Legado de Temer: Reforma trabalhista aumentou
informalidade ao enfraquecer sindicatos, diz estudo inédito
A reforma trabalhista de 2017, aprovada
durante o governo de Michel Temer (MDB), foi feita com a promessa de aumentar a
abertura de vagas formais no Brasil, ao permitir modalidades de trabalho mais
flexíveis, diminuir as disputas na Justiça por questões laborais e reduzir o
papel dos sindicatos nas negociações trabalhistas.
Mas um estudo inédito realizado por uma
pesquisadora de doutorado da Duke University (EUA) revelou que, apesar de os
salários do setor formal terem diminuído 0,9% nos anos seguintes à reforma, a
contratação formal também encolheu 2,5%.
Para chegar a esses resultados, a
pesquisadora usou dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais, uma
espécie de censo anual do mercado de trabalho formal no Brasil) e da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), de 2012 a 2021.
A partir desses dados, a economista construiu
um modelo computacional que compara o que aconteceu de fato depois da reforma
trabalhista com o que teria acontecido se a política não tivesse sido
implementada — o que é chamado nos estudos econômicos de contrafactual.
O cálculo é feito dessa forma porque não
basta olhar para os dados do mercado de trabalho antes e depois da reforma para
entender como ela afetou o país, já que muitas outras coisas aconteceram ao
mesmo tempo.
O uso desta metodologia contrafactual permite
isolar o efeito da reforma — ou de pontos específicos dela —, mantendo todas as
demais condições sem alteração.
"O que é surpreendente nesses resultados
é que os trabalhadores formais ficaram mais baratos, seus salários caíram, mas
o emprego formal também diminuiu", observa Nikita Kohli, autora do estudo
publicado em uma versão preliminar pelo blog Development Impact do Banco
Mundial.
Instigada por esse quebra-cabeça, a
pesquisadora indiana — com estudos já realizados sobre os mercados de trabalho
de Paquistão, Quênia, Brasil e Índia — decidiu olhar então para o que aconteceu
com os trabalhadores informais nas empresas brasileiras. Ela encontrou um
aumento de 6,7% na contratação informal no período posterior à reforma.
No Brasil, são considerados informais os
empregados sem carteira de trabalho assinada, trabalhadores por conta própria e
empregadores sem Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ). Quem trabalha
como Microempreendedor individual (MEI), por exemplo, fica fora dessa conta,
pois tem um CNPJ.
Ao fim de 2017, ano da aprovação da reforma
trabalhista, a parcela de informais entre os ocupados no Brasil era de 40,2%,
somando 37,1 milhões. Ou seja, esse grupo não tinha garantidos direitos
previstos pela lei trabalhista brasileira (CLT), como férias remuneradas,
controle de jornada, décimo terceiro salário ou recolhimento de FGTS.
A título de comparação, nos países
desenvolvidos, a média de informalidade era 18% à epoca, segundo dados da
Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Kohli constatou esse aumento da informalidade
no Brasil num contexto em que os sindicatos perderam 97% de sua fonte de
receita, devido ao fim da contribuição sindical obrigatória, também parte da
reforma trabalhista.
Através de sua metodologia, ela pôde analisar
especificamente o efeito dessa perda de financiamento dos sindicatos sobre o
mercado de trabalho brasileiro.
Kohli diz que seu interesse em estudar o
Brasil, além da qualidade dos dados públicos disponíveis, veio justamente da
força dos sindicatos locais e da legislação trabalhista do país, que resultam
em um sistema robusto de proteção aos trabalhadores, mas também que eleva
custos de contratação para os empregadores.
"Minha hipótese é que as empresas podem
estar pensando: 'Ok, os sindicatos desapareceram. Estes trabalhadores formais
tornaram-se mais baratos, mas agora também é menos provável que sejamos
inspecionados'", diz Kohli, em entrevista à BBC News Brasil.
• Menos
poder sindical, mais informalidade
Pelas regras brasileiras, cada categoria de
trabalhadores ou empresas tem um único sindicato que representa seus interesses
em uma determinada região, geralmente um município. Tradicionalmente, os níveis
de atuação e relevância desses sindicatos variam.
Para entender melhor o possível papel do
enfraquecimento dos sindicatos após a reforma trabalhista, Kohli dividiu sua
análise em regiões e identificou aquelas com sindicatos com atuação mais ou
menos fortes antes da lei.
Para isso, ela observou o percentual de
trabalhadores de cada região empregados em firmas que assinaram um acordo
coletivo de trabalho — documento firmado entre sindicatos e empresas para
regular direitos e condições de trabalho.
Quanto mais trabalhadores estavam sob esse
tipo de acordo coletivo, mais forte eram os sindicatos que haviam conseguido
essa negociação.
De posse desses dados, a pesquisadora avaliou
a distância das regiões analisadas com relação aos escritórios de fiscalização
do Ministério do Trabalho, localizados nas capitais e em alguns municípios — as
Superintendências e Gerências Regionais do Trabalho, no passado chamadas de
delegacias e subdelegacias.
Esses órgãos são responsáveis por garantir o
cumprimento das leis trabalhistas e proteger os direitos dos trabalhadores nas
suas respectivas regiões.
A distância importa, explica Kohli, porque os
fiscais do Trabalho se deslocam dos escritórios até as empresas para realizar
auditorias.
Isso significa que a intensidade das
inspeções é influenciada por essa distância — regiões próximas aos escritórios
tendem a ser mais inspecionadas.
Com todos esses aspectos em mãos, a
economista comparou as regiões com sindicatos mais e menos fortes, antes e
depois da aprovação da reforma.
"A ideia é que, se a política não
tivesse sido implementada, esses mercados de trabalho apresentariam tendências
semelhantes", explica a economista.
"Mas, com a implementação da reforma, os
mercados de trabalho com sindicatos fortes antes da reforma são mais afetados
[pelo aumento da informalidade nas empresas] do que aqueles com sindicatos
fracos, porque estes realmente já não tinham sindicatos [atuantes] lá para
começar."
A hipótese de Kohli é que isso acontece
porque, antes da reforma, os sindicatos fortes ajudavam a orientar a atuação
dos fiscais do Ministério do Trabalho, fazendo sugestões de onde as auditorias
deveriam ser realizadas, particularmente nas regiões mais distantes das
Superintendências e Gerências Regionais.
Mas, com a queda abrupta de receita após a
reforma trabalhista provocada pelo fim da contribuição sindical obrigatória, as
entidades tiveram de reduzir seus quadros de funcionários e fechar escritórios,
o que pode ter diminuído sua capacidade de influenciar no processo de
fiscalização.
A economista diz que uma evidência que
corrobora essa hipótese é que o número de inspeções trabalhistas não diminuiu
após a reforma, mas houve uma mudança na sua distribuição geográfica.
"A quantidade de inspeções é a mesma ao
longo do tempo", diz Kohli.
"O surpreendente é que as inspeções
aumentam em áreas mais próximas dos fiscais, e diminuem em regiões mais
distantes", destaca a pesquisadora.
"E, de fato, eu encontro que a queda do
emprego formal e o aumento do informal vêm dessas áreas mais expostas, dos
lugares onde as inspeções diminuíram. Isso ajuda a fortalecer meu
argumento."
• 'Reforma
tirou o oxigênio do movimento sindical'
Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos
Comerciários de São Paulo, conta que, na entidade que ele preside, o número de
funcionários chegou a ser de mais de 600 antes da reforma trabalhista. Esse
número caiu à metade disso nos anos seguintes à reforma, com a perda de
receita.
À época da reforma, uma pesquisa Datafolha
mostrou que o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical dividia opiniões,
com 46% contra o fim da obrigatoriedade, 44% a favor, 2% indiferentes e 8% sem
opinião sobre o tema.
"A reforma de 2017, além de desfigurar a
CLT, tirou de forma abrupta o oxigênio advindo da contribuição sindical do
movimento sindical em geral e dos comerciários de uma forma especial", diz
Patah, que também é presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT).
"Isso nos diminuiu, momentaneamente, a
capacidade de fazer frente às demandas dos trabalhadores. Perdemos associados,
deixamos de fazer uma certa prestação de serviços", lembra o sindicalista,
confirmando o que a pesquisadora da Duke University aponta em seu estudo.
Segundo o sindicalista, no setor de comércio
a informalidade é uma questão muito relevante e os sindicatos têm papel ativo
em denunciar casos de contratação informal, e outras violações das leis
trabalhistas, junto à Justiça do Trabalho e ao Ministério Público do Trabalho.
Na outra ponta, a Federação do Comércio de
Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomércioSP) rebate alguns
dos argumentos do sindicalista e celebra a reforma.
A federação que representa os empresários do
setor considera que as novas regras trabalhistas não reduziram os custos de
contratação, mas foram um avanço, por preservar um conjunto de direitos da CLT,
mas permitir negociar alguns deles, como jornada de trabalho e bancos de horas,
desde que com a participação dos sindicatos.
As empresas reclamam, porém, que muitas
regras aprovadas pela nova lei trabalhista continuam sendo questionadas na
Justiça, gerando insegurança e custos.
José Pastore, sociólogo e presidente o
Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP, também costuma
argumentar que a reforma não vetou a contribuição sindical, mas só a tornou
voluntária, um avanço considerado necessário num país onde o trabalhador não
pode escolher entre vários representantes sindicais nem fundar seu próprio
sindicato, se quiser.
Patah afirma que o baque da reforma
trabalhista foi temporário. Segundo ele, com o passar dos anos, as entidades
sindicais têm conseguido se recuperar em parte daquele impacto inicial,
buscando novas fontes de receita e estimulando a filiação voluntária de
trabalhadores para compensar o fim da taxa obrigatória.
Com isso, o Sindicato dos Comerciários de São
Paulo, por exemplo, conta atualmente com 470 funcionários, segundo o
sindicalista, tendo reconstituído parte de seu quadro e da capacidade de
atuação perdida logo após a reforma.
O percentual de sindicalizados no Brasil, no
entanto, segue em queda, ano após ano. Segundo dados do IBGE, a taxa de
sindicalização entre os trabalhadores ocupados no país caiu de 16,1% em 2012,
para 8,4% em 2023, com 8,4 milhões de sindicalizados naquele ano — menor
patamar da série histórica iniciada em 2012.
• 'Informalidade
está aumentando em todo o mundo'
Nikita Kohli, da Duke University, destaca a
importância de se entender melhor o papel dos sindicatos num mercado de
trabalho como o brasileiro, onde a informalidade é elevada — uma característica
dos países em desenvolvimento.
Isso porque a maioria dos estudos feitos
sobre o papel dos sindicatos refletem a realidade de países desenvolvidos, onde
a informalidade é baixa.
"A informalidade está aumentando em todo
o mundo", observa Kohli.
"Há o trabalho por plataforma, que é um
tipo de informalidade, e trabalhadores sem documentação e migrantes atuando em
diferentes contextos. Então entender como os sindicatos interagem com a
informalidade é algo extremamente importante", considera a pesquisadora.
Danilo Souza, professor da Faculdade de
Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo
(FEA-USP) e também coautor de estudo sobre os efeitos da reforma trabalhista,
avalia que o estudo de Kohli é bastante interessante e utiliza métodos de
análise econômica de fronteira.
Ele pondera, porém, que as mudanças trazidas
pela reforma foram muito além da queda da contribuição sindical. E que as
regiões mais ou menos sindicalizadas podem ter sido afetadas por outros pontos
da reforma, como a redução da judicialização e as novas formas de contratação,
como o trabalho intermitente, remoto e em tempo parcial.
"É verdade, muitas coisas aconteceram na
economia", diz Kohli, respondendo à ponderação do professor da USP.
"Mas cada uma dessas mudanças trazidas
pela reforma deveria ter facilitado a contratação formal — não esperaríamos que
levassem à redução da formalidade que eu observo. Comparo regiões mais e menos
sindicalizadas — ambas são afetadas por todos os pontos da reforma, mas o que
eu capturo é como elas responderam especificamente à perda de
sindicalização", diz a pesquisadora.
Daniel Duque, pesquisador do Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), destaca que o
artigo de Kohli traz uma contribuição importante, ao mostrar evidências sobre o
papel das inspeções no mercado de trabalho.
Ele pondera, porém, que falta ao estudo uma
discussão sobre os efeitos globais da reforma — o que em economia é chamado de
equilíbrio geral.
"Pode ser que a reforma tenha reduzido a
contratação formal de mercados muito sindicalizados, mas isso significa que o
efeito global foi de redução do emprego formal?", questiona o economista.
A pesquisadora afirma que, de fato, seu
artigo não consegue tratar do equilíbrio geral, pois isso exigiria um modelo de
análise e dados diferentes.
Por fim, Kohli reforça a importância e o
caráter surpreendente de seus resultados.
"A reforma foi desenhada justamente para
enfraquecer o papel dos sindicatos no processo de contratação formal",
observa a pesquisadora.
"A ideia era que os sindicatos
representavam uma rigidez nesse mercado de trabalho. Então, imaginaríamos que,
se os trabalhadores formais ficassem mais baratos e os sindicatos fossem
enfraquecidos ou deixassem de atuar com tanta força, o empregador formal
pensaria: 'agora posso contratar mais trabalhadores formais'", diz ela.
"O fato de que trabalhadores informais
também se tornaram mais fáceis de contratar não era algo que se previa. Então
isso me surpreendeu, porque esse é um efeito muito indireto [do enfraquecimento
dos sindicatos pela reforma], porque trabalhadores informais não são
sindicalizados — então é importante entendê-lo."
¨
Trabalho: um mundo
invisível. Por Luis Felipe Miguel
Um dos
motivos da baixa qualidade do debate público no Brasil é a quase absoluta
invisibilização da experiência vivida da classe trabalhadora.
Ela é a
maioria esmagadora da população. Mas quase não está nos jornais, na TV, nos
canais de sucesso do Youtube.
Não
está na literatura, como mostraram as pesquisas de Regina Dalcastagnè sobre
as personagens do romance contemporâneo.
Para
onde quer que olhemos, só vemos ricos ou a classe média com profissões de nível
superior.
A
experiência dos trabalhadores se mostra invisível para eles mesmos.
No
entanto, os confortos de que desfrutamos cotidianamente, sem sequer nos darmos
conta, só existem graças a seu trabalho.
O
trabalhador acorda talvez às cinco da manhã, todos os dias, para pegar dois,
quem sabe três transportes lotados e precários e chegar na hora em seu emprego.
Se for mulher, deve arrumar os filhos para irem à escola e ainda corre o risco
de ser importunada sexualmente no trajeto.
No
trabalho, o dia a dia é feito de ritmo exaustivo, ausência de autonomia e
autoritarismo de gerentes e capatazes. O trabalhador é tratado como incapaz
intelectual, mas também, contraditoriamente, como um ladino perigoso que
precisa ser vigiado de perto. A trabalhadora, uma vez mais, recebe uma cota
extra, estando muitas vezes submetida ao assédio dos chefes e patrões, um
assédio que as campanhas voltadas a celebridades da mídia deixam, quando muito,
num distantíssimo segundo plano.
O
trabalho é, para o trabalhador, um tempo de não-vida. Tudo o que ele deseja é
que a jornada passe rápido, a fim de recuperar o controle sobre si mesmo. Mas
ele deseja também que o seu tempo livre passe rápido, para logo chegar o outro
contracheque, já que o pagamento é escasso para fazer frente aos 30 dias do
mês.
O tempo
do trabalhador é, assim, duplamente furtado.
Ao
chegar em casa já de noite, esgotado pelo dia de trabalho, ele vai talvez se
narcotizar diante da novela, em busca de algo que o faça escapar da sua vida,
cansado demais para qualquer outra atividade. À trabalhadora, subjugada pela
organização convencional da vida doméstica, antes disso cabe ainda arrumar a
casa, preparar a comida para os filhos e, caso tenha, para o companheiro.
Talvez
eles frequentem também a igreja, em alguma noite ou final de semana, em busca
de espetáculo e de esperança. Se tiverem sorte, não serão esfolados pelo
sacerdote. No domingo, tem futebol e programa de auditório na TV, cerveja com
os amigos, reunião de família – e roupa para lavar e faxina da casa.
Quando
o filho fica doente, o trabalhador – em geral a trabalhadora – enfrenta
primeiro a fila do posto de saúde, depois a cara feia do patrão ao apresentar o
atestado. O medicamento a ser comprado quebra o orçamento já apertado do mês.
Se o
trabalhador estiver sem emprego, como é o caso de muitos e cada vez mais,
tentarão fazer com ele se veja como “empreendedor”, mas o que ele vai fazer é
se virar. A incerteza sobre o amanhã, que é estruturante na vida de qualquer
trabalhador, que não tem patrimônio nem rede de proteção e portanto tem sua
subsistência dependente da renda que gera naquele momento, fica ainda mais
urgente.
Vão
dizer que não ter carteira assinada é um progresso, que ele é um
“empreendedor”, que está mais próximo de Lemann e de Elon Musk do que do peão
da fábrica, do balconista da loja, do operador de telemarketing. Mesmo
submetido aos ditames opressivos dos aplicativos, como é cada vez mais comum,
deverá ver a si mesmo como um “autônomo”. Mas, sendo camelô ou entregador do
iFood, é apenas uma peça nas engrenagens do capital: “autônomo” sem autonomia,
que simplesmente assume boa parte dos riscos que antes ficariam na conta dos
empregadores e que, diante da primeira adversidade, estarão ao deus-dará.
Sendo
pobre, o trabalhador é visto com desconfiança pelas “forças da lei” – ainda
mais sendo negro, como a maioria é. Será parado pela polícia, será humilhado.
Os direitos que valem para a classe média com frequência não existem para ele.
Se tiver azar, levará um tiro. Ou vários. Ainda mais sendo negro, como a
maioria é.
Não é
que a vida do trabalhador se limite a isso. Ele ama, ele brinca, ele sonha, ele
pensa. Mas tudo isso ele faz remando contra a rotina opressiva que a exploração
lhe impõe. Ele faz nos interstícios de sua vida produtiva, que não é sua, não é
vida e tampouco produz para ele.
Quando
tem sorte, este trabalhador ou trabalhadora pode almejar o momento em que ao
menos parte dessa rotina se interrompe: a aposentadoria. O valor vai ser
pequeno e talvez ele tenha que fazer uns bicos para complementá-la, mas ele
terá uma renda segura e muito mais controle sobre seu próprio tempo.
Ele
desfrutará de um naco daquela liberdade que vai se tornando tão abundante
conforme subimos na pirâmide social: ser dono, ao menos um pouco, do próprio
nariz.
Poderá
talvez jogar baralho, talvez jogar bola, talvez cultivar um jardim, talvez
pintar ou escrever poemas, talvez montar uma oficina caseira de marcenaria ou
confeitaria, brincar com os netos, quem sabe fazer uma ou outra viagem. Se
tiver alguma renda e enquanto tiver saúde.
Depois,
quando os problemas da velhice se pronunciarem mais, sofrerá os últimos anos
com a falta de apoio do Estado brasileiro e a absoluta incompatibilidade de sua
pensão com as necessidades de um idoso.
O
trabalhador sonha com isso: com esses anos depois da aposentadoria e antes da
decrepitude, em que, se tiver sorte, vai poder desfrutar um pouco de sua
própria vida.
Mas
isso está cada vez mais distante. Sucessivos governos neoliberais, aqui no
Brasil como em outros lugares, uns com “face humana”, outros nem isso,
afastaram cada vez mais o trabalhador de sua ansiada alforria. Para a multidão
de precarizados, esta ilusão nem existe mais.
É que o
trabalhador, como ser humano, não pode existir: ele não passa de um veículo
para a valorização do capital. Enquanto tiver forças, trabalho. Quando não
tiver mais, é descartado.
O
discurso econômico dominante trata de trilhões e abstrações. Isso ocorre porque
a vida da classe trabalhadora – no chão da fábrica, na construção civil, na
faxina, na escola primária, no telemarketing – é mantida fora da consciência
coletiva.
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Fonte: BBC News Brasil

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