantes.
Segundo
a investigação, os supostos envolvidos fraudavam o registro de sócios em
associações de fachada para ajuizar ações coletivas em Varas específicas que
davam decisões favoráveis ao grupo.
“Em
aprofundamento das diligências, identificou-se a prática sistemática de fraudes
envolvendo empréstimos ofertados a idosos, por meio de associações fictícias
que, sob o disfarce de contribuições associativas, operavam como instituições
financeiras informais, à margem da regulação do Banco Central e das normas de
proteção ao consumidor”, diz o Gaeco.
As
entidades envolvidas são controlados por advogados ligados ao grupo investigado
que , segundo o Gaeco, “aliciavam aposentados e pensionistas, especialmente os
mais vulneráveis, induzindo-os à assinatura de termos de adesão que, na
prática, encobriam contratos de mútuo com juros abusivos, disfarçados de
mensalidades para serviços inexistentes”.
Com
base nas assinaturas, eram propostas ações em comarcas sob influência da
organização criminosa investigada.
• Defesa
A
defesa do juiz Glauco Marques, representada pelo advogado Inácio Queiroz,
afirmou que o juiz sempre esteve disponível para contribuir com a justiça e
nega todas as imputações feitas na representação do Ministério Público, que
resultaram no afastamento do cargo de juiz.
O
advogado também cita que o processo está sob sigilo, mas destaca que “não há
uma única prova ou ao menos indícios que determinem qualquer ligação ou mesmo
afetividade e amizade entre Glauco e os advogados das referidas associações”.
“O que
se tem, na verdade, é um juíz que em sua judicatura, homologou acordos entre a
associação citada e seus próprios associados, e deferiu liminares que por vezes
não foram sequer revogadas pelo Egrégio Tribunal de Justiça da Paraíba”,
afirma.
De
acordo com o advogado, após o cumprimento de “dezenas de cautelares, inclusive,
buscas e apreensões, não se olvidou qualquer transação bancária efetivada em
favor do juiz, ou mesmo conversas entre os envolvidos”.
A
defesa diz ainda que, apesar das centenas possíveis ações identificadas pela
investigação, pouco “mais de uma dezena destes processos” ficaram sob
responsabilidade do juiz.
• AGU investiga uso de criptomoedas em
fraudes bilionárias no INSS
O
ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, afirmou na
terça-feira (20) que organizações criminosas investigadas por fraudes no
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) utilizaram criptomoedas para ocultar
recursos desviados de aposentadorias e pensões.
Em
entrevista ao programa “Bom Dia, Ministro”, Messias explicou que há indícios do
uso de criptoativos para mascarar o patrimônio obtido ilegalmente pelas
entidades envolvidas. A AGU solicitou ao Judiciário o rastreio de operações
financeiras a partir de corretoras especializadas.
“No
pedido de bloqueio que nós fizemos na semana retrasada nós solicitamos ao juízo
que seja feito um rastreio a partir de corretoras de criptomoedas para entender
por onde esse recurso passou caso tenha sido utilizado”, declarou.
As
apurações fazem parte da ofensiva do governo contra fraudes em descontos
associativos realizados diretamente na folha de pagamento de beneficiários do
INSS. Segundo a AGU, os desvios podem ter alcançado R$ 2,8 bilhões. Outras
estimativas apontam
Até o
momento, 12 entidades, seis empresas e oito pessoas físicas tiveram bens
bloqueados por suspeita de envolvimento no esquema.
Além de
ocultar valores por meio de criptoativos, os investigados são suspeitos de
intermediar pagamentos de propina a servidores do INSS e pessoas ligadas ao
órgão. As propinas teriam chegado a R$ 23,8 milhões.
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Como
medida de prevenção, o governo também avalia o fim da autorização legal para
que associações e sindicatos realizem descontos diretos em benefícios
previdenciários. A possibilidade está em análise pela equipe técnica, mas ainda
não há decisão final.
Segundo
Messias, as entidades podem utilizar meios alternativos de cobrança, como
transferências bancárias e Pix. Até o momento, mais de 1,7 milhão de
beneficiários já pediram reembolso por valores descontados sem autorização.
Fonte:
Metrópoles/Infomoney

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