Democracia da Venezuela está morta há quase
20 anos, diz Steven Levitsky
Um dos autores de Como
as Democracias Morrem, ao lado de Daniel Zyblatt, o cientista político
americano Steven Levitsky é taxativo ao abordar a situação política da Venezuela.
“As pessoas falam de
uma crise da democracia venezuelana. A democracia da Venezuela está morta, e
está morta há quase 20 anos”, diz o renomado professor da Universidade Harvard,
ao participar do CNN Entrevistas.
Pesquisador das
democracias pelo mundo e dos países latino-americanos, Levitsky trata o regime
de Nicolás Maduro como uma “ditadura completa”. “Era um regime autoritário
brando na primeira década do século 21.”
Para Levitsky,
“devemos pensar que a antiga democracia do século 20 está morta e os
venezuelanos precisam construir uma nova agora”.
“Mas derrubar uma
ditadura estabelecida e consolidada como a venezuelana é difícil. A oposição
venezuelana, que cometeu muitos erros no passado, fez tudo certo nesta eleição.
Forçaram o governo Maduro a se envolver na mais escandalosa fraude eleitoral da
história moderna da América Latina.”
Ao avaliar a postura
da diplomacia e do governo brasileiro em buscar um papel de mediação nesse
conflito, Levitsky diz compreender a postura “cautelosa, silenciosa e
pragmática”, mas aponta os riscos dessa posição e o quanto o tempo é um fator
crucial.
“Entendo o desejo de
manter um assento à mesa. Mas, em algum momento, o governo brasileiro tem que
perceber que, se não for conseguir nada remotamente parecido com a democracia,
se não for conseguir uma transição, se o governo Maduro não ceder nada, muito
menos o poder, em algum momento, os brasileiros precisarão agir”, aponta o
cientista político.
“Caso contrário, terão
um assento à mesa no meio de um campo de concentração, e ninguém quer isso.”
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Como lidar com o populismo
Ao analisar o apelo do
populismo diante de democracias não tão consolidadas como a dos países
desenvolvidos, Levitsky reconhece que o descontentamento público em questões
como insegurança, corrupção e má qualidade dos serviços públicos, além da
desigualdade social, exercem um papel relevante.
“Quando os eleitores
ficam desapontados com governos após governos, ficam frustrados e recorrem a
figuras como Bukele (El Salvador), Chávez (Venezuela), Corrêa (Equador) ou
Milei (Argentina), que dizem que vão acabar com tudo”, avalia.
Com as redes sociais,
mesmo figuras de países menores, como El Salvador, se tornam referência, como é
o caso de Bukele.
“Há uma espécie de
transnacionalização. Ativistas do Partido Republicano sabem tudo sobre Milei,
sendo que a maioria deles, há dez anos, não sabia nem onde a Argentina ficava
no mapa.”
“Todas as nossas
democracias, tirando o Uruguai, estão lidando com esse problema de muito
descontentamento e a constante ascensão de candidatos personalistas que chegam
ao poder denunciando o sistema”, considera Levitsky.
“Alguns desses caras matam
a democracia: Bukele, Fujimori, Chávez”, cita Levitsky.
“Pode ser que as
democracias, sociedades, instituições tenham que se acostumar a uma política
mais fluida, uma política mais personalista. Temos que aprender a fortalecer as
instituições democráticas para que possamos conviver com um certo grau de
populismo, porque não acho que vamos eliminá-lo.”
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Democracia nos Estados Unidos
Em relação ao Brasil,
Levitsky tem feito elogios a lideranças políticas de direita que, na noite da
eleição vencida por Lula em 2022, reconheceram o resultado da disputa.
“Nos Estados Unidos,
mais de 80% dos políticos republicanos nacionais questionaram os resultados das
eleições”, compara.
“O Partido Republicano
é muito institucionalizado, não é personalista, foi durante muitos anos um
partido conservador de centro-direita, bastante tradicional”, observa Levitsky.
“Ao longo de apenas cinco ou seis anos, o partido se radicalizou.”
Em contrapartida,
Levitsky vê no Partido Democrata uma sigla que se viu em uma “situação de
emergência” diante da baixa competitividade do atual presidente, Joe Biden, em
seguir no comando dos EUA.
“A remoção do presidente Biden da chapa foi algo sem precedentes, mas é principalmente
resultado do fato de que, sinceramente, ele era um péssimo candidato que iria
perder a eleição”, afirma.
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Democracia multirracial nos EUA
No último livro
publicado no Brasil, cujo título original é Tyranny of Minority (A Tirania das
Minorias), Levitsky e Zyblatt argumentam que os Estados Unidos precisam lidar
com o fato de terem se tornado uma “democracia multirracial”, em que os
partidos que disputam o poder devem levar em conta a diversidade étnica do
país, no qual os brancos deixaram de ser a maioria demográfica.
Nesse sentido, o
cientista político vê a atual eleição “muito ilustrativa” desse conceito, com a
chapa republicana representada por dois homens brancos cristãos (Trump e o
senador J.D. Vance) e a democrata por uma mulher negra e de origem asiática (Kamala Harris) e um homem branco de classe média (o governador Tim Walz).
“Tenho 55 anos e,
durante a minha vida, os Estados Unidos passaram de um lugar onde mais de 80%
dos americanos se consideravam brancos e cristãos para um lugar onde menos de
50%, 43% em 2016, se consideravam brancos e cristãos”, explica Levitsky.
“É possível que esta
seja a última vez que você verá uma chapa como a dos republicanos, com dois
homens brancos abertamente cristãos nela. Isso não é mais suficiente para
ganhar maiorias nos EUA.”
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Venezuela critica 11
países que contestaram validação de eleição: “governos fracassados”
O ministério das
Relações Exteriores da Venezuela rejeitou, nesta sexta-feira (23), a declaração assinada por 11 países
americanos rejeitando a decisão do Supremo
Tribunal de Justiça do país que declarou Nicolás Maduro vitorioso das eleições
presidenciais e qualificou seus governos “fracassados”.
Em comunicado, a
chancelaria chavista disse rechaçar “nos termos mais enérgicos” o pronunciamento emitido conjuntamente pela Argentina, Costa Rica, Chile, Equador, Estados
Unidos, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai, que
considerou “grosseiro e insolente”.
A pasta liderada pelo
chavista Yván Gil disse ainda que os signatários do documento cometem
“transgressões ao direito internacional” por interferências em sua política
interna e que seu país irá “pulverizar todas e cada uma das ações que tentam
iniciar através dos seus governos fracassados contra o povo venezuelano”.
“A Venezuela exige
absoluto respeito à sua soberania e independência conquistadas após intensas
lutas contra os mais hostis impérios que se empenham em colocar as mãos nos
recursos naturais que não lhes pertence e tentam impor hoje, outra vez, uma
política de mudança de regime típica dos golpes de Estado que o império dos
Estados Unidos por mais de 100 anos promoveu na América Latina e no Caribe”,
acusa a chancelaria do país.
O comunicado
venezuelano também afirma que os governos que assinam a declaração conjunta se
tornam cúmplices de episódios de violência registrados nos protestos pós-eleitorais.
Os 11 países
criticados pela Venezuela emitiram uma declaração conjunta rejeitando
“categoricamente” o anúncio da Suprema Corte do país que indicava ter concluído uma suposta verificação
dos resultados do processo eleitoral e validava a reeleição de Maduro no
pleito.
No comunicado, os
governos reiteram que “só uma auditoria imparcial e independente que avalie
todas as atas garantirá o respeito pela vontade popular”. O Brasil não se uniu
à declaração, mas não deve reconhecer os resultados proclamados pelo Conselho Nacional Eleitoral do país até a divulgação das atas com os resultados
detalhados.
A União Europeia também afirmou, por meio do alto representante para
Relações Exteriores e Política de Segurança, Josep Borrell, que o bloco não
reconhecerá Maduro como presidente da Venezuela até que os boletins com a
desagregação dos resultados sejam entregues e possam ser verificados.
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María Corina recorre a
influenciadores e redes sociais contra Maduro
Quase na
clandestinidade, menos de um mês após as eleições de 28 de julho na Venezuela,
a líder oposicionista María Corina Machado parece ter encontrado em
influenciadores, comediantes e nas redes sociais uma plataforma para continuar
com a pressão sobre o resultado questionado das eleições.
A oposição afirma que
Edmundo González Urrutia é o candidato vencedor das eleições e que possui
provas para comprovar isso. O Conselho Nacional Eleitoral (CNE)
declarou vencedor o presidente Nicolás Maduro,
sem que até o momento tenha publicado detalhes dos resultados por centro e mesa
de votação.
Na quinta-feira (22),
o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) ratificou
os resultados anunciados pelo CNE. Ambas as
instituições são dirigidas por funcionários alinhados ao chavismo.
Nas últimas semanas,
Machado reduziu consideravelmente suas aparições públicas e, a partir de um
local desconhecido, tem participado de espaços alternativos para alcançar
outras audiências através de podcasts, programas no YouTube, transmissões ao
vivo no Instagram e TikTok.
E, embora não tenha
abandonado as entrevistas com mídias nacionais e internacionais, aprofundou uma
estratégia para transmitir sua mensagem e motivar audiências jovens, de acordo
com informações fornecidas por sua equipe de campanha e analistas.
Ana Milagros Parra é
uma cientista política venezuelana de 27 anos que analisa a comunicação
eleitoral do seu país através de suas redes sociais e também em seu podcast “A
medias”, onde aborda a atualidade política. Ela diz à CNN que, apesar
da estratégia comunicacional de Machado não ser explícita, trata-se de
“resistência civil”.
“Ela está desafiando a
censura e moldando-se a essa repressão. E tentando manter as pessoas
moralizadas, o que não significa que todo mundo vá sair às ruas. Já tivemos
episódios de sair às ruas todos os dias e foi contraproducente: houve muitas
baixas (mortes), muita violência e trauma geracional”, analisa Parra sobre a
atitude da oposição desde 28 de julho.
Parra define
resistência civil ou resistência pacífica como “moralizar as pessoas”, que, em
seu critério, representa “uma luta diária para manter as pessoas
comprometidas”, considerando que a curto e médio prazo a situação da Venezuela
é incerta.
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Coesão do eleitorado opositor
Parra acredita que as
condições políticas atuais no país exigem a necessidade de coesão da população.
E o público jovem é uma das frentes necessárias: “O mainstream, o que as
pessoas consomem”.
“Muitos dizem que é
banal que María Corina Machado esteja utilizando influenciadores. A maioria são
pessoas venezuelanas e as que não têm um público latino-americano.
É uma estratégia muito
voltada para os jovens. Para os jovens você precisa de um interlocutor que
possa digerir a informação, porque é uma estratégia política que não é fácil de
traduzir”, diz Parra.
“Então, estar em uma
live com Lele Pons, ou com comediantes, ou em um podcast muito famoso que não é
ouvido apenas por venezuelanos, mas por toda a América Latina é importante
porque você leva a mensagem, leva confiança, e de alguma forma fideliza populações
que não leem sobre política, e que se leem sobre política não entendem o
suficiente porque é complicado”, analisa.
Além disso, há uma
estratégia para alcançar diferentes públicos dentro de uma mesma geração,
acrescenta a cientista política. Isso inclui participar do podcast de comédia
venezuelano “Escuela de Nada” e também com a influenciadora e cantora
venezuelana Lele Pons – que vive nos Estados Unidos com sua família desde que
era criança -, com mais de 54 milhões de seguidores no Instagram que são, em
grande parte, pessoas daquele país.
“É aproveitar as
conexões que se tem com os 8 milhões de venezuelanos que imigraram”, aponta
Parra.
No programa ao vivo no
Instagram que fez com Pons em 9 de agosto, Machado não perdeu a oportunidade de
mandar algumas mensagens em inglês e se dirigir diretamente aos seguidores da
cantora para pedir paciência e apoio para amplificar a mensagem.
“Todos estamos
contigo”, disse Pons. “Você é como a mãe de todos”.
Ela não estava errada.
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Uma abordagem mais informal
Em todas as suas
participações, especialmente no podcast de comédia “Escuela de Nada”, ou com La
Divaza, um youtuber venezuelano conhecido, “Machado ri, faz piadas, tenta ser
engraçada”, diz Parra, com o objetivo de alcançar a geração Z, os jovens nascidos
entre meados dos anos 90 e o final dos anos 2000.
“São eles que podem
fazer um edit de TikTok, e acham engraçado, e dizem ‘essa senhora me dá
confiança, porque não é uma política que vejo inacessível para mim'”, analisa
Parra.
“Ela está conectando
com todos, ou é o que está tentando, unindo a todos para que sintam confiança
nela e que a estratégia que está fazendo, que depende das pessoas, possa ser
frutífera”, acrescenta.
Em seu diálogo no dia
6 de agosto com Chente Ydrach, um comediante de Porto Rico com mais de 1,3
milhões de inscritos no YouTube, Machado resumiu seu objetivo desta forma:
“Para nós é muito importante que a voz da Venezuela chegue ao mundo inteiro e
eu sei que as vozes de vocês são poderosas e têm credibilidade, e muita gente
vai entender o que estão vivendo os venezuelanos hoje”.
Nessas aparições, além
de sua atitude – fazer piadas, estar sentada de maneira mais relaxada e
descontraída – sua vestimenta também é diferente. “Uma coisa é ir com um
blazer, e outra é ir com sua camiseta branca e seu rosário… não são coisas que
saem do nada”, diz a cientista política.
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Mensagem multiplataforma
“Estamos avançando,
trabalhando em vários planos e todos entendem a nível da opinião pública
nacional, porque estão tão desesperados que querem que não possamos nos
comunicar entre nós. Até a rede X foi bloqueada. Então, é preciso garantir que
a comunicação sobre a verdade seja conhecida na Venezuela: sobre a opinião
pública internacional, sobre os governos e as instâncias multilaterais para que
exerçam toda a pressão sobre o regime”, disse Machado no protesto nas ruas de
17 de agosto.
Nas últimas semanas,
Machado concedeu entrevistas a jornalistas da CNN como Christiane
Amanpour e Fareed Zakaria; também a outros meios internacionais e nacionais, e
finalmente ao segmento dedicado a influenciadores.
ma fonte próxima à
estratégia comunicacional de María Corina Machado disse à CNN que se
trata de outra etapa, na qual à limitação nos meios tradicionais e as
restrições por sua segurança se soma o foco em outras audiências e por outras
vias.
Sua equipe acredita
que os influenciadores podem ser a melhor convocação para atrair outras pessoas
a apoiar e motivar outros que não necessariamente podem ouvir Machado pelos
meios que usa habitualmente.
A intenção,
acrescentou a fonte, era fazer com que a mensagem chegasse “por todas as vias
possíveis para que ninguém ficasse sem saber o que estava acontecendo” na
Venezuela, por isso em muitos casos essas participações com influenciadores ou
comediantes ocorreram no mesmo dia.
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Maduro contra Lele Pons
Essa estratégia
comunicacional da líder oposicionista gerou a reação do presidente Nicolás
Maduro.
“Agora há uma tal Lele
Pons. Ela quer com um show em Miami no sábado impor um governo na Venezuela.
Mas quem disse que Lele Pons é política? Agora sim entendemos que Lele Pons é a
CNE. Mas quanto dinheiro estão colocando por trás disso?”, disse em um vídeo no
TikTok em 16 de agosto, um dia antes da manifestação mundial convocada pela
líder oposicionista.
“Vocês poderão
conspirar de Miami, mas na Venezuela quem manda são os venezuelanos”,
acrescentou Maduro em uma mensagem dirigida aos artistas, comediantes e
influenciadores que deram visibilidade a Machado nas últimas semanas.
“Te incomodei? Não vai
me calar, Maduro!!!! A Venezuela ganhou”, respondeu a jovem em uma publicação
no X.
Em contraposição,
Parra analisa que o governo da Venezuela “pela primeira vez neste regime, desde
Chávez, não tem controle da narrativa apesar da propaganda”.
“Você tem os
porta-vozes principais do governo todos os dias em cadeia nacional ameaçando. E
se você observar, é um discurso que não tem pé nem cabeça, que não deve ser
desmerecido porque eles são capazes de agir, mas narrativamente não são lógicos
e não conseguiram ter controle do discurso, que é algo que ninguém tinha visto
nas últimas décadas”, explica a especialista venezuelana.
“Não têm roteiro. Por
que você, que diz que venceu, tem a atitude de estar preocupado com uma
influenciadora que falou mal de você? Se você tem o poder do Estado e o
controle total das instituições, por que você vai ficar em canais falando mal
de uma garota que está fora do país?”, questiona sobre as declarações de Maduro
sobre Pons.
Nas palavras da
cientista política, a única arma que o governo tem “é a violência, a repressão
e usar os mecanismos do Estado para controlar”.
Fonte: CNN Brasil
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