Aldo
Fornazieri: Crise no INSS e a estratégia de maximização de danos
O
escândalo do INSS, marcado pelo roubo dos aposentados por organizações
associativas, caiu como uma bomba termobárica sobre o governo, justamente no
momento em que engatilhava uma recuperação na avaliação da opinião pública. O
governo ficou atônito, desorientado, sem saber como reagir. Os partidos
governistas ficaram paralisados no Congresso, numa posição cômoda ou
acovardada, pois não reagiram com força na defesa do governo.
Esse
escândalo tem três sócios: o governo Bolsonaro, onde se originou a roubalheira;
a Câmara dos Deputados, que aprovou leis que favoreceram as fraudes; e o
governo Lula, que não fez um pente fino nos organismos públicos ao assumir o
terceiro mandato e deixou que o assalto aos aposentados continuasse. Mesmo o
governo adotando providências para investigar e estancar a crise, o peso maior
do desgaste recai sobre a atual administração. Ainda não há pesquisas que medem
o impacto do desgaste do governo, mas ele não deve ser pequeno.
O mais
estranho nessa crise é que o governo poderia tê-la evitado e, depois de
explodir, poderia tê-la minimizado. Não se pode esquecer que o terceiro mandato
de Lula segue-se ao desastroso governo Bolsonaro. Este governo cometeu vários
desatinos nos principais ministérios e órgãos com funções de gestão de
políticas públicas. Quem não se lembra do que foi feito na Saúde durante a
pandemia? Ou o que foi feito na educação e em outras pastas?
A
prudência recomendava que, ao assumir o terceiro mandato, Lula orientasse todos
os ministérios e órgãos públicos a promoverem uma checagem, passar um pente
fino, em todos eles para averiguar o que estava sendo feito em termos de
gestão, administração e execução. Pouco ou nada foi feito. O governo parece ter
adotado a tática Zeca Pagodinho: “deixa a vida me levar”.
A
própria Abin deveria ter alertado os descalabros no INSS, os absurdos no SUS,
os desastres nas políticas ambientais e a morte dos indígenas. Mas a Abin
permaneceu infiltrada de bolsonaristas. Agora tem-se um escândalo que
impressiona pela quantidade de pessoas afetadas, que espanta pelo volume dos
recursos envolvidos e que causa indignação pela facilidade com que o roubo de
aposentados vulneráveis e pobres poderia ter sido evitado.
As
medidas prudenciais de checagem não só não foram adotadas como os descalabros
de décadas na gestão do INSS continuaram, a exemplo do crescimento das filas
sob a gestão de Lupi, entre outras incompetências, impondo sofrimentos aos
aposentados. A falta de ação, de vontade política, vale também para o SUS e
para outros órgãos prestadores de serviços. O governo Lula não tem marcas. Se
tivesse desburocratizado e modernizado o INSS e o SUS teria duas marcas
excelentes, pois estaria atendendo demandas de setores dentre os mais
vulneráveis. Tecnologias não faltam para que essas modernizações ocorram.
Outro
fato que causa estranheza e é inadmissível no caso do escândalo do INSS é que
dois ministros, Carlos Lupi (Previdência) e Vinícius Marques de Carvalho
(Controladoria Geral da União), sabiam desde 2023 o que vinha ocorrendo. Nenhum
dos dois adotou qualquer providência. Uma das funções da CGU é justamente
impedir atos de corrupção. Por que eles não adotaram medidas? Eles alertaram o
Planalto, a Casa Civil, o presidente Lula?
Os dois
ministros deveriam ter sido demitidos quando as informações vieram a tona.
Vinícius continua no governo. Lupi só saiu nove dias depois da operação da
Polícia Federal contra os fraudadores. As primeiras medidas para dar uma
solução à crise só apareceram 15 dias depois da revelação do escândalo. A não
demissão dos dois ministros revela a fraqueza do presidente Lula. No caso de
Lupi, alegou-se que ele preside o PDT, que tem nove deputados federais.
Qualquer
estudante de ciência política saberia que a posição de Lupi era insustentável.
Saberia também que o governo precisaria agir rápido para minimizar o desgaste.
Nos dois casos, o governo adotou a estratégia de maximização de danos, o oposto
da estratégia de redução de danos.
A
estratégia de redução de danos foi adotada no Brasil no âmbito da saúde
pública, implementada pela primeira vez por gestores petistas na prefeitura de
Santos, tendo como foco o combate à AIDS e a outras doenças. Ela visa reduzir
riscos e consequências negativas associadas a determinadas condutas das pessoas
afetadas. Do ponto de vista mais amplo, a estratégia de redução de danos se
refere a uma conduta ética relacionada a adoção de medidas para mitigar efeitos
relacionados a práticas que causem danos, sofrimentos ou qualquer outra
consequência negativa. A rapidez no tempo na adoção de medidas é um indicador
de eficácia dessa estratégia.
Ao
demorar em anunciar medidas para sanear o INSS e em afastar Lupi, o governo
preferiu maximizar o desgaste antes de agir. Foi massacrado nas redes e a
oposição conseguiu as assinaturas para instalação de CPI no Congresso, fatos
que revelam o atordoamento do governo, a falta de comando político e a
continuação das crises na comunicação e na articulação política.
O
governo perdeu a batalha da comunicação e Sidônio Palmeira não consegue mostrar
a que veio. Dois vídeos são indicados, por analistas, paradigmas dessa derrota.
Nikolas Ferreira, mesmo mentindo como de costume, fez um vídeo profissional,
impactante e tecnicamente e politicamente eficiente. Conseguiu milhões de
interações. Lindeberg Farias fez um vídeo amador, insipido, contraproducente,
com minguado engajamento. Os bolsonaristas se adiantaram propondo o óbvio:
proibir o INSS de fazer qualquer desconto.
Na
esfera da articulação política, em poucos dias Gleisi Hoffmann colheu derrotas
acachapantes: não evitou que o projeto da anistia dos golpistas agregasse
número de assinaturas suficiente para tramitar com urgência, não evitou que a
proposta de CPI do INSS alcançasse o número de assinaturas para ser
viabilizada, e foi incapaz de barrar o projeto que estanca o processo contra o
deputado Alexandre Ramagem e, de contrabando, contra outros golpistas.
Ainda
há tempo para o governo promover uma virada, estancando as crises que ele mesmo
gera e conseguindo dar um rumo ao país? O tempo está se estreitando e até agora
não há sinais de mudança. A mudança depende de Lula: ele precisa constituir um
comando político-operacional do governo, um estado-maior, capaz de dar direção
e sentido, definindo projetos e prioridades estratégicas que sejam capazes de
pautar a política do país. O governo está sendo governado pelos fatos, pautado
pela oposição e pelas crises.
O
governo precisa ter programas amplos, para as maiorias sociais. Não bastam os
pacatos pés de meia, que atingem apenas alguns milhares de estudantes. No caso
do INSS, não basta devolver o dinheiro roubado para os aposentados. É preciso
modernizar e revolucionar o Instituto, transformando-o em orgulho dos
aposentados e do Brasil.
É
preciso tirar o SUS da condição de tapera caiada em que se encontra, tornando-o
eficiente no atendimento da saúde dos brasileiros. Em suma: o governo precisa
sair da pasmaceira, com uma gestão vibrante, com uma política de engajamento,
construindo um projeto de futuro e de esperança.
¨
Brasil 2050, uma tentativa de desenhar o futuro. Por Luís
Nassif
A mídia
continua em discussões intermináveis sobre as frases de Lula, sobre a visita de
Lula à Rússia, sobre o custo das viagens e outras quinquilharias que compõem o
manual do Jornalismo das Irrelevâncias.
Há um
vácuo político decorrente de dois fenômenos. O primeiro, da apatia de Lula para
disputar a pauta política. O segundo, a incapacidade da mídia de divulgar o
relevante.
Enquanto
o noticiário se perde em irrelevâncias sem fim, o futuro vai sendo construído
graças ao espaço aberto por Lula.
O
Brasil estreita relações com a China, com o Japão, com a Rússia, com a Europa,
sem se afastar dos Estados Unidos. E há, pelo menos, 4 centros no governo
construindo o futuro, juntando inteligência pública e privada.
- No Ministério da
Indústria e do Comércio, o NIB (Nova Indústria Brasil);
- na Fazenda, o
Projeto da Transição;
- no Ministério de
Ciência, Tecnologia e Inovação, o Livro Violeta, com as conclusões da 5a
Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação.
- E no Ministério
de Orçamento e Planejamento o Brasil 2050, uma tentativa de montar um
cenário para os próximos 25 anos, a partir dos programas em andamento.
Obviamente,
não é um programa determinativo. É um modelo de planejamento que visa
identificar as grandes linhas de desenvolvimento, definir as ações necessárias
e as métricas para serem acompanhadas ano a ano, para identificar avanços,
desvios, paralisações e retrocessos.
O
programa está sendo elaborado com auxílio de instituições privadas, como a
Fundação Dom Cabral, e de centros de inteligência do Estado brasileiro, como
IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), IBGE (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatísticas), BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social), TCU (Tribunal de Contas da União) e os Ministérios.
Até
agora, o Brasil 2050 gerou três documentos básicos: um estudo sobre as
megatendências globais; um relatório das entrevistas efetuadas no período; e
uma síntese executiva dos estudos temáticos.
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As Megatendências Mundiais
O
trabalho identifica 14 mega tendências que impactarão o Brasil até 2050. Dentre
elas:
- transição
demográfica;
- aceleração das
transformações tecnológicas;
- mudanças globais
e eventos extremos;
- valorização da
sustentabilidade e transição energética;
- mudanças nos
padrões de consumo.
Foram
identificadas também 28 incertezas, 5 globais e 23 nacionais, que podem afetar
o país. Dentre elas, mudanças imprevisíveis na geopolítica, novos avanços
tecnológicos e possíveis rupturas econômicas e sociais.
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O Relatório de Entrevistas
A
partir das contribuições de 22 entrevistados, incluindo ministros,
especialistas, gestores públicos, acadêmicos e empresários, levantaram-se os
seguintes pontos.
- Conquistas do
Brasil.
Houve o
reconhecimento de avanços relevantes, como a estabilização econômica, a redução
da pobreza, fortalecimento da proteção social, consolidação da democracia e
avanços na educação, saúde e energia renovável.
- Vantagens
competitivas
Entre
elas, recursos naturais abundantes, mercado interno forte e relacionamento
pacífico com os vizinhos.
- Desafios e
fragilidades.
Os mais
relevantes são a desigualdade social persistente, educação de baixa qualidade e
infraestrutura defasada. Mas também problemas institucionais, como baixa
segurança jurídica, burocracia excessiva e falta de planejamento estratégico. O
que levou a uma dependência de commodities, tornando o país vulnerável às
oscilações do mercado internacional.
Aliás,
deve haver estudos sobre as relações entre preços de commodities e estabilidade
política. Lula conseguiu espaço com o boom das commodities; enquanto o
impeachment de Dilma Rousseff foi acelerado pela queda nas cotações.
- Movimentos
globais e riscos.
O
Brasil será impactado por mudanças como a digitalização, mudanças climáticas e
envelhecimento da população. Além de incertezas geopolíticas, crises
sanitárias, protecionismo e ameaças à democracia.
- Visão para 2050
Perseguir
um modelo que tenha inclusão social, competitividade econômicas,
sustentabilidade e fortalecimento institucionais.
- Estratégias para
o futuro.
Propõem-se
reformas estruturais, de melhoria da educação, promoção da inovação tecnológica
e modernização da infraestrutura.
Nas
ações sociais, sugere-se a reformulação de políticas de transferência de renda,
ampliação de acesso à moradia e serviços essenciais.
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A Síntese Executiva
Esses
dados foram consolidados em uma Síntese Executiva, com as seguintes propostas:
>>>
1. Desenvolvimento Social e Garantia de Direitos
Erradicação
da pobreza e redução das desigualdades: Prioridade para o Brasil, com foco em
programas de transferência de renda e políticas integradas para a inclusão
social.
- Educação: Garantia de
acesso equitativo e inclusivo à educação básica, com ênfase na redução da
evasão escolar, principalmente no ensino médio.
- Saúde: Adaptação do
Sistema Único de Saúde (SUS) à nova dinâmica demográfica e climática,
visando aumentar a cobertura e qualidade do atendimento, especialmente em
áreas vulneráveis.
- Previdência e
Assistência Social: Garantia da sustentabilidade do sistema
previdenciário diante do envelhecimento populacional e novas modalidades
de trabalho.
- Cultura e
Diversidade:
Valorização da cultura como fator de inclusão e identidade nacional,
promovendo o acesso equitativo à cultura, especialmente nas periferias.
>>>
2. Desenvolvimento Econômico e Sustentabilidade Socioambiental e Climática
Cidades
sustentáveis e resilientes: Adoção de soluções que integrem sustentabilidade e
urbanização, visando a melhoria da infraestrutura e da qualidade de vida.
- Descarbonização
da economia:
Planejamento para a transição para uma economia de baixo carbono.
- Transição
energética:
Modernização da matriz energética para aumentar a produção e consumo de
fontes limpas, como solar e eólica.
- Transformação
digital e inovação: Desenvolvimento de um ecossistema digital
competitivo, com foco em inteligência artificial, segurança cibernética e
inovação tecnológica.
- Sustentabilidade
hídrica e biodiversidade: Garantia do uso sustentável dos
recursos naturais e da preservação ambiental, especialmente da
biodiversidade.
>>>
3. Fortalecimento das Instituições Democráticas e da Soberania Nacional
Fortalecimento
da democracia e das instituições: Desenvolvimento de um Estado mais eficiente
e transparente, com foco na redução das desigualdades e na promoção da justiça
social.
- Segurança
pública:
Modernização da segurança pública com tecnologias avançadas, buscando a
redução da criminalidade e maior proteção à vida.
- Soberania
nacional:
Expansão do papel do Brasil na ordem mundial, com ênfase na integração
regional e fortalecimento da posição geopolítica do país.
- Defesa e
soberania:
Reforço das capacidades de defesa nacional, com foco na proteção das
fronteiras e na modernização das forças armadas.
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Visões de Futuro
O
Brasil de 2050, segundo as projeções, será um país mais justo, inclusivo e
sustentável, com um sistema de proteção social eficiente, acesso universal
à educação e saúde de qualidade, e um modelo
econômico sustentável que aproveita seu potencial de energia
renovável e tecnologia. A segurança pública será integrada e
eficiente, e o país será um líder global em cultura e
sustentabilidade.
<><>
As ameaças
Não se
deve esquecer (e agora as observações são minhas) que virando a esquina haverá
um Bolsonaro, um Tarcísio ou a malícia política de um Michel Temer. E uma mídia
que ainda não entendeu o conceito de políticas estruturantes com continuidade.
Fonte:
Jornal GGN

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