sexta-feira, 2 de agosto de 2024

Contramão: enquanto Israel e Ucrânia clamam por munição, Brasil abre mão de fábrica, diz analista

Marinha do Brasil decide pela concessão da principal fábrica de munições do país ao capital estrangeiro, em mais um golpe à base industrial de defesa nacional. Nova onda de privatizações de empresas militares brasileiras em contexto geopolítico desfavorável agrava vulnerabilidade nacional, diz analista à Sputnik Brasil.

Nesta quarta-feira (31), a empresa vinculada à Marinha do Brasil EMGEPRON confirmou a sua intenção de conceder uma das principais fábricas de munição brasileiras ao capital estrangeiro. A concessão da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos foi ofertada a empresas de Reino Unido, Suécia, Itália e Israel durante evento realizado no Itaim, em São Paulo.

De acordo com a Marinha, a Empresa Gerencial de Projetos Navais (EMGEPRON), em parceria com a Diretoria de Sistemas de Armas da Marinha (DSAM), realizou um "road show" no centro financeiro paulistano, visando a entrega da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos (FAJCMC) à iniciativa privada.

A intenção da força é angariar fundos para a "modernização da fábrica" por meio da implementação de "novo modelo de gestão" que alavanque o empreendimento. A Marinha promete publicar os editais ainda neste semestre e concluir a concessão da fábrica por até 20 anos.

O bom desempenho nacional e internacional da Fábrica Müller de Campos anima os investidores. Advogado que atua nas tratativas defendeu a concessão, lembrando que "a fábrica é uma das principais produtoras de artefatos militares do mundo e, a partir da concessão à iniciativa privada, certamente vai gerar mais receita", reportou o portal Metrópoles.

De fato, a fábrica opera a contento, produzindo munições de qualidade para as Forças Armadas e exportando o seu excedente para parceiros do Brasil no Sul Global. Então, afinal, para que abrir mão dessa fábrica estratégica para o Brasil? A Sputnik Brasil conversou com especialistas para compreender os motivos por trás de mais uma privatização na Base Industrial de Defesa (BID) brasileira.

"Infelizmente, a privatização de fábricas de defesa não é novidade no Brasil. Existe uma ideia de que toda empresa que não dá lucro está dando prejuízo ao Estado brasileiro", disse o pesquisador do Núcleo de Avaliação da Conjuntura da Escola de Guerra Naval, Rafael Esteves Gomes, à Sputnik Brasil. "Mas sabemos que em setores estratégicos a lógica de mercado se aplica de forma um pouco diferente."

De acordo com o especialista, a concessão da fábrica consiste em "uma estratégia equivocada, que afeta uma área muito sensível para as Forças Armadas que é a de munições. Convenhamos que nada funciona sem munições".

A notícia sobre a concessão da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos agrava os ânimos de setores nacionalistas da sociedade brasileira, já insatisfeitos com a possível venda da fábrica de foguetes Avibrás ao capital estrangeiro.

"O Brasil não está olhando para o contexto internacional quando decide abrir mão de fábricas de munições ou da Avibrás", disse o especialista militar e oficial da reserva da Marinha do Brasil Robinson Farinazzo à Sputnik Brasil. "Estamos em um momento tenso geopoliticamente, com as principais potências se rearmando até os dentes. E o Brasil, ao contrário, abrindo mão das suas capacidades militares e tecnológicas."

Conflitos de larga escala sendo travados na Ucrânia e no entorno de Israel demonstram o caráter essencial das munições no campo de batalha. O Brasil se encontra em posição confortável nessa área, justamente pela produção nacional desses artefatos pela Fábrica Müller de Campos.

"Vemos os EUA modernizando suas fábricas de munição a toque de caixa, vemos as Forças Armadas de Israel e Ucrânia desesperadas atrás de munições no mercado mundial. E o Brasil, por incrível que pareça, se desfazendo da sua fábrica", considerou Farinazzo. "A fábrica tem bons balanços, exporta e é bem-sucedida, não sei qual o cálculo por trás dessa decisão."

A concessão da fábrica ao capital internacional também surpreende, uma vez que a Marinha poderia prospectar empresas brasileiras interessadas na empreitada. Como evidenciado no caso da Avibrás, bancos brasileiros demonstram resistência em participar de investimentos na área de defesa.

"A verdade é que não há nenhuma política para priorizar as compras nacionais", lamentou Farinazzo. "Este é um problema antigo, uma vez que o rearmamento das Forças Armadas deveria estar atrelado ao desenvolvimento da indústria nacional."

O aumento da presença estrangeira nas indústrias de defesa nacionais amplia o já considerável nível de dependência externa que as Forças Armadas enfrentam, particularmente no setor de aviação. Nesse sentido, a redução do comprometimento do Executivo com políticas de conteúdo nacional e desenvolvimento tecnológico nacional preocupa.

"Falemos claramente: outros países não repassarão tecnologia militar de ponta para o Brasil", considerou Farinazzo. "Ninguém vai te ensinar a fazer procedimentos sensíveis na área militar. O Brasil é quem precisa desenvolver suas capacidades e autonomia."

Apesar dos problemas estruturais, Gomes acredita que a sociedade civil organizada poderá agir contra a concessão da Fábrica Müller de Campos ao capital estrangeiro. O especialista cita como exemplo a recente resistência à venda da Avibrás no Congresso Nacional.

"O projeto de lei sobre a reestatização da Avibrás mostra que existem setores no Brasil que são contra a concessão de empresas da BID a grupos estrangeiros, principalmente no Congresso", disse Gomes. "A mesma mobilização poderá ser feita agora em relação a essa fábrica de munições."

·        Ponta do iceberg

A concessão da Fábrica Müller de Campos se insere em um contexto mais amplo de retomada da penetração dos EUA e seus aliados da OTAN no setor de defesa brasileiro. As dificuldades dos EUA em manter a sua posição estratégica em regiões como Oriente Médio e África, aliada aos revezes sofridos no conflito ucraniano, levam os EUA a recrudescer o controle sobre o seu entorno geográfico, explica o oficial da reserva da Marinha do Brasil.

"O que sobra para os EUA nesse contexto são o seu quintal América Latina. A intenção é criar um clientelismo militar na América Latina, de maneira que, em caso de conflito, a região não tenha para onde correr", disse Farinazzo. "Já vemos os EUA fomentando a dependência das Forças Armadas de países como Argentina e Colômbia, vemos as pressões sobre o Peru e Equador. O Brasil precisa se preparar para isso e buscar um caminho para garantir a sua independência."

O aumento das pressões norte-americanas sobre a base industrial de defesa brasileira é evidenciado pelo caso da Avibrás, quando Washington fez gestões para que a empresa chinesa Norinco não fosse considerada como possível compradora da empresa responsável pelos foguetes Astro.

Além disso, há renovado entusiasmo norte-americano na venda de seus equipamentos militares para o Brasil. Ainda que obsoletas, essas armas mantêm as Forças Armadas brasileiras atreladas aos padrões da OTAN. Exemplos são a recente compra brasileira de helicópteros Black Hawk e negociações para arrematar um lote de caças F-16 usados.

·        Governo ausente

A mais nova onda de privatizações e concessões de empresas de defesa brasileiras ocorre justamente durante um governo ligado à esquerda, que tradicionalmente adotava posições nacionalistas quanto à indústria brasileira. No entanto, as limitações políticas e financeiras do governo reduzem o papel de Lula e do Palácio do Planalto nas tratativas referentes à BID, lamenta Gomes.

"O governo infelizmente está dando pouca atenção para a indústria de defesa, o que é preocupante. Prometeu investir, mas não entregou", disse o pesquisador da Escola de Guerra Naval. "O marco fiscal é um dos motivos pelos quais o governo resiste a investir mais na BID ou a assumir a dívida da Avibrás, por exemplo."

Conforme reportado pela Agência Brasil, o governo federal não se disponibilizou a arcar com a dívida da Avibrás, estimada em R$ 700 milhões, ou estatizar definitivamente a empresa. De acordo com o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), "não há condições, nesse momento, de financeiramente o governo entrar nessa".

"O orçamento de defesa do Brasil cresce em números absolutos, mas não em porcentagem do PIB, permanecendo na casa dos 1,5%", avaliou Gomes. "Isso se demonstra insuficiente para a modernização das Forças Armadas, que buscam outras alternativas para atrair investimentos e manter os seus projetos funcionando."

Na avaliação de Gomes, a concessão à iniciativa privada é uma forma de levantar fundos para bancar projetos estratégicos, já que os R$ 127 bilhões garantidos pelo governo à defesa são majoritariamente revertidos para gastos de pessoal e administrativos.

"Afirmar que o Brasil tem o objetivo de modernizar as suas Forças Armadas, mas manter o investimento em defesa baixo e revertido para o pagamento de pessoal me parece, para o dizer o mínimo, uma incongruência", concluiu o especialista.

¨      Com foco em ampliar mercado, Brasil aumenta de 29 para 40 número de adidos agrícolas no exterior

Funcionários das missões diplomáticas são responsáveis por atuarem na abertura, manutenção e ampliação de mercados para o agronegócio brasileiro. Além disso, atuam para identificar oportunidades de cooperação com outros países.

O Brasil elevará de 29 para 40 o número de adidos agrícolas em suas missões diplomáticas ao redor do mundo, anunciou nesta quarta-feira (31) o Ministério das Relações Exteriores.

O incremento de funcionários, aprovado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é o maior desde a instalação da primeira adidância agrícola em 2008.

"Dos 11 novos postos, cinco estão na Ásia, três na África, dois na América do Sul e um na Europa. Os locais para instalar novas adidâncias agrícolas serão definidos posteriormente por meio de uma ordem interministerial do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) e do Ministério das Relações Exteriores (MRE)", diz o comunicado oficial.

Atualmente, o Brasil tem adidos agrícolas na Alemanha, Angola, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Bélgica (dois adidos), Canadá, China (dois adidos), Colômbia, Coreia do Sul, Egito, Estados Unidos da América, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, Marrocos, México, África do Sul, Suíça, Peru, Reino Unido, Rússia, Cingapura, Tailândia e Vietnã.

"Atualmente, o Brasil já soma mais de 50 mercados abertos em todo o mundo. As aberturas de mercados são resultado de transações bilaterais que culminam no acordo dos requisitos de sanidade a serem atestados e do certificado correspondente, sanitário, fitossanitário ou veterinário, que passará a ser aceito pelo país importador nos pontos de entrada da mercadoria", acrescentou.

A principal função desses adidos é identificar oportunidades de comércio, investimento e cooperação para a indústria agrícola do Brasil. "Quando no posto, os adidos mantêm a interlocução com representantes dos setores público e privado e interagem com relevantes formadores de opinião na sociedade civil, imprensa e academia. Além disso, essa atuação traz resultados para a economia brasileira por meio de aberturas de mercados", finaliza.

¨      Chineses passam à frente da Petrobras e levam mais da metade do petróleo em leilão de pré-sal

As petroleiras China National Offshore Oil Corporation (CNOOC) e PetroChina levaram 23 milhões dos 37,5 milhões de barris de petróleo vendidos em um leilão realizado nesta quarta-feira (31) pela Bolsa de Valores de São Paulo. O restante, 14,5 milhões, ficou com a Petrobras.

Com a compra dos chineses, a estatal Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA) arrecadou R$ 17 bilhões no 4º Leilão de Petróleo da União, que está sob o regime de partilha.

O valor ficou acima dos R$ 15 bilhões que eram esperados, segundo o jornal O Globo.

Estavam habilitadas para participar do leilão a Petrobras e a Refinaria de Mataripe, além das petroleiras ExxonMobil, Equinor, Galp, PRIO, Shell, TotalEnergies, CNOOC e PetroChina.

A PPSA é uma estatal que foi criada para gerenciar e fiscalizar a produção de petróleo e gás sob o regime de partilha. Nesse modelo, as petroleiras repassam parte da produção para o governo, cujo percentual é definido no momento do leilão do bloco, explica a mídia.

O volume de óleo foi dividido em quatro lotes que serão produzidos nos campos de Mero e Búzios, ambos no pré-sal da Bacia de Santos, ao longo de 2025. Na modalidade, vencem as propostas que tiverem o menor desconto em relação ao preço estabelecido pela PPSA.

Nesse leilão, foi estipulado como preço mínimo o valor do chamado "Brent datado", que tem como base o preço do petróleo bruto leve do mar do Norte, acrescido de um desconto máximo de US$ 4,40 (R$ 24,8) para os lotes de Mero e de US$ 4,25 (R$ 24) para o lote de Búzios. Esse desconto ocorre porque o comprador precisa pegar o óleo diretamente no navio-plataforma FPSO, em alto-mar.

O leilão contou com a participação do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e do presidente do Conselho de Administração da Petrobras, Pietro Mendes.

Os recursos, que serão destinados ao Fundo Social, só entrarão no caixa do governo, via Tesouro, entre abril de 2025 e abril de 2026.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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