quarta-feira, 7 de maio de 2025

João Filho: Moro e Dallagnol usam prisão de Collor para tentar apagar absurdos da Lava Jato

A prisão de Fernando Collor de Mello, após condenação a oito anos e 10 meses de cadeia, ressuscitou a Lava Jato no noticiário e deixou os viúvos da operação ouriçados. Está sendo usada para resgatar a operação da cova moral em que ela foi enterrada.

Sergio Moro e Deltan Dallagnol levantaram da tumba em que foram enterrados para dizer algo como: “Olha aí! Falem mal da Lava Jato agora!”. Jornalistas que atuaram como linha auxiliar das barbaridades comandadas pela operação estufaram o peito para cobrar coerência e dizer que aqueles que criticaram a Lava Jato no passado não podem aplaudir agora.

Não, não foi a Lava Jato que prendeu Collor. Sejamos honestos. Reacender esse falso debate a esta altura do campeonato é desonestidade. Entende-se por Lava Jato a força-tarefa chefiada pelo então procurador da República, Deltan Dallagnol, e julgada na 13ª Vara de Curitiba, comandada pelo então juiz Sergio Moro.

Entende-se também por Lava Jato um modus operandi específico, baseado fundamentalmente em delações premiadas sem critério, e um espírito justiceiro que lança mão de ilegalidades para atingir objetivos políticos.

A série de reportagens da Vaza Jato, publicada pelo Intercept Brasil, provou a existência de um conluio entre juiz e o Ministério Público Federal para perseguir Lula, que mais tarde teria todas suas condenações anuladas pelo Supremo Tribunal Federal, o STF. É isso o que está no imaginário da população quando se fala em Lava Jato.

Quando falamos em lavajatismo, estamos falando de um conluio que corroeu o judiciário para alcançar objetivos políticos. Estamos falando de Moro, Dallagnol e outras figuras célebres que entraram para a política partidária pelos braços do bolsonarismo. Portanto, há que se forçar muito a barra — para dizer o mínimo — para informar que a prisão de Collor é fruto dessa mesma força-tarefa.

O caso não passou por Curitiba, não passou pelas mãos de Dallagnol e nunca foi julgado por Moro. O caminho jurídico tomado foi completamente diferente dos casos que foram carimbados pela marca da força-tarefa.

O único fiapo de ligação com a Lava Jato está na origem. No curso da investigação de Alberto Youssef — o doleiro que Moro perdoou duas vezes —, a Polícia Federal encontrou comprovantes de depósitos em favor de Collor durante uma busca e apreensão da Lava Jato.

Como Collor era senador e tinha foro privilegiado, Moro foi obrigado a mandar o caso para Brasília – importante registrar: à época, Collor era um apoiador dos governos do PT, hoje é um bolsonarista como Moro. A partir daí, absolutamente nada mais tem a ver com a Lava Jato.

A investigação foi inteiramente conduzida pela Procuradoria Geral da República, a PGR, e o caso tramitou de cabo a rabo no STF. Não houve qualquer interferência dos justiceiros de Curitiba. O modus operandi é justamente o inverso do da Lava Jato: o caso não está ancorado apenas em delações premiadas, mas principalmente em provas concretas de lavagem de dinheiro. Há mais provas do que convicções na condenação do alagoano.

Atribuir, portanto, a prisão de Collor à Lava Jato é desonesto e serve a um único propósito: reescrever a história para tentar recuperar reputações manchadas pós-Vaza Jato — incluindo a de jornalistas que fechavam os olhos para as arbitrariedades e tratavam a operação como exemplo de combate à corrupção.

No dia da prisão de Collor, programas da CNN e da GloboNews não se acanharam em dar os louros para a marca Lava Jato. Impressiona como ainda existem jornalistas que se fazem de loucos e fingem que os fatos revelados pelas Vaza Jato jamais existiram.

Na CNN, houve jornalista que demonstrou estranheza: “fica a impressão que o caso virou bode expiatório da Lava Jato, porque todo mundo se salvou na Lava Jato num movimento capitaneado pelo STF, mas é o Collor que vai acabar indo para a prisão”.

Coube a um advogado criminalista convidado para comentar o caso corrigi-lo e apontar algumas obviedades ignoradas pelo jornalista: não é verdade que “todo mundo se salvou” e apenas Collor foi preso. Há vários condenados pela operação que estão cumprindo ou já cumpriram pena.

As ações penais contra Lula foram anuladas porque comprovou-se a parcialidade de Sergio Moro e outras irregularidades. O que o jornalista chamou maliciosamente de “movimento capitaneado pelo STF” nada mais foi do que o estrito cumprimento da lei.

Fica parecendo que o Supremo atrapalhou o trabalho de combate à corrupção dos bravos justiceiros da Lava Jato e só está prendendo Collor agora para não dizer que não falou das flores. O fato é que não há nada que indique a existência de um conluio jurídico contra Collor, nem um mísero indício que nos leve a uma suspeita.

Não é razoável que algo tão claro e evidente cause estranheza a jornalistas experientes. Difícil acreditar que essa mistura de alhos com bugalhos não seja proposital e tenha como objetivo minimizar os danos de imagem causados aos lavajatistas.

Além disso, essa narrativa ajuda a descredibilizar o STF justamente em um momento em que o tribunal tem sido alvo de uma campanha de descredibilização por aqueles que tentaram solapar a democracia.

Dallagnol e Moro surfaram na narrativa fornecida pelo jornalismo lavajatista. Indiretamente, puxaram para si o mérito da prisão de Collor — um aliado político deles, lembre-se. A tabelinha de sucesso entre parte da imprensa e os justiceiros de Curitiba foi reavivada.

Nas redes sociais, Dallagnol e Moro foram à forra, como se a prisão agora do colega bolsonarista fosse uma prova inquestionável da lisura de todo trabalho da Lava Jato. Aproveitaram da confusão criada pela imprensa e agiram como agem desde os tribunais: deturpando fatos e fazendo politicagem barata. 

De tempos em tempos, o consórcio lavajatista ressurge das cinzas para tentar dourar o passado da força-tarefa. Tenta-se jogar areia nos olhos da população para criar um falso debate com o intuito claro de resgatar um legado anticorrupção que nunca existiu. Profissionais de imprensa, que passaram anos apoiando cegamente essa operação ilegal, hoje têm dificuldades em lidar com esse passado.

Mesmo com tantos fatos escancarados pela Vaza Jato, há ainda quem prefira tentar reescrever a história para salvar sua própria biografia. Mas os fatos estão aí e são incontestáveis: Collor foi para a cadeia por uma ação que respeitou o devido processo legal — o oposto do que foi a Lava Jato.

•        Collor e as pedras que cantam: prisão domiciliar com vista para o mar. Por Aquiles Lins

Imagine a cena: em uma cobertura de 600 metros quadrados, no alto de um prédio à beira-mar em Maceió, Fernando Collor de Mello observa o verde esmeralda das águas de Ponta Verde. Cumprindo prisão domiciliar, o ex-presidente ouve tocar na 94.1 FM, a Rádio Gazeta, de sua propriedade, a seguinte 'pedrada': “Quem é rico mora na praia / Mas quem trabalha nem tem onde morar. Quem não chora dorme com fome / Mas quem tem nome joga prata no ar”. É Pedras que Cantam, do poeta Fausto Nilo, imortalizada por vozes como as de Fagner e Dominguinhos. A imagem é poética, mas não há poesia que disfarce o contraste entre o crime e a consequência — ou a falta dela.

Collor foi condenado a 8 anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Mas, aos 75 anos e com um quadro de saúde frágil — Parkinson, apneia do sono e transtorno bipolar, segundo os autos —, o ex-senador e ex-presidente obteve o benefício da prisão domiciliar, chancelado pelo STF e pela Procuradoria-Geral da República.

Nada mais justo que o Estado garanta tratamento digno a todos, inclusive aos condenados. Mas quando esse “digno” se traduz em uma cobertura avaliada em R$ 9 milhões, com vista panorâmica para o mar, a Justiça parece menos cega e mais cúmplice de uma lógica perversa: a de que, no Brasil, o cárcere tem endereço e classe social. Para o pobre, a cela superlotada. Para o rico, o silêncio climatizado de um apartamento de luxo, com tornozeleira eletrônica como adereço.

A ironia da situação se aprofunda quando se lembra que o Collor dos anos 1990 se vendia como o “caçador de marajás”. Três décadas depois, tornou-se ele próprio o símbolo da elite política acusada de desviar milhões em esquemas de corrupção. O caso da BR Distribuidora, em que Collor foi condenado por receber R$ 20 milhões em propina, é só mais um capítulo da novela nacional em que os protagonistas da alta cúpula política raramente enfrentam finais trágicos — ao menos no sentido penal.

Afinal, o crime compensa? Para quem pode pagar bons advogados, contar com o tempo da prescrição e habitar mansões enquanto cumpre pena, parece que sim. Collor, da varanda, segue ouvindo a canção. “Pra ser feliz num lugar / Pra sorrir e cantar / Tanta coisa a gente inventa / Mas no dia que a poesia se arrebenta / É que as pedras vão cantar”. Mas há muitas pedras neste país que já pararam de cantar. Estão cansadas de ver que a justiça ainda tem vista para o mar.

•        Collor teve prisão convertida devido a problemas de saúde

Após ter seu pedido de prisão domiciliar aceito pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quinta-feira (1°), Fernando Collor de Mello, preso por por corrupção e outros delitos, cumprirá a pena de  8 anos e 10 meses em uma cobertura de 600m², avaliada em R$ 9 milhões, na orla de Maceió, em Alagoas.

Em 2018, Collor declarou à Justiça Eleitoral que o apartamento, localizado na região da praia de Ponta Verde, valia R$ 1,8 milhão. Porém, em 2022, ao ser candidato a governador de Alagoas, o imóvel não apareceu mais em sua declaração de bens.

Já em novembro do ano passado, uma reportagem do UOL mostrou que a Justiça do Trabalho penhorou a propriedade devido a uma dívida trabalhista de R$ 264 mil com um ex-funcionário da TV Mar, integrante da Organização Arnon de Mello, empresa do qual Collor é sócio. Na época, o apartamento foi avaliado pela Justiça em R$ 9 milhões.

A cobertura foi comprada pelo ex-presidente em 2006, mas nunca havia sido registrada em cartório até 2023, quando a Receita Federal fez uma averbação e registrou o apartamento. O local possui cinco quartos, piscina, bar e direito a cinco vagas de estacionamento.

<><> Condições da prisão domiciliar

A decisão de Moraes foi baseada em mais de 130 laudos médicos apresentados pela defesa, que atestam que Collor foi diagnosticado com Doença de Parkinson em 2019. Os exames também evidenciam o agravamento do quadro ao longo dos anos, incluindo transtornos psiquiátricos, como privação crônica de sono e transtorno bipolar.

“Sua condição clínica severa, a idade avançada, de 75 anos, e a necessidade de tratamento especializado justificam a medida humanitária”, destacou Moraes no despacho.

A conversão do regime prisional incluiu regras rigorosas impostas pelo Supremo:

•        Obrigatoriedade do uso de tornozeleira eletrônica;

•        Restrições de visitação, limitadas exclusivamente aos advogados;

•        Suspensão imediata dos passaportes, impedindo qualquer deslocamento internacional.

Collor permanece em uma cela especial em Alagoas, mas, com a nova decisão, deverá ser transferido para o regime domiciliar, sob custódia e vigilância eletrônica, conforme os trâmites da Justiça.

Ao justificar a concessão da medida, Moraes frisou que a efetividade dos direitos fundamentais exige ações concretas, especialmente em situações que envolvem saúde, idade e dignidade humana:

“Não basta que os direitos estejam inscritos em textos legais; é preciso garantir sua aplicação concreta, prática e eficiente”, escreveu.

 

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Fonte: The Intercept/Brasil 247/Fórum

 

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