quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Justiça manda órgão ambiental dar licença para fazendas dentro de estação ecológica

Um desembargador do Tribunal de Justiça do Piauí decidiu, em caráter liminar e monocrático, que a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado do Piauí (SEMARH) deve emitir uma licença ambiental de duas fazendas para “evitar danos de grandes proporções à atividade econômica e ao exercício da função social da terra”. As duas propriedades estão localizadas dentro da Estação Ecológica de Uruçuí-Una, em Baixa Grande do Ribeiro, no Piauí, uma unidade de conservação de proteção integral federal. Os autores solicitam permissão para converter 74,7 mil hectares de Cerrado em cultivo de soja e milho.

Os requerentes do mandado de segurança contra o órgão ambiental estadual alegam que solicitaram licença ambiental em maio, mas até o momento o órgão não deu respostas. Para o magistrado, “não é razoável que os Impetrantes sejam penalizados pela morosidade na análise do seu pedido administrativo de obtenção de Licença Ambiental Provisória”. O ICMBio, órgão responsável pela gestão da Unidade de Informação, não consta como parte da ação.

Os reclamantes também acusam o Instituto de Terras do Piauí (INTERPI) de não ter respondido aos pedidos de Certidão de Regularidade Dominial para fins de licenciamento ambiental.

A decisão, proferida na semana passada (15/08), tem força de mandado de lei e determina “à SEMARH a expedição de Licença Ambiental Provisória, bem como, ao INTERPI a expedição da CRD [Certidão de Regularidade Dominial], até ulterior deliberação desse juízo. Determino ainda, que seja oficiado a SEMARH e o INTERPI, para que se proceda com a expedição dos respectivos documentos, de acordo com as determinações descritas acima”, decide o desembargador José James Gomes Pereira, da 2ª Câmara de Direito Pùblico.

A Fazenda Conesul, de propriedade da Conesul Colonizadora dos Cerrados Sul Piauiense LTDA, e a Fazenda Brejo das Meninas, de propriedade de Paulo Anacleto Garcia, querem permissão para desmatar 67.746 hectares e 7.362,29 hectares, respectivamente, para o  cultivo de soja e milho. Mas enquanto a Brejo das Meninas, que tem um total de 14.067 hectares, possui uma área de uso consolidado de 1,3 mil hectares, a fazenda Conesul, com 102.495,98 hectares, é ocupada inteiramente por vegetação nativa.

Procurada, a chefia da unidade, administrada pelo ICMBio, afirmou ter sido pego de surpresa com a decisão, e lembrou que a unidade de conservação está totalmente inserida no Cerrado. “Com o avanço dos projetos agrícolas, é o único refúgio para os animais da região”, disse a administração, que lembrou que animais ameaçados de extinção, como lobos-guará, onças-pintadas e gatos-do-mato, vivem dentro de seus limites.

O ICMBio respondeu ainda, em nota (íntegra abaixo), que “é incompatível a presença de moradores dentro da unidade ou qualquer atividade que cause degradação ambiental” e que “não compactua com o uso indevido dentro de unidades de conservação”, mas frisou que não é parte no processo. O órgão lembrou ainda que “a fazenda mencionada foi autuada em 2015 por desmatamento de 2.431 hectares dentro da Esec, já transitado em julgado”, com multa de mais de R$ 4,8 milhões.

Sobre o argumento de caducidade do decreto de criação da Estação Ecológica, o ICMBio afirmou entender que ele “não tem fundamento, uma vez que os decretos de criação de unidades de conservação são submetidos a regime especial previsto em lei”.

A Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado do Piauí e o Instituto de Terras também foram procurados para saber se já foram comunicados da decisão, se expediram as licenças e se recorreram da decisão. Os órgãos ainda não responderam, e o espaço segue aberto.

A Estação Ecológica de Uruçuí-Una possui 135.122,29 hectares e foi criada em junho de 1981. Como o prazo para pedidos de expropriação das propriedades rurais que estavam dentro da UC quando ela foi criada expirou, as desapropriações foram canceladas, mas, segundo decisão do TRF1, “eventual omissão do administrador não enseja a extinção da unidade de conservação, mas somente a caducidade do decreto expropriatório dos imóveis que ainda se acham titulados em favor de particulares”. Ou seja, “o fato de o Poder Público ainda não ter efetivado a desapropriação dos imóveis incluídos dentro da abrangência da

Estação Ecológica Uruçuí-Una não significa que os proprietários possam fazer uso incompatível do espaço, pois ele está sujeito a limitações ambientais e sociais”.

Os autores alegam que as fazendas funcionavam naquela área desde 1976, cinco anos antes da criação da unidade de conservação, e que portanto devem ser autorizados a continuar funcionando normalmente, mesmo dentro da Estação Ecológica. Em 2020, porém, a Advocacia-Geral da União (AGU), atuando em nome do ICMBio, obteve uma vitória na Justiça Federal do Piauí contra os donos das fazendas, que tentavam obter a autorização para funcionamento.

•        Íntegra da nota do ICMBio

Informamos que a Estação Ecológica de Uruçuí-Una é uma Unidade de Proteção Integral, criada pelo Decreto Federal s/nº de 02 de junho de 1981, com o objetivo de proteger e preservar amostras do ecossistema de cerrado. É incompatível a presença de moradores dentro da unidade ou qualquer atividade que cause degradação ambiental. Com relação ao processo questionado, o Instituto Chico Mendes (ICMBio/MMA) não é parte, e ainda não houve recebimento de qualquer intimação judicial a respeito do assunto.

O ICMBio não compactua com o uso indevido dentro de unidades de conservação, e quaisquer empreendimentos que causem impacto negativo a essas áreas devem ser avaliados por nossa equipe técnica. Justamente por isso, a fazenda mencionada foi autuada em 2015 por desmatamento de 2.431 hectares dentro da Esec, já transitado em julgado, com multa homologada no valor de R$ 4.862.000,00 (quatro milhões, oitocentos e sessenta e dois mil reais), bem como a manutenção do embargo da área até a comprovação da recuperação do dano.

Sobre a tese de caducidade defendida pela parte interessada, entendemos que não tem fundamento, uma vez que os decretos de criação de unidades de conservação são submetidos a regime especial previsto em lei.

 

•        Observatório do Clima propõe redução de 92% nas emissões até 2035

Um estudo da rede Observatório do Clima aponta que o Brasil precisa reduzir em 92% as emissões de gases do efeito estufa até 2035, para contribuir de forma justa com a proposta de limitar em 1,5 graus Celsius (ºC) o aquecimento global. O percentual tem como base as emissões de 2005 e avança limitando em 200 milhões de toneladas líquidas, a emissão anual que era de 2,4 bilhões de toneladas líquidas, há 19 anos.

O estudo considerou qual a carga de gases do efeito estufa que a atmosfera ainda suporta para manter o aumento da temperatura global em 1,5ºC e a participação do país nas emissões globais considerando a mudança no uso da terra promovida em seu território.

“É um cálculo para a necessidade do que o planeta precisa. É um cálculo feito entre o que seria justo, contando o histórico do Brasil de colocar [metas] em uma NDC, e também o que é possível a gente fazer olhando para o que nós precisamos de esforço para manter 1,5ºC”, explica Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.

O percentual foi apresentado nesta segunda-feira (26) pela entidade, na terceira contribuição para a proposta de meta climática que será apresentada pelo país durante a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém do Pará. O Observatório do Clima, foi a primeira iniciativa da sociedade civil a contribuir, em 2015, com estudos para subsidiar as ambições climáticas brasileiras, tendo contribuído novamente em 2020.

Como parte do Acordo de Paris, do qual o Brasil é signatário, será necessário apresentar até fevereiro de 2025, a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês). A proposta deverá avançar em relação ao Balanço Global (Global Stocktake, GST) que reuniu informações sobre a resposta do mundo à crise climática e foi apresentado na COP28, em Dubai, no ano passado.

O Brasil é o sexto maior emissor de gases do efeito estufa e, em 2023, apresentou uma NDC que estipulava teto para emissão de 1,3 bilhão de toneladas líquidas, em 2025, com redução de 48,4% em comparação com 2005. E em 2030, limita as emissões a 1,2 bilhão de toneladas líquidas, avançando a 53,1% do que era emitido em 2005.

A soma das metas apresentadas por todos os países signatários do Acordo de Paris ainda não garante a ambição global de manter a elevação climática nos patamares atuais e levaria o planeta a um aquecimento de 3ºC acima da temperatura do período pré-industrial.

“Nós estamos fazendo uma NDC para as pessoas que perderam as suas casas na enchente do Rio Grande do Sul, para as pessoas que estão sofrendo com as queimadas agora no Brasil, para as pessoas que estão mais vulneráveis a ondas de calor. Nós estamos mostrando que há um caminho para o país de fazer uma entrega que seja compatível com a gente frear o aumento desses extremos climáticos”, afirmou Astrini.

Para atingir a meta proposta pelo Observatório do Clima, os pesquisadores que contribuíram com o estudo apontam para a necessidade de o país alcançar outras ambições como o desmatamento zero até 2030, a recuperação de 21 milhões de hectares de vegetação nativa, o combate à degradação e aumento da proteção de seus biomas, as transições energéticas e à prática de agropecuária de baixa emissão, além de uma gestão adequada dos resíduos no país.

De acordo com Astrini, o objetivo é levar o estudo aos locais onde o debate é desenvolvido de maneira técnica e de modo a pressionar gestores públicos. “Dentro e fora do governo a gente vai levar esses números para provar que é possível ter mais ambição”, conclui.

 

Fonte: ((O))eco/Agencia Brasil

 

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