Lei de limite de terras para estrangeiros
no Brasil é crucial para soberania nacional, diz jurista
A lei que limita a
compra de terras por estrangeiros no Brasil, definida em 1971, determina que
áreas rurais pertencentes a esse grupo não podem ultrapassar 25% da superfície
de um mesmo município. Tal imposição é vista com maus olhos pelos setores da
mineração, da indústria e do agronegócio, que vêm fazendo pressão para que a
norma seja revista.
No entanto, o advogado
e economista Alessandro Azzoni defende que tais restrições são impostas visando
proteger a soberania nacional, a segurança alimentar, a preservação ambiental,
o desenvolvimento socioeconômico e a manutenção da cultura brasileira. "Um
dos aspectos fundamentais da soberania nacional é o território."
"Se não houver
essa restrição da aquisição de terras por estrangeiros, teremos um problema
para garantir e manter o controle dos recursos naturais. Isso daria uma
concentração excessiva da propriedade de terras nas mãos dos
estrangeiros."
Em entrevista à
Sputnik Brasil, Azzoni destacou os riscos ambientais decorrentes da exploração
desenfreada de recursos naturais por empresas estrangeiras. "É
constitucional a questão de proteger o meio ambiente. Estrangeiros podem
explorar irresponsavelmente os recursos naturais, causando danos
significativos."
"O Brasil já teve
um problema de desvalorização cambial muito forte. O dólar praticamente tinha
duas cotações. Para estrangeiros, o dólar valia muito mais, então se poderia
adquirir propriedades com valores irrisórios, aumentando a concentração."
Além disso, ele
comenta que a norma é também uma "maneira de proteger a terra",
sobretudo considerando os povos tradicionais que ali vivem. "Há um crime
muito usado pelas empresas estrangeiras, que é a bioprospecção — você roubar as
ideias de processos medicamentosos dos povos originários e tentar transformar
isso em remédios."
"A concentração
das terras em proprietários estrangeiros pode trazer impactos sociais, como
deslocamento de comunidades locais, e impactos ambientais, que essas empresas
fariam praticamente uma parte exploratória. Quando elas fossem atacadas ou tomassem
as autuações ambientais, automaticamente elas poderiam simplesmente fechar a
empresa local e ir embora do país, e o dano ficaria."
Azzoni comenta que a
lei também seria uma forma de ampliar a segurança alimentar brasileira, uma vez
que "a agricultura e os produtores mundiais não vão entrar […] para
explorar o setor de produzir alimentos de forma predatória, levando
praticamente toda a produção para fora".
Membro da diretoria do
Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP) e conselheiro deliberativo
da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), ele comparou a legislação
brasileira com políticas similares em outros lugares, como Austrália, China,
Estados Unidos e países da União Europeia, que também impõem restrições à
aquisição de terras por estrangeiros.
Ele descreve que a
Austrália tem uma "política muito dura na aprovação de investimento
estrangeiro em terras", utilizando até órgãos especializados que revisam
"praticamente todas as propostas e podem até bloquear essas
aquisições".
Já os chineses põem
"restrições significativas à questão de propriedade das terras,
principalmente para fins agrícolas, porque eles também garantem a questão da
segurança alimentar".
Os EUA também, segundo
ele, principalmente nas áreas agrícolas e terras próximas a locais de segurança
nacional.
• Por que querem derrubar a lei de
restrição de terras?
Vale ressaltar que
representantes da indústria, da mineração e do agronegócio têm manifestado
contrariedade às restrições impostas a empresas nacionais com capital
estrangeiro para a aquisição de terras no Brasil.
Azzoni alerta para os
perigos de abrir mão dessas restrições: "Você está abrindo mão da sua
soberania, repassando a sua exploração para essas empresas, e empresas de
mineração internacionais são altamente predatórias. Teríamos situações de
crimes ambientais, expansão de áreas, desmatamento, um impacto ambiental muito
grande."
"Todas as
economias no mundo hoje olham para o Brasil justamente no mercado de mineração,
que é o grande boom, a exploração do minério de ferro e do aço. A segunda é a
questão do agronegócio para alimentar o mundo — estaremos abrindo uma reserva
de mercado nossa."
A questão permanece em
discussão no Supremo Tribunal Federal (STF). Representantes dos setores alegam
que tais limitações afetam a competitividade e o desenvolvimento do país, além
de gerar um cenário de insegurança para negócios que afugenta investidores
internacionais.
Uma ação da Sociedade
Rural Brasileira (SRB) movida em 2015 pedia revisão da norma. Ela recebeu
parecer favorável, em julho de 2023, da Federação das Indústrias do Estado de
Minas Gerais (FIEMG). Além disso, tem apoio do Instituto Brasileiro de
Mineração (Ibram).
O que está em debate é
se a aplicação dessa regra a empresas foi ou não recepcionada pela Constituição
Federal de 1988.
Uma ação da União e do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), do governo
federal, pede a anulação de um parecer da Corregedoria do Tribunal de Justiça
de São Paulo (TJSP) que liberou cartórios de aplicarem a norma da lei de 1971.
A SRB pede à Suprema
Corte que consolide o entendimento de que a restrição não pode ser aplicada a
empresas nacionais com capital estrangeiro majoritário. A reportagem solicitou
um posicionamento por parte da entidade, mas não foi respondida até o momento
da publicação desta matéria.
Em abril de 2023, o
ministro do STF André Mendonça suspendeu todos os processos no país que tratam
da compra de terras por estrangeiros, acolhendo pedido da Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB).
Ele disse que a
reivindicação da OAB indicava "cenário de grave insegurança jurídica, o
que justifica a suspensão nacional dos processos".
A liminar foi
derrubada pelo plenário do STF no mês seguinte, em maio. O mérito das ações,
contudo, ainda não foi julgado.
Quantos hectares de
terra um estrangeiro pode ter no Brasil?
Cada município pode
ter até 25% de seu território sob controle de cidadãos ou empresas de outras
nacionalidades. Uma mesma nacionalidade estrangeira também não pode deter mais
do que 10% da área de um determinado município.
A lei que define tais
restrições foi sancionada em 1971, durante a ditadura militar.
Empresas que tenham a
maior parte do seu capital estrangeira devem seguir as mesmas regras. Uma
regulamentação feita nos anos 1990 prevê que aquisições que ultrapassem esses
limites sejam submetidas à aprovação do Congresso Nacional.
• Sem citar Essequibo, Lula fala de
integração e paz regional após encontro com presidente da Guiana
Na segunda agenda
internacional do ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa de
fóruns latinoamericanos e reuniões bilaterais com países da região. Sem citar
Essequibo, Lula ressaltou, após encontro bilateral com o presidente da Guiana,
Irfaan Ali, a importância de ampliar a integração regional na América do Sul em
todos os setores.
Reduzir em mais de 10
mil quilômetros a distância para o escoamento das exportações brasileiras para
a China, maior parceiro econômico do Brasil, e outros países da Ásia. Um dos
objetivos dos compromissos do presidente Lula na Guiana, que teve o último dia
de reuniões nesta quinta-feira (29), e também em São Vicente e Granadinas, onde
na sexta (1º) será realizada a cúpula da Comunidade de Estados
Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), é apresentar o projeto de investimento
para ampliar a infraestrutura de transportes entre os países da América do Sul.
Durante coletiva de
imprensa ao lado do presidente Irfaan Ali, Lula comentou rapidamente a
proposta. "Dentro desses projetos de investimento e infraestrutura, temos
compromisso com a integração com o nosso continente. Os ministros fizeram a
apresentação do projeto de integração que integra o Brasil, além da Guiana, a
outros países da América do Sul com o objetivo de chegar ao Pacífico e diminuir
em 10 mil quilômetros a distância do nosso comércio com a China, Japão e a
Ásia", ressaltou.
Além do presidente
brasileiro, participam da comitiva que esteve na Guiana os ministros de Portos
e Aeroportos (Silvio Costa Filho), Planejamento (Simone Tebet), Integração e do
Desenvolvimento Regional (Waldez Góes) e Transportes (Renan Filho).
"Convidei o
presidente [Irfaan] para que prepare uma missão empresarial e que visite logo o
Brasil, para mostrar aos empresários brasileiros as oportunidades que a Guiana
oferece para investimentos brasileiros em mineração, energética, petróleo e agricultura.
Há um vasto campo de interesse de empresários em investimentos na Guiana",
acrescentou.
• Crescimento acelerado na Guiana
Diante das descobertas
de novas reservas de petróleo, a economia da Guiana é a que mais cresce no
mundo: entre 2021 e 2023, alcançou quase 400% de aumento do produto interno
bruto (PIB). Lula, que desde a quarta (28) está em Georgetown, disse que o
momento é perceptível nas ruas da capital.
"Queria dizer ao
presidente que a mesma forma que a Guiana vive um momento excepcional de oportunidades
econômicas, e vi isso quando desci do aeroporto e fui para o hotel, diante da
quantidade de novas construções e as rodovias modernas que estão sendo
construídas aqui. Da mesma forma que acontecem esses investimentos em
infraestrutura, também estão acontecendo os investimentos na melhoria da
qualidade de vida do povo da Guiana", acrescenta Lula.
Por fim, o petista
ressaltou a vocação da América do Sul em ser uma zona de paz no planeta e que
os países vão seguir trabalhando para que isso seja mantido. "Não
precisamos de guerra, ela traz destruição da infraestrutura, de vida e
sofrimento. A paz traz prosperidade, educação, geração de emprego e
tranquilidade aos seres humanos. Esse é o papel que o Brasil pretende jogar na
América do Sul e no mundo", declarou, ao lembrar que após o impeachment da
presidente Dilma Rousseff o país passou a viver "um apagão" na
relação com a Guiana e as nações do Caribe.
Em um discurso menor,
o presidente da Guiana agradeceu pelas "extraordinárias horas" do
encontro com Lula e pontuou a importância para a maior integração regional —
através do estado de Roraima, os dois países compartilham mais de 1,6 mil quilômetros
de fronteiras, além de reservas da Floresta Amazônica. O país será convidado
pelo Brasil a participar dos encontros entre ministros de Estado do G20 para
discutir a crise climática.
"Estamos
comprometidos com o desenvolvimento econômico e os investimentos entre os dois
países, especialmente em infraestrutura", declarou Irfaan, que ainda
agradeceu o papel do Brasil em manter a paz e a estabilidade da região. O
presidente e o homólogo da Venezuela, Nicolás Maduro, estarão juntos na cúpula
da CELAC, e há expectativa de um novo encontro para discutir a questão de
Essequibo, que é reivindicada como território venezuelano.
• Declaração conjunta entre Guiana, Brasil
e Suriname
À margem da 46ª
Reunião Regular da Conferência dos Chefes de Governo da Comunidade do Caribe
(Caricom), os governos de Brasil, Guiana e Suriname divulgaram uma declaração
conjunta após encontros trilaterais entre as delegações dos países, que
terminou com o acordo para a implementação de grupos de trabalho em nível
técnico para as áreas de infraestrutura física e digital, energia e cooperação.
"Na área de
infraestrutura, os mandatários reconheceram a oportunidade de avançar na
consolidação de projetos que reforcem a conectividade física e digital entre os
três países, a exemplo da plena pavimentação da estrada Linden-Lethem, ligando
o estado brasileiro de Roraima a Georgetown, e da modernização da ligação
viária entre o estado brasileiro do Amapá e as capitais de Guiana e Suriname,
passando pela Guiana Francesa, a ser incluída em discussões futuras sobre essa
rota. Ressaltaram também a relevância de serem examinadas, nesse contexto, as
medidas para a otimização dessas rotas em matéria de facilitação de comércio e
investimentos."
Fonte: Sputnik Brasil
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